
No dia 05 de junho de 2025 a equipe do ITF fez uma visita técnica ao Convento Santo Antônio, no Rio de Janeiro, para preparar o Congresso Franciscano. Na volta, o grupo fez uma parada na Ilha do Fundão, na Baía da Guanabara, para visitar a Igreja de Bom Jesus da Ilha. Poucos conhecem este templo, que, diga-se de passagem, é muito bem conservado. Frei Sandro Roberto da Costa, Diretor do ITF, conseguiu o contato do Capelão que cuida atualmente da Igreja, Padre Lindemberg, que muito solicitamente anuiu ao pedido, colocando à disposição uma religiosa, Irmã Eva, para guiar a equipe durante a visita. A Igreja é hoje o único prédio remanescente daquele que um dia foi um convento franciscano, no meio da Baía da Guanabara.
Um pouco de história
A construção do convento de Bom Jesus da Ilha iniciou-se em 1704. O local era conhecido como Ilha da Caqueira, uma das oito ilhas que compunham o conjunto de ilhas, que, entre 1940 e 1950, foram soterradas e agrupadas, para possibilitar a construção da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Depois disso, passou a denominar-se Ilha do Fundão.
A construção do Convento e Igreja foi motivada pela necessidade de a Província ter um lugar adequado para acolher os frades doentes. A enfermaria do Convento Santo Antônio, em fins de 1600, estava abarrotada. A escolha do lugar deu-se pelo motivo de os frades já terem uma pequena casa na ilha, usada em momentos de passeio e recreação, desde fins de 1600. A pequena ilha original foi doada aos frades por D. Inês de Andrade, viúva do Capitão Francisco Teles Barreto, por escritura no ano de 1704. A pedra fundamental foi colocada no ano seguinte. Cinco anos depois, em 1710, o convento ficou pronto. A “Ilha da Caqueira” tornou-se a “Ilha dos frades” e, depois da construção, por causa do padroeiro, tornou-se a “Ilha do Bom Jesus”.
Embora fosse construído originalmente para receber os doentes e convalescentes da Província, o convento também recebeu estudantes de filosofia e teologia. E funcionou também como noviciado da Província. Todos os anos, por ocasião da oitava de São Francisco (os dias que se seguem à festa de São Francisco, 04 de outubro), D. João VI, sua família e comitiva iam ao convento. Visitavam os frades, depois passavam alguns dias na ilha.
As requisições do Governo Imperial e o fim da presença franciscana
Com o advento da decadência e a diminuição numérica não só dos franciscanos, mas dos religiosos em geral no Império, a Província não conseguia preencher todos os cargos nos conventos. O Governo Imperial, por sua vez, não apoiava a vida religiosa. O grande edifício, localizado relativamente próximo do centro da cidade, mas ao mesmo tempo isolado, foi seguidamente solicitado pelo governo para acolher doentes, principalmente aqueles que exigiam isolamento, devido ao risco de contágio. No ano de 1822 o convento foi requisitado para servir de “Hospital de Lázaros” (Leprosário). Foi permitido à Província deixar um ou dois religiosos para cuidar das alfaias e celebrar a missa para os enfermos. Em 1836 uma outra requisição foi feita, desta vez para abrigar os Colonos espanhóis das Canárias, vítimas das “febres”. Neste período ainda havia um frade como guardião do convento. Em 1850 foi a vez do convento acolher os doentes de cólera, que grassava na Bahia.

No ano de 1852, o convento e todas as propriedades existentes na ilha, foram cedidos em usufruto, gratuitamente, por vinte anos, às Irmãs alemãs do Sagrado Coração de Maria, que se encarregava da educação de meninas. As irmãs ficaram apenas quatro anos no local. Em 1857, mais uma vez o convento recebia os doentes de febre amarela, por apenas um ano. No ano seguinte, através de um contrato entre o governo e a Associação Cultural de Colonização, esta última passava a gozar do usufruto do convento por cinco anos, devendo pagar, anualmente, 400 contos de réis à Província. Devia também reservar três celas e um salão ao lado da Igreja, para o guardião ou outros religiosos por ocasião de solenidades. Em 1865 este contrato passou para o Ministério da Guerra, que passou a usar o convento para aquartelamento das tropas, pagando 800 contos de réis por ano. Nesta época o número de frades na Província era reduzido. Desde o Aviso do Ministério da Justiça, do dia 19 de maio de 1855, os religiosos do Brasil ficavam proibidos de receber noviços. A Província definhava a olhos vistos. O convento, por sua vez, também carecia de cuidados, de manutenção e reforma.

