Por Frei Almir Ribeiro Guimarães
1. Temos uma vida inteira para conhecer os mistérios de Cristo Jesus. Longe de nós a ideia de que basta ter conhecimento nocional, seco e árido a seu respeito. Paulo, em suas epístolas, fala que esse mistério é insondável e que aos poucos podemos conhecer a altura, a largura e a profundidade do amor de Cristo por nós. Nossa convivência pessoal com o Ressuscitado nos leva a chegar amorosamente mais perto dele e assim nos revestirmos de tal força que nem possamos nos separar de seu amor. O cuidado pela busca desse conhecimento nos ajuda a viver em Cristo, de Cristo e por Cristo.
2. “Quem poderia conhecer todos os tesouros de sabedoria e de ciência ocultos em Cristo e escondidos na pobreza de sua carne? Ele, sendo rico, se fez pobre por nossa causa, a fim de enriquecer-nos com sua pobreza; contudo, não perdeu suas riquezas, mas prometeu-as para o futuro. Como é grande a riqueza de sua bondade, reservada para os que o temem e concedida aos que nele esperam!” (Santo Agostinho). Toda a espiritualidade do Coração de Jesus é marcada pela sabedoria e ciência que estão no coração aberto no alto da cruz.
3. Desde o começo de sua trajetória até sua morte de Cristo há um caminho de despojamento e de pobreza. Sempre ouvimos dizer que Cristo se fez pobre para nos enriquecer. Podemos dizer que a pobreza de Cristo está na raiz de sua sabedoria e de sua ciência. Jesus viveu de maneira simples. Conviveu com todo tipo de pessoas, mas sempre esteve entre os pequenos. Tinha particular satisfação de aproximar-se dos pecadores e, desta forma, sem autoritarismos e imposições, lhes propunha um caminho novo. Jesus é pobre, de maneira toda especial, porque não tem apoios externos. Ficamos perplexos de ver que, durante o seu processo, e mesmo antes, ele vive uma terrível solidão. Jesus é pobre e nessa pobreza ele traça a estrada que devem percorrer todos os que querem ser seus discípulos. A pobreza é caminho real que nos leva a Cristo e a sermos particularmente amados por seu Pai.
4. Francisco de Assis ficava abismado em meditar na pobreza de Jesus. Admirá-la, venerá-la e imitá-la é sinal de sabedoria e os que o fazem estão revestidos de um conhecimento divino. “Os irmãos não se apropriem de nada, nem de casa, nem de lugar. E como peregrinos e forasteiros neste mundo, servindo ao Senhor em pobreza e humildade, não devem envergonhar-se, porque o Senhor se fez pobre por nós neste mundo. Esta é aquela sublimidade da altíssima pobreza que vos constituiu, meus irmãos caríssimos, herdeiros e reis do Reino dos céus, vos fez pobres de coisas, vos elevou em virtudes. Seja esta a vossa porção que vos conduz à terra dos vivos. Aderindo totalmente a ela, irmãos diletíssimos, nenhuma outra coisas jamais queirais ter debaixo do céu em nome de Nosso Senhor Jesus Cristo” (Admoestação VI).
5. Tais palavras e considerações parecem estranhas aos ouvidos dos asseclas da sociedade da gastança, do consumo, dos bens, das coisas, do dinheiro, das prestações, dos juros baixos para facilitar o gastar. Jesus é fonte de sabedoria e de conhecimento existenciais. Precisamente em seu aniquilamento, de modo particular no aparente fracasso que é sua morte, está a força de Deus. Não nos cansamos de nos postar aos pés da cruz sempre nos dando conta do amor desse homem que é fiel até o fim. Ali, preso no madeiro, Jesus é o mais indefeso e os mais pobre de todos os homens. E o mundo todo foi embebido de seu amor e de sua entrega, desse pobre no presépio e paupérrimo na cruz. Por isso, nas primeiras sextas-feiras de cada mês os discípulos se postam diante do Coração do pobre mártir do Calvário, aberto pela lança e fazendo jorrar a água e o sangue.
6. Terminamos esta reflexão retomando Agostinho. As poucas frases que transcrevemos apontam para a pobreza do presépio. Agostinho lembra que um dia seremos saciados com o face a face do Ressuscitado. “Mas até que isso aconteça, até mostrar o que nos basta, até bebermos e ficamos saciados na fonte da vida que é ele mesmo, enquanto caminhamos na fé e peregrinamos longe dele, enquanto temos fome e sede de justiça e desejamos, com indizível ardor, contemplar a beleza de Cristo na sua condição divina, celebremos com amorosa devoção o nascimento de Deus na condição de servo”. Parafraseando Agostinho, podermos dizer: “Enquanto não podemos ver a glória do rosto do Ressuscitado celebremos com carinho e respeito o Coração daquele que amou até o fim e nos mostrou, por seu peito aberto, todas as riquezas do conhecimento e da sabedoria”.
Obs.: Os textos de Agostinho foram tirados de Liturgia das Horas I, p. 473-475.