33º Domingo do Tempo Comum
- 33º Domingo do Tempo Comum
- Leituras bíblicas para este domingo
- Reflexão do exegeta Frei Ludovico Garmus
- Presente e futuro se confundem
- Quando as coisas tocam seu termo
- As palavras de Jesus não passarão
- “Minhas palavras não passarão”
- Reflexão em vídeo de Frei Gustavo Medella
33º Domingo do Tempo Comum
Abraçar o que não passa
Frei Gustavo Medella
As leituras deste 33º Domingo do Tempo Comum acenam para o tema da permanência, ou seja, debruçam-se sobre a questão: “Diante de tanta inconstância e perecibilidade, o que de fato permanece, o que resiste à ação do tempo?”. Na primeira Leitura, o Profeta Daniel menciona a sabedoria e a generosidade em dividi-la como credenciais para uma eternidade feliz: “Mas os que tiverem sido sábios brilharão como o firmamento; e os que tiverem ensinado a muitos homens os caminhos da virtude brilharão como as estrelas, por toda a eternidade” (Dn 12,3).
O Salmo Responsorial (Sl 15) celebra o contentamento eterno de uma vida com Deus: “Junto a vós, felicidade sem limites, delícia eterna e alegria ao vosso lado”. A segunda leitura, por sua vez, ressalta a força e a atualidade do Sacrifício de Cristo-Sacerdote, sentado “para sempre à direita de Deus” (Hb 10,12b). O Evangelho, por fim, apresenta a vinda gloriosa do Cristo e a certeza de que muitas coisas podem passar, mas suas “Palavras não passarão” (Mc 13,31).
Diante de exposições tão claras da Palavra de Deus, resta-nos, humildemente, pedir ao Senhor a graça do discernimento para que, diante do poder sedutor de tantas coisas que passam (status, fama, poder, sucesso…), abraçarmos as que não passam.
FREI GUSTAVO MEDELLA, OFM, é o atual Vigário Provincial e Secretário para a Evangelização da Província Franciscana da Imaculada Conceição. Fez a profissão solene na Ordem dos Frades Menores em 2010 e foi ordenado presbítero em 2 de julho de 2011.
Imagem ilustrativa de Frei Fábio Melo Vasconcelos
Leituras bíblicas para este domingo
Primeira leitura: Daniel 12,1-3
1“Naquele tempo se levantará Miguel, o grande príncipe, defensor dos filhos de teu povo; e será um tempo de angústia, como nunca houve até então, desde que começaram a existir nações. Mas, nesse tempo, teu povo será salvo, todos os que se acharem inscritos no livro. 2Muitos dos que dormem no pó da terra despertarão, uns para a vida eterna, outros para o opróbrio eterno. 3Mas os que tiverem sido sábios brilharão como o firmamento; e os que tiverem ensinado a muitos homens os caminhos da virtude brilharão como as estrelas, por toda a eternidade.”
Palavra do Senhor.
Sl 15(16)
Guardai-me, ó Deus, porque em vós me refugio!
Ó Senhor, sois minha herança e minha taça, / meu destino está seguro em vossas mãos! /
Tenho sempre o Senhor ante meus olhos, / pois, se o tenho a meu lado, não vacilo. – R.
Eis por que meu coração está em festa, † minha alma rejubila de alegria /
e até meu corpo no repouso está tranquilo; / pois não haveis de me deixar entregue à morte /
nem vosso amigo conhecer a corrupção. – R.
Vós me ensinais vosso caminho para a vida; † junto a vós, felicidade sem limites, /
delícia eterna e alegria ao vosso lado! – R.
Segunda leitura: Hebreus 10,11-14.18
11Todo sacerdote se apresenta diariamente para celebrar o culto, oferecendo muitas vezes os mesmos sacrifícios, incapazes de apagar os pecados. 12Cristo, ao contrário, depois de ter oferecido um sacrifício único pelos pecados, sentou-se para sempre à direita de Deus. 13Não lhe resta mais senão esperar até que seus inimigos sejam postos debaixo de seus pés. 14De fato, com esta única oferenda, levou à perfeição definitiva os que ele santifica. 18Ora, onde existe o perdão, já não se faz oferenda pelo pecado.
Palavra do Senhor.
