Vida Cristã - Província Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil - OFM

Viagem Apostólica do Papa Francisco às Filipinas e ao Sri Lanka

Discurso do Papa no Encontro Inter-religioso

Na viagem ao Sri Lanka, o Papa Francisco participou nesta terça-feira (13/1), de um encontro inter-religioso, que contou com a presença de representantes de comunidades budistas, hinduístas, muçulmanas e algumas confissões cristãs. O Santo Padre reiterou o respeito da Igreja católica por outras religiões, bem como o seu desejo de confirmar os esforços comuns em prol da harmonia e da paz.

O Santo Padre lembrou que essas grandes tradições religiosas no Sri Lanka partilham com a Igreja católica os desejos de sabedoria, verdade e santidade. Já no Concílio Vaticano II, mencionou o Pontífice, a Igreja declarou seu respeito por outras religiões. “Pela minha parte, desejo reafirmar o sincero respeito da Igreja por vós, vossas tradições e crenças”.

A Igreja quer cooperar com as outras religiões na busca por prosperidade para todos os srilanqueses, disse o Papa. Ele acredita que o diálogo é essencial para que as partes se conheçam e se respeitem, mas para que tal diálogo seja eficaz, as convicções são importantes.

“É certo que esse diálogo fará ressaltar como são diferentes as nossas crenças, tradições e práticas; mas, se formos honestos ao apresentar as nossas convicções, seremos capazes de ver mais claramente aquilo que temos em comum e abrir-se-ão novos caminhos para a mútua estima e cooperação e, seguramente, para a amizade”.

Lembrando o passado trágico do Sri Lanka, que sofreu por anos com conflitos civis, Francisco destacou que agora são necessários a cura e a unidade, não mais conflitos nem divisões. “Espero que a cooperação inter-religiosa e ecumênica prove que os homens e as mulheres não têm de esquecer a própria identidade, tanto étnica como religiosa, para viverem em harmonia com os seus irmãos e irmãs”.

Francisco também destacou que a reconciliação de todos os srilanqueses deve ser colocada no centro dos esforços para renovar a sociedade e não se deve permitir o uso da religião para atos de violência. “A bem da paz, não se deve permitir que se abuse das crenças para a causa da violência ou da guerra”.

Com o encontro inter-religioso, Francisco concluiu seu primeiro dia de visita ao Sri Lanka. Nesta quarta-feira, 14, ele segue para um dos momentos mais esperados da viagem: a Santa Missa com a canonização do Beato José Vaz.


Encontro inter-religiosono
Bandaranaike Memorial Intrenational Conference Hall
Terça-feira, 13 de janeiro de 2015

Queridos amigos!

Agradeço a oportunidade de tomar parte neste encontro, que congrega, entre outras, as quatro maiores comunidades religiosas que são parte integrante da vida do Sri Lanka: budismo, hinduísmo, islamismo e cristianismo. Agradeço-vos a vossa presença e a calorosa recepção. Agradeço também a quantos ofereceram orações e bênçãos e, em particular, exprimo a minha gratidão a D. Cletus Chandrasiri Perera e ao Venerável Vigithasiri Niyangoda Thero pelas suas amáveis palavras.

Vim ao Sri Lanka seguindo os passos dos meus antecessores, os Papas Paulo VI e João Paulo II, para demonstrar o grande amor e a solicitude da Igreja Católica por esta nação. É uma graça especial para mim poder visitar a comunidade católica daqui, confirmá-la na fé em Cristo, rezar com ela e partilhar as suas alegrias e sofrimentos. De igual modo é uma graça também poder estar com todos vós, homens e mulheres destas grandes tradições religiosas, que partilhais connosco um desejo de sabedoria, verdade e santidade.

No Concílio Vaticano II, a Igreja Católica declarou o seu profundo e duradouro respeito pelas outras religiões. Afirma ela que «nada rejeita do que nessas religiões existe de verdadeiro e santo. Olha com sincero respeito esses modos de agir e viver, esses preceitos e doutrinas» (Nostra aetate, 2). Pela minha parte, desejo reafirmar o sincero respeito da Igreja por vós, vossas tradições e crenças.

É neste espírito de respeito que a Igreja Católica deseja cooperar convosco e com todas as pessoas de boa vontade na busca da prosperidade para todos os srilanqueses. Espero que a minha visita ajude a encorajar e aprofundar as várias formas de cooperação inter-religiosa e ecuménica que têm sido empreendidas nos anos recentes.

Estas louváveis iniciativas proporcionaram oportunidades de diálogo, que é essencial se nos quisermos conhecer, compreender e respeitar uns aos outros. Mas, como ensina a experiência, para que tal diálogo e encontro sejam eficazes, devem fundar-se numa apresentação completa e franca das nossas respectivas convicções. É certo que esse diálogo fará ressaltar como são diferentes as nossas crenças, tradições e práticas; mas, se formos honestos ao apresentar as nossas convicções, seremos capazes de ver mais claramente aquilo que temos em comum e abrir-se-ão novos caminhos para a mútua estima e cooperação e, seguramente, para a amizade.

Tais progressos nas relações inter-religiosas e ecuménicas assumem um significado particular e urgente no Sri Lanka. Durante muitos anos, os homens e mulheres deste país foram vítimas de contenda civil e de violência. O que é necessário agora são a cura e a unidade, não mais conflitos nem divisões. Por certo, a promoção da cura e da unidade é um nobre compromisso que incumbe sobre quantos têm a peito o bem da nação e, na verdade, da família humana inteira. Espero que a cooperação inter-religiosa e ecuménica prove que os homens e as mulheres não têm de esquecer a própria identidade, tanto étnica como religiosa, para viverem em harmonia com os seus irmãos e irmãs.

Há tantas maneiras de os seguidores das diferentes religiões levarem a cabo tal serviço. Inúmeras são as necessidades a acudir com o bálsamo sanador da solidariedade fraterna. Penso de modo particular nas necessidades materiais e espirituais dos pobres, dos indigentes, de quantos esperam ansiosamente por uma palavra de consolação e de esperança. Penso aqui também em tantas famílias que continuam a chorar a perda dos seus entes queridos.

Sobretudo neste momento da história da vossa nação há tantas pessoas de boa vontade que procuram reconstruir os fundamentos morais do conjunto da sociedade. Que o crescente espírito de cooperação entre os líderes das diferentes comunidades religiosas encontre expressão num compromisso que ponha a reconciliação de todos os srilanqueses no centro de qualquer esforço para renovar a sociedade e as suas instituições. A bem da paz, não se deve permitir que se abuse das crenças para a causa da violência ou da guerra. Devemos ser claros e inequívocos ao desafiar as nossas comunidades a viverem plenamente os princípios da paz e da coexistência, que se encontram em cada religião, e denunciar actos de violência sempre que são cometidos.

Queridos amigos, de novo vos agradeço pela generosa recepção e pela vossa atenção. Que este encontro fraterno nos confirme a todos nos esforços por viver em harmonia e espalhar as bênçãos da paz.

PAPA FRANCISCO

Discursos às Autoridades

Senhor Presidente,
Ilustres Autoridades do Governo,
Eminência, Excelências,
Queridos amigos!

Obrigado pela vossa recepção calorosa. Há muito que eu esperava por esta visita ao Sri Lanka e os dias que passaremos juntos. O Sri Lanka é conhecido como a Pérola do Oceano Índico pelas suas belezas naturais. Mas, e muito mais importante, esta ilha é conhecida pelo calor do seu povo e a rica diversidade das suas tradições culturais e religiosas.

Senhor Presidente, apresento-lhe meus venturosos votos para as suas novas responsabilidades. Saúdo os ilustres membros do governo e as autoridades civis que nos honram com a sua presença. De modo especial agradeço a presença dos proeminentes líderes religiosos, que têm um papel tão importante na vida deste país. E, evidentemente, desejo manifestar o meu apreço aos fiéis, aos membros do coro, bem como às inúmeras pessoas que trabalharam para tornar possível esta visita. Agradeço a todos, do fundo do coração, pela vossa gentileza e hospitalidade.

A minha visita ao Sri Lanka é primariamente pastoral. Como pastor universal da Igreja Católica, vim para encontrar e encorajar os católicos desta ilha, bem como para rezar com eles. Um ponto central desta visita será a canonização do Beato José Vaz, cujo exemplo de caridade cristã e de respeito por todos, sem distinção de etnia ou religião, continua a servir-nos de inspiração e lição ainda hoje. Mas a minha visita quer também expressar o amor e a solicitude da Igreja por todos os srilanqueses e confirmar o desejo da comunidade católica de participar ativamente na vida desta sociedade.

É uma tragédia contínua no nosso mundo que muitas comunidades estejam em guerra entre si. A incapacidade de conciliar as diferenças e divergências, sejam elas antigas ou recentes, fez surgir tensões étnicas e religiosas, muitas vezes acompanhadas por surtos de violência. Durante muitos anos, o Sri Lanka conheceu os horrores do conflito civil e agora tem procurado consolidar a paz e curar as feridas daqueles anos. Não é tarefa fácil superar a amarga herança de injustiças, hostilidades e desconfiança deixada pelo conflito. Só se pode conseguir, superando o mal com o bem (cf. Rm 12, 21) e cultivando aquelas virtudes que promovem a reconciliação, a solidariedade e a paz. Além disso, o processo de cura exige que se inclua a busca da verdade, não com o objetivo de abrir velhas feridas, mas como meio necessário para promover a justiça, a cura e a unidade.

Queridos amigos, estou convencido de que os seguidores das várias tradições religiosas têm um papel essencial a desempenhar no delicado processo de reconciliação e reconstrução em curso neste país. Para que tal processo tenha lugar, é preciso que todos os membros da sociedade trabalhem juntos; todos devem ter voz; devem ser livres de expressar as suas preocupações, as suas necessidades, as suas aspirações e os seus temores. Mais importante, porém, é estarem prontos a aceitar-se uns aos outros, respeitar as legítimas diversidades e aprender a viver como uma única família. Quando as pessoas se ouvem humilde e francamente umas às outras, pouco a pouco vão aparecendo mais visivelmente os valores e aspirações comuns. A diversidade será vista, não já como uma ameaça, mas como uma fonte de enriquecimento. Divisa-se mais claramente a estrada para a justiça, a reconciliação e a harmonia social.

Neste sentido, a grande obra de reconstrução deve incluir a melhoria das infraestruturas e prover às necessidades materiais, mas também, e mais importante ainda, promover a dignidade humana, o respeito pelos direitos humanos e a plena inclusão de todos os membros da sociedade. Formulo votos de que os líderes políticos, religiosos e culturais do Sri Lanka, medindo as suas palavras e ação sobre a base do bem e da cura que daí resultará, prestem uma contribuição duradoura para o progresso material e espiritual do povo do Sri Lanka.

Senhor Presidente, queridos amigos! Mais uma vez vos agradeço pela vossa recepção. Possam estes dias que passaremos juntos ser dias de amizade, diálogo e solidariedade. Invoco a abundância das bênçãos de Deus sobre o Sri Lanka, a Pérola do Oceano Índico, e rezo para que a sua beleza brilhe em todo o seu esplendor para bem da prosperidade e da paz de todos os seus habitantes.

O Sri Lanka em dados

O Santo Padre chega a um país que ainda sofre as consequências da guerra civil de 1983-2009 entre a maioria cingalesa e a minoria tâmil, e que deixou mais de 100 mil mortos. Hoje está em andamento um processo de reconciliação nacional.

O Sri Lanka, país insular do Sul da Ásia, constituído pela ilha de Ceilão e por pequenas ilhas adjacentes, situa-se no Oceano Índico e ocupa uma área de cerca 65 mil km2.

A economia baseia-se no chá, têxteis e turismo. A agricultura contribui com cerca de 1/4 do PIB; contudo, o país não produz o suficiente para as suas necessidades. São produzidos cereais, algodão, borracha e chá.

A população é de cerca 20 milhões de habitantes. A civilização do Sri Lanka remonta ao século VI a. C. Os povos mais antigos da ilha são os tâmiles e os cingaleses. Os cingaleses constituem 83% dos habitantes do país, os tâmeis representam 9% e os mouros do Sri Lanka 8%. As principais religiões são o budismo (69%), o hinduísmo (16%), o islamismo (8%) e o cristianismo (8%). O tâmul (ou tâmil) e o cingalês são as línguas nacionais – embora o cingalês seja a oficial e o inglês uma língua também bastante falada.

Papa leva mensagem de perdão a local marcado por guerra

O Papa Francisco esteve,  nesta quarta-feira, 14, em Madhu, Diocese de Mannar, para visitar e rezar no Santuário dedicado a Nossa Senhora do Rosário. Duas crianças puseram-lhe uma guirlanda de flores em sinal de boas-vindas, tradição do país. A imagem de Nossa Senhora foi colocada no pórtico do Santuário para a bênção do Papa. No local, marcado por intensos conflitos de guerra e perseguição aos católicos em anos passados, o Santo Padre levou uma mensagem de conforto aos cidadãos do Sri Lanka, tamis e cingaleses. O Santuário de Nossa Senhora do Rosário em Madhu fica ao norte do Sri Lanka e é a primeira vez que um Papa visita essa região do país.

