Vida Cristã - Província Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil - OFM

Viagem Apostólica do Papa Francisco ao Paraguai, Bolívia e Equador

Veja como foi a viagem do Papa à América Latina

A exemplo do que se viu durante a Jornada Mundial da Juventude, no Rio de Janeiro, o papa Francisco manteve um vibrante encontro com milhares de jovens em Assunção, no Paraguai, pouco antes de encerrar uma intensa visita que também o levou ao Equador e à Bolívia. Depois de celebrar uma missa campal ante um milhão de peregrinos no complexo militar de Ñu Guazú, na periferia da capital, Francisco foi aclamado por uma multidão de jovens em um ato às margens do rio Paraguai.

O Papa levou ao delírio os jovens: “Façam bagunça, mas a organizem direito. Façam bagunça, sim, mas também ajudem a arrumar a bagunça que fazem. Façam bagunça e depois a organizem, não destruam nada”, enfatizou, em um sermão de dez minutos.

“Francisco, não se vá”, cantou a multidão, interrompendo o papa diversas vezes. Francisco então deixou de lado seu discurso oficial e mais uma vez improvisou, ao relatar que um bisco comentou com ele, numa mistura de brincadeira e seriedade: “Você continua aconselhando os jovens a fazer bagunça, mas depois as bagunças feitas pelos jovens somos nós que temos que resolver. Necessitamos de jovens com esperança e fortes de espírito, não de jovens fracotes, que nem que sim, nem que não (indecisos). Não queremos jovens que se cansem rápido, e que estejam com a cara de enfado”.

— Façam uma bagunça que nos dê um coração livre, solidariedade, esperança, uma bagunça que nasça de ter conhecido Jesus e de saber que Deus é minha fortaleza. Essa é a bagunça que precisam fazer — concluiu.

Após esse encontro, Francisco partiu para cumprir com seu último compromisso em Assunção, mas o ato sofreu um contratempo quando uma multidão ultrapassou as barreira de segurança e se aproximou perigosamente do papamóvel.

Com isso, o Pontífice não pôde se encontrar com os familiares dos 400 mortos em um incêndio ocorrido em um centro comercial local em 2004. A agenda oficial previa que o Papa visitaria o Memorial dos Mortos o incêndio no centro comercial Ycuá Bolaños e trocasse algumas palavras com os familiares das vítimas, mas o incidente fez com que a segurança conduzisse o carro papal diretamente para o aeroporto internacional “Silvio Pettirossi” para regressar a Roma.

Em meio à tensão, Francisco continuou saudando a multidão. Os familiares das quase 500 vítimas fatais ficaram frustrados com o cancelamento do compromisso depois de meses de organização. No entanto, o papa abençoou os restos do prédio incendiado, ocupado até hoje pelos familiares que o converteram praticamente em um templo.

Pela manhã, ao som de cânticos em latim e em guarani, o papa Francisco celebrou sua última missa campal carregada de referências à cultura nativa. Diante de mais de um milhão de fiéis, o Papa fez uma homilia muito solene na presença do presidente anfitrião, Horacio Cartes, e sua colega argentina, Cristina Kirchner.

Papa atacou novamente a cultura do “descarte” e do “consumo” em missa. Em seu sermão, o papa descreveu “a cédula de identidade do cristão” e afirmou que o objetivo dos fiéis de Jesus é “passar da lógica do egoísmo, da clausura, da luta, da divisão, da superioridade, à lógica da vida, da gratuidade, do amor”.

— É preciso passar da lógica do domínio, do arrasar, manipular, para a lógica do acolher receber, cuidar. São duas lógicas que estão em jogo, duas maneiras de enfrentar a vida e a missão — enfatizou.

“Uma fé que não é solidária ou está doente ou está morta”, disse o Papa.

Antes de realizar a missa, o papa criticou a fé sem solidariedade ao visitar um dos bairros mais pobres de Assunção, onde seus habitantes denunciaram o desprezo do Estado em relação aos camponeses deslocados que vivem na miséria urbana.

No último de seus três dias neste país, e antes de retornar a Roma após um giro pela América do Sul de oito dias, o pontífice visitou duas casas precárias, onde o ofereceram um café da manhã típico guarani, com chá mate cozido e chipa, um pão de mandioca e queijo.


Íntegra do discurso preparado pelo Santo Padre:

Queridos jovens!

Enche-me de alegria poder encontrar-me convosco, neste clima de festa. Poder ouvir os vossos testemunhos e partilhar o vosso entusiasmo e amor a Jesus.

Obrigado, D. Ricardo Valenzuela, responsável da pastoral juvenil, pelas suas palavras! Obrigado, Manuel e Liz, pela coragem de partilhardes as vossas vidas, oferecendo o vosso testemunho neste encontro. Não é fácil falar das nossas coisas pessoais, e menos ainda diante de tantas pessoas. E vós partilhastes o tesouro maior que tendes: as vossas vicissitudes, as vossas vidas e como Jesus, pouco a pouco, entrou nelas.

Para responder às vossas perguntas, gostaria de realçar algumas das coisas que partilhastes.

Manuel, falaste mais ou menos assim: «Hoje tenho desejos, de sobra, de servir os outros; tenho vontade de me vencer». Passaste por momentos muito difíceis, situações muito dolorosas, mas hoje tens grande desejo de servir, de sair, de partilhar a tua vida com os outros.

Liz não é nada fácil ser mãe dos próprios pais, sobretudo quando se é jovem, mas que grande sabedoria e maturidade encerram as tuas palavras, quando nos dizias: «Hoje jogo com ela, mudo-lhe as fraldas… Coisas todas, que hoje ofereço a Deus; e estou apenas compensando o que mãe fez por mim».

Vós, jovens paraguaios, sois corajosos de verdade.

Partilhastes também como conseguistes continuar; onde encontrastes forças. Na paróquia – dissestes ambos –, nos amigos da paróquia e nos retiros espirituais que lá se organizavam. Duas chaves muito importantes: os amigos e os retiros espirituais.

Os amigos. A amizade é um dos presentes maiores que uma pessoa, um jovem pode ter e pode oferecer. É verdade! Como é difícil viver sem amigos. Vede se esta não é uma das coisas mais belas que Jesus disse: «Chamei-vos amigos, porque vos dei a conhecer tudo o que ouvi ao meu Pai» (Jo 15, 15). Um dos maiores segredos do cristão reside no fato de ser amigo, amigo de Jesus. Quando uma pessoa ama alguém, permanece ao seu lado, cuida dele, ajuda-o, diz-lhe o que pensa, mas sem o deixar caído por terra. Assim faz Jesus conosco, nunca nos deixa caídos por terra. Os amigos apoiam-se, fazem-se companhia, protegem-se. Assim procede o Senhor connosco. Serve-nos de apoio.

Os retiros espirituais. Santo Inácio tem uma meditação famosa, chamada das duas bandeiras. Descreve, por um lado, a bandeira do demônio e, por outro, a bandeira de Cristo. Seria como as camisas de duas equipes; e pergunta-nos, em qual delas gostaríamos de jogar.

Com aquela meditação, leva-nos a imaginar como seria pertencer a uma ou a outra equipe. Seria como perguntar: Com quem queres jogar na vida?

E Santo Inácio diz que o demônio, para recrutar jogadores, promete àqueles que jogam com ele riqueza, honras, glória e poder. Serão famosos. Serão endeusados por todos.

No lado oposto, apresenta-nos o jogo de Jesus. Não como algo fantástico. Jesus não nos apresenta uma vida de “estrelas”, famosos; pelo contrário, jogar com Ele é um convite à humildade, ao amor, ao serviço aos outros. Jesus não nos mente. Toma-nos a sério.

Na Bíblia, o demônio é chamado o pai da mentira. Ele prometia ou, melhor, fazia-te crer que, se fizesses certas coisas, serias feliz; mas depois dás-te conta de que não és nada feliz; foste atrás de algo que, longe de te dar a felicidade, fez-te sentir mais vazio, mais triste. Amigos, o diabo, é um «vende fumaça». Promete-te, promete-te, mas não te dá nada, nunca cumpre nada do que diz. É um mau pagador. Faz-te desejar coisas que não depende dele que tu as obtenhas ou não. Faz-te depositar a esperança em algo, que nunca te fará feliz. Este é o seu jogo, esta é a sua estratégia: falar muito, oferecer muito e não fazer nada. É um grande «vende fumaça», porque tudo o que nos propõe é fruto da divisão, de nos compararmos com os outros, de pisar a cabeça aos outros para conseguirmos as nossas coisas. É um «vende fumaça», porque o único caminho para alcançar tudo isto é pôr de lado os teus amigos, não dar apoio a ninguém. Porque tudo se baseia na aparência. Faz-te crer que o teu valor depende de quanto possuis.

Do lado contrário, temos Jesus que nos oferece o seu jogo. Não nos vende fumaça; não nos promete, aparentemente, grandes coisas. Não nos diz que a felicidade está na riqueza, no poder, no orgulho. Antes pelo contrário, mostra-nos que o caminho é outro. Este Treinador diz aos seus jogadores: bem-aventurados, felizes os pobres em espírito, os que choram, os mansos, os que têm fome e sede de justiça, os misericordiosos, os puros de coração, os que trabalham pela paz, os perseguidos por causa da justiça. E conclui dizendo: Alegrai-vos com tudo isto.

Por que motivo? Porque Jesus não nos mente. Mostra-nos um caminho que é vida, que é verdade. Ele mesmo é a grande prova disso. É o seu estilo, a sua maneira de viver a existência, a amizade, a relação com o seu Pai. E a isto nos convida: a sentirmo-nos filhos, filhos amados.

Jesus não te vende fumaça. Porque sabe que a felicidade verdadeira, a felicidade que enche o coração não está nos trapos que vestimos, nos sapatos que calçamos, na etiqueta de determinada marca. Ele sabe que a verdadeira felicidade encontra-se em sermos sensíveis, em aprender a chorar com os que choram, em aproximar-se de quem está triste, em deixar chorar sobre o próprio ombro, dar um abraço. Quem não sabe chorar, não sabe rir e, consequentemente, não sabe viver. Jesus sabe que, neste mundo de tanta concorrência, inveja e agressividade, a verdadeira felicidade passa por aprender a ser pacientes, a respeitar os outros, a não condenar nem julgar ninguém. Quem se irrita já perdeu: diz o ditado. Não abandoneis o vosso coração à ira, ao rancor. Felizes os que têm misericórdia. Felizes os que sabem colocar-se no lugar de outro, os que têm a capacidade de abraçar, de perdoar. Todos experimentámos isto alguma vez. Todos, em determinados momentos, nos sentimos perdoados: como é bom! É como reaver a vida, ter uma nova oportunidade. Não há nada mais belo do que ter nova oportunidade. É como se a vida voltasse a começar. Por isso, felizes aqueles que são portadores de nova vida, de novas oportunidades. Felizes quantos trabalham para isso, aqueles que lutam para isso. Erros, todos cometemos; as equivocações, não têm conta. Por isso, felizes aqueles que são capazes de ajudar os outros a sair dos seus erros, das suas equivocações. São verdadeiros amigos e não deixam ninguém caído por terra. Estes são os puros de coração, aqueles que, conseguindo ver mais além da simples nódoa, superam as dificuldades. Felizes aqueles que se fixam especialmente na parte boa dos outros.

Liz, tu nomeaste Chikitunga, uma Serva de Deus paraguaia. Disseste que era como tua irmã, tua amiga, teu modelo. Ela, como muitos outros, mostra-nos que o caminho das Bem-aventuranças é um caminho de plenitude, um caminho possível, real; que enche o coração. Os Santos são nossos amigos e modelos que já deixaram de jogar neste campo, mas transformaram-se naqueles jogadores indispensáveis para quem sempre se olha a fim de darmos o melhor de nós mesmos. Eles são a prova de que Jesus não é um «vende fumaça», mas que a sua proposta é mesmo de plenitude. Acima de tudo, é uma proposta de amizade: amizade verdadeira, amizade de que todos precisamos. Amigos, segundo o estilo de Jesus. Não para ficarmos entre nós, mas sair pelo campo, ir fazer mais amigos. Para contagiar com a amizade de Jesus toda a gente, onde quer que esteja, no trabalho, no estudo, na noitada, por whastapp, no facebook ou no twitter. Quando saem para dançar, ou estão a tomar um bom tereré. Na praça ou jogando uma partida no campo do bairro. É aí que estão os amigos de Jesus. Não vendendo fumaça, mas dando apoio; o apoio de saber que somos felizes, porque temos um Pai que está no Céu.

