Vida Cristã - Província Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil - OFM

4º domingo do Advento

Quarto domingo do Advento

Salve, santo silêncio de José!

 

Frei Gustavo Medella

“Ao ver sua Esposa em Mãe transformar-se
José quer deixar Maria em Segredo.
Um anjo aparece: ‘É obra de Deus!’
Afasta-lhe o medo.

(Hino da Solenidade de São José – estrofe inspirada em Mt 1,19)

Em tempos de não se levar desaforo para casa, de se lavar roupa suja em praça pública e nas redes sociais, de se fazer prosperar a injustiça e o ódio à força de notícias falsas e escandalosas, de se promover julgamentos capitais, sumários e superficiais, o silêncio do justo José traz consigo uma eloquência profética. É um silêncio que grita. Não se trata de omissão, mas de prudência, sabedoria e compaixão. Silêncio de quem, nas idas e vindas da vida, amadureceu o suficiente para saber que as respostas nem sempre são imediatas e o primeiro impulso com frequência não é a ação mais indicada. Obrigado por este precioso silêncio, ó bom e justo José!

No quarto domingo do Advento, às vésperas da chegada do Emanuel, é hora de guardarmos este silêncio fecundo que traz em si uma admiração impossível de ser expressa só por palavras. Afinal, diante da Palavra de Deus-Conosco, o mais sábio que se tem a fazer é calar… E contemplar. Logo, logo, é Natal!


FREI GUSTAVO MEDELLA, OFM, é o atual Vigário Provincial e Secretário para a Evangelização da Província Franciscana da Imaculada Conceição. Fez a profissão solene na Ordem dos Frades Menores em 2010 e foi ordenado presbítero em 2 de julho de 2011


Imagem ilustrativa de Frei Fábio Melo Vasconcelos

Leituras bíblicas para este domingo

Primeira Leitura: Isaías 7,10-14

Naqueles dias, 10o Senhor falou com Acaz, dizendo: 11“Pede ao Senhor teu Deus que te faça ver um sinal, quer provenha da profundeza da terra, quer venha das alturas do céu”. 12Mas Acaz respondeu: “Não pedirei nem tentarei o Senhor”. 13Disse o profeta: “Ouvi, então, vós, casa de Davi: será que achais pouco incomodar os homens e passais a incomodar até o meu Deus? 14Pois bem, o próprio Senhor vos dará um sinal. Eis que uma virgem conceberá e dará à luz um filho, e lhe porá o nome de Emanuel”. – Palavra do Senhor.


Salmo Responsorial: 23(24)

O rei da glória é o Senhor onipotente; / abri as portas para que ele possa entrar!

  1. Ao Senhor pertence a terra e o que ela encerra, / o mundo inteiro com os seres que o povoam; / porque ele a tornou firme sobre os mares / e, sobre as águas, a mantém inabalável. – R.
  2. “Quem subirá até o monte do Senhor, / quem ficará em sua santa habitação?” / “Quem tem mãos puras e inocente coração, / quem não dirige sua mente para o crime. – R.
  3. Sobre este desce a bênção do Senhor / e a recompensa de seu Deus e salvador.” / “É assim a geração dos que o procuram / e do Deus de Israel buscam a face.” – R.

Segunda Leitura: Romanos 1,1-7

1Eu, Paulo, servo de Jesus Cristo, apóstolo por vocação, escolhido para o evangelho de Deus, 2que pelos profetas havia prometido, nas Sagradas Escrituras, 3e que diz respeito a seu Filho, descendente de Davi segundo a carne, 4autenticado como Filho de Deus com poder pelo Espírito de santidade que o ressuscitou dos mortos, Jesus Cristo, nosso Senhor. 5É por ele que recebemos a graça da vocação para o apostolado, a fim de podermos trazer à obediência da fé todos os povos pagãos, para a glória de seu nome. 6Entre esses povos estais também vós, chamados a ser discípulos de Jesus Cristo. 7A vós todos que morais em Roma, amados de Deus e santos por vocação, graça e paz da parte de Deus, nosso Pai, e de nosso Senhor Jesus Cristo. – Palavra do Senhor.