A história e o fim dos tempos
Evangelho: Mc 13,24-32
* 24 «Nesses dias, depois da tribulação, o sol vai ficar escuro, a lua não brilhará mais, 25 as estrelas começarão a cair do céu, e os poderes do espaço ficarão abalados. 26 Então, eles verão o Filho do Homem vindo sobre as nuvens com grande poder e glória. 27 Ele enviará os anjos dos quatro cantos da terra, e reunirá as pessoas que Deus escolheu, do extremo da terra ao extremo do céu.»
Fiquem vigiando -* 28 «Aprendam, portanto, a parábola da figueira: quando seus ramos ficam verdes, e as folhas começam a brotar, vocês sabem que o verão está perto. 29 Vocês também, quando virem acontecer essas coisas, fiquem sabendo que ele está perto, já está às portas. 30 Eu garanto a vocês: tudo isso vai acontecer antes que morra esta geração que agora vive. 31 O céu e a terra desaparecerão, mas as minhas palavras não desaparecerão.
32 Quanto a esse dia e a essa hora, ninguém sabe nada, nem os anjos no céu, nem o Filho. Somente o Pai é quem sabe.
* 24-27: A queda de Jerusalém manifesta e antecipa o julgamento com que Deus acompanha toda a história, e que se consumará no fim dos tempos. O Filho do Homem é Jesus que, pela sua morte e ressurreição, testemunhadas pelos discípulos, irá reunir todo o povo de Deus (cf. Dn 7,13-14).
* 28-37: Somente agora Jesus responde à pergunta dos discípulos (v. 4). Mas, em vez de dizer «quando» ou «como» acontecerá o fim, ele indica apenas como o discípulo deve se comportar na história. A tarefa do discípulo é testemunhar sem desanimar, continuando a ação de Jesus. A espera da plena manifestação de Jesus e do mundo novo por ele prometido impede, de um lado, que o discípulo se instale na situação presente; de outro, evita que o discípulo desanime, achando que o projeto de Jesus é difícil, distante e inviável.
Bíblia Sagrada – Edição Pastoral
Reflexão do exegeta Frei Ludovico Garmus
33º Domingo do Tempo Comum
Oração: “Senhor nosso Deus, fazei que nossa alegria consista em vos servir de todo o coração, pois só teremos felicidade completa, servindo a vós, o criador de todas as coisas”.
- Primeira leitura: Dn 12,1-3
Nesse tempo teu povo será salvo.
O livro de Daniel foi escrito durante o domínio selêucida da Síria, no contexto da revolta dos Macabeus. Os judeus eram, então, oprimidos por pesados tributos do rei sírio Antíoco IV, proibidos de praticar sua religião e obrigados a práticas religiosas pagãs. Era um tempo de muito sofrimento. Entre os judeus havia os que procuravam ser fiéis à fé dos antepassados; outros, porém, colaboravam com os dominadores e traíam sua fé. O autor projeta o drama de seu tempo (domínio selêucida) para o tempo dos babilônios e persas. Ao descrever suas visões, usa uma linguagem codificada, na qual os governantes são representados como animais ferozes. A intenção é animar a esperança dos fiéis perseguidos. No passado, o profeta Ezequiel animava a esperança dos exilados em Babilônia com a fé na ressurreição da nação (Ez 37,1-14). Em Daniel se afirma não só a salvação do povo judeu, mas também, a ressurreição individual dos justos e pecadores: “Muitos dos que dormem no pó da terra, despertarão, uns para a vida eterna, outros para o opróbrio eterno”. O caminho do sábio para a salvação é a fiel observância da Lei de Deus. Sábios são os que ensinaram o caminho das virtudes que praticaram (observância da Lei), porque “brilharão como estrelas por toda a eternidade”.
Salmo responsorial: Sl 15
Guardai-me, ó Deus, porque em vós me refugio.
- Segunda leitura: Hb 10,11-14.18
Com uma única oferenda,
levou à perfeição definitiva os que ele santifica.