ENCONTRO COM OS JOVENS

DISCURSO DO SANTO PADRE

Margens do Rio Costanera, Assunção, Paraguai


Texto e foto:  Vatican News

“O serviço é o critério do verdadeiro amor”

Guayaquil – Uma missa dedicada ao amor e à alegria em família, celebrada no Parque Los Samanes, em Guayaquil, após visitar o Santuário da Divina Misericórdia, foi o ponto alto da visita do Papa Francisco ao Equador nesta segunda-feira.

O Santo Padre deixou a Nunciatura Apostólica em Quito às 8 horas, dirigindo-se ao Aeroporto Internacional, onde, a bordo de um A330 da Alitália, voou até Guayaquil, a maior cidade do Equador. Após 50 minutos de voo, foi recebido pelo Arcebispo Dom Antonio Arregui Yarza e autoridades locais e imediatamente dirigiu-se ao Santuário Nacional da Divina Misericórdia de Guayaquil, para uma breve visita. No local estavam presentes centenas de fieis, anciãos e doentes.

Maria e o episódio das Bodas de Caná guiaram a reflexão do Papa Francisco. “As Bodas de Caná se repetem em cada geração, em cada família, em cada um de nós” e “Maria está atenta àquelas bodas já iniciadas, é solícita pelas necessidades dos esposos, não se fecha em seu mundo”, disse o Papa. O vinho é sinal de alegria, de amor, de abundância:

“Quantos dos nossos adolescentes e jovens percebem que, em suas casas, há muito que não existe nenhum! Quantas mulheres, sozinhas e tristes, se interrogam quando foi embora o amor, quando se diluiu da sua vida! Quantos idosos se sentem deixados fora da festa das suas famílias, abandonados num canto e já sem beber do amor diário. A falta de vinho pode ser efeito também da falta de trabalho, doenças, situações problemáticas que as nossas famílias atravessam. Maria não é uma mãe “reclamadora”, não é uma sogra que espia para se consolar com as nossas inexperiências, erros ou descuidos. Maria é simplesmente mãe! Permanece ao nosso lado, atenta e solícita. Maria é mãe!”

E é nesse momento que Maria se dirige com confiança a Jesus e reza. A sua solicitude pelas necessidades dos outros apressa a “hora” de Jesus. Maria nos ensinou a deixar as nossas famílias nas mãos de Deus; ela ensinou a rezar, alimentando a esperança que nos indica que as nossas preocupações também preocupam Deus:

“Rezar sempre nos arranca do perímetro das nossas preocupações, nos fazendo transcender aquilo que nos magoa, agita ou falta a nós mesmos para nos colocarmos na pele dos outros, calçarmos os seus sapatos. A família é uma escola onde a oração também nos lembra que há um nós, que há um próximo vizinho, evidente: vive sob o mesmo teto, compartilha conosco a vida e se faz necessitado”.

Maria, finalmente, age. As palavras “fazei o que Ele vos disser”, dirigidas aos serventes, são um convite dirigido também a nós para nos colocarmos à disposição de Jesus – observou o Papa – que veio para servir e não para ser servido. O serviço é o critério do verdadeiro amor. E isso se aprende especialmente na família, onde nos tornamos servidores uns dos outros por amor. No seio da família, ninguém é descartado; Todos valem o mesmo:

“Na família, “se aprende a pedir licença sem servilismo, a dizer ‘obrigado’ como expressão duma sentida avaliação das coisas que recebemos, a dominar a agressividade ou a ganância, e a pedir desculpa quando fazemos algo de mal. Esses pequenos gestos de sincera cortesia ajudam a construir uma cultura da vida compartilhada e do respeito pelo que nos rodeia”. A família é o hospital mais próximo, a primeira escola das crianças, o grupo de referência imprescindível para os jovens, o melhor asilo para os idosos. A família constitui a grande “riqueza social” que outras instituições não podem substituir, devendo ser ajudada e reforçada para não perder jamais o justo sentido dos serviços que a sociedade presta aos cidadãos. Com efeito, esses serviços que a sociedade oferece aos cidadãos não são uma espécie de esmola, mas uma verdadeira “dívida social” para com a instituição familiar, que é a base e que tanto contribui para o bem comum de todos”.

A família também constitui uma pequena Igreja, uma “Igreja doméstica” que, juntamente com a vida, canaliza a ternura e a misericórdia divina. Na família, a fé se mistura com o leite materno: experimentando o amor dos pais, sente-se envolvido pelo amor de Deus:

“E, na família, os milagres se fazem com o que há, com o que somos, com aquilo que a pessoa tem à mão. Muitas vezes não é o ideal, não é o que sonhamos, nem o que “deveria ser”. Tem um detalhe para se fazer pensar. O vinho novo das bodas de Caná nasce das talhas de purificação, isto é, do lugar onde todos tinham deixado o seu pecado”.

O Papa recordou então do Sínodo Ordinário dedicado às famílias, a ser realizado para amadurecer um verdadeiro discernimento espiritual e encontrar soluções concretas para as inúmeras dificuldades e importantes desafios que a família deve enfrentar nos nossos dias. E pediu orações por uma intenção particular: “Para que, mesmo aquilo que nos pareça impuro, nos escandalize ou espante, Deus – fazendo-o passar pela sua “hora” – possa milagrosamente transformá-lo. A família hoje precisa desse milagre”.

Francisco observou, que a boa nova que ensina esta passagem, é que o melhor dos vinhos ainda está por ser bebido, o mais gracioso, profundo e belo para a família ainda está por vir:

“Ainda está por vir o tempo em que saboreamos o amor diário, onde os nossos filhos redescobrem o espaço que partilhamos, e os mais velhos estão presentes na alegria de cada dia. O melhor dos vinhos está na esperança, está para vir a cada pessoa que aposta no amor. Precisamos apostar no amor! E ainda está por vir, mesmo que todas as variáveis e estatísticas digam o contrário; o melhor vinho ainda está por vir para aqueles que hoje veem desmoronar tudo. Murmurai até acreditá-lo: o melhor vinho está por vir; e sussurrai-o aos desesperados ou que desistiram do amor. Deus sempre Se aproxima das periferias de quantos ficaram sem vinho, daqueles que só têm desânimos para beber; Jesus Se sente inclinado a desperdiçar o melhor dos vinhos com aqueles que, por uma razão ou outra, sentem que já lhes romperam todas as talhas”.

Como Maria nos convida, façamos “o que Ele nos disser” e agradeçamos por, neste nosso tempo e na nossa hora, o vinho novo, o melhor, nos faça recuperar a alegria de viver família.

Após a celebração, o Pontífice visitou o Colégio Javier, da Companhia de Jesus, onde almoçou com os jesuítas da comunidade.


HOMILIA DO SANTO PADRE

A passagem do Evangelho que acabamos de ouvir é o primeiro sinal prodigioso, segundo a narrativa do Evangelho de João. A preocupação de Maria, transformada em súplica a Jesus: “Não têm mais vinho!” e a referência à “hora” vão se compreender nos relatos da Paixão.

É bom que assim seja, porque nos permite ver a ânsia de Jesus por ensinar, acompanhar, curar e alegrar, a começar da súplica de sua Mãe: “Não têm mais vinho!”.

As bodas de Caná se repetem em cada geração, em cada família, em cada um de nós e em nossas tentativas de fazer com que o nosso coração consiga se apoiar em amores duradouros, fecundos e felizes. Demos um lugar à Maria, “a mãe”, como diz o evangelista. Façamos com Ela o itinerário de Caná.

Maria está atenta naquelas bodas já iniciadas, é solícita pelas necessidades dos esposos. Não Se fecha em Si mesma, não Se encerra no seu mundo; ao contrário, o seu amor A faz “ser para” os outros. E, por isso, Se dá conta da falta de vinho. O vinho é sinal de alegria, de amor, de abundância. Quantos dos nossos adolescentes e jovens percebem que, em suas casas, há muito que não existe nenhum! Quantas mulheres, sozinhas e tristes, se interrogam quando foi embora o amor, quando se diluiu da sua vida! Quantos idosos se sentem deixados fora da festa das suas famílias, abandonados num canto e já sem beber do amor diário. A falta de vinho pode ser efeito também da falta de trabalho, doenças, situações problemáticas que as nossas famílias atravessam. Maria não é uma mãe “reclamadora”, não é uma sogra que espia para se consolar com as nossas inexperiências, erros ou descuidos. Maria é simplesmente mãe! Permanece ao nosso lado, atenta e solícita. Maria é mãe! Digam todos comigo: ‘Maria é mãe’. Outra vez: ‘Maria é mãe’. E é nesse momento que Maria se dirige com confiança a Jesus e reza.

Não vai ao chefe de mesa; apresenta a dificuldade dos esposos diretamente a seu Filho. A resposta que recebe parece desalentadora: “Que tem isso a ver contigo e comigo? Ainda não chegou a minha hora” (v. 4). Mas, entretanto, já deixou o problema nas mãos de Deus. A sua solicitude pelas necessidades dos outros apressa a “hora” de Jesus. Maria é parte dessa hora, desde o presépio até à cruz – Ela soube “transformar um curral de animais na casa de Jesus, com uns pobres paninhos e uma montanha de ternura” (EG 286), e nos recebeu como filhos quando uma espada Lhe transpassava o coração –, Maria nos ensinou a deixar as nossas famílias nas mãos de Deus; ela ensinou a rezar, alimentando a esperança que nos indica que as nossas preocupações também preocupam Deus.

Rezar sempre nos arranca do perímetro das nossas preocupações, nos fazendo transcender aquilo que nos magoa, agita ou falta a nós mesmos para nos colocarmos na pele dos outros, calçarmos os seus sapatos. A família é uma escola onde a oração também nos lembra que há um nós, que há um próximo vizinho, evidente: vive sob o mesmo teto, compartilha conosco a vida e se faz necessitado.
Maria, finalmente, age. As palavras “fazei o que Ele vos disser” (v. 5), dirigidas aos serventes, são um convite dirigido também a nós para nos colocarmos à disposição de Jesus, que veio para servir e não para ser servido. O serviço é o critério do verdadeiro amor. E isso se aprende especialmente na família, onde nos tornamos servidores uns dos outros por amor. No seio da família, ninguém é descartado; Todos valem o mesmo.

Na família, “se aprende a pedir licença sem servilismo, a dizer ‘obrigado’ como expressão duma sentida avaliação das coisas que recebemos, a dominar a agressividade ou a ganância, e a pedir desculpa quando fazemos algo de mal. Esses pequenos gestos de sincera cortesia ajudam a construir uma cultura da vida compartilhada e do respeito pelo que nos rodeia” (LS 213). A família é o hospital mais próximo, a primeira escola das crianças, o grupo de referência imprescindível para os jovens, o melhor asilo para os idosos. A família constitui a grande “riqueza social” que outras instituições não podem substituir, devendo ser ajudada e reforçada para não perder jamais o justo sentido dos serviços que a sociedade presta aos cidadãos. Com efeito, esses serviços que a sociedade oferece aos cidadãos não são uma espécie de esmola, mas uma verdadeira “dívida social” para com a instituição familiar, que é a base e que tanto contribui para o bem comum de todos.

A família também constitui uma pequena Igreja, uma “Igreja doméstica” que, juntamente com a vida, canaliza a ternura e a misericórdia divina. Na família, a fé se mistura com o leite materno: experimentando o amor dos pais, sente-se envolvido pelo amor de Deus.

E, na família, os milagres se fazem com o que há, com o que somos, com aquilo que a pessoa tem à mão. Muitas vezes não é o ideal, não é o que sonhamos, nem o que “deveria ser”. Tem um detalhe para se fazer pensar. O vinho novo das bodas de Caná nasce das talhas de purificação, isto é, do lugar onde todos tinham deixado o seu pecado. “Onde abundou o pecado, superabundou a graça” (Rm 5, 20). Na família de cada um de nós e na família comum que todos formamos, nada se descarta, nada é inútil. Pouco antes de começar o Ano Jubilar da Misericórdia, a Igreja vai celebrar o Sínodo Ordinário dedicado às famílias para amadurecer um verdadeiro discernimento espiritual e encontrar soluções concretas para as inúmeras dificuldades e importantes desafios que a família deve enfrentar nos nossos dias. Convido vocês a intensificar a oração por essa intenção: para que, mesmo aquilo que nos pareça impuro, nos escandalize ou espante, Deus – fazendo-o passar pela sua “hora” – possa milagrosamente transformá-lo. A família hoje precisa desse milagre.