Na chegada ao local, o Papa foi acolhido pelo bispo de Mannar, Dom Joseph Rayappu, e por algumas autoridades locais. No Santuário, foi feita uma oração a Maria pela consolidação da paz no país, alcançada em 2009 ao término de um conflito de trinta anos. Estavam presentes no momento de oração familiares de tamis e cingaleses, particularmente atingidos pela hostilidade.

No discurso, Francisco destacou, sobretudo, o auxílio de Maria Santíssima ao povo. “Nossa Senhora manteve-se sempre convosco. Ela é mãe de cada casa, de cada família ferida, de todos aqueles que estão procurando voltar a uma existência pacífica. Hoje, agradecemos-Lhe por ter protegido de tantos perigos, passados e presentes, o povo do Sri Lanka. Maria nunca esquece os seus filhos desta ilha esplêndida”. Em 2001, a imagem de Nossa Senhora foi levada em peregrinação, ao longo de todo o ano, por todos os cantos do Sri Lanka. E depois de sangrentas batalhas, iniciaram em 2004 as negociações de paz que se concluíram em 2009, com a fim definitivo da guerra. Por isso, os srilankeses veem em Nossa Senhora de Madhu um símbolo de paz.

O Papa não deixou de lembrar os sofrimentos provocados pela guerra. Destacou a necessidade de pedir perdão pelos pecados e o mal que o Sri Lanka conheceu. No entanto, afirmou não ser fácil tal tarefa, e refletiu que tais sofrimentos só são compressíveis  à luz da cruz de Cristo.

Depois do seu discurso, o Papa abençoou o povo e a estátua de Nossa Senhora de Madhu e às 16h30 (hora local, meio-dia em Roma), tomou de novo o helicóptero para Colombo, tendo jantado na Nunciatura, onde pernoita.

E assim terminou este segundo dia da visita pastoral do Papa na perla do Oceano Índico, o Sri-Lanka. Nesta quinta-feira cedo, antes da partida para as Filipinas, irá de carro, da Nunciatura de Colombo à capela de Nossa Senhora do Lanka, em Bolawana a 35 km de Colombo. Este Santuário, onde existe um Instituto Cultural e uma Capela dedicada a Bento XVI, remonta a 1911.

VISITA A TEMPLO BUDISTA

O Papa Francisco visitou nesta quarta-feira (14) um templo budista no Sri Lanka, o que não estava previsto em seu programa, informou seu porta-voz. No templo Baha Bohdy de Colombo, o Papa foi recebido pelo presidente desta organização budista internacional, Banagale Upathissa. O porta-voz do Papa, Federico Lombardi, disse a jornalistas que Francisco desejava “expressar a sua amizade” com o budismo neste encontro que durou cerca de 20 minutos.

Durante esta reunião, o monge budista, que estava acompanhado por sete jovens monges, abriu uma estupa, um monumento funerário com relíquias de dois monges falecidos. O monge decidiu abrir a estupa por ocasião da visita do Papa, que tirou os sapatos no templo, no qual havia uma grande estátua de Buda. Normalmente, este monumento é aberto apenas uma vez ao ano. O Sri Lanka tem 20 milhões de habitantes. A população é predominantemente budista, enquanto os católicos representam 7%.

No final do dia, ainda na Nunciatura, o Papa recebeu os 20 bispos do Sri-Lanka, mantendo com eles um breve colóquio e um momento de oração. O encontro com os bispos estava previsto para o primeiro dia da visita e depois para ontem, mas foi adiado devido a atrasos no programa.

Oração Mariana no Santuário de Nossa Senhora do Rosário em Madhu

Amados irmãos e irmãs!

Encontramo-nos na casa da nossa Mãe. Ela nos acolhe aqui na sua casa. Neste santuário de Nossa Senhora de Madhu, cada peregrino pode sentir-se em casa, porque aqui Maria nos introduz na presença do seu Filho Jesus. Aqui todos os cidadãos do Sri Lanka, tamis e cingaleses, vêm como membros de uma única família. A Maria, confiam as suas alegrias e os seus sofrimentos, as suas esperanças e as suas necessidades. Aqui, na sua casa, sentem-se seguros. Sabem que Deus está presente; sentem o seu amor; conhecem a sua terna misericórdia.

Hoje estão aqui famílias que sofreram imenso no longo conflito que dilacerou o coração do Sri Lanka. Muitas pessoas – tanto do Norte como do Sul – foram mortas na violência terrível e sangrenta destes anos. Nenhum srilanquês consegue esquecer os trágicos acontecimentos relacionados com este mesmo lugar, nem o dia triste em que a venerável imagem de Maria, remontando à chegada dos primeiros cristãos ao Sri Lanka, foi levada do seu santuário.

Mas Nossa Senhora manteve-se sempre convosco. Ela é mãe de cada casa, de cada família ferida, de todos aqueles que estão procurando voltar a uma existência pacífica. Hoje agradecemos-Lhe por ter protegido de tantos perigos, passados e presentes, o povo do Sri Lanka. Maria nunca esquece os seus filhos desta ilha esplêndida. Assim como Ela nunca saiu de junto do seu Filho na cruz, assim também nunca saiu de junto dos seus filhos srilanqueses que sofriam.

Hoje queremos agradecer a Nossa Senhora por esta presença. Depois de tanto ódio, tanta violência e tanta destruição, queremos agradecer-Lhe por continuar a trazer-nos Jesus, o único que tem o poder de curar as feridas abertas e restituir a paz aos corações destroçados. Mas queremos também pedir-Lhe que nos alcance a graça da misericórdia de Deus. Pedimos ainda a graça de nos emendarmos dos nossos pecados e de todo o mal que esta terra conheceu.

Não é fácil fazê-lo. Na verdade, só quando chegarmos a compreender, à luz da Cruz, o mal de que somos capazes e do qual porventura fomos cúmplices, é que podemos experimentar um autêntico remorso e um verdadeiro arrependimento. Só então podemos receber a graça de nos aproximarmos uns dos outros com verdadeira contrição, oferecendo e procurando um verdadeiro perdão. Neste árduo esforço de perdoar e encontrar a paz, Maria sempre está aqui a encorajar-nos, guiar-nos, levar-nos a dar mais um passo. Precisamente como Ela perdoou aos assassinos do seu Filho junto da Cruz, quando segurava nas mãos o corpo d’Ele sem vida, assim agora Ela quer guiar os srilanqueses para uma maior reconciliação, de tal modo que o bálsamo do perdão de Deus possa produzir verdadeira cura para todos.

Por fim, queremos pedir a Maria, nossa Mãe, que acompanhe com as suas orações os esforços dos cidadãos do Sri Lanka de ambas as comunidades, tamil e cingalesa, por reconstruir a unidade perdida. Pedimos que, assim como a imagem d’Ela voltou ao seu santuário de Madhu depois da guerra, assim também todos os seus filhos e filhas do Sri Lanka possam voltar à casa de Deus num renovado espírito de reconciliação e fraternidade.

Amados irmãos e irmãs, sinto-me feliz por estar convosco na casa de Maria. Rezemos uns pelos outros. Acima de tudo, peçamos que este santuário possa ser sempre uma casa de oração e um refúgio de paz. Por intercessão de Nossa Senhora de Madhu, que todos possam encontrar aqui inspiração e força para construir um futuro de reconciliação, justiça e paz para os filhos desta amada terra. Amém.

Quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

PAPA FRANCISCO

Missa de Canonização do Beato José Vaz

Como era de se esperar, uma multidão estimada em 500 mil pessoas participou da missa de canonização do beato José Vaz  nesta quarta-feira, 14, o primeiro santo do Sri Lanka. Em sua viagem ao país, o Papa Francisco presidiu a Santa Missa. Na homilia, Francisco destacou a figura de São José Vaz como grande missionário do Evangelho.

O Pontífice enfatizou três razões de São José Vaz como exemplo para os fiéis: a primeira, o seu sacerdócio exemplar, ensinando a sair rumo às periferias e tornar Jesus conhecido e amado em todo lugar.

O novo santo também mostrou a importância de transcender as divisões religiosas no serviço da paz. O Santo Padre lembrou que São José Vaz gastou seu ministério em favor dos necessitados e assim é um exemplo para a Igreja no Sri Lanka, que serve todos sem distinção de raça, credo, tribo, condição social ou religião.

“A liberdade religiosa é um direito humano fundamental. (…)  Como nos ensina a vida de José Vaz, a autêntica adoração de Deus leva, não à discriminação, ao ódio e à violência, mas ao respeito pela sacralidade da vida, ao respeito pela dignidade e a liberdade dos outros e a um solícito compromisso em prol do bem-estar de todos”.

O último aspecto citado pelo Papa foi o exemplo de zelo missionário dado por São José Vaz, que deixou para trás sua casa e família para responder ao chamado a ir mais longe e falar de Cristo.

“São José sabia como oferecer a verdade e a beleza do Evangelho num contexto plurirreligioso, com respeito, dedicação, perseverança e humildade. Este é, também hoje, o caminho para os seguidores de Jesus”.

O Papa concluiu a homilia rezando para que, a exemplo de São José Vaz, os cristãos do Sri Lanka possam ser confirmados na fé e contribuir ainda mais para a paz, justiça e reconciliação na sociedade do país. “Isto é o que Cristo espera de vós. Isto é o que São José vos ensina. Isto é o que a Igreja precisa de vós”.


Santa Missa e Canonização do beato José Vaz
Colombo – Sri Lanka
Quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

«Todos os confins da terra verão a salvação do nosso Deus» (Is 52, 10).

Esta é a magnífica profecia que ouvimos na primeira leitura de hoje. Isaías prediz o anúncio do Evangelho de Jesus Cristo até aos confins da terra. Esta profecia tem um significado especial para nós, que celebramos a canonização do grande missionário do Evangelho, São José Vaz. Ele, como tantos outros missionários na história da Igreja, respondeu à ordem dada pelo Senhor ressuscitado para fazer discípulos de todas as nações (cf. Mt 28, 19). Com as suas palavras e, o mais importante, com o exemplo da sua vida, conduziu o povo desta nação à fé que nos concede «parte na herança com todos os santificados» (Act 20, 32).

Em São José, vemos um sinal eloquente da bondade e do amor de Deus pelo povo do Sri Lanka. Mas, nele, vemos também um estímulo para perseverar no caminho do Evangelho a fim de crescermos nós próprios em santidade e testemunharmos a mensagem evangélica de reconciliação à qual dedicou a sua vida.

Padre do Oratório, José Vaz deixa Goa, sua terra natal, e chega a este país movido apenas pelo zelo missionário e por um grande amor a estes povos. Por causa da perseguição religiosa em ato, vestia-se como um mendigo, cumpria os seus deveres sacerdotais encontrando secretamente os fiéis, muitas vezes durante a noite. Os seus esforços deram energia espiritual e moral à população católica assediada. Sentia uma ânsia particular de servir os doentes e atribulados. O seu ministério em favor dos enfermos, durante uma epidemia de varíola em Kandy, foi tão apreciado pelo rei, que lhe foi concedida maior liberdade de ministério. A partir de Kandy, pôde alcançar outras partes da ilha. Deixou-se consumir pelo trabalho missionário e morreu, exausto, aos cinquenta e nove anos de idade, venerado pela sua santidade.

São José Vaz continua a ser um exemplo e um mestre por muitas razões, mas gostaria de focalizar três.

Antes de mais nada, foi um sacerdote exemplar. Hoje temos aqui conosco muitos sacerdotes, religiosos e religiosas, que, como ele, estão consagrados ao serviço do Evangelho de Deus e do próximo. Encorajo cada um de vós a olhar para São José como para um guia seguro. Ensina-nos a sair para as periferias, a fim de tornar Jesus Cristo conhecido e amado por toda a parte. Ele é também um exemplo de sofrimento paciente por causa do Evangelho, de obediência aos superiores, de solícito cuidado pela Igreja de Deus (cf. At 20, 28). Como nós, São José viveu num período de transformações rápidas e profundas; os católicos eram uma minoria e, com frequência, dividida no seu seio; havia hostilidade ocasional, e até mesmo perseguição, dos de fora. Apesar disso, ele, permanecendo constantemente unido ao Senhor crucificado na oração, foi capaz de se tornar para todos um ícone vivo do amor misericordioso e reconciliador de Deus.

Em segundo lugar, São José mostrou-nos a importância de transcender as divisões religiosas no serviço da paz. O seu amor indiviso a Deus abriu-o ao amor do próximo; gastou o seu ministério em favor dos necessitados, sem olhar quem fosse e onde estivesse. O seu exemplo continua a inspirar hoje a Igreja no Sri Lanka, a qual, de bom grado e generosamente, serve todos os membros da sociedade. Não faz distinção de raça, credo, tribo, condição social ou religião, no serviço que proporciona através das suas escolas, hospitais, clínicas e muitas outras obras de caridade. Nada mais pede do que liberdade para exercer a sua missão. A liberdade religiosa é um direito humano fundamental. Cada indivíduo deve ser livre de procurar, sozinho ou associado com outros, a verdade, livre de expressar abertamente as suas convicções religiosas, livre de intimidações e constrições externas. Como nos ensina a vida de José Vaz, a autêntica adoração de Deus leva, não à discriminação, ao ódio e à violência, mas ao respeito pela sacralidade da vida, ao respeito pela dignidade e a liberdade dos outros e a um solícito compromisso em prol do bem-estar de todos.