O começo de uma nova história

Evangelho: Mt 1, 18-24

* 18 A origem de Jesus, o Messias, foi assim: Maria, sua mãe, estava prometida em casamento a José, e, antes de viverem juntos, ela ficou grávida pela ação do Espírito Santo. 19 José, seu marido, era justo. Não queria denunciar Maria, e pensava em deixá-la, sem ninguém saber. 20 Enquanto José pensava nisso, o Anjo do Senhor lhe apareceu em sonho, e disse: «José, filho de Davi, não tenha medo de receber Maria como esposa, porque ela concebeu pela ação do Espírito Santo. 21 Ela dará à luz um filho, e você lhe dará o nome de Jesus, pois ele vai salvar o seu povo dos seus pecados.»

22 Tudo isso aconteceu para se cumprir o que o Senhor havia dito pelo profeta: 23 «Vejam: a virgem conceberá, e dará à luz um filho. Ele será chamado pelo nome de Emanuel, que quer dizer: Deus está conosco.» 24 Quando acordou, José fez conforme o Anjo do Senhor havia mandado: levou Maria para casa.

* 18-25: Jesus não é apenas filho da história dos homens. É o próprio Filho de Deus, o Deus que está conosco. Ele inicia nova história, em que os homens serão salvos (Jesus = Deus salva) de tudo o que diminui ou destrói a vida e a liberdade (os pecados).

Bíblia Sagrada – Edição Pastoral

Reflexões do exegeta Frei Ludovico Garmus

4º Domingo do Advento, Ano A

 Oração: Derramai, ó Deus, a vossa graça em nossos corações para que, conhecendo pela mensagem do Anjo a encarnação do vosso Filho, cheguemos, por sua paixão e cruz, à glória da ressurreição.

  1. Primeira leitura: Is 7,10-14

Eis que uma virgem conceberá.

Acaz, rei de Judá, preparava-se para pedir socorro ao grande rei da Assíria, a fim de proteger-se contra os pequenos reinos vizinhos. O motivo era que o rei dos arameus e de Israel queriam forçar Acaz a entrar numa aliança contra o rei da Assíria, sob pena de o destituir do trono, colocando em perigo a promessa da estabilidade da dinastia de Davi (2Sm 7,16). Isaías desaconselha Acaz de buscar auxílio da Assíria. Pede apenas que o rei confie em Deus e peça um sinal do céu. Mas o rei prefere seguir a opinião de seus conselheiros militares a escutar a voz do Profeta. É neste contexto que é dado o sinal da virgem – assim era chamada a jovem esposa do rei – que conceberá e dará a luz um filho. Sinal que Deus não abandonava seu povo seria o nome a ser dado ao meninoEmanuel, Deus conosco. O nascimento do menino, herdeiro do trono de Acaz, seria o sinal do socorro divino no qual o rei deveria confiar. Os evangelhos e a Igreja veem em Jesus, nascido da virgem Maria, pelo poder do Espírito Santo, a realização plena do sinal do Emanuel, Deus conosco (Evangelho).

Salmo responsorial: Sl 23 (24)

O rei da glória é o Senhor onipotente;

abri as portas para que ele possa entrar!

  1. Segunda leitura: Rm 1,1-7

Jesus Cristo, descendente de Davi, Filho de Deus.

Ao escrever aos romanos, Paulo segue o costumeiro cabeçalho de endereçamento duma carta, composto por três elementos essenciais: quem escreve (“Eu Paulo”, v. 1), a quem escreve (“a vós todos que morais em Roma”, v. 7a) e a fórmula de saudação (“graça e paz da parte de Deus, nosso Pai…”). Paulo, porém, entusiasmado pelo anúncio do Evangelho, faz acréscimos importantes em cada um dos itens. O início da Carta aos Romanos é tão denso que pode ser considerado como um resumo do Evangelho: Cristo é o Filho de Deus, “segundo o Espírito”, e Filho de Davi, “segundo a carne”; é o Senhor glorioso e ressuscitado, presente na comunidade; nele se cumprem as promessas feitas pelos profetas. Por graça de Cristo, Paulo se considera “apóstolo por vocação, para o Evangelho de Deus”, o mesmo Evangelho de Deus que Jesus começou a pregar (cf. Mc 1,14). Este Evangelho não é restrito apenas aos judeus, mas se destina também a “trazer à obediência da fé todos os povos pagãos”. Entre estes povos estão os cristãos de Roma, que acolheram a mensagem de Paulo. Com estas palavras de Paulo define-se a missão universal do Salvador que esperamos: Jesus veio para salvar toda a humanidade.