E toda essa história começou porque “não tinham vinho” e tudo se pôde fazer porque uma mulher – a Virgem Maria – esteve atenta, soube pôr nas mãos de Deus as suas preocupações e agiu com sensatez e coragem. Mas, tem um detalhe e não é menos significativo o dado final: saborearam o melhor dos vinhos. E essa é a boa nova: o melhor dos vinhos ainda está por ser bebido, o mais gracioso, profundo e belo para a família ainda está por vir. Ainda está por vir o tempo em que saboreamos o amor diário, onde os nossos filhos redescobrem o espaço que partilhamos, e os mais velhos estão presentes na alegria de cada dia. O melhor dos vinhos está na esperança, está para vir a cada pessoa que aposta no amor. Precisamos apostar no amor! E ainda está por vir, mesmo que todas as variáveis e estatísticas digam o contrário; o melhor vinho ainda está por vir para aqueles que hoje veem desmoronar tudo. Murmurai até acreditá-lo: o melhor vinho está por vir; e sussurrai-o aos desesperados ou que desistiram do amor. Deus sempre Se aproxima das periferias de quantos ficaram sem vinho, daqueles que só têm desânimos para beber; Jesus Se sente inclinado a desperdiçar o melhor dos vinhos com aqueles que, por uma razão ou outra, sentem que já lhes romperam todas as talhas.

Como Maria nos convida, façamos “o que Ele nos disser” e agradeçamos por, neste nosso tempo e na nossa hora, o vinho novo, o melhor, nos faça recuperar a alegria de viver família.

SANTUÁRIO DA DIVINA MISERICÓRDIA

O Papa visitou segunda-feira (06/07) o Santuário da Divina Misericórdia em Guayaquil, onde rezou a ‘Ave Maria’ com centenas de pacientes com câncer, idosos e pobres e em seguida brincou dizendo que ‘não iria cobrar por sua bênção’.

Cerca de 2 mil pessoas receberam com entusiasmo o Papa, a quem um menino quase tocou o rosto quando passou entre os participantes. Logo depois, ele se curvou para uma paciente deitado em uma maca no chão para abençoá-la. Em seguida, rezou silenciosamente diante da imagem do Senhor da Divina Misericórdia e se dirigiu ao público.

“Vou rezar por cada um de vocês, vou dizer ao Senhor que ele sabe os seus nomes e vou pedir a Jesus muita misericórdia para cada um de vocês, e também para Nossa Senhora, que está sempre ao seu lado”.

Ainda brincando, Francisco explicou que o bispo (Arcebispo Antonio Arregui Yarza, de Guayaquil) lhe disse que tinham que respeitar o horário, e portanto, era hora de ir-se.

E acrescentou: “Antes de ir, vou abençoá-los, mas não vou cobrar nada. Peço, porém, o favor de rezarem por mim, prometem-me?” e as pessoas responderam com um ‘sim’ retumbante.

O Papa e sua comitiva deixaram o Santuário e se dirigiram ao Parque de Los Samanes, aonde celebrou a primeira missa desta viagem.


MISSA CAMPAL

Quito – O Parque do Bicentenário ficou completamente lotado na manhã desta terça-feira (07/07) em Quito, no Equador, aonde o Papa celebrou uma missa campal. Situado na zona norte da capital, o parque é a maior área verde da cidade, com 125 hectares, no terreno anteriormente ocupado pelo aeroporto. Foi inaugurado em 2013, para comemorar duzentos anos de independência do país, e seu projeto contempla ainda a construção de campos esportivos, museus, áreas culturais e de lazer.

Concelebraram com Francisco cerca de 40 bispos locais, inclusive os eméritos, e no final da missa, tomou a palavra o Arcebispo de Quito, Dom Gabriel Trávez Trávez, OFM.

Como sempre, o Papa foi acolhido pela multidão com aplausos e manifestações de afeto. Milhares de fiéis, muitos dos quais passaram a noite no local, lançavam pétalas e agitavam bandeiras com o rosto do Pontífice. Muitos erguiam terços, cruzes e outros objetos na passagem do papamóvel. Em seu trajeto, o Papa fez uma breve parada para abençoar uma senhora cadeirante.

Segundo o Padre Richard Ordóñez, porta-voz da Arquidiocese de Quito, cerca de 2.000 pessoas, entre leigos e religiosos, distribuíram a comunhão. O primeiro canto entoado foi “Equador abre as portas ao redentor”, o mesmo utilizado há 30 anos, quando João Paulo II visitou o país.

O Pontífice iniciou a homilia da missa ‘pela evangelização dos povos’ com a afirmação que “a palavra de Deus convida-nos a viver a unidade, para que o mundo acredite” e relacionou o sussurro de Jesus na Última Ceia com o grito da Independência da Hispano-América, um grito nascido da consciência da falta de liberdade, de estarmos sendo espremidos e saqueados, “sujeitos às conveniências dos poderosos de turno”.

“Nós todos juntos, aqui reunidos à volta da mesa com Jesus, somos um grito, um clamor nascido da convicção de que a sua presença nos impele para a unidade, indica um horizonte estupendo, oferece um banquete apetecível”, lembrou o Papa à multidão de fiéis que o ouviram em silêncio. “Nossa resposta deve repetir o clamor de Jesus e aceitar a graça e a tarefa da unidade”, completou.

Continuando, explicou que Jesus nos enviou a este mundo desafiador e dilacerado pelas guerras e a violência que ele mesmo experimentou na sua própria carne: intrigas, desconfianças e traição no dia a dia. E o comparou com aquele grito de liberdade que prorrompeu há pouco mais de 200 anos:

“A história conta-nos que só se tornou contundente quando deixou de lado os personalismos, o afã de lideranças únicas, a falta de compreensão de outros processos libertadores com características diferentes, mas não por isso antagônicas”.

Neste sentido, o Papa questionou: “Poderá a evangelização ser veículo de unidade de aspirações, sensibilidades, esperanças e até de certas utopias? É claro que sim; isso mesmo acreditamos e gritamos. Como disse uma vez, “enquanto no mundo, especialmente em alguns países, se reacendem várias formas de guerras e conflitos, nós, cristãos, insistimos na proposta de reconhecer o outro, de curar as feridas, de construir pontes, de estreitar laços e de nos ajudarmos a carregar as cargas uns dos outros”.

“Daí a necessidade, explicou, de lutar pela inclusão em todos os níveis, evitando egoísmos, promovendo a comunicação e o diálogo, encorajando a colaboração. É preciso confiar o coração ao companheiro de estrada, sem medo nem ceticismo. A unidade é impensável se a mundanidade espiritual nos faz estar em guerra uns com os outros, na busca estéril do poder, do prestigio, do prazer ou da segurança econômica. E isto às custas dos mais pobres, dos mais excluídos, dos mais indefesos, dos que não perdem a sua dignidade embora esta seja pisoteada todos os dias”.

“A evangelização não consiste em fazer proselitismo, o proselitismo é uma caricatura da evangelização, mas em atrair os afastados com o nosso testemunho, em aproximar-se humildemente daqueles que se sentem longe de Deus e da Igreja, daqueles que se sentem condenados ‘a priori’ por aqueles que se sentem perfeitos e puros; aproximar-se daqueles que têm medo ou dos indiferentes, para lhes dizer: ‘O Senhor também te chama para seres parte do seu povo, e fá-lo com grande respeito e amor’”.

O Papa também lembrou que a evangelização “também não é um arranjo feito à nossa medida, no qual ditamos as condições, escolhemos alguns membros e excluímos os outros. Jesus reza para que façamos parte duma grande família, na qual Deus é nosso Pai e todos nós somos irmãos. Isto não se fundamenta no fato de ter os mesmos gostos, as mesmas preocupações, os mesmos talentos. Somos irmãos porque Deus nos criou por amor e, por pura iniciativa Dele, nos destinou para sermos seus filhos”. Somos irmãos, porque, justificados pelo sangue de Cristo Jesus passamos da morte à vida, fazendo-nos ‘co-herdeiros’ da promessa. Esta é a salvação que Deus realiza e a Igreja alegremente anuncia: fazer parte do ‘nós’ divino”.

Concluindo, Francisco afirmou que seria belo se todos pudessem admirar como nos preocupamos uns pelos outros; como mutuamente nos animamos e fazemos companhia. “Em qualquer doação, é a própria pessoa que se oferece. ‘Dar-se’ significa deixar atuar em si mesmo toda a força do amor que é o Espírito de Deus e, assim, dar lugar à sua força criadora. Dando-se, o homem volta a encontrar-se a si mesmo com a sua verdadeira identidade de filho de Deus, semelhante ao Pai e, como Ele, doador de vida, irmão de Jesus, de Quem dá testemunho. Isto é evangelizar, esta é a nossa revolução – porque a nossa fé é sempre revolucionária – este é o nosso grito mais profundo e constante”.

Uma educação que forme espírito crítico

Quito  – Neste terceiro dia em solo equatoriano, após presidir uma missa no Parque do Bicentenário em Quito para milhares de fieis, o Papa Francisco encontrou o mundo da educação do Equador. Após uma pausa para o almoço e breve descanso na Nunciatura, o Santo Padre dirigiu-se à Pontifícia Universidade Católica do Equador, fundada em 1946, de propriedade da Arquidiocese de Quito, e confiada aos jesuítas desde sua fundação.

O encontro foi realizado num campo com capacidade para acolher cerca de cinco mil pessoas. Na acolhida de Francisco, não faltaram bênçãos a crianças e doentes, selfies, abraços e muitos, muitos buquês e pétalas de flores, forma que os equatorianos têm de expressar sua afeto e carinho por uma pessoa que lhes é muito cara.

Ao som de cantos, Francisco foi acolhido pelo Reitor do Ateneu e saudado pelo Bispo de Loja e Presidente da Comissão Episcopal para a Educação e a Cultura, Dom José Espinoza Mateus. Após a entrega de dons, foi rezada uma oração de São Miguel Febres Cordero FSC, educador equatoriano falecido em 1854, seguida pelos testemunhos de uma estudante, de uma professora e do reitor da Universidade de Cuenca. Após, proferiu o seu quinto pronunciamento desta primeira etapa da viagem à América Latina.

Para ilustrar a linha de raciocínio de seu discurso, iniciado com os verbos “cultivar e cuidar” – citados no Livro do Gênesis e na Parábola do Semeador -, Francisco usou inúmeras citações contidas na sua recente Encíclica Laudato Si. As palavras “cultivar” e “cuidar”, “andam de mãos dadas, disse ele. Não cultiva quem não cuida, não cuida quem não cultiva. Somos convidados não somente a participar na obra criadora cultivando-a, fazendo-a crescer, desenvolvendo-a, mas também a cuidá-la, protegê-la e guardá-la”.

Francisco reitera que este convite impõe-se forçosamente, “já não como uma mera recomendação, mas como uma necessidade, devido ao mal que provocamos à terra devido ao uso irresponsável e do abuso dos bens que Deus nela colocou”.

A relação entre a nossa vida e a da nossa mãe terra – alertou o Papa – é uma relação que encerra uma possibilidade tanto de abertura, transformação e vida, como de destruição e morte:

“Uma coisa é clara! Não podemos continuar a desinteressar-nos da nossa realidade, dos nossos irmãos, da nossa mãe terra. Não nos é lícito ignorar o que está a acontecer ao nosso redor, como se determinadas situações não existissem ou não tivessem nada a ver com a nossa realidade. Não cessa de ecoar, com força, esta pergunta de Deus a Caim: «Onde está o teu irmão?» Eu me interrogo se a nossa resposta continuará a ser: «Sou, porventura, guarda de meu irmão?» (Gn 4, 9)”.
O Papa observou, que neste contexto universitário, seria bom se interrogar sobre a nossa educação a respeito desta terra que clama ao céu. Os nossos centros educativos – disse ele – são uma sementeira, uma possibilidade, terra fértil que devemos cuidar, estimular e proteger. Terra fértil, sedenta de vida. E perguntou aos educadores:

“Velais pelos vossos alunos, ajudando-os a desenvolver um espírito crítico, um espírito livre, capaz de cuidar do mundo atual? Um espírito que seja capaz de procurar novas respostas para os múltiplos desafios que a sociedade nos coloca? Sois capazes de os estimular para não se desinteressarem da realidade que os rodeia? Como entra, nos currículos universitários ou nas diferentes áreas do trabalho educativo, a vida que nos rodeia com as suas perguntas, interpelações, controvérsias? Como geramos e acompanhamos o debate construtivo que nasce do diálogo em prol de um mundo mais humano? O diálogo, esta palavra ponte, que cria pontes”.