Finalmente, São José oferece-nos um exemplo de zelo missionário. Embora tenha partido para o Ceilão a fim de assistir e apoiar a comunidade católica, na sua caridade evangélica ele veio para todos. Deixando para trás a sua casa, a sua família, o conforto dos lugares que lhe eram familiares, respondeu à chamada para ir mais longe, para falar de Cristo onde quer que se encontrasse. São José sabia como oferecer a verdade e a beleza do Evangelho num contexto plurirreligioso, com respeito, dedicação, perseverança e humildade. Este é, também hoje, o caminho para os seguidores de Jesus. Somos chamados a ir mais longe com o mesmo zelo, com a mesma coragem de São José, mas também com a sua sensibilidade, com o seu respeito pelos outros, com a sua ânsia de partilhar com eles a palavra da graça (cf. Act 20, 32) que tem o poder de os edificar. Somos chamados a ser discípulos missionários.

Amados irmãos e irmãs, rezo para que, seguindo o exemplo de São José Vaz, os cristãos desta nação possam ser confirmados na fé e dar uma contribuição ainda maior para a paz, a justiça e a reconciliação na sociedade srilanquesa. Isto é o que Cristo espera de vós. Isto é o que São José vos ensina. Isto é o que a Igreja precisa de vós. Confio-vos todos à intercessão do nosso novo Santo, para que, em união com toda a Igreja espalhada pelo mundo inteiro, possais cantar um cântico novo ao Senhor e proclamar a sua glória até aos confins do mundo. Porque o Senhor é grande e digno de todo o louvor (cf. Sal 96/95, 4). Amém.

PAPA FRANCISCO

Homilia do Papa na Missa com religiosos nas Filipinas

Santa Missa com os bispos, sacerdotes, religiosas e religiosos
Catedral da Imaculada Conceição – Manila
Sexta-feira, 16 de janeiro de 2015

“Tu me amas?” [o povo: “Sim!”] Obrigado! Mas eu estava lendo a palavra de Jesus! Diz o Senhor: “Tu me amas? (…) Apascenta os meus cordeiros” (Jo 21, 15.16). As palavras de Jesus a Pedro, no Evangelho de hoje, são as primeiras palavras que vos dirijo, amados irmãos bispos e sacerdotes, religiosos e religiosas, e jovens seminaristas. Estas palavras recordam-nos algo de essencial. Todo o ministério pastoral nasce do amor. Toda a vida consagrada é um sinal do amor reconciliador de Cristo. Como Santa Tereza do Menino Jesus, na variedade das nossas vocações, cada um de nós é chamado de alguma forma, como Santa Teresa do Menino Jesus, a ser o amor no coração da Igreja.

Com grande afeto vos saúdo e peço para levardes o meu afecto a todos os vossos irmãos e irmãs idosos e doentes e a todos aqueles que hoje não puderam juntar-se a nós. Com a Igreja nas Filipinas que olha para o quinto centenário da sua evangelização, sentimos gratidão pela herança deixada por tantos bispos, sacerdotes e religiosos das gerações passadas. Eles esforçaram-se não só por pregar o Evangelho e construir a Igreja nesta nação, mas também por forjar uma sociedade inspirada pela mensagem evangélica da caridade, do perdão e da solidariedade ao serviço do bem comum. Hoje vós continuais a mesma obra de amor. Como eles, sois chamados a construir pontes, apascentar o rebanho de Cristo e preparar vigorosos caminhos para o Evangelho na Ásia ao alvorecer duma nova era.

«O amor de Cristo nos absorve completamente» (2 Cor 5, 14). Na primeira leitura de hoje, São Paulo diz-nos que o amor que somos chamados a anunciar é um amor reconciliador, que jorra do coração do Salvador crucificado. Somos chamados a ser «embaixadores em nome de Cristo» (cf. 2 Cor 5, 20). O nosso é um ministério de reconciliação. Proclamamos a Boa-Nova do amor, da misericórdia e da compaixão infinitos de Deus. Proclamamos a alegria do Evangelho. Uma vez que o Evangelho é a promessa da graça de Deus, a única que pode trazer plenitude e cura ao nosso mundo arruinado, ele pode inspirar a construção duma ordem social verdadeiramente justa e redimida.

Ser embaixador de Cristo significa, antes de mais nada, convidar cada pessoa a um renovado encontro com o Senhor Jesus (cf. Evangelii gaudium, 3). Este convite deve estar no centro da vossa comemoração da evangelização das Filipinas. Mas o Evangelho é também uma exortação à conversão, a um exame da nossa consciência, como indivíduos e como povo. Como justamente ensinaram os vossos bispos, a Igreja nas Filipinas é chamada a individuar e combater as causas da desigualdade e injustiça profundamente enraizadas, que desfeiam o rosto da sociedade filipina, contradizendo claramente o ensinamento de Cristo. O Evangelho chama os indivíduos cristãos a conduzirem vidas honestas, íntegras e solícitas pelo bem comum. Mas chama também as comunidades cristãs a criarem «círculos de integridade», redes de solidariedade que possam impelir a abraçar e transformar a sociedade com o seu testemunho profético.

Os pobres. Os pobres estão no centro do Evangelho, estão no coração do Evangelho; se tiramos os pobres do Evangelho, não podemos entender plenamente a mensagem de Jesus Cristo. Como embaixadores de Cristo, nós, bispos, sacerdotes e religiosos, devemos ser os primeiros a acolher a sua graça reconciliadora nos nossos corações. São Paulo explica o que isso significa. Significa rejeitar perspectivas mundanas, olhando cada coisa de novo à luz de Cristo. Isso comporta que nós somos os primeiros a examinar a nossa consciência, a reconhecer as nossas falhas e quedas e a tomar o caminho da conversão contínua, da conversão cotidiana. Como podemos proclamar a novidade e o poder libertador da Cruz aos outros se mesmo nós não permitimos à Palavra de Deus sacudir o nosso orgulho, o nosso medo de mudar, os nossos compromissos mesquinhos com a mentalidade deste mundo, a nossa mundanidade espiritual (cfr Evangelii gaudium, 93)?

Para nós, sacerdotes e pessoas consagradas, a conversão à novidade do Evangelho implica um encontro diário com o Senhor na oração. Os Santos ensinam-nos que isto é a fonte de todo o zelo apostólico. Para os religiosos, viver a novidade do Evangelho significa encontrar incessantemente na vida da comunidade e nos apostolados da comunidade o incentivo para uma união cada vez mais estreita com o Senhor na caridade perfeita. Para todos nós, isto significa viver de tal forma que espelhemos a pobreza de Cristo, cuja vida estava inteiramente focalizada em fazer a vontade do Pai e servir os outros. Naturalmente, a grande ameaça a isto mesmo é cair num certo materialismo que pode insinuar-se dentro das nossas vidas e comprometer o testemunho que prestamos. Somente o tornar-nos pobres, expulsando o nosso autocomprazimento, permitirá identificar-nos com os últimos dos nossos irmãos e irmãs. Veremos as coisas sob uma nova luz e, deste modo, poderemos responder, com honestidade e integridade, ao desafio de anunciar a radicalidade do Evangelho numa sociedade acostumada à exclusão, à polarização e a uma desigualdade escandalosa.

Aqui desejo dirigir uma palavra especial aos jovens sacerdotes, religiosos, e seminaristas presentes. Peço-vos que partilheis a alegria e o entusiasmo do vosso amor por Cristo e pela Igreja com todos, mas sobretudo com os da vossa idade. Mantende-vos presentes no meio dos jovens que possam sentir-se confusos e desanimados, e todavia continuam a ver a Igreja como sua amiga no caminho e uma fonte de esperança.

Sede solidários com aqueles que, vivendo no meio duma sociedade molesta pela pobreza e a corrupção, sentem-se com o espírito abatido, tentados a largar tudo, deixar a escola e viver pela estrada. Proclamai a beleza e a verdade do matrimónio cristão a uma sociedade que é tentada por apresentações confusas da sexualidade, do matrimónio e da família. Como sabeis, estas realidades estão cada vez mais sob ataque de forças poderosas que ameaçam desfigurar o plano criador de Deus e trair os verdadeiros valores que inspiraram e moldaram quanto de belo existe na vossa cultura.

Na realidade, a cultura filipina foi plasmada pela criatividade da fé. Por todo o lado, os filipinos são conhecidos pelo seu amor a Deus, pela sua piedade fervorosa e a sua ardente e cordial devoção a Nossa Senhora e ao seu terço. Este grande legado contém um forte potencial missionário. É o modo como o vosso povo inculturou o Evangelho e continua a acolher a sua mensagem (cf. Evangelii gaudium, 122). No vosso esforço de preparação para o quinto centenário, construí sobre estas bases sólidas.

Cristo morreu por todos a fim de que, mortos n’Ele, não vivamos mais para nós mesmos, mas para Ele (cf. 2 Cor 5, 15). Amados irmãos bispos, sacerdotes e religiosos, rogo a Maria, Mãe da Igreja, que faça jorrar de todos vós uma tal abundância de zelo, que possais gastar-vos abnegadamente ao serviço dos nossos irmãos e irmãs. Possa, assim, o amor reconciliador de Cristo penetrar ainda mais profundamente no tecido da sociedade filipina e, por vosso intermédio, nos ângulos mais distantes do mundo. Amém.

Comovente encontro do Papa com crianças de rua nas Filipinas

O Papa Francisco está desde ontem, quinta-feira, à tardinha, nas Filipinas, tendo chegado a Manila, proveniente de Colombo (Sri-Lanka) por volta das 18 horas locais. Depois da cerimônia de boas-vindas no Aeroporto, o Papa jantou e pernoitou na Nunciatura de Manila.

Não há palavras para descrever o grandíssimo entusiasmo com que os filipinos acolheram e estão acompanhando cada momento desta visita do Papa, procurando tocar o Papa, e elevar a sua mão à testa, para se sentirem abençoados por ele. Entusiasmo e interesse que transparece também em toda a imprensa local. Os jornais dedicam todos as suas seções, desde a primeira página às páginas de lazer e moda ao Papa Francisco, procurando colher desta visita significado para todos os setores da vida quotidiana dos Filipinos.

Um Papa sempre atento aos pobres, como se viu também aqui com a visita improvisada a um centro para crianças (direto por um padre francês, ao pé da Catedral) e que tanto comoveu os presentes.

O Centro denominado “Fundação TNK” hospeda 20 crianças de rua. No pátio foram reunidas muitas outras das 320 crianças de rua assistidas pela Fundação também em outras casas. As crianças acolheram o Papa (que se deteve com eles uns 20 minutos) com pequenos discursos, abraços, fotos, pequenos dons (entre os quais uma imagem em madeira de Nossa Senhora e uma foto do Santíssimo Sacramento exposto sobre o lixo por ocasião de uma adoração com um grupo de recolhedores de lixo e um mosaico realizado por uma criança com pedaços velhos de papel colorido, etc.) . O Papa concluiu, dando às criancinhas as sua bênção.

Logo de manhã, o Papa deslocou-se ao Palácio Presidencial de Manila, onde foi recebido com todas as honras pelo Presidente Benigno Aquino III; foi-lhe oferecido uma toalhinha refrescante, conforme a tradição do país, assinou o livro de ouro, e dirigiu um discurso às autoridades e ao corpo diplomático ali reunidos.

Depois do encontro com as autoridades, o Papa foi à Catedral de Manila, onde pouco depois das 11 horas locais celebrou a Santa Missa e na sequência terá, no Palácio do Desporto de Manila, designado “Mall of Asia Arena”, um encontro com as famílias. Haverá liturgia da palavra em inglês e intercessões em diversas línguas locais.

Que as famílias não percam a capacidade de sonhar, diz Papa

Que a família nunca perca a capacidade de sonhar. Esta foi uma das mensagens deixadas pelo Papa Francisco às famílias das Filipinas no encontro que teve com elas nesta sexta-feira, 16, em sua visita ao país. Falando várias vezes de improviso, em espanhol, Francisco também destacou a necessidade da família permanecer em Deus e rezar sempre unida.

O discurso do Papa se concentrou na figura de São José, que muitas vezes aparece nas escrituras repousando enquanto lhe é revelada em sonho a vontade de Deus. Francisco disse que não é possível uma família que não sonhe pois, sem essa capacidade, os filhos não crescem e o amor se perde.

“Por isso, recomendo a vocês que à noite, quando fizerem o exame de consciência, se coloquem essa pergunta: hoje sonhei com o futuro dos meus filhos? Sonhei com o amor do meu esposo, da minha esposa, sonhei com meus pais e avós que fizeram a história também? É tão importante sonhar. Primeiro de tudo sonhar em uma família. Não percam essa capacidade de sonhar”.