Aclamação ao Evangelho

Eis que a virgem conceberá e dará à luz um filho.

Chamar-se-á Emanuel que significa: Deus conosco.

  1. Evangelho: Mt 1,18-24

Jesus nascerá de Maria, prometida em casamento a José, filho de Davi.

As histórias da infância de Lucas e Mateus apresentam narrativas bastante distintas. Mesmo assim contém dados comuns: o nome de Jesus, os nomes de Maria, sua mãe, e de José, seu “pai adotivo”; José como descente de Davi; que Maria já estava legalmente prometida a José; o nascimento em Belém, e Nazaré, como residência de Maria e José e de Jesus. Principalmente a convicção de fé acerca da concepção virginal do menino Messias e sua “filiação divina”, por obra do Espírito Santo.

Mateus apresenta a genealogia de Jesus Cristo desde Abraão até Jacó, seguindo o esquema “fulano foi pai de sicrano” (Mt 5 1,1-17). Mas ao chegar a José diz: “Jacó foi pai de José, esposo de Maria, da qual nasceu Jesus chamado Cristo”. O evangelho de hoje quer explicar por que Maria e não José está na origem da geração de Cristo, porque foi “concebido pela ação do Espírito Santo”. Este é um dado que Mateus recebeu da tradição cristã. José é apresentado legalmente como esposo de Maria. Por isso, prometida em casamento a José. Seria o que chamaríamos hoje de noivado, que naqueles tempos não significava ainda convivência do casal. Vendo sua noiva grávida, José, um homem justo e temente a Deus, pensava em separar-se de Maria, sem denunciá-la publicamente por infidelidade. Em sonho, porém, o anjo lhe explica o mistério. José, então, acolhe Maria em sua casa, torna-se o pai legal de Jesus e assegura sua descendência davídica. Assim fica esclarecida a verdadeira identidade de Jesus: Jesus é descendente de Davi, através do pai adotivo e legal José; é filho da virgem Maria, esposa legal de José, mas concebido pelo poder do Espírito Santo. Por isso, é o Filho de Deus, o Emanuel, o Deus conosco, para sempre: “Eis que estou convosco, todos os dias, até o fim do mundo” (Mt 28,20).

O tema central da liturgia de hoje é o encontro do divino e do humano em Jesus Cristo, o Emanuel, Deus conosco. Paulo, na 2ª leitura, resume este mistério lembrando que Cristo, “segundo a carne”, é descendente de Davi, mas foi “autenticado como Filho de Deus segundo o Espírito de Santidade que o ressuscitou dos mortos”. Neste mistério do encontro do divino com o humano, Maria ocupa um lugar central. Nos Evangelhos, José não pronuncia nenhuma palavra. É o homem justo e silencioso que contempla o mistério da Encarnação. Um convite para assim nos prepararmos para o Natal.


FREI LUDOVICO GARMUS, OFMé professor de Exegese Bíblica do Instituto Teológico Franciscano de Petrópolis (RJ). Fez mestrado em Sagrada Escritura, em Roma, e doutorado em Teologia Bíblica pelo Studium Biblicum Franciscanum de Jerusalém, do Pontifício Ateneu Antoniano. É diretor industrial da Editora Vozes e editor da Revista “Estudos Bíblicos”, editada pela Vozes. Entre seus trabalhos está a coordenação geral e tradução da Bíblia Sagrada da Vozes.

Jesus Salvador de cada pessoa humana

Frei Clarêncio Neotti

Mateus conta que José deu ao filho, nascido de Maria, o nome de Jesus. Desde o início de seu Evangelho, acentua em Jesus a qualidade de salvador. Repete o que pouco antes disse: “Ele salvará o povo”. Porque Jesus, em hebraico, quer dizer: “Deus é salvação”. O nome Jesus não era novidade, o Nome Josué tem o mesmo significado. E tanto um quanto outro eram usados como nomes próprios. A novidade era Jesus de Nazaré vir para salvar o povo de seus pecados (1/21). Outros salvaram de inimigos e animais ferozes, de fome e desgraças. Jesus de Nazaré libertou o homem do pecado, para que o homem retornasse à comunhão com Deus.