O Papa lançou outro questionamento, para uma situação que envolve a todos, famílias, centros educativos, professores:

“Como ajudamos os nossos jovens a não olhar um grau universitário como sinônimo de maior posição, dinheiro, prestígio social? Não são sinônimos. Ajudamos a ver esta preparação como sinal de maior responsabilidade perante os problemas de hoje, perante o cuidado do mais pobre, perante o cuidado do meio ambiente?”

Dirigindo-se aos jovens presentes, “semente de transformação desta sociedade equatoriana”, Francisco observou que “este tempo de estudo não é só um direito, mas um privilégio que tendes”, chamando então a atenção para o fato dos tantos “amigos, conhecidos ou desconhecidos”, que gostariam “de ter um lugar nesta casa, mas, por várias circunstâncias, não conseguiram. Em que medida o nosso estudo nos ajuda a ser solidários com eles?”, questionou.

O Santo Padre ressaltou então o papel fundamental e essencial das comunidades educativas na construção da cidadania e da cultura. “Não basta realizar análises, descrições da realidade; é necessário gerar as áreas, espaços de verdadeira pesquisa, debates que gerem alternativas para as problemáticas especialmente de hoje”, exortou.

Perante a globalização do paradigma tecnocrático que tende a “crer que toda a aquisição de poder seja simplesmente progresso, aumento de segurança, de utilidade, de bem-estar, de força vital, de plenitude de valores, como se a realidade, o bem e a verdade desabrochassem espontaneamente do próprio poder da tecnologia e da economia”, disse o Pontífice, citando a Laudato Si:

“Nos é pedido, com urgência, que nos animemos a pensar, a debater sobre a nossa situação atual, sobre o tipo de cultura que queremos ou pretendemos não só para nós, mas também para os nossos filhos, para os nossos netos. Esta terra, recebemo-la como herança, como um dom, como um presente. Nos fará bem interrogarmo-nos: Como queremos deixá-la? Qual é a orientação, o sentido que queremos dar à existência? Com que finalidade passamos por este mundo? Para que lutamos e trabalhamos?”

As iniciativas individuais – disse Francisco – são sempre boas e fundamentais, mas nos é pedido para dar um passo mais: animar-nos a olhar a realidade organicamente e não de forma fragmentária; a fazer perguntas que nos envolvam a todos, uma vez que «tudo está interligado».

Francisco concluiu, fazendo uma invocação ao Espírito Santo, para ser “nosso mestre e companheiro de viagem”, fazendo-se um conosco para encontrarmos caminhos de vida nova”.


O trinômio de Francisco para alicerçar
uma sociedade mais justa

Quito – Após deixar a Pontifícia Universidade Católica do Equador, o Papa Francisco dirigiu-se de papamóvel até a Igreja de São Francisco, distante 4 km, para o encontro com a sociedade civil. O Prefeito de Quito, que aguardava diante da Igreja, entregou ao Pontífice as chaves da cidade, sem discurso. O Padre Guardião da comunidade franciscana acolheu o Papa na igreja, uma das mais importantes construções históricas da capital equatoriana.

O imponente complexo da Igreja e do Convento de São Francisco, constitui a construção religiosa mais antiga de toda América Latina, de grande significado simbólico para as populações indígenas, enquanto sede dos comandos militares Inca e Caranqui. A construção teve início em 1536, três anos após a fundação de Quito, sendo concluída em 1680. O complexo abriga 3.500 obras de arte colonial da Escola de Quito, uma riquíssima biblioteca franciscana, entre outras preciosidades culturais e religiosas.

Protagonismo

No encontro com o Papa Francisco, estavam representados protagonistas da sociedade nos campos da cultura, da economia, do empreendimento industrial e rural, do voluntariado, do esporte, além de representantes das populações indígenas amazônicas. O Santo Padre foi saudado pelo Arcebispo de Cuenza e Presidente da Comissão para os Leigos da CEE, Dom Cabrera Herrera. Três leigos – um homem e duas mulheres deram seus testemunhos.

O Papa afirmou “sentir-se em casa” na Igreja São Francisco de Quito, e aproveitou a acolhida para apresentar “algumas chaves de convivência cívica, a começar pela vida família”:

Reflexão

“A nossa sociedade ganha, quando cada pessoa, cada grupo social se sente verdadeiramente de casa. Numa família, os pais, os avós, os filhos são de casa; ninguém fica excluído. Se alguém tem uma dificuldade, mesmo grave, ainda que seja por culpa dele, os outros correm em sua ajuda, apoiam-no; a sua dor é de todos. Me vem em mente a imagem destas mães ou esposas. As vi em Buenos Aires fazendo filas nos dias de visita para entrar no cárcere, para ver a seu filho ou a seu esposo que não se comportou bem, para dizer numa linguagem mais branda, porém não os deixam porque seguem sendo de casa. Como nos ensinam estas mulheres. Na sociedade, não deveria acontecer o mesmo? E, no entanto, as nossas relações sociais ou o jogo político, no sentido mais amplo da palavra – não esqueçamos que a política, dizia o Beato Paulo VI, é uma das formas mais altas de caridade -, muitas vezes este agir nosso se baseia no confronto, que produz descarte. Assim vamos construindo uma cultura do descarte que hoje em dia assumiu dimensões mundiais, de amplitude. Isto é ser família? A minha posição, a minha ideia, o meu projeto consolidam-se, se for capaz de vencer o outro, de me impor. Nas famílias, todos contribuem para o projeto comum, todos trabalham para o bem comum, mas sem anular o indivíduo; pelo contrário, sustentam-no, promovem-no. Brigam, porém tem algo que não muda: o laço familiar. As brigas de família tornam-se reconciliações depois. As alegrias e as penas de cada um são assumidas por todos. Isto sim é ser família!”.

“Oh se pudéssemos ver o adversário político, o vizinho de casa com os mesmos olhos com que vemos os filhos, esposas ou maridos, pais ou mães! – exclamou o Papa, perguntando:

Comunicar

“Amamos a nossa sociedade? Amamos o nosso país, a comunidade que estamos tentando construir? Amamo-la nos conceitos proclamados, no mundo das ideias? Amemo-la mais com as obras do que com as palavras! Em cada pessoa, em sua situação concreta, na vida que compartilhamos. O amor tende sempre à comunicação; nunca ao isolamento”.

Francisco observou que a partir deste afeto, surgirão gestos simples que fortalecem os vínculos pessoais, ressaltando que no âmbito familiar, as pessoas recebem os valores fundamentais do amor, da fraternidade e do respeito mútuo, que se traduzem em valores sociais fundamentais: a gratuidade, a solidariedade e a subsidiariedade:

Boas obras

“Para os pais, todos os filhos, embora cada um tenha a sua índole própria, são igualmente adoráveis. Mas, quando a criança se nega a partilhar o que recebe gratuitamente deles, quebra esta relação. O amor dos pais ajuda-o a sair do seu egoísmo, para que aprenda a viver com os demais, a ceder para se abrir ao outro. No âmbito social, isto supõe assumir que a gratuidade não é complementar, mas requisito necessário da justiça. O que somos e temos foi-nos confiado para o colocarmos ao serviço dos outros; a nossa tarefa é fazer com que frutifique em boas obras. Os bens estão destinados a todos e, embora uma pessoa ostente o seu título de propriedade, sobre eles pesa uma hipoteca social”.

Desta forma – disse o Pontífice – o conceito econômico de justiça, baseado no princípio de compra-venda, é superado pelo conceito de justiça social, que defende o direito fundamental da pessoa a uma vida digna. O Papa alertou que a exploração dos recursos naturais, tão abundantes no Equador, não deve apostar no benefício imediato.

Ecologia integral

“Ser administradores desta riqueza que recebemos compromete-nos com a sociedade no seu conjunto e com as gerações futuras, às quais não poderemos legar este património sem o devido cuidado do meio ambiente, sem uma consciência de gratuidade que brota da contemplação do mundo criado. Hoje estão aqui conosco irmãos dos povos indígenas da Amazônia Equatoriana. Lá o Equador – juntamente com os outros países detentores de faixas amazónicas – tem uma oportunidade para exercer a pedagogia duma ecologia integral. Recebemos o mundo como herança dos nossos pais, mas também como empréstimo das gerações futuras, a quem o temos de devolver”.

Da fraternidade vivida na família, nasce a solidariedade na sociedade, que não consiste apenas em dar ao necessitado, mas em sermos responsáveis uns pelos outros. Se virmos no outro um irmão, ninguém pode ficar excluído, marginalizado.

Subsidiariedade

O respeito pelo outro que se aprende na família traduz-se – frisou o Santo Padre – na esfera social, em subsidiariedade. Assumir que a nossa opção não é necessariamente a única legítima é um sadio exercício de humildade:

“Ao reconhecer a parte boa que há nos outros, mesmo com as suas limitações, vemos a riqueza que encerra a diversidade e o valor da complementaridade. Os homens, os grupos têm direito de percorrer o seu caminho, ainda que isso às vezes suponha cometer erros. No respeito da liberdade, a sociedade civil é chamada a promover cada pessoa e agente social, para que possa assumir o seu papel e contribuir, a partir da sua especificidade, para o bem comum. O diálogo é necessário, fundamental para chegar à verdade, que não pode ser imposta, mas procurada com sinceridade e espírito crítico”.

Participação

Numa democracia participativa, cada uma das forças sociais, os grupos indígenas, os afro-equatorianos, as mulheres, os grupos de cidadãos e quantos trabalham para a comunidade nos serviços públicos são protagonistas imprescindíveis neste diálogo. No-lo dizem com a maior eloquência as paredes, pátios e claustros deste lugar: baseada sobre elementos da cultura Inca e Caranqui, a beleza das suas proporções e formas, o arrojo dos seus diferentes estilos combinados de modo notável, as obras de arte designadas pelo nome de «escola quitenha», condensam um longo diálogo, com sucessos e fracassos, da história equatoriana. O hoje está cheio de beleza, e se é verdade que no passado houve erros e abusos – como negá-lo? – podemos afirmar que a amálgama irradia tanta exuberância que nos permite olhar o futuro com muita esperança.

Também a Igreja quer colaborar na busca do bem comum, com as suas atividades sociais e educativas, promovendo os valores éticos e espirituais, sendo um sinal profético que leve um raio de luz e esperança a todos, especialmente aos mais necessitados. Concluído o encontro com a sociedade civil, Francisco visitou de forma privada a “Igreja da Companhia”, onde estavam presentes alguns jesuítas da comunidade local.

“Somos objetos da gratuidade de Deus”

Quito – No Santuário Nacional Mariano “El Quinche”, no Equador, o Papa Francisco encontrou o clero, religiosos, religiosas e seminaristas. Bem à vontade, o Santo Padre comentou que até teria um discurso pronto, mas que não estava com vontade de lê-lo e preferia falar com o coração sobre os dias que esteve em contato com o povo equatoriano, sobre a riqueza espiritual das pessoas, a profundidade, a valentia e, principalmente, a alegria na recepção – algo raro hoje em dia.

Durante o discurso, o Papa Francisco enalteceu dois princípios fundamentais pra viver: a gratuidade em servir e a preservação da memória. Sobre a gratuidade, e pensando na Virgem, em Maria, que já tinha essa consciência, o Pontífice enfatizou a palavra: ‘faça’. ‘Fazer’ esse caminho de retorno à gratuidade que Deus deixou. “Somos objetos da gratuidade de Deus”, disse o Pontífice.

“Consciência de gratuidade. Por isso, façam-se, façam, que se manifeste a gratuidade de Deus. Religiosas, religiosos, sacerdotes, seminaristas. Todos os dias voltem, façam esse caminho de retorno à gratuidade com que Deus lhes escolheu”, falou espontaneamente o Papa.
O outro princípio é a preservação da memória, tomando cuidado para não adoecer, não lembrando das origens.

“Não percam a memória, sobretudo, a memória de onde vocês vieram. Não reneguem suas raízes. E não se sintam promovidos. A gratuidade não pode conviver com a promoção. Quando um religioso entra em carreira, em carreira humana, começam a adoecer e a perder a memória de onde vieram. Todos os dias renovem o sentimento que tudo é gratuidade. Nada merecemos. E peçam a graça de não perder a memória”, sublinhou o Papa Francisco.