O Santo Padre observou que Deus também fala com o homem nos momentos de repouso, quando ele coloca de lado seus deveres e atividades diárias. A partir disso, o Papa pediu que as famílias considerem três aspectos, em especial: repousar no Senhor, levantar-se com Jesus e Maria e ser voz profética.

“O repouso é essencial também para a nossa saúde espiritual, para podermos ouvir a voz de Deus e compreender aquilo que nos pede”. E para que cada cristão possa providenciar uma casa para Jesus, a exemplo da Sagrada Família, é preciso repousar em Deus, encontrar tempo para rezar, mesmo diante dos afazeres da vida cotidiana.

“Se não rezarmos, nunca conheceremos a coisa mais importante de todas: a vontade de Deus a nosso respeito. Além disso, durante toda a nossa atividade, na multiplicidade das nossas ocupações, conseguiremos verdadeiramente pouco sem a oração”.

Embora necessários, tais momentos de repouso não podem se prolongar por muito tempo, ressaltou o Papa. A exemplo de São José, após ouvir a voz de Deus, é preciso despertar e agir.

“A fé não nos tira do mundo, mas insere-nos mais profundamente nele. Na realidade, a cada um de nós cabe um papel especial na preparação da vinda do Reino de Deus ao nosso mundo. (…) Deus chama-nos a reconhecer os perigos que ameaçam as nossas próprias famílias e a protegê-las do mal.

Francisco mencionou ainda as várias pressões que a vida a família sofre hoje. “A família está ameaçada também pelos crescentes esforços de alguns em redefinir a própria instituição do matrimônio mediante o relativismo, a cultura do efêmero, a falta de abertura à vida”.

Nesse ponto, o Pontífice recordou o beato Paulo VI, que teve a coragem de de defender a abertura à vida na família. “Paulo VI era valente, era um bom pastor e alertou suas ovelhas sobre os lobos que as rondava. Que ele nos abençoe nesta tarde”. E acrescentou: “Toda a ameaça à família é uma ameaça à própria sociedade”.

“Jesus não os abandona”, diz Papa em Tacloban

Mesmo com a ameaça da chegada de uma tempestade a Tacloban, nas Filipinas, neste sábado, 17, o Papa Francisco dirigiu-se à cidade para presidir a Missa com os fiéis que o aguardavam. A intensa chuva e os fortes ventos não assustaram a multidão que se reuniu no aeroporto local para participar da Celebração.

Na homilia, o Santo Padre contou aos presentes que, de Roma, quando viu a catástrofe provocada pelo Tufão Yolanda, há 14 meses, sentiu que tinha que estar ali. “Eu quis vir para estar com vocês. Um pouco tarde, é verdade. Mas estou”, disse o Papa.

Dirigindo-se espontaneamente aos presentes, Francisco explicou que diante de todo o sofrimento vivido pelos cidadãos de Tacloban, que perderam casa, familiares ou ficaram enfermos, ele somente guarda silêncio. “Não sei o que dizer-lhes, (…) os acompanho com o coração em silêncio”.

Entretanto, o Pontífice afirmou que Jesus sabe o que dizer a cada um. “Jesus vai adiante de nós sempre. E quando passamos por alguma cruz, ele passou primeiro. (…) Jesus não nos decepciona. Temos um Senhor que é capaz de chorar conosco, que é capaz de acompanhar-nos nos momentos mais difíceis da vida”, destacou.

As lágrimas e o silêncio eram visíveis entre os presentes, à medida que Francisco falava.

“Muitos de vocês se perguntaram olhando para Cristo, ‘por que, Senhor?’ O Senhor responde a cada um no coração, do seu coração. Não tenho outras palavras para dizer-lhes. Olhemos para Cristo, Ele é o Senhor, Ele nos compreende porque experimentou a Cruz”, disse o Papa.

Ao final da homilia, o Santo Padre convidou os fiéis a dirigirem seu olhar à Nossa Senhora e a Jesus na cruz, e num momento de silêncio, falarem o que traziam no coração.

“Não estamos sozinhos”, afirmou o Pontífice. “Temos uma mãe, temos Jesus, nosso irmão mais velho, não estamos sós. E também temos muitos irmãos que neste momento de catástrofe vieram encontrar-nos”.

O Papa concluiu pedindo desculpas por não ter outra palavra a dizer aos presentes, e lembrou-os mais uma vez, que Jesus não decepciona, nem mesmo Maria, com seu amor e ternura. “Olhemos para ela como filhos (…) Sigamos adiante!”

Após a Missa o Santo Padre almoçou com 30 familiares de vítimas do Tufão, em seguida, deslocou-se a Catedral, onde faria um discurso aos sobreviventes da Catástrofe, para explicar os motivos do cancelamento. Em seguida, o Papa retornou a cidade de Manila.

MORTE DE JOVEM VOLUNTÁRIA

Uma jovem de 21 anos, voluntária na organização da Missa celebrada pelo Papa Francisco em Tacloban, morreu neste sábado, 17, ao ser atingida por um andaime de aço derrubado pela tempestade tropical, informou o Padre Amadeo Alvero, porta-voz da Arquidiocese de Palo.

O Pontífice foi informado do acontecimento pela Nunciatura de Manila e rezou pela jovem. Segundo informações do Diretor da Sala de Imprensa da Santa Sé, padre Federico Lombardi, o Papa pediu a um dos organizadores das viagens papais, Alberto Gasbarri, informações sobre o acidente e possíveis contatos com a família da moça, para lhe manifestar solidariedade.

Devido à tempestade Mekkhala, – a primeira a passar pelo arquipélago filipino este ano – a programação de Francisco teve que ser abreviada. O Papa celebrou a Missa sob chuva intensa e voou de regresso a Manila quatro horas antes do previsto, a conselho do serviço meteorológico.

Uma média de 20 tempestades tropicais atinge todos os anos as Filipinas.

A tempestade tropical Mekkhala avança para oeste e pode provocar ventos de até 145 km/h. Se seguir a trajetória prevista, é possível que a capital Manila, para onde Francisco regressou após a visita a Tacloban, também seja afetada.

O Pontífice teve ainda tempo para passar rapidamente pelo “Centro Papa Francisco para os pobres”, e abençoar as instalações de fora, do papamóvel. O Centro ainda não foi inaugurado e é uma obra financiada pelo Cor Unum, o conselho pontifício encarregado de iniciativas de caridade.

O previsto encontro com o clero local, às 15h30 (hora local) na Catedral de Palo, foi cancelado, mas Francisco passou pelo templo para saudar todos os presentes – cerca de 500 pessoas – e explicar-lhes o motivo da mudança de programa: “Obrigado por suas calorosas boas-vindas; devo lhes dizer uma coisa que me entristece: estava programado que o avião voltasse a Manila às 17h, mas um tufão do 2º grau se aproxima e o piloto disse que temos que ir embora às 13h. Desculpo-me por isso”, acrescentou o Pontífice, que em seguida rezou uma ‘Ave Maria’ e abençoou os fiéis.

Momentos depois, recebeu de presente a imagem de uma virgem entalhada na madeira das ruínas da Catedral, que ficou destruída com o tufão Yolanda. O Papa Francisco quis, todavia, conhecer uma família de pescadores de Tacloban, com quem permaneceu cerca de dez minutos.

A chuva e o forte vento na cidade não impediram que milhares de cidadãos, cobertos com capas e capuzes, lotassem as ruas para assistir à passagem do papamóvel. O avião papal decolou do Aeroporto Daniel Romualdez rumo a Manila às 13h08 (hora local).

O principal objetivo da visita de Francisco a Tacoblan era, precisamente, consolar as milhares de vítimas das numerosas tempestades que se abatem sobre as Filipinas, especialmente o tufão Yolanda, que deixou mais de 3 mil mortos somente nesta cidade, em novembro de 2013.

Íntegra da Homilia

A primeira leitura nos disse que temos um grande sacerdote. Jesus viveu como nós e se iguala a nós em tudo, menos no pecado. Porque ele não era pecador, mas para ser mais igual a nós, assumiu nosso pecado, se fez pecado.

Jesus vai adiante de nós sempre, e quando nós passamos por alguma cruz, ele passou primeiro. E se hoje todos nós nos reunimos aqui, 14 meses depois que passou o Tufão Yolanda é porque temos a segurança de que não vamos fraquejar na fé, porque Jesus passou primeiro.

Em sua paixão ele assumiu todas as nossas dores. E quando, permita-me fazer uma confissão, quando eu vi de Roma esta catástrofe, senti que tinha que estar aqui. E esses dias decidi fazer a viagem aqui, quis vir para estar com vocês, um pouco tarde é verdade, mas estou. Estou para dizer-lhes que Jesus é seu Senhor, que Jesus não nos decepciona.

Padre – você podem me dizer – a mim iludiu porque perdi minha casa, minha família, o que tinha, estou enfermo… É verdade o que me dizem, e eu respeito seu sentimento. Porém, Jesus está lá, na cruz, cravado, e de lá não nos decepciona.

Ele foi consagrado Senhor nesse trono, e aí passou por todas as calamidades que tememos. Jesus é o Senhor, e é Senhor a partir da cruz, ali reinou. Por isso ele é capaz de entender-nos, como escutamos na primeira leitura.

Em tudo isso se iguala a nós, por isso temos um Senhor que é capaz de chorar conosco, que é capaz de acompanhar-nos nos momentos mais difíceis da vida.

Muito de vocês perderam tudo, e eu não sei o que dizer-lhes, Ele sabe o que dizer-lhes. Muitos de vocês perderam parte da família, eu somente guardo silêncio, e os acompanho com meu coração em silêncio. Muitos vocês se perguntaram, olhando a Cristo: por que Senhor? E a cada um o Senhor responde no coração, a partir do Seu coração.

Não tenho outra palavra a dizer-lhes. Olhemos a Cristo, Ele é o Senhor. Ele nos compreende porque passou pela dor, pelo sofrimento. No momento em que não entendemos nada, no momento em que queremos rebelar-nos, resta-nos somente estender a mão e agarrar-nos em seu manto.

Pedir-lhe: mamãe, como um filho que quando tem medo diz: mamãe. Essa é a única palavra que pode expressar nossos momentos de apuros: mãe, mamãe.

Façamos juntos um momento de silêncio, olhemos o Senhor, Ele pode compreender-nos porque passou por todas as coisas. E olhemos para nossa mãe, e como um filho agarremo-nos em seu manto. Com um coração digamos: Mãe. Em silêncio, façamos esta oração e cada um diga-lhe o que sente.

Não estamos sós, temos uma mãe, temos Jesus, nosso irmão maior. Não estamos sós. E também temos muitos irmãos que neste momento de catástrofe vieram ajudar-nos. E também nós nos sentimos mais irmãos e temos que ajudar-nos uns aos outros.

Esta é a única mensagem que tenho a dizer-lhes. Perdoem-me se não tenho outra palavra. Mas eu tenho a certeza de que Jesus não decepciona. Tenho a certeza que o amor e a ternura de nossa Mãe não decepciona. E agarrados a isso, como filhos, e com a força que nos dá Jesus, nosso irmão maior, sigamos adiante e caminhemos como irmãos.

Muito obrigado!

PAPA FRANCISCO

Aeroporto Internacional de Tacloban – Filipinas
Sábado, 17 de janeiro de 2015

Papa reúne mais de 6 milhões de pessoas em Manila

Os filipinos já tinham o recorde de público na visita de um papa, conseguido com o Papa João Paulo II durante a Jornada Mundial da Juventude em 2005. Mas nesta viagem do Papa Francisco eles deram outra grande demonstração de fé ao reunir 6 milhões de pessoas no Rizal Park, em Manila, durante a última celebração do Papa Francisco na capital filipina.

“Temos seis milhões” de pessoas, disse o presidente da Autoridade de Desenvolvimento de Manila, Francis Tolentino. O porta-voz do Vaticano, Federico Lombardi, afirmou, citando autoridades filipinas, que o número poderia chegar a 7 milhões de pessoas.

Os filipinos comemoraram junto com Francisco o dia de Santo Niño – uma festa onde se venera a imagem do Menino Jesus, vestido em trajes reais, coroado e ornado com o cetro, o globo e a cruz. O Papa usou da festividade para lembrar os fiéis de serem sempre como crianças e espalharem o Reino de Cristo no mundo. Santo Niño, disse o Papa, “recorda-nos a nossa identidade mais profunda: todos nós somos filhos de Deus, membros da família de Deus”.

Na missa, o pontífice pediu aos fiéis do país, cuja grande maioria da população é católica, para que sejam missionários na Ásia, onde o catolicismo é a religião de apenas 3,2% da população. “As Filipinas são o país líder na Ásia. É um dom de Deus, uma bênção, mas também é uma vocação. Os Filipinos são chamados a ser missionários da fé na Ásia”, afirmou, na homilia realizada em Manila, perante milhões de pessoas, apesar da forte chuva que atingia a capital.

Francisco criticou a corrupção, o conformismo, o desperdício, as ameaças contra o meio ambiente e “os ataques insidiosos” contra a família.

A missa em Manila foi um dos pontos altos da visita de cinco dias do papa ao país. Protegido com uma capa impermeável amarela, o pontífice, de 78 anos, acenou e sorriu ao longo do percurso que fez no seu papamóvel, até chegar ao local da celebração.