Pouco mais adiante, no capítulo 9/ Mateus observa que fariseus e doutores da lei se escandalizaram, porque Jesus dissera a alguém: “Teus pecados te são perdoados” (9/2). Jesus lhes declarou abertamente: “Tenho na terra o poder de perdoar pecados” (9/6). Quando, portanto, no Evangelho de hoje, Mateus nos diz que José “pôs nele o nome de Jesus”, não quer apenas nos dizer o nome pelo qual o Menino seria chamado, mas nos dizer qual seria a missão específica desse Menino, concebido de forma miraculosa: ser o Salvador dos homens.

Pôr o nome no menino tinha ainda um sentido jurídico.  José adotava a criança que não nascera dele. E, sendo José da família de Davi, ao adotar o menino, inseriu-o na linhagem de Davi, como haviam predito os profetas. Assim Paulo pôde dizer na segunda leitura (Rm 1/3): “Jesus nasceu da estirpe de Davi, segundo a carne”. Além do nome Jesus, Mateus ainda nos dá hoje dois outros nomes dele: filho de Davi, pelo qual Jesus será chamado inúmeras vezes na vida pública; e Emanuel, que exprime a razão de ser da encarnação: ser um Deus–conosco, para que nós sejamos pessoas-com-Deus.


FREI CLARÊNCIO NEOTTI, OFMentrou na Ordem Franciscana no dia 23 de dezembro de 1954. Durante 20 anos, trabalhou na Editora Vozes, em Petrópolis. É membro fundador da União dos Editores Franciscanos e vigário paroquial no Santuário do Divino Espírito Santo (ES). Escritor e jornalista, é autor de vários livros e este comentário é do livro “Ministério da Palavra – Comentários aos Evangelhos dominicais e Festivos”, da Editora Santuário.

A Mãe do Menino está para dar à luz

Frei Almir Guimarães

♦ Estamos bem às portas do Natal.  Deus conosco, Emanuel. Ainda um pouco de tempo para enfeitar nosso interior e deixar de lado preocupações exageradas com o secundário que anda tomando o lugar do essencial: o Senhor que os espaços siderais não comportam veio viver nossa existência em todas as circunstâncias.  Mateus vem nos dizer que o Menino das Palhas é o único que podemos chamar de Emanuel. Aquele que vive a nossa vida.

♦ Inspirado em página de Pagola podemos seguir suas sugestões para a preparação mais imediata da festa da Encarnação:

>> É preciso que tenhamos a coragem de ficar a sós. Procurar um lugar tranquilo e sossegado.  Escutar nosso interior, nossa verdade mais íntima.  Vivemos cercados de pessoas que amamos e pelas quais somos amados.  Quando entramos no mundo do silêncio parece que tudo pode ganhar distância e vemos as coisas em sua nudez. Tomamos distância de nós e de circunstâncias que podem nos empobrecer.

>> Continuando ainda em silêncio podemos ter a impressão que fazemos parte de uma realidade mais ampla, desconhecida. Donde nos chega a vida? O que há no fundo de nosso ser? Se continuarmos mais um pouco em silêncio talvez venhamos a experimentar um certo temor e, ao mesmo tempo,  uma paz que antes não havíamos experimentado. Estamos diante do mistério ultimo de nosso ser que chamamos de Altíssimo,  Senhor, Magnífico.

>> Precisamos nos abandonar a esse Mistério com confiança. Deus parece imenso e longínquo.  Se nos abrimos a ele, haveremos de perceber que está próximo de nós.  Ele está em nós  sustentando nossa  fragilidade e  fazendo-nos viver. Não é como as pessoas que nos amam a partir do exterior. Deus é mais íntimo do que somos a nós mesmos.

>> Karl  Ranher afirma que a experiência do coração é única que nos faz compreender a mensagem de fé do Natal:  Deus se fez homem. Nunca estamos sozinhos.  Se assim for, podemos celebrar o Natal.  Haveremos de nos alegrar com os nossos e ser mais generoso com os que sofrem e vivem tristes.

♦ E Maria se faz presente neste  4º domingo do Advento.  Essa mocinha de Nazaré foi colocada diante da proposta do Altíssimo de viver perto de nós.  O Deus grande por meio do mensageiro  pede assentimento à moça de Nazaré.  Há  hesitações, solicitações de esclarecimentos,  relutância  com protesto de humildade de sua parte.  Ela pertencia ao grupo dos pobres de Javé que contavam com a ação de Deus em sua vida e na história de seu povo.  “Eis aqui a serva do Senhor.  Fala-se em mim segundo a sua Palavra”.  Quem sabe tudo isso levou tempo.  Maria deixou o convite descansar nos cantinhos de seu interior. Com o seu assentimento abrem-se as cortinas de seu interior. O sim da moça de Nazaré é a primeira etapa da instauração do mundo novo com Jesus.