O discurso oficial do Santo Padre que não foi lido, já foi entregue para publicação e é o seguinte:

“Queridos irmãos e irmãs! Trago aos pés de Nossa Senhora de El Quinche o que vivi nestes dias da minha visita. Quero deixar no seu coração, os idosos e doentes com quem acabo de partilhar alguns momentos na casa das Irmãs da Caridade, bem como todos os outros dos encontros anteriores. Deixo-os no coração de Maria, mas também os deposito no coração de vocês: sacerdotes, religiosos e religiosas, seminaristas, para que, chamados a trabalhar na vinha do Senhor, sejam guardiões de tudo o que este povo do Equador vive por entre lágrimas e alegrias.

A D. Lazzari, ao Padre Mina e à Irmã Sandoval agradeço as palavras, que me dão motivo para partilhar com todos vocês algumas coisas relativas à nossa solicitude comum pelo Povo de Deus.
No Evangelho, o Senhor nos convida a aceitar a missão, sem pôr condições. É uma mensagem importante que convém não esquecer, ressoando, com um acento especial, neste Santuário dedicado à Virgem da Apresentação. Maria é exemplo de discípula para nós, que, como Ela, recebemos uma vocação. A sua resposta confiante – ‘faça-se em mim segundo a tua palavra’ – lembra-nos as suas palavras nas bodas de Caná: ‘Fazei o que Ele vos disser’ (Jo 2, 5). O seu exemplo é um convite a servir como Ela.

Na Apresentação da Virgem, podemos encontrar algumas sugestões para a nossa própria chamada. A Virgem Menina foi um presente de Deus para os seus pais e para todo o povo, que esperava a libertação. É um fato que se repete frequentemente na Escritura: Deus responde ao clamor do seu povo, enviando uma criança, frágil, destinada a trazer a salvação e que, ao mesmo tempo, restaura a esperança de uns pais idosos. A palavra de Deus nos diz que, na história de Israel, os juízes, os profetas, os reis são um presente do Senhor para fazer chegar a sua ternura e misericórdia ao seu povo. São sinal de gratuidade de Deus: foi Ele quem os elegeu, escolheu e destinou. Isso nos afasta da auto-referencialidade, nos faz compreender que já não nos pertencemos, que a nossa vocação requer que nos afastemos de todo o egoísmo, de toda a busca de lucro material ou compensação afetiva, como nos disse o Evangelho. Não somos mercenários, mas servidores; viemos, não para ser servidos, mas para servir, fazendo-o com desprendimento total, sem bastão nem bolsa.

Algumas tradições sobre a invocação de Nossa Senhora de Quinche nos dizem que Diego de Robles fez a imagem por encomenda dos índios Lumbicí. Diego não a fez por devoção, a fez para tirar proveito econômico. Como não lhe puderam pagar, a levou a Oyacachi e a trocou por tábuas de cedro. Mas Diego se negou a atender o pedido daquele povo para que lhes fizesse também um altar para a imagem até que, caindo do cavalo, encontrou-se em perigo e sentiu a proteção da Virgem. Voltou à aldeia e fez o pedestal da imagem. Todos nós também já fizemos a experiência de um Deus que nos atravessa diante e que, na nossa realidade de caídos, derrubados, nos chama. Que a vaidade e o mundanismo não nos façam esquecer onde Deus nos resgatou! Que a Virgem Maria de El Quinche nos faça descer dos postos de ambições, interesses egoístas, cuidados excessivos de nós mesmos!

A ‘autoridade’, que os apóstolos recebem de Jesus, não é para seu próprio benefício: os nossos dons são para renovar e construir a Igreja. Não neguem a partilhar, não resistam a dar, não se fechem na comodidade; sejam mananciais que transbordam e refrescam, especialmente a bem dos oprimidos pelo pecado, a desilusão, o rancor (cf. EG 272).

O segundo traço que me evoca a Apresentação da Virgem é a perseverança. Na sugestiva iconografia mariana desta festa, a Virgem Menina se afasta de seus pais subindo a escadaria do Templo. Maria não olha para trás e, numa clara referência à advertência evangélica, caminha decididamente para diante. Nós, como os discípulos do Evangelho, também nos pusemos a caminho para levar a cada povo e lugar a boa nova de Jesus. A perseverança na missão implica não mudar de casa para casa, buscando onde nos tratem melhor, onde haja mais recursos e comodidades. Supõe unir a nossa sorte à de Jesus até o fim. Alguns relatos das aparições da Virgem de El Quinche dizem que uma ‘senhora com um menino nos braços’ visitou, durante várias tardes seguidas, os indígenas de Oyacachi, quando estavam refugiados por causa do assédio dos ursos. Várias vezes Maria foi ao encontro dos seus filhos. Eles não acreditaram nela, desconfiavam daquela senhora, mas admiravam a sua perseverança em voltar toda tarde ao pôr-do-sol. Saibamos perseverar, mesmo que nos rejeitem, ainda que se faça noite e cresçam a confusão e os perigos. Perseverar nesse esforço, sabendo que não estamos sozinhos, que é o Povo Santo de Deus que caminha.

De certo modo podemos ver, na imagem da Virgem Menina subindo ao Templo, a Igreja que acompanha o discípulo missionário. Ao lado d’Ela estão os seus pais, que Lhe transmitiram a memória da fé e, agora, generosamente, oferecem Ela ao Senhor para que possa seguir o seu caminho. A sua comunidade está representada no ‘séquito das virgens, suas companheiras’, com as lâmpadas acesas (cf. Sal 44, 15), nas quais os Padres da Igreja viram uma profecia de todos os que, imitando Maria, procuram sinceramente ser amigos de Deus. E estão os sacerdotes que esperam para recebê-la e que nos lembram que, na Igreja, os pastores têm a responsabilidade de acolher com ternura e ajudar a discernir cada espírito e cada chamada.

Caminhemos juntos, sustentando-nos uns aos outros e peçamos, com humildade, o dom da perseverança ao serviço deles.

Nossa Senhora de El Quinche foi ocasião de encontro, de comunhão, para este lugar que, desde os tempos dos Incas, se tornara uma povoação multi-étnica. Como é belo quando a Igreja persevera no seu esforço por ser casa e escola de comunhão, quando geramos aquilo a que me apraz chamar a cultura do encontro!

A imagem da Apresentação nos diz que a Virgem Menina, depois de abençoada pelos sacerdotes, se sentou nos degraus do altar e dançou a seus pés. Penso na alegria que se expressa nas imagens do banquete das núpcias, dos amigos do noivo, da noiva adornada com as suas jóias. É a alegria de quem descobriu um tesouro e vendeu tudo para o adquirir. Encontrar o Senhor, viver na sua casa, participar da sua intimidade compromete a anunciar o Reino e levar a salvação a todos. Cruzar os portais do Templo exige nos tornar, como Maria, templos do Senhor e nos por a caminho para O levarmos aos irmãos. A Virgem, como primeira discípula missionária, depois do anúncio do Anjo, partiu sem demora para uma cidade de Judá, a fim de compartilhar essa alegria imensa, a mesma que fez São João Batista saltar no seio da sua mãe. Quem ouve a sua voz ‘salta de alegria’ e se torna, por sua vez, um proclamador da alegria. A alegria de evangelizar move a Igreja, a faz sair como Maria.

Embora sejam múltiplas as razões que se invocam para a transferência do santuário de Oyacachi para este lugar, limito-me a uma: ‘aqui é e tem sido mais acessível, mais fácil para estar perto de todos’. Assim o entendeu o arcebispo de Quito, Frei Luis Lopez de Solís, quando mandou edificar um Santuário capaz de atrair e acolher todos. Uma Igreja em saída é uma Igreja que se aproxima, que desce para não estar distante, que sai da sua comodidade e ousa chegar a todas as periferias que precisam da luz do Evangelho (EG 20).

Agora vamos regressar às nossas tarefas, solicitadas pelo Santo Povo que nos foi confiado. Entre elas, não esqueçamos de cuidar, animar e educar a devoção popular que experimentamos neste santuário e tão generalizada em muitos países latino-americanos. O povo fiel soube expressar a fé com a sua própria linguagem, manifestar os seus sentimentos mais profundos de dor, dúvida, alegria, fracasso, gratidão com várias formas de piedade: procissões, velas, flores, cânticos que se transformam numa bela expressão de confiança no Senhor e de amor à sua Mãe, que é também a nossa.

Em Quinche, a história dos homens e a história de Deus convergem na história de uma mulher, Maria, e numa casa, a nossa casa, a irmã mãe terra. As tradições dessa invocação falam dos cedros, dos ursos, da fenda na rocha que foi aqui a primeira casa da Mãe de Deus. Falam-nos no ontem, de aves que rodearam o lugar, e no hoje, de flores que enfeitam os arredores. As origens dessa devoção nos levam para tempos onde era mais simples ‘a harmonia serena com a criação (…), contemplar o Criador, que vive entre nós e naquilo que nos rodeia e cuja presença não precisa de ser criada’ (LS 225) e que Se manifesta no mundo criado, em seu amado Filho, na Eucaristia que permite aos cristãos se sentirem membros vivos da Igreja e participarem ativamente na sua missão (cf. Aparecida, 264), em Nossa Senhora de Quinche, que, a partir daqui, acompanhou os alvores do primeiro anúncio da fé aos povos indígenas. A Ela recomendamos a nossa vocação. Que Ela faça de nós um presente para o nosso povo. Que Ela nos dê a perseverança na entrega e a alegria de sair para levar o Evangelho de seu Filho Jesus – unidos aos nossos pastores – até os confins, até às periferias do nosso querido Equador.”

Nossa Senhora da Apresentação de El Quinche, padroeira do Equador

A história remonta o ano de 1591, quando os índios do povoado de Oyacachi receberam uma escultura de Nossa Senhora, através do artista espanhol Dom Diego de Robles que pedia, em troca, madeiras de fino cedro que tinham naquela região. Antes disso, a tradição conta que a Virgem já havia aparecido várias vezes no povoado, prometendo proteção contra os animais ferozes e os estragos das tempestades e dos vulcões, se ali fosse construído um altar para ela.

Com uma gruta natural para abrigar a Imagem, a Nossa Senhora começava a operar contínuos milagres. Depois foi trasladada para uma capela, difundindo, assim, mais devoção pelo país. Da capela em Oyacachi, a Imagem milagrosa da Virgem foi trasladada para dentro da Igreja do Santuário de El Quinche, atrás do altar principal, onde se encontra hoje. Entre tantas manifestações da devoção mariana no país, a de Nossa Senhora da Apresentação de El Quinche foi a mais notável e, por isso, merecedora do título de padroeira, quando da sua coroação em 20 de junho de 1943. A festa litúrgica é celebrada em 21 de novembro.

Construído em 1928, o local que recebe frequentes peregrinações em honra à Virgem foi proclamado Santuário Mariano Nacional em 1985. A Igreja acolhe cerca de 1500 pessoas, enquanto que o campo mariano ao externo pode receber até 15 mil pessoas.

“Devemos construir pontes em vez de muros”

La Paz – O Papa discursou à sociedade civil boliviana na Catedral de La Paz no início da noite desta quarta-feira (08/07). Retomando diversos pontos da sua recente encíclica, Francisco convidou os presentes a refletirem sobre uma ecologia integral que considere o homem e a natureza numa relação plena e recíproca. Sobre a questão de uma saída para o mar para o território boliviano, o Papa pediu diálogo: “Devemos construir pontes, em vez de erguer muros”, defendeu o Pontífice.

Ao falar da sutil linha que separa as definições de “bem comum” e “bem-estar”, o Papa exortou os presentes a saírem de si mesmos e usarem obras de caridades cristãs para expandir o bem comum.

“Pelo contrário, o bem comum é algo mais do que a soma de interesses individuais; é passar do que “é melhor para mim” àquilo que “é melhor para todos”, e inclui tudo o que dá coesão a um povo: metas comuns, valores compartilhados, ideais que ajudam a levantar os olhos para além dos horizontes particulares”.

Francisco reforçou ainda que os atores sociais têm a responsabilidade de contribuir para a construção da unidade e o desenvolvimento da sociedade.

“A liberdade é sempre o campo melhor para que os pensadores, as associações de cidadãos, os meios de comunicação desempenhem a sua função, com paixão e criatividade, ao serviço do bem comum”.

A fé não é subcultura

Sobre o papel dos cristãos na sociedade, o Papa recordou que a fé é uma luz que não encandeia nem perturba – as ideologias que encandeiam, precisou Francisco – mas ilumina e orienta no respeito pela consciência e a história de cada pessoa e de cada sociedade humana.

Destacando que o cristianismo teve um papel importante na formação da identidade do povo boliviano, o Papa sublinhou que “a liberdade religiosa – tal como é entendida habitualmente no foro civil – lembra também que a fé não se pode reduzir à esfera puramente subjetiva, não é uma subcultura”.