O autor continua afirmando a superioridade do sacerdócio e do sacrifício único de Cristo sobre o sacerdócio e os sacrifícios do antigo templo. Os sacrifícios da antiga Aliança eram oferecidos diariamente pelos sacerdotes, sem conseguir apagar os pecados do povo. Pelo sacrifício, oferecido uma única vez por nossos pecados, Cristo alcançou um lugar de honra “à direita do Pai”, isto é, como juiz: “donde virá a julgar os vivos e os mortos” (Credo). Pela sua morte e ressurreição garantiu, para todos os que o seguem, o perdão dos pecados e “levou à perfeição definitiva os que ele santifica”.
Aclamação ao Evangelho: Lc 21,36
É preciso vigiar e ficar de prontidão;
em que dia o Senhor há de vir, não sabeis não!
- Evangelho: Mc 13,24-32
Ele reunirá os eleitos de Deus,
de uma extremidade à outra da terra.
O último ensinamento de Jesus, antes da paixão, trata da destruição de Jerusalém e seu Templo, e da segunda vinda do Senhor, no fim dos tempos. Mateus e Lucas têm uma descrição mais ampla destes eventos. Marcos é mais sintético. Conta que, ao sair e Jerusalém, os discípulos chamaram a atenção de Jesus à majestosa construção do Templo. E Jesus lhes respondeu: “Estais vendo tudo isso? … Não ficará pedra sobre pedra; tudo será destruído”. Ao chegarem ao monte das Oliveiras, Pedro, Tiago, João e André lhe perguntaram em particular quando isso haveria de acontecer e qual seria o sinal. Antes do texto hoje proclamado, Jesus fala dos sinais que precederão o “quando” (Mc 13,5-13). Haverá guerras, terremotos e fome. Antes que chegue o fim, o Evangelho será anunciado a todas as nações e os cristãos serão perseguidos. Quando o inimigo se instalar em Jerusalém, é hora de os cristãos, os eleitos, fugirem para os montes e não confiarem em falsos cristos e profetas (v. 14-23). Todos esses sinais estão relacionados à destruição de Jerusalém e à vida dos cristãos no Império Romano.
O texto que hoje ouvimos refere-se à segunda vinda do Senhor no fim dos tempos, como Juiz. Marcos escreveu seu evangelho, provavelmente, antes da destruição de Jerusalém no ano 70 d.C., quando se iniciou a Guerra Judaica. Sinais, como boatos de guerra, terremotos e fome, sempre existiram e existirão. Jesus, porém, não responde sobre quando acontecerá a segunda vinda do Filho do Homem: “Quanto a esse dia e à hora, ninguém sabe nem os anjos do céu, nem o Filho, mas somente o Pai”. Importa é estar atento aos sinais (exemplo da figueira) e vigiar. As obras humanas, impérios e potências mundiais, tendem a desaparecer: “O céu e a terra passarão, mas as minhas palavras não passarão” (cf. Is 40,6-8; 1Pd 1,24-25).
Em vez de nos apavorarmos diante da perspectiva de um fim imaginado como próximo, melhor seria vigiar, reavivar a fé na presença de Cristo no meio de nós e reforçar a confiança na Palavra de Deus: “Eis que estou convosco, todos os dias, até o fim do mundo” (Mt 28,20). Experimentamos essa confiança durante a pandemia.
FREI LUDOVICO GARMUS, OFM, é professor de Exegese Bíblica do Instituto Teológico Franciscano de Petrópolis (RJ). Fez mestrado em Sagrada Escritura, em Roma, e doutorado em Teologia Bíblica pelo Studium Biblicum Franciscanum de Jerusalém, do Pontifício Ateneu Antoniano. É diretor industrial da Editora Vozes e editor da Revista “Estudos Bíblicos”, editada pela Vozes. Entre seus trabalhos está a coordenação geral e tradução da Bíblia Sagrada da Vozes.
Presente e futuro se confundem
Frei Clarêncio Neotti
Jesus está em Jerusalém. Aproxima-se o final dos tempos previstos para a Paixão. Já no capítulo 11, Marcos conta a entrada triunfal na Cidade Santa e a aclamação de Jesus como “aquele que veio em nome do Senhor” (Mc 11,9). Todo o capí-
tulo 12 são admoestações de Jesus sobre a justiça, o amor, a humildade, a generosidade, sua origem divina, sua missão de salvador e a ressurreição para todos.