O mal causado pelo pecado também foi recordado pelo Papa na homilia. Francisco atribuiu ao pecado a destruição da unidade e da beleza da família humana e a autoria das estruturas sociais que perpetuam a pobreza, a ignorância e a corrupção. Mas, ainda neste sentido, Francisco disse que a grande ameaça ao plano de amor de Deus é, e sempre foi, a mentira que tem por pai, o diabo. Ele, disse o Papa, tem a função de distrair o homem com “prazeres efêmeros e passatempos superficiais”.

“Desta forma, desperdiçamos os dons recebidos de Deus, entretendo-nos com apetrechos fúteis; gastamos o nosso dinheiro em jogos de azar e na bebida; fechamo-nos em nós mesmos. Esquecemos de nos centrar nas coisas que realmente contam. Esquecemo-nos de permanecer interiormente como crianças”, refletiu.

Entretanto, o Santo Padre recordou que uma Criança, o Santo Niño, trouxe ao mundo a bondade de Deus, a misericórdia e a justiça. “Resistiu à desonestidade e à corrupção, que são a herança do pecado, e triunfou sobre elas com o poder da cruz”. “Agora, no final da minha visita às Filipinas, entrego-vos a Jesus que veio estar entre nós como criança. Que Ele torne todo o amado povo deste país capaz de trabalhar unido, de se proteger mutuamente a começar pelas vossas famílias e comunidades, na construção de um mundo de justiça, integridade e paz”, concluiu.

Francisco terminará sua viagem às Filipinas nesta segunda-feira, 19, quando tomará o voo de retorno à Roma às 10h (hora local).

Íntegra da Homilia

«Um menino nasceu para nós, um filho nos foi dado» (Is 9, 5). Sinto uma alegria particular por celebrar convosco o domingo do «Santo Niño». A imagem do Santo Menino Jesus acompanhou a difusão do Evangelho neste país desde o início. Vestido com os trajes reais, coroado e ornado com o ceptro, o globo e a cruz, recorda-nos continuamente a ligação entre o Reino de Deus e o mistério da infância espiritual. Disto mesmo nos fala Ele no Evangelho de hoje: «Quem não receber o Reino de Deus como um pequenino, não entrará nele» (Mc 10, 15). O «Santo Niño» continua a anunciar-nos que a luz da graça de Deus brilhou sobre um mundo que habitava nas trevas, trazendo a Boa-Nova da nossa libertação da escravidão e guiando-nos pela senda da paz, do direito e da justiça. Além disso, recorda-nos que fomos chamados para espalhar o Reino de Cristo no mundo.

Ao longo da minha visita, ouvi-vos cantar: «Somos todos filhos de Deus». Isto é o que o «Santo Niño» nos vem dizer. Recorda-nos a nossa identidade mais profunda. Todos nós somos filhos de Deus, membros da família de Deus. São Paulo disse-nos hoje que, em Cristo, nos tornamos filhos adoptivos de Deus, irmãos e irmãs em Cristo. Isto é o que nós somos. Esta é a nossa identidade. Vimos uma belíssima expressão disto, quando os filipinos se uniram em torno dos nossos irmãos e irmãs atingidos pelo tufão.

O Apóstolo diz-nos que fomos abundantemente abençoados porque Deus nos escolheu: «no alto do Céu [Ele] nos abençoou com toda a espécie de bênçãos espirituais em Cristo» (Ef 1, 3). Estas palavras têm uma ressonância especial nas Filipinas, porque é o maior país católico na Ásia. E isto é já um dom especial de Deus, uma bênção; mas é também uma vocação: os filipinos estão chamados a ser exímios missionários da fé na Ásia.

Deus escolheu-nos e abençoou-nos com uma finalidade: ser santos e irrepreensíveis na sua presença (cf. Ef 1, 4). Escolheu cada um de nós para ser testemunha, neste mundo, da sua verdade e da sua justiça. Criou o mundo como um jardim esplêndido e pediu-nos para cuidar dele. Todavia, com o pecado, o homem desfigurou aquela beleza natural; pelo pecado, o homem destruiu também a unidade e a beleza da nossa família humana, criando estruturas sociais que perpetuam a pobreza, a ignorância e a corrupção.

Às vezes, vendo os problemas, as dificuldades e as injustiças, somos tentados a desistir. Quase parece que as promessas do Evangelho não são realizáveis, são irreais. Mas a Bíblia diz-nos que a grande ameaça ao plano de Deus a nosso respeito é, e sempre foi, a mentira. O diabo é o pai da mentira. Muitas vezes, ele esconde as suas insídias por detrás da aparência da sofisticação, do fascínio de ser «moderno», de ser «como todos os outros». Distrai-nos com a miragem de prazeres efémeros e passatempos superficiais. Desta forma, desperdiçamos os dons recebidos de Deus, entretendo-nos com apetrechos fúteis; gastamos o nosso dinheiro em jogos de azar e na bebida; fechamo-nos em nós mesmos. Esquecemos de nos centrar nas coisas que realmente contam. Esquecemo-nos de permanecer interiormente como crianças. Na realidade, estas – como nos ensina o Senhor – têm uma sabedoria própria, que não é a sabedoria do mundo. É por isso que a mensagem do «Santo Niño» é tão importante. Fala profundamente a cada um de nós; recorda-nos a nossa identidade mais profunda, aquilo que somos chamados a ser como família de Deus.

O «Santo Niño» recorda-nos também que esta identidade deve ser protegida. Cristo Menino é o protector deste grande país. Quando Ele veio ao nosso mundo, a sua própria vida esteve ameaçada por um rei corrupto. O próprio Jesus viu-Se na necessidade de ser protegido. Ele teve um protector na terra: São José. Teve uma família aqui na terra: a Sagrada Família de Nazaré. Desta forma, recorda-nos a importância de proteger as nossas famílias e a família mais ampla que é a Igreja, a família de Deus, e o mundo, a nossa família humana. Hoje, infelizmente, a família tem necessidade de ser protegida de ataques insidiosos e programas contrários a tudo o que nós consideramos de mais verdadeiro e sagrado, tudo o que há de mais nobre e belo na nossa cultura.

No Evangelho, Jesus acolhe as crianças, abraça-as e abençoa-as. Também nós temos o dever de proteger, guiar e encorajar os nossos jovens, ajudando-os a construir uma sociedade digna do seu grande património espiritual e cultural. Especificamente, temos necessidade de ver cada criança como um dom que deve ser acolhido, amado e protegido. E devemos cuidar dos jovens, não permitindo que lhes seja roubada a esperança e sejam condenados a viver pela estrada.

Uma criança frágil trouxe ao mundo a bondade de Deus, a misericórdia e a justiça. Resistiu à desonestidade e à corrupção, que são a herança do pecado, e triunfou sobre elas com o poder da cruz. Agora, no final da minha visita às Filipinas, entrego-vos a Jesus que veio estar entre nós como criança. Que Ele torne todo o amado povo deste país capaz de trabalhar unido, de se proteger mutuamente a começar pelas vossas famílias e comunidades, na construção dum mundo de justiça, integridade e paz. O «Santo Niño» continue a abençoar as Filipinas e a sustentar os cristãos desta grande nação na sua vocação de ser testemunhas e missionários da alegria do Evangelho, na Ásia e no mundo inteiro.

Por favor, rezai por mim. Deus vos abençoe a todos!

PAPA FRANCISCO
Santa Missa no Rizal Park em Manila – Filipinas
Domingo, 18 de janeiro de 2015

Papa pede que jovens sejam sábios, não “jovens de museu”

Em encontro com jovens nas Filipinas, Francisco pediu sabedoria e capacidade de aprender a chorar, amar e receber

O encontro do Papa Francisco com os jovens em Manila, nas Filipinas, neste domingo, 18, foi marcado pela emoção. Uma das jovens que falou para o Papa não conseguiu conter as lágrimas. Tocado pelos testemunhos, Francisco abandonou o discurso preparado para falar o que lhe veio ao coração. Ele se desculpou por não ler o que estava preparado, mas justificou sua decisão: “A realidade que vocês apresentaram é superior a todas as respostas que eu tinha preparado””.

“Quando falo de maneira espontânea, faço isso em espanhol, porque não conheço a língua inglesa. Posso fazer isso? Muito obrigado!”, disse o Papa, acrescentando seu objetivo para o encontro: exprimir o amor e a esperança que a Igreja tem pelos jovens e encorajá-los a se dedicarem com paixão e honestidade para renovar a sociedade e contribuir na construção de um mundo melhor.

No encontro, três jovens que já foram moradores de rua apresentaram seus testemunhos ao Papa. Um deles era uma menina, que se emocionou, não conseguiu conter as lágrimas e foi consolada por Francisco. Ela perguntou ao Papa algo que, segundo o Pontífice, não tem resposta: por que as crianças sofrem?

Francisco destacou que as pessoas só conseguem entender alguma coisa quando o coração está pronto para interrogar a si mesmo e chorar. Ele falou da “compaixão” mundana, que consiste em, no máximo, dar uma moeda. “Se Cristo tivesse tido esse tipo de compaixão, seria simplesmente passado, teria curado três ou quatro pessoas e teria voltado ao Pai. Somente quanto Cristo foi capaz de chorar compreendeu o que acontecia nas nossas vidas”.

No mundo de hoje falta essa capacidade de chorar, disse o Papa: “Algumas realidades da vida são vistas apenas com os olhos lavados pelas lágrimas”. Ele pediu que as pessoas aprendam a chorar, como a pequena jovem fez hoje, pois isso é necessário para um bom cristão.

Jovens sábios, não “jovens de museu”

A pergunta do outro jovem foi sobre o excesso de informação dos dias atuais. Não se trata de um mal, disse o Papa, mas há o perigo de acumular informação e não saber como utilizá-la. “Corremos o risco de nos transformarmos em jovens de museu, que têm tudo, mas não sabem o que fazer. Não precisamos de jovens ‘museu´’, mas de jovens sábios”.

Para se tornar, sábio, porém, Francisco reconheceu que há o desafio do amor: é preciso aprender a amar. Ele enfatizou que é através do amor que toda a informação se torna fecunda e o Evangelho propõe três linguagens simples para isso: pensar, sentir e realizar. “As informações que recebemos devem chegar ao coração e se transformarem em algo concreto”.

O outro testemunho foi de um jovem que, junto a um grupo de amigos, criou um sistema de iluminação para ajudar os atingidos pelo tufão Yolanda. Francisco agradeceu por esse trabalho e destacou que, assim como é preciso dar, deve-se aprender a receber.

Como exemplo, ele citou os doutores da lei do tempo de Jesus, que davam as leis ao povo, ensinavam as pessoas, mas nunca permitiu que o povo desse alguma coisa a eles. Segundo o Papa, há muitos jovens assim, que sabem dar, mas não sabem receber.

“Não é fácil de compreender. Aprender a mendigar, aprender a receber da humildade daqueles que ajudamos. Aprender a ser evangelizados pelos pobres (…) Vocês que vivem dando sempre e acreditam não precisar de nada, sabem que também vocês são pobres? Sabem que estão na pobreza e que precisam ser evangelizados pelos pobres, pelos doentes, por aqueles que vocês ajudam? Isso é o que vos ajuda a amadurecer no vosso empenho e querer ajudar os outros”

Papa se encontra com pai de jovem que morreu nas Filipinas

Antes de voltar à Nunciatura apostólica neste domingo, 18, o Papa Francisco se encontrou com o pai da voluntária Kristel Mae Padasas, de 27 anos, que morreu neste sábado, 17, após ser atingida por um andaime em uma tempestade em Tacloban, nas Filipinas.

O pai de Kristel estava em Manila e, no encontro com o Papa, estava acompanhado por um primo. A conversa durou cerca de 20 minutos, tendo como intérprete o arcebispo local, Cardeal Luis Antonio Tagle. Sobre a mesa, estavam duas fotos da jovem e dela pequena com os pais. O pai disse que estava abalado, mas consolado ao pensar que a filha pôde preparar o encontro do povo com o Papa.

Houve a tentativa de telefonar para a mãe da jovem que está em Hong Kong, mas não se conseguiu. Ela deve chegar a Manila nesta segunda-feira, 19. Mais cedo, no encontro com os jovens, Francisco recordou o triste incidente e rezou uma Ave Maria e um Pai Nosso pela jovem e por seus pais.

Discurso no interior com os jovens

Queridos jovens amigos!

É uma alegria para mim estar hoje convosco. Saúdo cordialmente a cada um de vós e agradeço a todos aqueles que tornaram possível este encontro. Durante a minha visita às Filipinas, senti uma vontade particular de me encontrar convosco, queridos jovens, para vos escutar e falar. Desejo exprimir o amor e a esperança que a Igreja tem por vós e em vós. A minha intenção é encorajar-vos, como cidadãos cristãos deste país, na oferta de vós mesmos feita com entusiasmo e honestidade para o grande compromisso de renovar a vossa sociedade e contribuir para a construção de um mundo melhor.