Saída para o mar

Sobre a questão territorial entre Chile, Peru e Bolívia, Francisco afirmou que hoje é indispensável o desenvolvimento da diplomacia com os países vizinhos, que evite os conflitos entre povos irmãos e contribua para um diálogo franco e aberto dos problemas.

“Penso na saída para o mar. Diálogo: é indispensável. Devemos construir pontes, em vez de erguer muros. Devemos construir pontes, em vez de erguer muros”, frisou o Pontífice.


ÍNTEGRA DO DISCURSO

Estou contente por este encontro com vocês, autoridades políticas e civis da Bolívia, membros do Corpo Diplomático e pessoas relevantes do mundo da cultura e do voluntariado. Agradeço a Dom Edmundo Abastoflor, Arcebispo de La Paz, a sua amável recepção. Peço a gentileza para poder cooperar, com algumas palavras de incentivo, na tarefa que cada um de vós já realiza.

Todos nós aqui presentes, cada um à sua maneira, compartilhamos a vocação de trabalhar pelo bem comum. Há 50 anos, o Concílio Vaticano II definiu o bem comum como «o conjunto das condições da vida social que permitem, tanto aos grupos como a cada membro, alcançar mais plena e facilmente a própria perfeição» (GS 26). Obrigado por desejardes, cada qual a partir do próprio papel e missão, que as pessoas e a sociedade se desenvolvam, alcancem a sua perfeição. Tenho a certeza de que, no vosso afã pelo bem comum, buscais o belo, o verdadeiro e o bom. Que este esforço sempre ajude a crescer no respeito pela pessoa humana, enquanto tal, com direitos fundamentais e inalienáveis orientados para o seu desenvolvimento integral, a paz social, isto é, a estabilidade e a segurança duma certa ordem, que não se realiza sem uma particular atenção à justiça distributiva (cf. LS 157).

No trajeto para a catedral, pude admirar os cumes do Hayna Potosí e do Illimani, daquele “morro jovem” e do outro que indica “o lugar por onde sai o sol”. Vi também como muitas casas e bairros, de forma artesanal, se confundem com as encostas, e fiquei maravilhado com algumas obras da sua arquitetura. O ambiente natural e o ambiente social, político e econômico estão intimamente relacionados. Isto impõe-nos estabelecer as bases duma ecologia integral, que incorpore claramente todas as dimensões humanas na solução das graves questões socioambientais dos nossos dias; caso contrário, os glaciares desses montes continuarão a reduzir-se e a lógica da recepção, a consciência do mundo que queremos deixar aos que vierem depois de nós, a sua orientação geral, o seu sentido, os seus valores derreter-se-ão também como aqueles gelos (cf. LS 159-160).

Dado que tudo está relacionado, precisamos uns dos outros. Se a política se deixa dominar pela especulação financeira, ou a economia se deixa reger apenas pelo paradigma tecnocrático e utilitarista da produção máxima, não poderão sequer compreender – e muito menos resolver – os grandes problemas que afetam a humanidade. Há necessidade também da cultura; dela faz parte não só o desenvolvimento da capacidade intelectual do ser humano nas ciências e da capacidade de gerar beleza nas artes, mas também as tradições populares locais com a sua sensibilidade particular pelo meio onde surgiram e ao qual dão sentido. Requer-se igualmente uma educação ética e moral, que cultive atitudes de solidariedade e corresponsabilidade entre as pessoas. Devemos reconhecer o papel específico das religiões no desenvolvimento da cultura e os benefícios que podem trazer à sociedade. Nomeadamente os cristãos, como discípulos da Boa Nova, são portadores duma mensagem de salvação que tem em si mesma a capacidade de enobrecer as pessoas, inspirar altos ideais capazes de incentivar linhas de ação que vão além dos interesses individuais, possibilitando a capacidade de renúncia a favor dos outros, a sobriedade e as outras virtudes que ajudam a dominar-nos e que nos unem.

Habituamo-nos tão facilmente ao ambiente de desigualdade que nos rodeia, que ficamos insensíveis às manifestações do mesmo. E assim, sem nos dar conta, confundimos o «bem comum» com o “bem-estar”, sobretudo quando somos nós que o desfrutamos. O bem-estar, que faz referência apenas à abundância material, tende a ser egoísta, a defender interesses parciais, a não pensar nos outros e a deixar-se levar pela tentação do consumismo. Assim entendido, o bem-estar, em vez de ajudar, incuba possíveis conflitos e desintegração social; instalando-se como perspectiva dominante, gera o mal da corrupção que faz desanimar imensamente e causa tanto dano. Pelo contrário, o bem comum é algo mais do que a soma de interesses individuais; é passar do que “é melhor para mim” àquilo que “é melhor para todos”, e inclui tudo o que dá coesão a um povo: metas comuns, valores compartilhados, ideais que ajudam a levantar os olhos para além dos horizontes particulares.

Os distintos atores sociais têm a responsabilidade de contribuir para a construção da unidade e o desenvolvimento da sociedade. A liberdade é sempre o campo melhor para que os pensadores, as associações de cidadãos, os meios de comunicação desempenhem a sua função, com paixão e criatividade, ao serviço do bem comum. Também os cristãos, chamados a ser fermento no povo, trazem a sua própria mensagem à sociedade. A luz do Evangelho de Cristo não é propriedade da Igreja; esta é sua serva, para que chegue até aos confins do mundo. A fé é uma luz que não encandeia nem perturba, mas ilumina e orienta no respeito pela consciência e a história de cada pessoa e de cada sociedade humana. O cristianismo teve um papel importante na formação da identidade do povo boliviano. A liberdade religiosa – tal como é entendida habitualmente na ágora civil – lembra também que a fé não se pode reduzir à esfera puramente subjetiva. O nosso desafio há-de ser incentivar e favorecer a germinação da espiritualidade e do compromisso cristão nas obras sociais.

Entre os vários atores sociais, gostaria de salientar a família, ameaçada em toda a parte pela violência doméstica, o alcoolismo, o machismo, a droga, a falta de trabalho, a insegurança social, o abandono dos idosos, os meninos de rua e recebendo pseudo-soluções a partir de perspectivas que evidenciam uma clara colonização ideológica. Os problemas sociais, que a família resolve em silêncio, são tantos, que a sua não-promoção é deixar desamparados os mais desprotegidos.

Uma nação, que procura o bem comum, não pode fechar-se em si mesma; as redes de relações abonam a sociedade. Assim nos demonstra o problema da emigração nos nossos dias. Hoje é indispensável o desenvolvimento da diplomacia com os países vizinhos, que evite os conflitos entre povos irmãos e contribua para um diálogo franco e aberto dos problemas. Devemos construir pontes, em vez de erguer muros. Todos os temas, por mais espinhosos que sejam, têm soluções compartilháveis, razoáveis, equitativas e duradouras. E, em todo o caso, nunca devem ser motivo de agressividade, rancor ou inimizade, que agravam mais a situação e tornam mais difícil a sua solução.

A Bolívia passa por um momento histórico: a política, o mundo da cultura, as religiões fazem parte deste estupendo desafio da unidade. Nesta terra, onde a exploração, a ganância e variados egoísmos e perspectivas sectárias ensombraram a sua história, hoje pode ser o tempo da integração. Hoje a Bolívia pode “criar novas sínteses culturais”. Como são estupendos os países que, superando a desconfiança doentia, integram os diferentes e que fazem desta integração um novo fator de desenvolvimento! Como são belas as nações quando estão cheias de espaços que unem, relacionam, favorecem o reconhecimento do outro (cf. EG 210)! A Bolívia, na sua busca de integração e unidade, é chamada a ser uma “multiforme harmonia que atrai” (EG 117).

Muito obrigado pela vossa atenção! Peço ao Senhor que a Bolívia, “esta terra inocente e bonita”, continue a progredir cada vez mais para ser aquela “pátria feliz, onde o homem vive o bem da felicidade e da paz”. A Virgem Santa cuide de todos e o Senhor vos abençoe com abundância. Não esqueçam de rezar por mim, porque preciso.

Papa chega à Bolívia e defende ‘cultura da memória’

La Paz – Jallalla Bolívia! Viva a Bolívia: com essas palavras, Francisco saudou a nação, ao finalmente pisar em solo boliviano. Em meio às cores vibrantes das flores e dos trajes típicos indígenas, o Papa recebeu um colar ancestral do Presidente Evo Morales e se dirigiu a ele e ao povo com uma mensagem clara: “Se o crescimento for apenas material, corre-se sempre o risco de voltar a criar novas diferenças, de a abundância de uns ser construída sobre a escassez de outros. Por isso, além da transparência institucional, a coesão social requer um esforço na educação dos cidadãos”.

Palavras que falam não somente à Bolívia, mas a toda a América Latina, inclusive ao Brasil, que vive um momento de expansão econômica, mas não de expansão cultural e educacional. A mesma tônica foi dada ao discurso às autoridades civis, desta vez na Catedral.

O Papa pronunciou seu primeiro discurso em terras bolivianas no aeroporto de El Alto, no final da tarde desta quarta-feira (08/07), na capital da Bolívia.

Inclusão
A Bolívia tem dado passos importantes na inclusão de amplos setores na vida econômica, social e política do País, afirmou o Pontífice ao recordar que a Constituição reconhece os direitos dos indivíduos, das minorias, do meio ambiente, e instituições sensíveis a tais realidades.

“Tudo isto requer um espírito de cooperação dos cidadãos, de diálogo e participação dos indivíduos e dos atores sociais nas questões de interesse comum. O progresso integral dum povo inclui o crescimento em valores das pessoas e a convergência em ideais comuns que consigam unir vontades, sem excluir nem rejeitar ninguém”.

Vazio
O Papa advertiu para os perigos de crescimento que não leva em consideração o ser humano na sua condição integral.

“Se o crescimento for apenas material, corre-se sempre o risco de voltar a criar novas diferenças, de a abundância de uns ser construída sobre a escassez de outros. Por isso, além da transparência institucional, a coesão social requer um esforço na educação dos cidadãos”.
Ao reiterar a opção preferencial e evangélica da Igreja pelos últimos, Francisco cunhou a expressão “cultura da memória”.

Cultura da Memória
“Custodiar aos que hoje são descartados por tantos interesses que colocam ao centro da vida econômica o deus dinheiro. E são descartadas as crianças e o jovens que são o futuro do País, e os idosos que são a memória. Por isso, temos que cuidar e protegê-los, porque são nosso futuro”.

E finalizou: “A Igreja opta por gerar com este cuidado uma “cultura da memória” que garanta aos idosos não só a qualidade de vida nos seus últimos anos, assim como o calor e o carinho, como bem expressa a Constituição da Bolívia”.


ÍNTEGRA DO DISCURSO

No início desta visita pastoral, desejo dirigir a minha saudação a todos os homens e mulheres da Bolívia, com cordiais votos de paz e prosperidade. Agradeço ao Senhor Presidente do Estado Plurinacional da Bolívia a calorosa recepção que me deu e as suas amáveis palavras de boas-vindas. O meu agradecimento estende-se também aos Senhores Ministros e Autoridades do Estado, das Forças Armadas e da Polícia Nacional, que tiveram a bondade de me virem receber. Aos meus Irmãos no Episcopado, aos sacerdotes, religiosos, religiosas e fiéis cristãos, a toda a Igreja que peregrina na Bolívia, quero expressar-lhes os meus sentimentos de comunhão fraterna no Senhor. Reservo um lugar especial no coração para os filhos desta terra que, por várias razões, tiveram de procurar “outra terra” para os abrigar, outro lugar onde esta mãe os torne fecundos e possibilite a vida.

Sinto grande alegria por estar neste país de beleza singular, abençoado por Deus nas suas distintas áreas: o planalto, os vales, as terras amazônicas, os desertos, os lagos incomparáveis. É deste modo poético que o assinala o preâmbulo da vossa Constituição: “Em tempos imemoriais, ergueram-se montanhas, deslocaram-se rios, formaram-se lagos. A nossa Amazônia, o nosso pântano, o nosso planalto e as nossas planícies e vales cobriram-se de verdura e flores”. Isto faz-me lembrar que “o mundo é algo mais do que um problema a resolver; é um mistério agradável que contemplamos na alegria e no louvor» (LS 12 ). Mas, acima de tudo, é uma terra abençoada nas suas gentes, com a sua diversificada realidade cultural e étnica, que constitui uma grande riqueza e um apelo permanente ao respeito mútuo e ao diálogo: povos nativos milenários e povos nativos contemporâneos. Quanta alegria nos dá saber que a língua castelhana, trazida para estas terras, convive agora com 36 idiomas nativos, amalgamando-se – como fazem o vermelho e o amarelo, nas flores nacionais de kantuta e patujú – para conferir beleza e unidade ao que é diverso. Nesta terra e neste povo, radicou-se fortemente o anúncio do Evangelho, que, ao longo dos anos, foi iluminando a sociedade, contribuindo para o desenvolvimento do povo e promovendo a cultura.

