Frei Luiz Iakovacz
Normalmente, fala-se dos direitos humanos, dos animais e vegetais. Raras vezes, alguém proclama que a “água tem direitos”. No entanto, foi isso que aconteceu em 22 de março de 1992, quando a Organização das Nações Unidas (ONU) publicou a Declaração Universal dos Direitos da Água e definiu que, a partir do ano seguinte (1993), nesta mesma data, se comemorasse o Dia Mundial da Água.
Será que a água tem direitos?! Entre outras, podemos mencionar três razões:
A primeira: a água é o princípio da vida e sem ela, nada pode existir.
Segunda: a ciência ensina que 70% da superfície da terra é de água; deste imenso volume, 97% da água é salgada e, apenas, 3% da água é própria para o consumo humano. Mesmo assim, ela sustenta todo o ser vivo que, nela existe! Porém, a própria ONU alerta que a “água é um recurso finito” e poderá faltar se, desde agora, não se tomarem medidas preventivas. Em 2030, por exemplo, para os seres vivos sobreviveram será necessário um volume quarenta (40) vezes maior que o de hoje.
A terceira motivação para celebrar os direitos da água vem do próprio corpo. A ciência diz que ele é mais água que massa corpórea, chegando à proporção de 50 a 65%, em um adulto. Aos nossos olhos, isto parece “quase impossível” e pergunta-se: “Onde está todo esse volume e o que faz”? A maior parte concentra-se nos milhões de células que, por sua vez, dependem da água para viverem. Além disso, ela ajuda no “transporte” de substâncias, regula a temperatura interna e expele resíduos e toxinas pela urina. O corpo humano está intimamente ligado à água. Tanto assim que precisa de aproximadamente quarenta (40) litros diários para prover suas necessidades pessoais, beber e cozinhar.
Resumidamente, os direitos da água são os seguintes:
01. A água faz parte do patrimônio do planeta;
02. A água é a seiva do nosso planeta;
03. Os recursos naturais de transformação da água em água potável são lentos, frágeis e muito limitados;
04. O equilíbrio e o futuro de nosso planeta dependem da preservação da água e de seus ciclos;
05. A água não é somente herança de nossos predecessores; ela é, sobretudo, um empréstimo aos nossos sucessores;
06. A água não é uma doação gratuita da natureza; ela tem um valor econômico: precisa-se saber que ela é, algumas vezes, rara e dispendiosa e que pode muito bem escassear em qualquer região do mundo;
07. A água não deve ser desperdiçada, nem poluída, nem envenenada;
08. A utilização da água implica respeito à lei;
09. A gestão da água impõe um equilíbrio entre os imperativos de sua proteção e as necessidades de ordem econômica, sanitária e social;
10. O planejamento da gestão da água deve levar em conta a solidariedade e o consenso em razão de sua distribuição desigual sobre a Terra.
Se de um lado, esta Declaração Universal tem respaldo de todos há, porém, certa reserva com o item 06. É bom estarmos atentos porque a água é “patrimônio universal” e, consequentemente, não pode ser privatizada e comercializada.
Como cristãos e, utilizando-nos da Bíblia, precisamos afirmar que a água é dom da natureza. Deus a criou (Gn 1,6-13), bem como os rios que frutificam a terra (Gn 2,10-14); a faz brotar, gratuitamente, da rocha (Ex 7,6) e purifica a que se estragou (2 Rs 2,21); faz brotar água pura do Templo de Jerusalém, formando um rio que traz fartura onde passa (Ez 47,1-12); a água cura (Jo 5,1-9) e é gratuita (Apoc 21,6; 22,17).
Por outro lado, a luta pela posse da água provoca atritos entre pastores (Ex 2, 13-22), trama a morte de Moisés (Ex 17,1-4) e desune o próprio povo, no poço de Jacó (Jo 4,7-15). A água, também, é fonte de salvação e morte como relatam os episódios do dilúvio (Gn 7,1-23) e a passagem do Mar Vermelho (Ex 14,15-31). Seguidamente, a Bíblia se refere à água e ela não vem do acaso, pois está relacionada com o Criador.
Os que vivenciam o carisma franciscano são impelidos a lutarem pela defesa da água, assim como ela é: “Louvado sejas, meu Senhor, pela irmã água que é mui útil, humilde, preciosa e casta (Cântico do Irmão Sol, 7). Este é o seu direito, deixar ser o que ela é, de fato!
Por fim, é necessário acreditar e viver a experiência do Mestre Jesus, no encontro com a samaritana, junto ao poço de Jacó: “Quem beber desta água terá sede novamente. Mas quem beber da água que Eu lhe der, tornar-se-á, nele, uma fonte de água que jorra para a vida eterna” (Jo 4,13-14).
Esta promessa, Ele a reafirma por ocasião da Festa dos Tabernáculos. “No último dia, o mais solene da festa, de pé, no meio do Templo, grita: Quem tiver sede, venha a Mim, e beba! É como diz a Escritura: ‘do seu interior brotarão rios de água viva’. Jesus falou isso referindo-se ao Espírito que iam receber os que Nele acreditassem. Com efeito, ainda não tinham o Espírito porque ainda não havia sido glorificado” (Jo 7,37-39).