Se passássemos diretamente ao capítulo 14 (traição de Judas e de Pedro, Última Ceia, Paixão), haveria uma sequência natural. Mas o Evangelista intercala um capítulo inteiro, que costumamos chamar de ‘Discurso sobre os últimos tempos’. E
o escreve num estilo chamado apocalíptico.
Não devemos ler o capítulo 13 como se fossem profecias sobre a destruição do mundo, mas ver quais as lições que estão por trás das figuras empregadas. No estilo apocalíptico sempre se fala em catástrofes que acontecerão com a natureza. Na verdade, usando o estilo apocalíptico, Jesus retoma suas grandes lições para a vida da comunidade no presente e seu caminhar para o futuro. Aliás, nos ensinamentos de Jesus, muitas vezes, presente e futuro se confundem. A história da salvação é um projeto que se vai realizando. Por isso é sempre alguma coisa a vir e, ao mesmo tempo, alguma coisa que está acontecendo e nos envolve.
FREI CLARÊNCIO NEOTTI, OFM, entrou na Ordem Franciscana no dia 23 de dezembro de 1954. Durante 20 anos, trabalhou na Editora Vozes, em Petrópolis. É membro fundador da União dos Editores Franciscanos e vigário paroquial no Santuário do Divino Espírito Santo (ES). Escritor e jornalista, é autor de vários livros e este comentário é do livro “Ministério da Palavra – Comentários aos Evangelhos dominicais e Festivos”, da Editora Santuário.
Quando as coisas tocam seu termo
Frei Almir Guimarães
Os que tiverem sido sábios brilharão como o firmamento; e os que tiverem ensinado a muitos homens os caminhos da virtude brilharão como estrelas por toda a eternidade.
Daniel 12, 3
Ficai sabendo que o Filho do Homem está próximo, às portas
Marcos 13, 29
Estamos para terminar mais um ano litúrgico da vida da Igreja. No primeiro domingo de dezembro, proximamente, começaremos a ser envolvidos pela melodia, pelas cores e pela atmosfera do advento. Os textos do Antigo e do Novo Testamento haverão de fazer germinar em nosso interior sentimentos de esperança. Deus vem. No presente domingo, no entanto, são proclamadas leituras que nos falam do fim dos tempos e o advento de um mundo que desconhecemos e que se situa depois dos tempos. Nossa liturgia convida a se faça um balanço da vida e as leituras apontam para o definitivo amanhã. O que andamos fazendo de nossas vidas?
Na vida há muitos “finais”. Há, por exemplo, o final da juventude e a entrada no tempo adulto. É preciso fazer bem as transições e administrar os “finais”. O adulto de hoje foi preparado no tempo da juventude com suas opções, escolhas, apoios e desapoios. Não se fica adolescente e jovem o tempo todo. Há uma morte para um novo estado de vida. Morre o tempo da juventude e vem um tempo novo. Um final… e um começo.
Há o tempo que passa na vida a dois, no casamento, na família. Uma suavidade dança no rosto de um casal envelhecido, mas ainda com brilho nos olhos e ternura no coração. Ao longo do tempo da vida os dois foram olhando os “sinais” e fazendo com que amor amadurecesse e seu bem querer se tornasse forte como a morte. Final de uma etapa e começo do tempo do amor sereno. Um final e um novo começo.
Há o fim do tempo profissional e a chegada da aposentadoria. Período delicado que pode nos fazer muito mal. Sensação de vazio. Uma espécie impressão de que tudo o que foi feito não teve valor. Quem ficou atento aos fatos que iam se sucedendo não é pego de surpresa. Deixa um modo de ser e ganha outro jeito mais gratuito, mais livre, mais sereno. Finais, sempre finais…
Chega ao fim o tempo que um filho ou uma filha tiveram que acompanhar um pai uma mãe, doente de cama, ou internado. Carinho, atenção, renúncias… O filho ou a filha ensinaram a muitos homens o caminho da virtude. Vem o tempo de retomar a vida, depois de tanta dedicação e esquecimento de suas coisas… Final e recomeço…
Sim, certamente as leituras deste domingo nos falam do sucesso ou do pouco êxito final da existência de cada um. Certo que no fim dos tempos estará a figura do Filho do homem, próximo, às portas. Ao longo de nossa vida ele sempre se fez presente. Convivemos com ele. Enxugamos o suor de sua fronte no rosto do mais abandonados. Ouvimos sua Palavra ressoar no templo misterioso de nossa interioridade. Não há que ter preocupações aflitivas. Os céus e a terra passarão, mas a palavra do Senhor não passará. Final, momento de angústia, segundo os escritos bíblicos. Mas também certeza da presença daquele que nos ama e por cada um de nós deu sua vida.