Venho, como hóspede e peregrino, para confirmar a fé dos crentes em Cristo ressuscitado, a fim de que todos nós que acreditamos n’Ele, enquanto peregrinamos nesta vida, sejamos testemunhas do seu amor, fermento de um mundo melhor e colaboremos na construção duma sociedade mais justa e solidária.

A Bolívia tem dado passos importantes na inclusão de amplos sectores na vida econômica, social e política do país. Tem uma Constituição que reconhece os direitos dos indivíduos, das minorias, do meio ambiente, e instituições sensíveis a tais realidades. Tudo isto requer um espírito de cooperação dos cidadãos, de diálogo e participação dos indivíduos e dos atores sociais nas questões de interesse comum. O progresso integral dum povo inclui o crescimento em valores das pessoas e a convergência em ideais comuns que consigam unir vontades, sem excluir nem rejeitar ninguém. Se o crescimento for apenas material, corre-se sempre o risco de voltar a criar novas diferenças, de a abundância de uns ser construída sobre a escassez de outros. Por isso, além da transparência institucional, a coesão social requer um esforço na educação dos cidadãos.

Nestes dias, gostaria de animar a vocação dos discípulos de Cristo que é comunicar a alegria do Evangelho, ser sal da terra e luz do mundo. A voz dos Pastores, que tem de ser profética, fala à sociedade em nome da Igreja Mãe, partindo da sua opção evangélica preferencial pelos últimos. A caridade fraterna, viva expressão do mandamento novo de Jesus, traduz-se em programas, obras e instituições que buscam a promoção integral da pessoa bem como o cuidado e a protecção dos mais vulneráveis. Não se pode crer em Deus Pai sem ver um irmão em cada pessoa, e não se pode seguir Jesus sem dar a vida por quem Ele morreu na cruz.

Numa época em que se tende frequentemente a esquecer ou distorcer os valores fundamentais, a família merece uma atenção especial dos responsáveis pelo bem comum, porque é a célula básica da sociedade, que fornece sólidos vínculos de união sobre os quais se baseia a convivência humana e, com a geração e educação dos filhos, garante a renovação da sociedade.

A Igreja sente também uma preocupação especial pelos jovens que, comprometidos com a sua fé e com grandes ideais, são uma promessa de futuro, “vigias que anunciam a luz da alvorada e a nova primavera do Evangelho” (João Paulo II, Mensagem para a XVIII Jornada Mundial da Juventude, 6). Cuidar das crianças e fazer com que a juventude se comprometa em ideais nobres é garantia de futuro para uma sociedade. Uma sociedade que encontra a sua estabilidade quando valoriza, admira e salvaguarda os seus maiores; quando opta por gerar uma “cultura da memória” que garanta aos idosos não só a qualidade de vida nos seus últimos anos, mas também o carinho, como bem se exprime a vossa Constituição.

Senhor Presidente, queridos amigos, obrigado por estarem aqui! Estes dias permitir-nos-ão vários momentos de encontro, diálogo e celebração da fé. Faço-o com alegria, por estar nesta pátria que de si própria diz ser pacifista, que promove a cultura da paz e o direito à paz.
Coloco esta visita sob o amparo da Santíssima Virgem de Copacabana, Rainha da Bolívia, pedindo-Lhe que proteja todos os seus filhos. Muito obrigado e que o Senhor vos abençoe. Jallalla Bolívia!

Na Bolívia, Papa reza por jesuíta assassinado na ditadura

La Paz – Ao chegar à Bolívia nesta quarta-feira (08/07), segunda etapa de sua viagem à América Latina, no trajeto entre o aeroporto e La Paz, o Pontífice fez uma parada de alguns minutos no local simbólico onde o sacerdote jesuíta Luis Espinal Camps SJ foi assassinado pela ditadura de Garcia Meza, em 1980.

“Boa tarde, queridos irmãos e irmãs. Parei aqui para saudar vocês mas, sobretudo, para recordar. Recordar um irmão, um nosso irmão, vítima de interesses que não queriam que se lutasse pela liberdade da Bolívia. P. Espinal pregou o Evangelho e esse Evangelho encomodou e, por isso, o eliminaram”, disse o Papa antes de proferir a seguinte oração:

“Que o Senhor tenha em sua Glória ao Padre Luis Espinal, que pregou o Evangelho, este Evangelho que nos traz liberdade, que nos torna livres. Como todo filho de Deus, Jesus nos trouxe esta liberdade, e ele predicou este Evangelho. Que Jesus o tenha junto a Ele. Dê-lhe, Senhor, o descanso Eterno e o faça brilhar para a luz que não tem fim. Que descanse em paz”, disse o Papa ao abençoar todos os presentes.

História

Padre Luis, poeta, jornalista e cineasta, nasceu na Espanha em 2 de fevereiro de 1932. Entrou na Companhia de Jesus em 1949, sendo ordenado sacerdote em Barcelona em 1962. Enviado como missionário à Bolívia em 1968, exerceu atividade pastoral em defesa dos operários, também na mídia (Rádio Fides, televisão, filmes e livros). Participou das lutas sociais e de uma greve de fome de 19 dias, ao lado das famílias de mineradores, em 1977. Durante a ditadura de Luis Garcia Meza, um dos períodos mais sangrentos da história da Bolívia, Padre Luis foi preso em 21 de março de 1980 por paramilitares. Seu corpo com sinal de violência foi encontrado no dia seguinte, no Km 8 da estrada para o monte Chacaltaya, ao longo do Rio Choqueyapu.

O parecer de jesuítas bolivianos

A morte do jesuíta provocou forte comoção na população que participou em massa dos funerais realizados dia 24 de março em La Paz. Em 2007, o Presidente Evo Morales declarou com um decreto o dia 21 de março como “Dia do Cinema boliviano”, em comemoração ao aniversário do assassinato de Luis Espinal, em reconhecimento pela sua luta pelos direitos humanos e pela democracia, e em reconhecimento pela sua contribuição ao cinema na Bolívia.

Alguns jesuítas da Companhia de Jesus expressaram suas impressões e sentimentos sobre o gesto de Francisco, reconhecendo que é um reconhecimento do martírio de uma pessoa como tantas outras que ofereceram sua vida na defesa dos direitos humanos, da fé e da justiça. O Diretor do grupo Fides, Eduardo Pérez, admitiu que inicialmente não achou conveniente participar da organização do ato, porém, agora diz entender ser um gesto louvável de Francisco.

Simbólico

Já o antropólogo e linguista Xavier Albó, considerado o “autor intelectual” da homenagem. Considera-se feliz pelo gesto do Papa, não obstante seu desejo fosse levar o Papa Francisco até o local do assassinato. No entanto, a escassez de tempo impediu tal feito. “Pode não ser o mesmo local, porém é simbólico, pois por lá passou o corpo de Luis Espinal, já estava morto quando passou por lá. E me parece muito bom que agora passe por lá o Papa Francisco”.

Para o ecônomo, Fredy Quilo, a bênção de Francisco no local representa também um reconhecimento de todos os mártires da América Latina, católicos e não-católicos. Já para o Vigário Judicial, Miguel Manzanera, será difícil apresentar o caso de Luis Espinal como martírio, pois esteve associado a movimentos de caráter socialista e revolucionários, devendo, portanto, ser mais reconhecido pelo exemplo de coragem e de amor ao próximo e aos mais fracos.

Defensor da fé

Para o teólogo Víctor Colina, por sua vez, companheiro de Luis Espinal, com quem compartilhou muitas experiências dentro da Companhia de Jesus, Espinal foi um homem profundamente cristão, espiritual e de grande vivência mística, profética. Para ele, o gesto do Papa “é significativo, pois é um reconhecimento de que Espinal não era um homem perigoso, que se envolveu onde não lhe dizia respeito, mas um homem que defendeu a fé e a justiça”.

Por fim, o Provincial da Companhia de Jesus na Bolívia, Osvaldo Chirveches reconheceu que Espinal “não é patrimônio da congregação, mas de todo o povo boliviano, as pessoas recordam dele com carinho, pois foi um excelente seguidor de Jesus. Ademais, o Papa Francisco conhece muito bem este acontecimento e por isto o brindará com uma oração em memória de Espinal”.

Aos religiosos, o Papa diz não à ‘espiritualidade do zapping’

Santa Cruz de la Sierra – O “Coliseu Dom Bosco”, em Santa Cruz de la Sierra, acolheu num clima de muita alegria e expectativa, cerca de 4 mil religiosos e religiosas, seminaristas, sacerdotes e leigos consagrados para o encontro com o Papa Francisco.

Após ser saudado por Dom Roberto Bordi, Bispo encarregado pela Vida Consagrada e ouvir os testemunhos de um sacerdote, uma religiosa e um seminaristas, o Papa se pronunciou inspirando-se na experiência de Bartimeu, narrada no Evangelho de Marcos, lido precedentemente. O Evangelista – observou o Papa – parecia querer mostrar como as pessoas reagem perante o sofrimento de quem está na beira da estrada, da pessoa que está sentada sobre a sua dor. E “três são as respostas aos gritos do cego, e estas respostas tem atualidade”, disse o Papa: passar; cala-te e Coragem, levanta-te”.

Alguns passam – disse o Papa – e neste passa temos o eco da indiferença, “do passar ao lado dos problemas, procurando que estes não nos toquem. Não os ouvimos, não os reconhecemos, surdez”: “É a tentação de ver como coisa natural a dor, a tentação de habituar-se à injustiça. Eu estou aqui com Deus, com a vida consagrada, eleito por Jesus e para o ministério e é natural que existam doentes, pobres, pessoas que sofrem. É tão natural que não me chama a atenção um grito de alguém. Dizemos aqui para nós: é normal, sempre foi assim. É o eco que aparece num coração blindado, fechado, que perdeu a capacidade de admiração e, portanto, a possibilidade de mudança. Trata-se de um coração que se habituou a passar sem se deixar tocar; uma existência que, andando por aqui e por ali, não consegue radicar-se na vida do seu povo. Poderíamos chamá-la a espiritualidade do zapping. Passa e volta a passar, mas não fica nada. São aqueles que correm atrás da última novidade, do último «bestseller», mas não conseguem entrar em contacto, relacionar-se, envolver-se”.

Julgo – afirmou o Papa – que isto é o maior desafio da espiritualidade cristã. “Como podes amar a Deus que não vês e não amas o teu irmão que vês”. Eles acreditavam ouvir a voz do Senhor. Traduziam as suas palavras que passam pelo alambique de seu coração blindado. Dividir esta unidade é uma das grandes tentações que nos acompanharão ao longo de todo o caminho (…) “Passar, sem escutar a dor do nosso povo, sem nos radicarmos nas suas vidas, na sua terra, é como ouvir a Palavra de Deus sem deixar que lance raízes dentro de nós e seja fecunda. Uma planta, uma história sem raízes é uma vida seca”.

Cala-te

O calar é a segunda atitude perante o grito de Bartimeu. “Cala-te, não chateies, não perturbes”. Ao contrário da atitude anterior, esta escuta, reconhece, toma contato com o grito de outro. Sabe que está ali e reage duma forma muito simples: repreendendo. os padres, as religiosas, os bispos, os papas. É a atitude de quem, à frente do povo de Deus, continuamente o está repreendendo, resmungando, mandando-o calar. Mas, “façam neles um carinho, por favor. escutem-nos, digam que Jesus lhes ama. ‘Mas não posso, a criança chora na Igreja e estou pregando’. Como se o choro da criança não fosse uma sublime pregação”: “É o drama da consciência isolada, daqueles que pensam que a vida de Jesus é apenas para aqueles que consideram aptos. A seus olhos parece lícito que encontrem espaço apenas os «autorizados», uma «casta de pessoas diferentes» que pouco a pouco se separa, diferenciando-se do seu povo. Fizeram da identidade uma questão de superioridade”.

Ouvem mas não escutam; veem, mas não fixam o olhar. A necessidade de se diferenciar bloqueou- lhes o coração. A necessidade de dizer «eu não sou como ele, como eles» afastou-os não só do grito do seu povo e do seu pranto, mas também e particularmente dos motivos de alegria. Rir com aqueles que riem, chorar com os que choram: está aqui parte do mistério do coração sacerdotal.