Durante a Guerra do Paraguai (1864-1870), o Governo cogitou construir um edifício para acolher os soldados mutilados ou doentes que regressavam da guerra. O nome dado à construção na época era grandiloquente: Asilo para os Inválidos da Pátria. O terreno do convento foi o escolhido. Consta que os frades não foram consultados. O fato é que, no dia 29 de julho de 1868, era inaugurado solenemente, na Ilha do Bom Jesus, o Asilo dos Inválidos da Pátria. Era uma construção nova (ainda não totalmente acabada), mas que também ocupava parte do convento. No ano de 1875 foram feitas as negociações com a Província, para a legalização da venda do terreno e do convento ao Governo. O convento e a ilha foram vendidos por 60 apólices da dívida pública, de 1 conto de réis cada uma. O último frade que morava na ilha, frei Manuel de Santa Isabel Brandão, que servia como Capelão do Asilo, foi exonerado em 1875.
Complexo artístico e arquitetônico
A igreja é constituída de um belíssimo altar mor, com retábulo feito de talha dourada, muito bem conservado. Imagens barrocas de São Francisco, Santo Antônio e da Imaculada Conceição encimam o altar. Chama a atenção, no entanto, a belíssima imagem, em tamanho natural, do Senhor Bom Jesus atado à Coluna, que dá nome ao convento. Dois anjos tocheiros barrocos, em tamanho natural, de madeira, também se destacam pela harmonia barroca. Há ainda dois altares laterais, mais simples. É digno de nota a imagem de Sant’anna, que, segundo afirmam, foi trazida da Fortaleza do Humaitá, pelos soldados que retornaram da Guerra do Paraguai.
Logo abaixo do altar mór, na frente, no corredor central, há uma bela lápide, de pedra de lioz, onde consta o nome do filho da doadora, Antônio Teles de Menezes, que foi padroeiro do convento, mandado fazer por seu filho, Francisco Teles de Barreto de Menezes. No centro do corredor há uma cripta (catacumba), à qual é possível ter acesso erguendo-se uma porta de madeira. Interessante que é a única igreja da Província que tem esta construção. Esta cripta foi aterrada e cimentada na época da ocupação do convento pelos militares. Mas, não sabemos em que época, foi desaterrada e hoje é possível visitá-la. É constituída de três carneiros (sepulturas), uma no centro, e duas nas laterais. Nela guarda-se uma urna de metal com os ossos de duas mulheres, parentes dos doadores do terreno.
No lado direito da igreja ainda existe um corredor espaçoso, que é parte daquilo que um dia foi o claustro do convento. O mesmo corredor encontra-se também na parte de cima. Esses amplos corredores ao longo de todo o cumprimento da Igreja permitem ter uma ideia da grandiosidade daquela construção. Nas fotos antigas percebe-se que existiam dois claustros, um de cada lado da igreja. Hoje o que sobrou é apenas a igreja. Há ainda a torre sineira, com o sino. Também desapareceu o arco cruzeiro, que ficava em frente à Igreja. Hoje também não há nem sinais dos alicerces do antigo convento. O Asilo dos Inválidos, por sua vez, também está em ruínas, como podemos constatar pelas fotos.
A igreja hoje

Numa foto em preto e branco do ano de 1909 ainda é possível ver-se o complexo todo do que era o convento de Bom Jesus da Ilha. Ao lado da igreja, à direita e à esquerda estão as duas construções, que constituíam os claustros. Não conseguimos descobrir em que ano começaram as demolições do prédio. O fato é que, entre 1940 e 1950 foram feitos os aterramentos das várias ilhas, para a construção da Cidade Universitária da Universidade federal do Rio de Janeiro. Muito provavelmente todo o material que constituía a secular construção acabou servindo de aterro para este imenso projeto. São conjecturas, que só uma pesquisa mais acurada, principalmente nos arquivos da Prefeitura do Rio, no Departamento de Obras, ou no Arquivo do Exército poderão esclarecer. A igreja foi tombada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), em 1937. Atualmente está em território militar, e tem o título de “Santuário Militar Bom Jesus da Coluna”. Nela são celebradas missas aos domingos, às 10 horas, abertas ao público.
Frei Sandro Roberto da Costa



