Daniel afirma que brilharão como o firmamento os que tiverem ensinado a muitos homens os caminhos da virtude.
♦ Olhar com atenção o outro, o ser humano, adivinhar suas carências mais profundas, não deixar que leis e decretos do governo ou da estupidez de uns e de outros destruam suas vidas e seu amanhã. Há os que cuidaram de ensinar o bem, as virtudes. Eles brilharão…
♦ Os pais não farão de seus filhos discípulos da indecorosa sociedade do mercado e do consumo. Tirarão de suas entranhas o melhor que eles têm. Ensinarão o caminho da lealdade, do altruísmo, do desvencilhamento de si mesmos. Os que ensinam as virtudes brilharão como estrelas.
♦ Os que se casam não vivem o fato como alguma privada demais, deles somente, somente lutando pelos seus interesses. Os que vivem numa família de verdade ultrapassam o tempo do romantismo narcisista e fazem de sua vida uma propaganda do amor conjugal. Ensinam os caminhos da virtude ao mundo todo.
O texto de Marcos fala de uma grande tribulação no final dos tempos. Pode-se dizer que, perto do momento da morte, quando se aguardar sua chegada e ela não vier inopinada e inesperadamente, pode ser que tenhamos a impressão de que “as forças serão abaladas”. Para que ensinou as virtudes para os homens isso não acontece. Quem está à portas é o Filho do homem. Nada a temer. Esperar apenas o amanhã com aquele que já amamos em nossa vida mortal. Ele está próximo, às portas…
FREI ALMIR GUIMARÃES, OFM, ingressou na Ordem Franciscana em 1958. Estudou catequese e pastoral no Institut Catholique de Paris, a partir de 1966, período em que fez licenciatura em Teologia. Em 1974, voltou a Paris para se doutorar em Teologia. Tem diversas obras sobre espiritualidade, sobretudo na área da Pastoral familiar. É o editor da Revista “Grande Sinal”.
As palavras de Jesus não passarão
José Antonio Pagola
Os sinais de desesperança nem sempre são inteiramente visíveis, porque a falta de esperança pode vir disfarçada de otimismo superficial, ativismo cego ou secreta indiferença.
Por outro lado, são muitos os que não reconhecem sentir medo, tédio, solidão ou desesperança porque, de acordo com o modelo social vigente, supõe-se que um homem que triunfa na vida não pode sentir-se só, entediado ou temeroso. Erich Fromm, com sua habitual perspicácia, assinalou que o homem contemporâneo está procurando livrar-se de algumas repressões como a sexual, mas se vê obrigado a “reprimir tanto o medo e a dúvida como a depressão, o tédio e a falta de esperança”.
Outras vezes nos defendemos de nosso “vazio de esperança” mergulhando na atividade. Não suportamos estar sem fazer nada. Precisamos estar ocupados em algo para não enfrentar o nosso futuro.
Mas a pergunta é inevitável: O que nos espera depois de tantos esforços, lutas, ilusões e dissabores? Não temos outro objetivo senão produzir cada vez mais, desfrutar cada vez melhor o que foi produzido e consumir sempre mais, até sermos consumidos por nossa própria caducidade?
O ser humano necessita de uma esperança para viver. Uma esperança que não seja “um invólucro para a resignação”, como a daqueles que se viram para organizar uma vida bastante tolerável a fim de aguentar a aventura de cada dia. Uma esperança que também não deve confundir-se com uma espera passiva, que só é, muitas vezes, “uma forma disfarçada de desesperança e impotência” (Erich Fromm).
O homem precisa, em seu coração, de uma esperança que se mantenha viva, mesmo que outras pequenas esperanças se vejam malogradas e, inclusive, completamente destruídas.