De modo especial, agradeço aos jovens que me dirigiram palavras de boas-vindas. Expressaram de forma eloquente, em vosso nome, as vossas preocupações e ansiedades, a vossa fé e as vossas esperanças. Falaram das dificuldades e expectativas dos jovens. Embora não possa responder a cada uma destas questões de forma exaustiva, sei que, juntamente com os vossos pastores e entre vós, ireis considerá-las cuidadosamente com a ajuda da oração e fareis propostas concretas de acção.

Hoje quero sugerir-vos três áreas-chave onde tendes uma contribuição significativa a dar à vida do vosso país. A primeira é o desafio da integridade. O termo «desafio» pode ser entendido de duas maneiras. A primeira, de modo negativo, como uma tentativa de agir contra as vossas convicções morais, contra tudo o que vós professais acerca do que é verdadeiro, bom e justo. A nossa integridade pode ser desafiada por interesses egoístas, pela ganância, pela desonestidade ou pela intenção de manipular os outros.

Mas a palavra «desafio» pode-se entender também em sentido positivo. Pode ser vista como um convite a ser corajoso, a dar um testemunho profético da própria fé e de tudo o que se crê e considera sagrado. Neste sentido, o desafio da integridade é algo com que é preciso confrontar-vos nestes tempos e nas vossas vidas. Não se trata de algo que se pode adiar para quando fordes mais idosos ou tiverdes maiores responsabilidades. Mesmo agora, sois desafiados a agir com honestidade e lealdade nas vossas relações com os outros, sejam eles jovens ou idosos. Não fujais deste desafio. Um dos maiores desafios que os jovens têm pela frente é o de aprender a amar. Amar significa assumir um risco: o risco da rejeição, o risco de ser usados ou, pior, usar o outro. Não tenhais medo de amar. Mas, mesmo amando, preservai a vossa integridade. Também nisso, sede honestos e leais.

Na leitura que acabámos de ouvir, Paulo diz a Timóteo: «Ninguém escarneça da tua juventude; antes, sê modelo dos fiéis na palavra, na conduta, no amor, na fé, na castidade» (1 Tm 4, 12).

Portanto sois chamados a dar bom exemplo, exemplo de integridade. Ao fazê-lo, naturalmente tereis de enfrentar oposições e críticas, o desânimo e até o ridículo. Mas vós recebestes um dom que vos permite superar estas dificuldades: o dom do Espírito Santo. Se alimentardes este dom com a oração diária e tirardes força da participação na Eucaristia, sereis capazes de alcançar aquela grandeza moral a que vos chama Jesus. Tornar-vos-eis também uma bússola para os vossos amigos que andam à deriva. Penso especialmente nos jovens que se sentem tentados a perder a esperança, a abandonar os seus altos ideais, a deixar a escola ou a gozar o dia-a-dia.

Por isso, é essencial não perder a vossa integridade, não comprometer os vossos ideais, nem ceder às tentações contra a bondade, a santidade, a coragem e a pureza. Abraçai o desafio. Com Cristo, vós sereis – na verdade, já o sois – os artífices duma cultura filipina renovada e mais justa.

Uma segunda área onde sois chamados a dar a vossa contribuição é mostrar solicitude pelo meio ambiente. Isto não se deve apenas ao facto de que o vosso país, mais do que outros, corre o risco de ser seriamente afectado pelas alterações climáticas. Sois chamados a cuidar da criação, não só como cidadãos responsáveis, mas também como seguidores de Cristo. O respeito pelo ambiente requer mais do que simplesmente usar produtos não poluentes ou reciclá-los. Estes são aspectos importantes, mas não suficientes. Temos necessidade de ver, com os olhos da fé, a beleza do plano de salvação de Deus, a ligação entre o ambiente natural e a dignidade da pessoa humana. O homem e a mulher foram criados à imagem e semelhança de Deus, tendo-lhes sido dado o domínio sobre a criação (cf. Gn 1, 26-28). Como administradores da criação, somos chamados a fazer da Terra um belíssimo jardim para a família humana. Quando destruímos as nossas florestas, devastamos o solo e poluímos os mares, traímos esta nobre vocação.

Há três meses, os vossos bispos abordaram estes temas numa Carta Pastoral profética. Pediram a cada um que reflectisse sobre a dimensão moral das nossas actividades e dos nossos estilos de vida, nos nossos consumos e no uso que fazemos dos recursos naturais. Hoje peço-vos que o façais no contexto das vossas vidas e do vosso compromisso em prol da construção do Reino de Cristo. Queridos jovens, o uso e a gestão correctos dos recursos naturais é uma tarefa urgente, para a qual tendes uma importante contribuição a dar. Sois o futuro das Filipinas. Mostrai-vos interessados por tudo o que sucede na vossa belíssima terra.

Outra área, para a qual podeis prestar uma contribuição, é particularmente querida a todos vós: o cuidado dos pobres. Somos cristãos, membros da família de Deus. Cada um de nós – não importa se, individualmente, temos muito ou pouco – é chamado a estender a mão pessoalmente e servir os nossos irmãos e irmãs necessitados. Há sempre alguém perto de nós que está em necessidade: material, psicológica, espiritual. O maior presente que lhe podemos dar é a nossa amizade, a nossa solicitude, a nossa ternura, o nosso amor por Jesus. Recebê-Lo significa receber com Ele tudo; dá-Lo significa dar o maior presente de todos.

Muitos de vós sabem o que significa ser pobre. Mas, muitos de vós terão experimentado também algo da bem-aventurança que Jesus prometeu aos «pobres em espírito» (Mt 5, 3). Gostaria de deixar aqui uma palavra de incentivo e gratidão àqueles de vós que escolheram seguir Nosso Senhor na sua pobreza, através da vocação ao sacerdócio e à vida religiosa; bebendo naquela pobreza, enriquecereis a muitos. A todos vós, porém, especialmente àqueles que podem fazer e dar mais, peço: Por favor, fazei mais! Por favor, dai mais! Quando ofereceis algo do vosso tempo, dos vossos talentos e dos vossos recursos a tantas pessoas carentes que vivem marginalizadas, sois diferentes. É uma diferença de que há uma necessidade desesperada e pela qual sereis abundantemente recompensados pelo Senhor, pois – como Ele disse – «tereis um tesouro no céu» (Mc 10, 21).

Vinte anos atrás, São João Paulo II afirmou, neste mesmo lugar, que o mundo precisa de «um novo tipo de jovem»: um jovem que esteja comprometido com os mais altos ideais e desejoso de construir a civilização do amor. Sede aqueles jovens de que falava São João Paulo II. Não percais os vossos ideais. Sede jubilosas testemunhas do amor de Deus e do plano maravilhoso que Ele tem para nós, para este país e para o mundo em que vivemos. Por favor, rezai por mim. Deus vos abençoe a todos.

Campo Desportivo da Universidade de São Tomás, Manila
Domingo, 18 de Janeiro de 2015

Papa Francisco: “Os pobres nos evangelizam”

Padre Lombardi – Santo Padre, obrigado por vir até aqui. Vemo-lo em grande forma depois destes dias de visita e agradecemos-lhe por nos dar de novo trabalho para fazer hoje também, porque, com a sua conversa, faz-nos trabalhar durante toda a viagem.

Papa Francisco – Antes de mais nada, quero saudar-vos. Bom dia, obrigado pelo vosso trabalho. Foi bom, e muito obrigado pelo que fizestes.

Kara David, grupo filipino – Bom dia, Santo Padre. Desculpe, vou falar em inglês. Muito obrigado por ter visitado o nosso país e por dar tanta esperança aos filipinos. Gostaríamos que voltasse ao nosso país. A minha pergunta: Os filipinos aprenderam muito ouvindo a sua mensagem. Há alguma coisa que o Santo Padre tenha aprendido dos filipinos do seu encontro conosco?

Papa Francisco – Os gestos! Os gestos comoveram-me. Não são gestos protocolares… São gestos bons, gestos sentidos, gestos que vêm do coração. Alguns quase fazem chorar. Neles está tudo: a fé, o amor, a família, a esperança, o futuro… Aquele gesto dos pais quando levantavam as crianças para que o Papa as abençoasse. O gesto de um pai… Havia tantos que levantavam as crianças quando eu passava pela estrada. Um gesto que não se vê em outros lugares. Era como se dissessem: este é o meu tesouro, este é o meu futuro, este é o meu amor; por ele vale a pena trabalhar, por ele vale a pena sofrer. É um gesto original, nascido do coração.

O segundo gesto que me impressionou muito foi um entusiasmo sincero, o júbilo, a alegria; eram capazes de fazer festa mesmo sob a chuva. Dizia-me um dos cerimoniários que ficou edificado porque os acólitos em Tacloban, com toda aquela chuva, nunca perderam o sorriso. É a alegria, a alegria sincera. Não era um sorriso maquiado, não; era um sorriso que vinha de dentro. E, por detrás daquele sorriso, há a vida normal, existem as tribulações, existem os problemas… Outro gesto: as mães que traziam os filhos doentes; e o modo como as mães os traziam. As mães não levantavam tanto os filhos… até aqui [até ao braço]. Sim, viam-se tantas crianças deficientes, mas não escondiam a criança, levavam-na ao Papa para que a abençoasse. Este é o meu filho: é assim, mas é meu. Todas as mães sabem disso e fazem-no; mas a maneira de como fazer é que me impressionou.

O gesto da paternidade, da maternidade, do entusiasmo, da alegria. E há uma palavra que é de difícil compreensão para nós porque foi demasiado vulgarizada, usada demasiado mal ou mal compreendida, mas é uma palavra que tem substância: a resignação. Um povo que sabe sofrer e que é capaz de se levantar e ir para diante. Ontem, no colóquio que tive com o pai de Krystel – a jovem voluntária que morreu em Tacloban – fiquei edificado [com aquilo que me disse]: «Morreu em serviço», e procurava palavras para se confortar, para aceitar aquilo. Um povo que sabe sofrer. Foi isto o que eu vi, segundo a minha interpretação dos gestos.

Jean-Louis de la Vaissière, da France Presse, pelo grupo francês – Santidade, já foi duas vezes à Ásia. Os católicos na África ainda não receberam a sua visita. O Santo Padre sabe que, desde a República Centro-Africana à Nigéria e a Uganda, há muitos fiéis atribulados pela pobreza, a guerra, o fundamentalismo islâmico que esperam a sua visita este ano. Assim queria-lhe perguntar: Quando e onde pensa ir?

Papa Francisco – A minha resposta é hipotética. O plano é ir à República Centro-Africana e a Uganda; os dois, neste ano. Creio que será lá para o fim, por causa do tempo. Devem encontrar a melhor condição climática, que não haja mau tempo. Está um pouco atrasada esta viagem por causa do problema do ebola. É uma grave responsabilidade promover grandes encontros devido ao contágio. Mas, nestes países, isso não é problema. Como hipótese, neste ano, serão os dois citados.

Salvatore Izzo, da AGI – Agência Italiana de Informação, pelo grupo italiano – Santo Padre, em Manila estávamos num albergue muito bom, eram todos muito gentis e comia-se muito bem. Mas logo que se deixava o hotel, éramos – digamos assim – moralmente agredidos pela pobreza. Víamos crianças que vagavam no meio dos desperdícios; tratados, diria talvez Vossa Santidade, como desperdícios. Sabe?! Tenho um filho de seis anos e senti vergonha ao ver estes que estão tão mal. Mas o meu filho, que se chama Rocco, compreendeu muito bem aquilo que Vossa Santidade nos ensina quando diz para partilhar com os pobres. E assim, a caminho da escola, procura distribuir o lanche pelos mendigos da área. Para mim, porém, é muito mais difícil. E também para outras pessoas adultas é difícil. Um único Cardeal, há 40 anos, deixou tudo para ir estar com os leprosos (Léger). Bem, a minha pergunta é esta: Por que é tão difícil seguir aquele exemplo, mesmo para os Cardeais? Entretanto há outra coisa que lhe queria perguntar, mas diz respeito ao Sri Lanka. Lá vimos todas aquelas favelas, quando íamos para o aeroporto. São barracas apoiadas nas árvores; vivem praticamente debaixo das árvores. A maioria são tâmis, claramente discriminados. O Santo Padre, no dia seguinte ao massacre de Paris, talvez como primeira impressão, disse: «Há um terrorismo isolado e um terrorismo de Estado». Que queria dizer com a expressão «terrorismo de Estado»? Ocorreu-me aquela expressão ao ver o sofrimento e a discriminação daquelas pessoas.