♦ Passou ela a guardar as coisas no fundo do coração. Vestida da força do alto, respirando esperança, Maria vai percorrer seu caminho de fé de mulher grávida.  Vai acompanhar seu  Filho em suas andanças, aplausos e perseguições,  até o alto da cruz… Sempre mãe, sempre fiel,  sempre levando as coisas ao fundo do coração.

♦ Deus não é o Ser onipotente e poderoso que às vezes nós, humanos, imaginamos, encerrado na seriedade e no mistério de seu mundo incessível. Deus é esse menino entregue carinhosamente  à  humanidade, esse pequeno que busca o nosso olhar  para alegrar-nos com seu sorriso. O fato de Deus se ter feito menino diz muito mais sobre Deus as sutilezas e especulações sobre seu mistério.


Oração

É quase Natal!

Senhor, é quase Natal.
Ainda não é Natal.
Paira , no entanto, no ar uma suave esperança
que nem sabemos descrever.
É bom esperar,  muito  bom esperar.
Esperar o amigo que vem de longe,
o fim de uma doença que nos atemorizava,
a chegada da primavera depois de um inverno rude,
o entendimento depois do desentendimento.
Quero esperar,  preciso esperar.
Quantas vezes acontece que paro
nessas coisas de todos os dias
que não me enchem de  fôlego e de entusiasmo.
No canto da minha boca, por vezes, um sorriso amargo,
inexpressivo de quem nada espera.
Mas agora é diferente.
Estamos às portas do Natal.
Bendita noite de Natal.
Que nesta hora, Senhor,  meu coração experimente sede de ti
Que de todos os cantinhos de meu coração subam um suspirar pela tua vinda.
Estou bem perto de  Maria, Maria do Advento.
Para  Deus nada   é impossível.


FREI ALMIR GUIMARÃES, OFMingressou na Ordem Franciscana em 1958. Estudou catequese e pastoral no Institut Catholique de Paris, a partir de 1966, período em que fez licenciatura em Teologia. Em 1974, voltou a Paris para se doutorar em Teologia. Tem diversas obras sobre espiritualidade, sobretudo na área da Pastoral familiar. É o editor da Revista “Grande Sinal”.

Não precisamos de Deus entre nós?

José Antonio Pagola

Há uma pergunta que todos os anos me ronda desde que começo a observar pelas ruas os preparativos que anunciam a proximidade do Natal: o que pode haver ainda de verdade no fundo dessas festas tão degeneradas por interesses consumistas e por nossa própria mediocridade?

Não sou o único. Ouço muitas pessoas falar da superficialidade do Natal, da perda de seu caráter íntimo e familiar, da vergonhosa manipulação dos símbolos religiosos e de tantos excessos e despropósitos que deterioram hoje o Natal.

Mas, na minha opinião, o problema é mais profundo. Como pode celebrar o mistério de um “Deus feito homem” uma sociedade que vive praticamente de costas para Deus, e que destrói de tantas maneiras a dignidade do ser humano?

Como pode celebrar “o nascimento de Deus” uma sociedade na qual o célebre professor francês G. Lipovetsky, ao descrever a atual indiferença, pode dizer estas palavras: “Deus está morto, as grandes finalidades se extinguem’ mas para todo o mundo isso dá na mesma, é essa a feliz notícia”?

Ao que parece, são muitas as pessoas para as quais dá exatamente no mesmo crer ou não crer, ouvir que “Deus está morto” ou que “Deus nasceu’: Sua vida continua funcionando como sempre. Parece que não precisam mais de Deus.

E, no entanto, a história contemporânea já está nos obrigando a fazer algumas graves perguntas. Há algum tempo se falava da “morte de Deus”; hoje se fala da “morte do ser humano’: Há alguns anos se proclamava “o desaparecimento de Deus”; hoje se anuncia “o desaparecimento do ser humano”. Será que a morte de Deus não arrasta consigo de maneira inevitável a morte do ser humano?

Expulso Deus de nossas vidas, encerrados em um mundo criado por nós mesmos e que não reflete senão nossas próprias contradições e misérias, quem pode dizer-nos quem somos e o que realmente queremos?