Nós cristãos encontramos esta esperança em Jesus Cristo e em suas palavras, que “não passarão”. Não esperamos algo ilusório. Nossa esperança se apoia no fato inabalável da ressurreição de Jesus. A partir de Cristo ressuscitado atrevemo-nos a ver a vida presente em “estado de gestação”, como germe de uma vida que alcançará sua plenitude final em Deus.
JOSÉ ANTONIO PAGOLA cursou Teologia e Ciências Bíblicas na Pontifícia Universidade Gregoriana, no Pontifício Instituto Bíblico de Roma e na Escola Bíblica e Arqueológica Francesa de Jerusalém. É autor de diversas obras de teologia, pastoral e cristologia. Atualmente é diretor do Instituto de Teologia e Pastoral de São Sebastião. Este comentário é do livro “O Caminho Aberto por Jesus”, da Editora Vozes
“Minhas palavras não passarão”
Pe. Johan Konings, SJ
Jesus vivia num tempo de ‘apocaliptismo’. Esperava-se uma intervenção de Deus, talvez por meio do Messias, para substituir este mundo ruim por “um mundo novo muito melhor”. Qualquer acontecimento um tanto fora do comum era interpretado como sinal de que “estava para acontecer” … É como quem está no ponto do ônibus: em qualquer veículo maior aparecendo na curva pensa reconhecer “seu ônibus” …
As pessoas dificilmente suportam a incerteza quanto ao futuro. O ser humano precisa de uma referência estável. Jesus no-la oferece. Depois de ter evocado as imagens que seus contemporâneos usam a respeito do fim do mundo, ele afirma: “Minha palavra não passará” (evangelho). Em meio a tudo que pode caducar, sua palavra está firme, como baliza e ponto de referência em nossa vida e em nossa história, enquanto as grandezas históricas esvaecem como a neblina diante do sol. Depois dos sonhos do progresso ilimitado, o mundo toma consciência de que talvez esteja cavando seu próprio túmulo. O progresso traz desmatamento, desertificação, poluição ambienta!. Nos países ricos faltam nascimentos, nos pobres, comida para os que nascem. Mas, em vez de reagir com responsabilidade, impondo-se os devidos limites, muitos respondem com irresponsabilidade. “Aproveitemos, pois amanhã tudo acaba”. Esse é o lado apocalíptico da sociedade de consumo. A sociedade assiste como que de camarote à própria destruição.
No meio disso, a palavra de Jesus é referência firme. É palavra de amor e fidelidade até o fim. Por causa disso, nunca passa. Supera o fim do mundo. É amor sem fim. Ainda que passem TV, internet, programas espaciais … o amor fraterno nunca sai de moda. Ainda que não possa mais pagar a gasolina do meu carro particular, nunca serei dispensado de visitar meu irmão necessitado. Ainda que fechem todos os supermercados, nunca poderei fechar a mão para o pobre. O que Jesus ensinou e mostrou sempre terá sentido. É a aplicação mais segura que existe. Se aplico minha vida neste sentido, posso dormir tranquilo. O que Jesus ensina não é roído pela inflação.
Costumamos imaginar o definitivo e o eterno como vida depois da morte, ressurreição futura (1a leitura). Mas, na realidade, nossa ressurreição já começou na medida em que nossa vida está unida à de Cristo, que ressuscitou. A vida que dura não é a das células do corpo, mas a da comunhão com Deus. A ressurreição de Jesus é a mostra segura dessa vida: quem segue Jesus, já está encaminhando para essa vida que não tem limite, por ser a vida de Deus mesmo. Jesus não perde a vaidade. Observando sua palavra e vivendo sua prática de vida já estamos vivendo a vida sem fim que se manifestou na ressurreição de Jesus.
PE. JOHAN KONINGS nasceu na Bélgica em 1941, onde se tornou Doutor em Teologia pela Universidade Católica de Lovaina, ligado ao Colégio para a América Latina (Fidei Donum). Veio ao Brasil, como sacerdote diocesano, em 1972. Em 1985 entrou na Companhia de Jesus (Jesuítas) e, desde 1986, atuou como professor de exegese bíblica na FAJE, Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia, em Belo Horizonte. Faleceu no dia 21 de maio de 2022. Este comentário é do livro “Liturgia Dominical, Editora Vozes.
Reflexão em vídeo de Frei Gustavo Medella