Papa Francisco – Quando uma de vós me perguntava qual era a mensagem que levava para as Filipinas, eu disse: os pobres. É a mensagem da Igreja hoje. Aquilo que o senhor diz do Sri Lanka, dos tâmis, da discriminação… Os pobres, as vítimas desta cultura do descarte. Isso é verdade. Hoje não se descarta apenas o papel, o que sobra. Descartam-se as pessoas. E a discriminação é um tipo de descarte. Descartam-se estas pessoas. Vem-me ao pensamento a imagem das castas… Isto não pode continuar. E o descarte hoje parece quase normal. O senhor falava do hotel de luxo ao lado das barracas. Na minha diocese de Buenos Aires, havia toda uma área nova, chamada Puerto Madero, até à estação ferroviária, e depois começa a «Villa Miseria», os pobres, uns atrás dos outros. Da parte de cá, existem 36 restaurantes de luxo, que, se lá fores comer, levam-te couro e cabelo; da parte de lá, temos a fome. Uma coisa pegada à outra; e nós temos tendência para nos habituar a isto. Sim, aqui estamos nós, e lá estão os descartados. Esta é a pobreza, e creio que a Igreja deve dar sempre maior exemplo nisto, deve rejeitar todo o mundanismo. Para nós, consagrados, bispos, padres, religiosas, leigos que acreditam verdadeiramente, o pecado mais grave, a ameaça mais grave é o mundanismo. É tão feio quando se vê um consagrado, um homem da Igreja, uma religiosa, mundanos. É feio. Este não é o caminho de Jesus. É o caminho duma ONG que se chama Igreja. Mas esta ONG não é a Igreja de Jesus. Porque a Igreja não é uma ONG, é outra coisa. Mas, quando uma parte da Igreja – estas pessoas – se torna mundana, transforma-se numa ONG e deixa de ser a Igreja. A Igreja é Cristo morto e ressuscitado para nossa salvação, é o testemunho dos cristãos que seguem a Cristo. Aquele escândalo de que falou é verdade: sim, muitas vezes nós escandalizamos os cristãos; escandalizamos quer sejamos padres quer leigos, porque é difícil o caminho de Jesus. É verdade; a Igreja deve despojar-se.

O senhor fez-me voltar com o pensamento àquela expressão terrorismo do Estado: que este descarte seja uma espécie de terrorismo. Verdadeiramente, eu nunca o tinha pensado; mas, deixa-me pensar. Não sei, de verdade, que lhe dizer; uma coisa é certa, não se trata de carícias; é como dizer: Não, tu não! Tu fora…

Ou aquilo que aconteceu aqui em Roma. Um sem-abrigo, coitado, tinha uma dor de barriga; e, quando tens uma dor de barriga e vais ao hospital, às Urgências, dão-te uma aspirina ou qualquer coisa do gênero, ou marcam-te consulta quinze dias depois: daqui a quinze dias volta aqui. Então o homem foi ter com um padre, este viu-o, compadeceu-se e disse-lhe: «Levo-te ao hospital, mas tu faz-me um favor: quando eu começar a explicar aquilo que tens, finge que desmaias» E assim aconteceu: um artista, fê-lo bem. Era uma peritonite. Este homem estava descartado. Se fosse sozinho, era descartado e morria. Aquele pároco era sagaz e ajudou-o bem. Vivia longe do mundanismo. Isto será terrorismo? Bem… pode-se pensar que seja… pensá-lo com cautela. Obrigado! Os melhores votos para a Agência.

Jan-Christoph Kitzler, da ARD, a rádio alemã, pelo grupo alemão – Obrigado, Santo Padre. Eu gostaria de voltar brevemente ao encontro que teve com as famílias. Lá falou da «colonização ideológica». Poder-nos-ia explicar um pouco melhor a expressão? Depois, referiu-se ao Papa Paulo VI, falando dos casos particulares que são importantes na pastoral das famílias. Pode dar-nos alguns exemplos destes casos particulares e, quem sabe, dizer-nos mesmo se há necessidade de abrir as estradas, alargar o corredor destes casos particulares?

Papa Francisco – Quanto à colonização ideológica, direi apenas um exemplo que eu mesmo constatei. Vinte anos atrás, em 1995, uma Ministra da Educação pedira um grande empréstimo para construir escolas para os pobres. Deram-lhe o empréstimo com a condição de que, nas escolas, houvesse um livro para as crianças de certo grau de escolaridade. Era um livro escolar, um livro didaticamente bem preparado, onde se ensinava a teoria do gênero. Esta senhora precisava do dinheiro do empréstimo, mas havia aquela condição. Sagaz, disse que sim e fez preparar outro livro, tendo dado os dois e assim resolveu o problema… Esta é a colonização ideológica: invadem um povo com uma ideia que não tem nada a ver com o povo: com grupos do povo, sim; mas não com o povo. E colonizam o povo com uma ideia que altera ou quer alterar uma mentalidade ou uma estrutura. Durante o Sínodo, os bispos africanos lamentavam-se disto mesmo: que, para certos empréstimos, se imponham determinadas condições. Limito-me a dizer este caso que vi. Porque falo de «colonização ideológica»? Porque agarram-se precisamente à necessidade de um povo: aproveitam-se das crianças para ali entrar e consolidar-se. Mas isto não é novo. Fizeram o mesmo as ditaduras do século passado; entraram com a sua doutrina. Pensai nos «Balilla» (jovens aliciados pelo fascismo), pensai na Juventude Hitleriana… Colonizaram o povo; queriam fazê-lo. Mas, quanto sofrimento! Os povos não devem perder a liberdade. O povo tem a sua cultura, a sua história; cada povo tem a sua cultura. Mas, quando chegam condições impostas pelos impérios colonizadores, procuram fazer com que os povos percam a sua identidade para se criar uniformidade. Esta é a globalização da esfera: todos os pontos são equidistantes do centro. Mas, a verdadeira globalização – como gosto de dizer – não é a da esfera. É importante globalizar, não como a esfera, mas como o poliedro, isto é, que cada povo, cada parte mantenha a sua identidade, o seu ser, sem acabar colonizada ideologicamente. Estas são as «colonizações ideológicas». Há um livro (desculpai, se faço publicidade!), há um livro intitulado “Lord of the World” [Senhor do Mundo]. Talvez inicialmente o estilo nos pareça um pouco pesado, porque foi escrito no ano 1907, em Londres; naquela época, o escritor viu este drama da colonização ideológica e descreve-o no livro. O autor é Benson; escreveu-o em 1907, recomendo-vos a sua leitura. Lendo-o, compreendereis bem o que quero dizer com «colonização ideológica».

Esta era a primeira questão. A segunda: Que queria eu dizer de Paulo VI? É certo que a abertura à vida é uma condição do sacramento do Matrimônio. Um homem não pode dar o sacramento à mulher nem a mulher ao homem se ambos não estão de acordo sobre este ponto: estar abertos à vida. Tanto é assim que, se se puder provar que um tal ou uma tal se casou com a intenção de não estar aberto à vida, aquele matrimônio é nulo; a falta de abertura à vida é causa de nulidade matrimonial. Paulo VI estudou isto com uma comissão: como proceder para ajudar tantos casos, tantos problemas, problemas importantes que dificultam o amor da família. Problemas de todos os dias. Muitos, muitos… Mas era qualquer coisa de mais grave. A recusa de Paulo VI não incidia sobre os problemas pessoais, a propósito dos quais dirá depois aos confessores para serem misericordiosos e compreenderem as situações e perdoarem, isto é, serem misericordiosos, compreensivos. Mas, ele olhava para o neomalthusianismo [newmalthusiana é a atualização da Teoria populacional malthusiana, criada pelo demógrafo, arquiteto e engenheiro Thomas Malthus. Para os neomalthusianos, a superpopulação dos países é a causa do subdesenvolvimento desses países]  universal em expansão. E como se reconhece este neomalthusianismo? É a natalidade abaixo de 1% na Itália; e o mesmo em Espanha. Aquele neomalthusianismo que visava o controle da humanidade pelas grandes potências. Isto não significa que o cristão deve fazer filhos em série. Há alguns meses, numa paróquia, censurei uma mulher porque estava grávida do oitavo depois de sete cesarianas. «Mas a senhora quer deixar sete órfãos?» Isto é tentar a Deus. Fala-se de paternidade responsável. Este é o caminho: a paternidade responsável. Mas aquilo que eu queria dizer era que Paulo VI não tivera uma visão antiquada, fechada. Não. Foi um profeta, que daquele modo nos disse: cuidado com o neomalthusianismo que está chegando. Era isto que eu queria dizer. Obrigado.

Padre Lombardi – Entretanto, uma informação. Estamos de novo sobre a China. Até parece que estamos ganhando o hábito de fazer estas conferências com o Papa enquanto sobrevoamos a China, como já sucedeu ao regressar da Coreia.

Valentina Alazraki, pelo grupo espanhol – Santidade, no nosso voo para as Filipinas, usou uma determinada imagem e relativo gesto com o nosso bom Gasbarri, ou seja, que se ele insultasse sua mãe mereceria um soco. Esta frase criou um pouco de confusão e não foi bem compreendida por todos, no mundo, porque parecia dizer que, perante uma provocação, talvez se justificasse um pouco uma reação violenta. Poder-nos-ia explicar um pouco melhor o que queria dizer?

Papa Francisco – Em teoria, podemos dizer que uma reação violenta perante uma ofensa, uma provocação – em teoria, sim?! – não é uma coisa boa, não se deve fazer. Em teoria, podemos dizer o que diz o Evangelho, ou seja, que devemos apresentar a outra face. Em teoria, podemos dizer que temos a liberdade de exprimir e esta é importante. Em teoria, estamos todos de acordo. Mas somos humanos, e existe a prudência, que é uma virtude da convivência humana. Eu não posso insultar, provocar uma pessoa continuamente, porque arrisco-me de a irritar e receber uma reação não justa, não justa. Mas é humano. Por isso, digo que a liberdade de expressão deve ter em conta a realidade humana, digo que se deve ser prudente. É um modo de dizer também que se deve ser educado. Prudente. A prudência é a virtude que regula as nossas relações humanas. Eu posso ir até este ponto; mais além, não. Era isto o que eu queria dizer: em teoria, todos estamos de acordo que há liberdade de expressão, que uma reação violenta não é boa, que é sempre má. Todos estamos de acordo. Mas, na prática, contenhamo-nos um pouco, porque somos humanos e corremos o risco de provocar os outros e, por isso, a liberdade deve ser acompanhada pela prudência. Queria dizer isto.

Nicole Winfield, da Associated Press dos Estados Unidos, pelo grupo inglês – Santo Padre, pelo grupo inglês, queria de novo perguntar sobre as viagens deste ano. O Santo Padre disse-nos já que estava prevista a viagem à América. Mencionou três cidades: Nova York, Washington e Filadélfia; mas, com a canonização de Serra, perguntamo-nos se não estará prevista também uma etapa na Califórnia ou nas fronteiras do México. E depois, na América do Sul, disse à nossa colega Isabel Piqué que estavam previstas três viagens ou uma viagem em três países da América do Sul. Quais são? E pensa beatificar pessoalmente o Arcebispo Romero, considerado recentemente mártir?

Papa Francisco – Começo pelo último ponto. Aqui haverá uma guerra entre o Cardeal Amado e o Arcebispo Paglia; qual dos dois fará a beatificação? Não eu, pessoalmente: a cerimônia para os Beatos é normalmente celebrada pelo Cardeal do Dicastério ou outro.

Da última pergunta, passemos à primeira: os Estados Unidos. Sim, as três cidades são as indicadas: Filadélfia, para o Encontro das Famílias, Nova York – tenho já a data, mas não me lembro dela – para a visita às Nações Unidas e Washington. São estas três. Gostaria de ir à Califórnia para a canonização de Junípero Serra, mas há o problema do tempo: são necessários mais dois dias. Penso fazer tal canonização no Santuário de Washington. É um acontecimento nacional. Em Washington (creio que no Capitólio) há mesmo uma estátua de Junípero. Penso que seja lá. Entrar nos Estados Unidos pela fronteira do México seria interessante, como sinal de fraternidade e ajuda aos emigrantes, mas o senhor sabe que ir ao México sem visitar Nossa Senhora seria um drama e poder-se-ia desencadear uma guerra! E também porque haveria necessidade de mais três dias. Enfim, ainda não está tudo definido. Penso que serão apenas estas três cidades. Haverá tempo depois para ir ao México. Esqueci-me de qualquer coisa? Ah, quanto aos países latino-americanos, estão previstos três para este ano (está tudo ainda em fase de estudo): Equador, Bolívia e Paraguai. Estes três. No próximo ano, se Deus quiser, desejava visitar (mas ainda não está nada resolvido) Chile, Argentina e Uruguai. E falta incluir o Peru, que não sabemos onde colocá-lo… Mas é isto!

Carla Lim, pelo grupo filipino – Bom dia, Santo Padre. Agradeço-lhe por inspirar o meu país. Em nome do povo filipino, muito lhe agradeço. Perdoe-me por não poder falar italiano. O Santo Padre mencionou em alguns dos discursos nas Filipinas a corrupção, dizendo que esta tira recursos ao povo. Que se pode fazer, Santidade, para combater a corrupção, e não só no governo mas talvez na Igreja também?