Não é indispensável que Deus nasça de novo entre nós, que brote com nova luz em nossas consciências, que se abra caminho no meio de nossos conflitos e contradições?

Para encontrar-nos com esse Deus não é preciso ir muito longe. Basta achegar-nos silenciosamente a nós mesmos. Basta aprofundar-nos em nossas interrogações e anseios mais profundos.

Esta é a mensagem do Natal: Deus está perto de ti, onde estás, contanto que te abras a seu Mistério. O Deus inacessível se fez humano e sua proximidade misteriosa nos envolve. Em cada um de nós Deus pode nascer.


JOSÉ ANTONIO PAGOLA cursou Teologia e Ciências Bíblicas na Pontifícia Universidade Gregoriana, no Pontifício Instituto Bíblico de Roma e na Escola Bíblica e Arqueológica Francesa de Jerusalém. É autor de diversas obras de teologia, pastoral e cristologia. Atualmente é diretor do Instituto de Teologia e Pastoral de São Sebastião. Este comentário é do livro “O Caminho Aberto por Jesus”, da Editora Vozes.

Esperar o Filho de Deus

Pe. Johan Konings

Neste último domingo do Advento celebramos o ponto alto de nossa esperança e de nossa espera. Revivemos a espera do Messias, para tirar mais fruto de sua vinda, que continua acontecendo em cada momento da história.

Quando o antigo Israel estava ameaçado pelos povos estrangeiros, Deus suscitou a esperança do povo mediante o sinal da “jovem”(a rainha?) que ficou grávida e cujo filho receberia o nome de “Emanuel”, Deus conosco (1ª leitura). Visto que “jovem” pode também ser traduzido por “Virgem”, esse sinal se realiza plenamente em Maria Virgem. A concepção, pela “Virgem”, do filho dado por Deus é o sinal de que Deus está agindo. O povo pode contar com ele.

Em Jesus, a Escritura se cumpre (evangelho). Deus está agindo, mas não sem que os seus colaboradores assumam sua responsabilidade. José, “descendente de Davi”, faz com que o “filho de Deus”(o Messias) nasça “filho de Davi”, ou seja, descendente de Davi, conforme as Escrituras (cf. Mt 1, 1-16). José não precisa ter medo de acolher Maria: ela é sua esposa (Mt 1,20). Ela se tornará mãe do Emanuel, pelo poder do Espírito de Deus (Deus que age, Mt 1,21). Assim, humanamente falando, Jesus é “filho de Davi” e, pela obra do Espírito Santo em Maria, ele é “Filho de Deus” (2ª leitura).

O mistério de Jesus ter nascido sem que Maria deixasse de ser virgem significa que Jesus, em última instância, não é mera obra humana, mas antes de tudo um presente de Deus à humanidade. Seu nascimento é sinal de que Deus está conosco para nos salvar. Seu nome, Jesus, significa “Deus salva”; é o equivalente de Emanuel.

O mistério se manifesta através de sinais: o mistério do amor, através da rosa; o mistério de Deus que age, através do sinal da Virgem que se torna mãe. Há uma coisa que nos ajuda a vislumbrar o significado desta história: diante da gravidez, os pais, e sobretudo a mãe, têm consciência da presença de um mistério: os pais sentem que o filho não é apenas obra deles.

Diante do mistério do Filho que Deus dá ao mundo, nós sentimos profunda admiração-contemplação, fé e confiança diante do agir de Deus em Jesus, verdadeiramente homem e verdadeiramente Filho de Deus. Sentimos também gratidão pelo presente que Deus nos oferece. E deixando de lado todas as (vãs e vaidosas) tentativas de “resolver o mistério”, dedicamo-nos a contemplá-lo e a nos envolver na alegria que ele representa.


PE. JOHAN KONINGS nasceu na Bélgica em 1941, onde se tornou Doutor em Teologia pela Universidade Católica de Lovaina, ligado ao Colégio para a América Latina (Fidei Donum). Veio ao Brasil, como sacerdote diocesano, em 1972. Em 1985 entrou na Companhia de Jesus (Jesuítas) e, desde 1986, atuou como professor de exegese bíblica na FAJE, Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia, em Belo Horizonte. Faleceu no dia 21 de maio de 2022.  Este comentário é do livro “Liturgia Dominical, Editora Vozes.

Caminhos do Evangelho