Papa Francisco – Esta é forte! Hoje, no mundo, a corrupção é assunto de todos os dias e o comportamento corrupto encontra, rápida e facilmente, ninho nas instituições. Dado que uma instituição tem tantos setores, aqui e além, tem tantos dirigentes e vice-dirigentes, é muito fácil que nela possa fazer ninho a corrupção. Toda a instituição pode cair nisto. A corrupção é tirar do povo. A pessoa corrupta, que faz negócios corruptos, governa de forma corrupta ou se associa com outras para fazer um negócio corrupto, rouba do povo. As vítimas são as pessoas que ele [aponta para Salvatore Izzo] viu perto do albergue de luxo: aquelas são as vítimas da corrupção. A corrupção não está fechada em si mesma: move-se. E mata, sabe? A corrupção, hoje, é um problema mundial. Uma vez, no ano 2001 mais ou menos, perguntei ao Chefe de gabinete do Presidente de então (era um governo que pensávamos fosse menos corrupto; e era verdade: não era tão corrupto aquele governo): «Diga-me, as ajudas que enviais para o interior do país, em dinheiro ou coisas para comer, vestir… de tudo isso quanto chega ao destino?» Imediatamente aquele homem, que é um homem verdadeiro, com as mãos limpas, diz-me: «Cerca de 35%». Assim ele me disse, em 2001, na Argentina.

E agora, a corrupção nas instituições eclesiais. Quando falo da Igreja, gosto de pensar nos fiéis, nos batizados, na Igreja inteira. E é melhor falar de pecadores. Todos somos pecadores. Mas, quando falamos de corrupção, referimo-nos a pessoas corruptas ou a instituições da Igreja que caem na corrupção; e há casos, há. Recordo que uma vez, no ano de 1994 – tinha acabado de ser nomeado bispo do Bairro Flores, em Buenos Aires – vieram ter comigo dois trabalhadores ou funcionários de um Ministério, dizendo-me: «O senhor tem aqui tanta necessidade, com tantos pobres nas Villas Miséria». «Oh sim!» – retorqui; e contei. «Nós podemos ajudá-lo. Conseguimos, se quiser, uma ajuda de 400.000 pesos». Naquela altura, o peso e o dólar equivaliam-se: eram 400.000 dólares americanos. «E vós conseguis?» «Mas certamente». Eu ouvia-os, pois, «quando a esmola é demasiado grande, até o Santo desconfia» e eles continuaram: «Para isso, nós fazemos o depósito e depois o senhor dá-nos metade». Naquele momento, pensei: Que fazer? Ou insulto-os e dou-lhes um pontapé onde não bate o sol ou faço-me de desentendido. Fiz-me de desentendido. Disse-lhes (e era verdade!): «Os senhores sabem que nós, nas vicariatos, não temos conta; os senhores devem fazer o depósito na arquidiocese com recibo». «Ah, não sabíamos… prazer…» E foram-se embora. Mas depois pensei: Se estes dois vieram diretamente ter comigo, sem pedir autorização (é um pensamento mau!), é porque alguém já lhes disse que sim. Mas é um pensamento mau! A corrupção é fácil de fazer. Mas lembremo-nos disto: pecadores, sim; corruptos, não! Corruptos, nunca! Devemos pedir perdão pelos católicos, pelos cristãos que escandalizam com a sua corrupção. É uma praga, na Igreja; mas existem tantos santos… santos pecadores, mas não corruptos. Olhemos também para a outra parte, para a Igreja santa! Também há algum… Obrigado pela coragem de fazer esta pergunta.

Anaïs Feuga, de «Radio France», pelo grupo francês – Estamos sobrevoando a China. Quando íamos para a Coreia, o Santo Padre disse-nos que estava pronto para ir à China já amanhã. À luz destas declarações, pode-nos explicar por que não recebeu o Dalai Lama, quando recentemente esteve em Roma, e como vão as relações com a China?

Papa Francisco – Obrigado por esta pergunta. Obrigado. É costume, no protocolo da Secretaria de Estado, não receber chefes de Estado ou pessoas desse nível, quando estão em Roma para uma reunião internacional. Por exemplo, por ocasião da reunião da FAO, não recebi ninguém. Por isso é que ele não foi recebido. Vi que alguns jornais disseram que não o recebi com medo da China: isso não é verdade. Naquela altura, a razão foi esta. Ele solicitou audiência, e foi-lhe referida uma certa data. Tinha-a pedido antes, mas não para aquela ocasião; temos bom relacionamento. Mas o motivo não foi a recusa da pessoa nem o medo da China. Estamos abertos, e queremos a paz com todos. E como estão as relações? O governo chinês é educado; e nós também somos educados. Fazemos as coisas passo a passo, como tudo o que se faz na história. Ainda não se sabe; mas eles sabem que eu estou disposto a receber ou a ir. Eles sabem disso.

Marco Ansaldo, da «Repubblica», pelo grupo italiano – Santo Padre, acaba de fazer uma viagem encantadora, muito rica, cheia de coisas belas, aqui nas Filipinas. Mas eu gostaria de recuar um passo, até porque o terrorismo atinge a cristandade, os católicos, em muitas partes do mundo. Vimo-lo ainda nestes últimos dias, no Níger; mas os exemplos são muitíssimos. Ora o Santo Padre, na última viagem que fizemos, ao regressar da Turquia fez um apelo aos líderes islâmicos dizendo que era útil um passo, uma intervenção muito firme da parte deles. Mas não me parece que isto tenha sido tomado em consideração e acolhido, apesar das suas palavras. Há alguns países muçulmanos moderados – pode-se muito bem dar o exemplo da Turquia – que mantêm, a propósito do terrorismo (cito os casos do IS ou mesmo do «Charlie Hebdo»), uma atitude pelo menos ambígua. Pois bem, não sei se o Santo Padre teve possibilidades, neste mês e meio, de refletir e pensar como ir mais além do seu convite, que não foi acolhido, e contudo era importante. O Santo Padre ou alguém por si – penso na Secretaria de Estado, vejo aqui Mons. Becciu ou o próprio Cardeal Parolin –, até porque este é um problema que continuará a interpelar-nos.

Papa Francisco – Repeti aquele apelo no próprio dia da partida para o Sri Lanka, ao falar ao Corpo Diplomático na parte de manhã. No discurso ao Corpo Diplomático, disse ser meu desejo que se exprimam os líderes religiosos, políticos, acadêmicos e intelectuais. O próprio povo moderado islâmico pede isto aos seus líderes. Alguns já fizeram qualquer coisa. Creio que é preciso também dar-lhes um pouco de tempo, porque, para eles, a situação não é fácil. Tenho esperança, porque há tantas pessoas boas entre eles, tanta gente boa, tantos líderes bons, e estou certo de que se chegará a isso. Mas queria dizer e salientar que repeti o mesmo no dia da partida.

Cristoph Schmidt, pelo grupo alemão – Santo Padre, antes de mais nada queria dizer-lhe muito obrigado por todos os momentos tão impressionantes desta semana. É a primeira vez que o acompanho e gostaria de lhe dizer mil vezes obrigado. A minha pergunta: O Santo Padre falou da multidão de crianças nas Filipinas, da sua alegria por haver assim tantas crianças. Mas, segundo as sondagens, a maioria dos filipinos pensa que o enorme crescimento da população filipina é uma das razões mais importantes para a pobreza imensa do país, já que, em média, uma mulher, nas Filipinas, dá à luz mais de três filhos na sua vida, e a posição católica relativamente à contracepção parece ser uma das poucas questões em que um grande número de pessoas nas Filipinas não está de acordo com a Igreja. Que pensa disto?

 Papa Francisco – Creio que o número de três por família, mencionado pelo senhor, seja importante – de acordo com o que dizem os peritos – para manter a população. Três por casal. Quando se desce abaixo deste nível, acontece o outro extremo, como, por exemplo, na Itália onde ouvi dizer (não sei se é verdade) que, em 2024, não haverá dinheiro para pagar aos reformados. A diminuição da população. Por isso a palavra-chave para responder é esta expressão que usa sempre a Igreja, e eu também: «paternidade responsável». Como se consegue isto? Com o diálogo. Cada pessoa, com o seu pastor, deve procurar o modo como fazer esta paternidade responsável. Aquele exemplo, que mencionei há pouco, de uma mulher que esperava o oitavo filho e tinha sete com partos cesáreos: isto é uma irresponsabilidade. «Não! Eu confio em Deus». «Mas atenção! Deus dá-te os meios; sê responsável». Creem alguns – desculpem a frase – que, para ser bons católicos, devem ser como coelhos. Não. Paternidade responsável. Isto é claro e por isso, na Igreja, há os movimentos matrimoniais, há os especialistas no assunto, há os pastores, e investiga-se. Eu conheço muitas e muitas soluções lícitas, que serviram de ajuda para o efeito. Mas fez bem em mo dizer. Há ainda outra coisa curiosa, que é diversa mas está relacionada a isso. Para as pessoas mais pobres, um filho é um tesouro. É verdade que aqui se deve ser prudente. Mas, para eles, um filho é um tesouro. Deus sabe como ajudá-los. Talvez alguns não sejam prudentes nisto, é verdade. Paternidade responsável. Mas é preciso também ver a generosidade daquele pai e daquela mãe que veem em cada criança um tesouro.

 Isabel Piqué, pelo grupo espanhol – Em representação do grupo espanhol, duas perguntas. Foi uma viagem comovente para todos: vimos chorar, em Tacloban, durante o tempo todo; nós mesmos, jornalistas, choramos; ontem o Santo Padre disse que o mundo precisa de chorar. Foi tudo muito intenso. Queríamos perguntar qual foi, para o Santo Padre, o momento mais intenso: a Missa em Tacloban e depois, ontem, quando aquela jovem se pôs a chorar… Esta é a primeira pergunta. Depois, a segunda: Ontem o Santo Padre fez história, bateu o recorde de João Paulo II no mesmo lugar, isto é, havia 6/7 milhões de pessoas. Como vive isto? O Cardeal Tagle contou-nos que no altar, durante a Missa, o Santo Padre lhe perguntou: «Mas quantas pessoas estão?» Assim, como vive o fato de ter superado este recorde, ter entrado na história como o Papa com a Missa mais numerosa da história?

Papa Francisco – A primeira: o momento mais intenso. O de Tacloban, a Missa, para mim, foi intenso, muito intenso. Ver todo o povo de Deus ali de pé, rezando, depois daquela catástrofe… Pensar nos meus pecados e naquela gente… Foi intenso, um momento muito intenso. Lá, no momento da Missa, sentia-me como que aniquilado, quase não me saía a voz. Não sei o que me sucedeu; talvez fosse a emoção, não sei. Mas, tudo o que sentia era isto: uma espécie de aniquilação. E, depois, momentos intensos foram os gestos, cada gesto. Quando passava e um pai fazia assim [faz o gesto de levantar a criança], eu dava a bênção, e ele dizia-me obrigado; para eles, era suficiente uma bênção. Pensei: e eu com tantas pretensões, quero isto, quero aquilo… Aquilo fez-me bem. Momentos intensos. Mesmo quando soube que aterrissamos, em Tacloban, com um vento de 70 Km/h, tomei a sério o aviso de que deveríamos sair à uma hora da tarde, e não depois, porque havia perigo. Mas não tive medo.

Quanto à grande presença, senti-me tão aniquilado. Aquele era o povo de Deus, e o Senhor estava ali. É a alegria da presença de Deus que nos diz: pensai bem que sois os servidores destas pessoas. Os protagonistas são elas…

E depois o fato do pranto. Uma das coisas que se perde quando há demasiado bem-estar, quando não se compreendem bem os valores, ou quando nos habituamos à injustiça, a esta cultura do descarte, é a capacidade de chorar. É uma graça que devemos pedir. No Missal antigo, havia uma bela oração para se pedir o pranto. Dizia mais ou menos assim: «Ó Senhor, Vós que fizestes com que Moisés fizesse sair, com a sua vara, água do rochedo, fazei que da rocha do meu coração saia a água das lágrimas». É uma belíssima oração. Nós, cristãos, devemos pedir a graça de chorar, sobretudo os cristãos abastados, e chorar pelas injustiças, chorar pelos pecados. É que o pranto abre-te à compreensão de novas realidades ou de novas dimensões da realidade. Foi aquilo que disse a jovem, e também o que eu lhe disse a ela. Ela foi a única a fazer aquela pergunta a que não se pode responder: «Por que sofrem as crianças?» O grande Dostoiévski pôs a pergunta, mas não conseguiu responder: Por que sofrem as crianças? Ela, sim, com o seu pranto: uma mulher que chorava. Quando digo que é importante que as mulheres sejam tidas mais em conta na Igreja, não é só para lhes dar uma função de secretária num dicastério; isso também pode ser. Mas não é para isso; é para que elas nos digam como sentem e veem a realidade, porque as mulheres olham a partir duma riqueza diferente, maior. Outra coisa, que desejo sublinhar aqui: aquilo que disse ao último jovem [no encontro com a juventude], ou seja, que verdadeiramente trabalha bem, dá, organiza, ajuda os pobres. Mas não esqueças – disse-lhe eu – que também nós devemos ser mendigos junto deles, porque os pobres evangelizam-nos. Se tiramos os pobres do Evangelho, não podemos compreender a mensagem de Jesus. Os pobres evangelizam-nos. «Eu vou evangelizar os pobres». Sim, mas deixa-te evangelizar por eles, porque têm valores que tu não tens.

Agradeço-vos imenso pelo vosso trabalho! Estimo-o. E muito obrigado. Sei que é um sacrifício para vós.