Coragem, levanta-te

Por fim, encontramo-nos com o terceiro eco. Um eco que não nasce diretamente do grito de Bartimeu, mas de ver como Jesus se comportou perante o grito do cego mendicante. É um grito que se transforma em Palavra, em convite, em mudança, em proposta de novidade frente às nossas formas de reagir ao Povo Santo de Deus. Ao contrário dos outros que passavam, diz o Evangelho que Jesus Se deteve e perguntou que estava a acontecer: “Deteve-se perante o clamor duma pessoa. Sai do anonimato da multidão para o identificar, comprometendo-se assim com ele.

Radica-se na sua vida. E, longe de o mandar calar, pergunta: Que posso fazer por ti? Não precisa de diferenciar-se, separar-se, catalogá-lo para ver se está autorizado ou não a falar. Limita-se a fazer uma pergunta, a identificá-lo pretendendo ser parte da vida daquele homem, querendo assumir a sua própria sorte. Deste modo restitui-lhe gradualmente a dignidade que tinha perdido, faz a sua inclusão. Longe de olhá-lo de fora, esforça-se por se identificar com os problemas e, assim, manifestar a força transformadora da misericórdia. Não há compaixão que não se detenha, escute e solidarize com o outro”. A compaixão não é zapping, não é silenciar a dor; pelo contrário, é a lógica própria do amor. É a lógica que não está centrada no medo, mas na liberdade que nasce de amar e coloca o bem do outro acima de todas as coisas. É a lógica que nasce de não ter medo de se aproximar da dor do nosso povo. Embora muitas vezes se reduza a estar ao seu lado e fazer desse momento uma oportunidade de oração”.

Esta é a lógica do discipulado, frisou Francisco. Isto é o que faz o Espírito Santo conosco e em nós. “Um dia Jesus viu-nos à beira da estrada, sentados nas nossas dores, nas nossas misérias. Não silenciou os nossos gritos; antes, deteve-Se, aproximou-Se e perguntou que podia fazer por nós. E, graças a tantas testemunhas que nos disseram «coragem, levanta-te», gradualmente fomos tocando aquele amor misericordioso, aquele amor transformador que nos permitiu ver a luz. Não somos testemunhas de uma ideologia, uma receita, uma forma de fazer teologia. Somos testemunhas do amor sanador e misericordioso de Jesus. Somos testemunhas da sua intervenção na vida das nossas comunidades.

Esta é a pedagogia do Mestre; esta é a pedagogia de Deus com o seu Povo. Passar da indiferença do zapping à «coragem, levanta-te que [o Mestre] chama-te». E não porque somos especiais, não porque somos melhores, nem porque somos funcionários de Deus, mas apenas porque somos testemunhas agradecidas da misericórdia que nos transforma.

Não estamos sozinhos, neste caminho, encorajou o Papa. Ajudamo-nos uns aos outros com o exemplo e a oração. Estamos circundados por uma nuvem de testemunhas:

“Lembremos a Beata Nazária Ignacia de Santa Teresa de Jesús, que dedicou a sua vida ao anúncio do Reino de Deus cuidando dos idosos, com a «panela do pobre» para aqueles que não tinham nada para comer, abrindo orfanatos para crianças sem ninguém, hospitais para feridos da guerra, e até criando um sindicato feminino para a promoção da mulher. Lembremos também a Venerável Virgínia Blanco Tardío, devotada totalmente à evangelização e ao cuidado das pessoas pobres e doentes. Elas e muitos outros servem-nos de estímulo no nosso caminho. Vamos para diante com a ajuda de Deus e a cooperação de todos. O Senhor serve-Se de nós para que a sua luz chegue a todos os cantos da terra”.

O Papa concluiu abençoando a todos “de coração” e pedindo “rezem por mim”.

“Futuro da humanidade está nas mãos dos povos”

Santa Cruz de la Sierra  – “Precisamos e queremos uma mudança, uma mudança real, uma mudança das estruturas”. Ao concluir o II Encontro dos Movimentos Populares em Santa Cruz de la Sierra, o Papa Francisco pronunciou o mais longo e contundente discurso desta sua nona viagem apostólica internacional, denunciando a ambição desenfreada pelo dinheiro, as novas formas de colonialismo e as agressões ao meio-ambiente. O Pontífice afirmou que os “três T” – terra, teto e trabalho” são direitos sagrados pelos quais vale a pena lutar e propôs três grandes tarefas aos movimentos populares.

Ao começar falando da necessidade de mudanças, Francisco esclareceu que os problemas “têm uma matriz global” e que portanto dizem respeito à toda humanidade, chamando a atenção de que só reconhecemos que as coisas não vão bem quando explodem as guerras, a violência e a criação está ameaçada. O Papa reitera, que as diversas formas de exclusão não são questões isoladas, mas “têm um elo invisível” que as une, fruto de um sistema que “impõe a lógica do lucro a qualquer custo”, tornando-se uma situação insuportável para os camponeses, comunidades, povos e a irmã Terra, por isto, a necessidade de uma mudança:

“Queremos uma mudança nas nossas vidas, nos nossos bairros, no vilarejo, na nossa realidade mais próxima; mas uma mudança que toque também o mundo inteiro, porque hoje a interdependência global requer respostas globais para os problemas locais. A globalização da esperança, que nasce dos povos e cresce entre os pobres, deve substituir esta globalização da exclusão e da indiferença”.

Uma mudança positiva, redentora

O Papa explicou que a mudança “que queremos e precisamos” é uma mudança positiva, que nos faça bem, “redentora”. “Verifiquei nas minhas viagens “que existe uma expectativa, uma busca forte, um anseio de mudanças em todos os povos do mundo”. E uma insatisfação, “e sobretudo tristeza”, reina mesmo “dentro da minoria (…) que pensa sair beneficiada deste sistema”.

Dinheiro, o esterco do diabo

A terra, os povos e as pessoas estão sendo castigados de forma quase selvagem, e por trás deste sofrimento está o “esterco do diabo” (expressão usada por Basílio de Cesareia), “reina a ambição desenfreada do dinheiro”, e assim, “o serviço ao bem comum fica em segundo plano”:

“Quando o capital se torna um ídolo e dirige as opções dos seres humanos, quando a avidez do dinheiro domina todo o sistema socioeconômico, arruína a sociedade, condena o homem, transforma-o em escravo, destrói a fraternidade inter-humana, faz lutar povo contra povo e até, como vemos, põe em risco esta nossa casa comum”.

O destino está em vossas mãos

Para o Papa, não basta assinalar as causas estruturais do drama social e ambiental contemporâneo, pois “já sofremos de um certo excesso de diagnóstico”, que nos leva ao pessimismo e a pensar que nada podemos fazer além “de cuidar de nós mesmos e dos pequenos círculo da família e dos amigos”. “O futuro da humanidade – exclamou o Papa, dirigindo-se aos mais humildes, explorados, pobres e excluídos – está nas vossas mãos, na vossa capacidade de vos organizar e buscar alternativas criativas na busca diária dos “3 T” e na vossa participação como protagonistas nos grandes processos de mudanças nacionais, regionais e mundiais. Não se acanhem!”

Conversão das atitudes do coração

Francisco alertou, que uma “mudança de estruturas que não seja acompanhada de uma conversão sincera das atitudes e do coração, acaba a longo ou curto prazo por burocratizar-se, corromper-se e sucumbir”. Para evitar isto, enalteceu a “imagem do processo”, “onde a paixão por semear, por regar serenamente e que outros verão florescer, substitui a ansiedade de ocupar todos os espaços de poder disponíveis e de ver resultados imediatos”.

Os heroísmos cotidianos, vividos muitas vezes na “crueza da tormenta humana”, o trabalho aparentemente insignificante, as lutas, o apego ao bairro, à terra, ao território, levam a assumir tarefas comuns motivadas pelo amor fraterno:

“A entrega, a verdadeira entrega nasce do amor pelos homens e mulheres, crianças e idosos, vilarejos e comunidades… Rostos e nomes que enchem o coração. A partir destas sementes de esperança semeadas pacientemente nas periferias esquecidas do planeta, destes rebentos de ternura que lutam por subsistir na escuridão da exclusão, crescerão grandes árvores, surgirão bosques densos de esperança para oxigenar este mundo”.

O serviço da Igreja

O Papa encorajou os povos e suas organizações a construírem uma alternativa humana à globalização exclusiva, com criatividade, sem perder o apego às coisas próximas, mas construindo sobre bases sólidas, sobre as necessidades reais e a experiência. “Vós sois semeadores”, “mais cedo ou mais tarde vamos ver os frutos”. Neste sentido, o Santo Padre destacou o serviço da Igreja, que não deve ser alheia a este processo no anúncio do Evangelho:

“Muitos sacerdotes e agentes pastorais realizam uma tarefa imensa acompanhando e promovendo os excluídos em todo o mundo, ao lado de cooperativas, dando impulso a empreendimentos, construindo casas, trabalhando abnegadamente nas áreas da saúde, desporto e educação. Estou convencido de que a cooperação amistosa com os movimentos populares pode robustecer estes esforços e fortalecer os processos de mudança”.

As três tarefas dos movimentos populares

Para esta “mudança positiva” não existe uma receita. No entanto, o Papa propôs três grandes tarefas que requerem a decisiva contribuição do conjunto dos movimentos populares: colocar a economia a serviços dos povos, unir os povos no caminho da paz e da justiça e defender a Mãe Terra.

“A economia não deveria ser um mecanismo de acumulação, mas a condigna administração da casa comum”, o que implica em “cuidar adequadamente os bens entre todos”, observou o Papa, explicando que uma “economia verdadeiramente comunitária, de inspiração cristã” deveria garantir aos povos dignidade, prosperidade e civilização em seus múltiplos aspectos, que além dos três “T”, envolvem acesso à educação, à saúde, à inovação, às manifestações artísticas e culturais, ao esporte e à recreação:

“Uma economia justa deve criar as condições para que cada pessoa possa gozar duma infância sem privações, desenvolver os seus talentos durante a juventude, trabalhar com plenos direitos durante os anos de atividade e ter acesso a uma digna aposentação na velhice. É uma economia onde o ser humano, em harmonia com a natureza, estrutura todo o sistema de produção e distribuição de tal modo que as capacidades e necessidades de cada um encontrem um apoio adequado no ser social. Vós – e outros povos também – resumis este anseio duma maneira simples e bela: «viver bem»”.

A justa distribuição dos frutos da terra e do trabalho humano – afirmou o Pontífice – não é uma mera filantropia. É um dever moral. Para os cristãos, é um mandamento. “Trata-se de devolver aos pobres e às pessoas o que lhes pertence”. Os movimento sociais, neste sentido, têm um papel essencial, não apenas exigindo e reclamando, mas criando: “Vós sois poetas sociais!”. E quando o Estado e organizações assumem juntos a missão dos “3 T”, ativam-se os princípios de solidariedade e subsidiariedade que permitem construir o bem comum numa democracia plena e participativa.

Unir os povos no caminho da paz e da justiça

O Papa destacou que os povos do mundo querem ser artífices de seu próprio destino e nenhum poder constituído tem o direito de privar os países pobres do pleno exercício da sua soberania e quando o fazem, “vemos novas formas de colonialismo” que afetam as possibilidades de paz e de justiça.

Francisco volta-se para a realidade na América Latina, onde “os governos da região juntaram seus esforços para fazer respeitar a sua soberania”, “na forma como faziam os nossos antepassados”, para então exortar os movimentos populares a “cuidar e fazer crescer esta unidade”, evitando toda divisão.

Novo colonialismo

O novo colonialismo, nas suas diversas fisionomias – alertou o Papa – atenta contra este desenvolvimento humano equitativo e ameaça a soberania dos países da ‘Pátria Grande” e de outras latitudes do planeta:

“O novo colonialismo assume variadas fisionomias. Às vezes, é o poder anônimo do ídolo dinheiro: corporações, credores, alguns tratados denominados «de livre comércio» e a imposição de medidas de «austeridade» que sempre apertam o cinto dos trabalhadores e dos pobres. Os bispos latino-americanos denunciam-no muito claramente, no documento de Aparecida”.

Também os monopólios dos meios de comunicação social, como nova forma de colonialismo – denuncia o Papa – pretendem impor “padrões alienantes de consumo e certa uniformidade cultural”. E devemos dizer não às “velhas e novas formas de colonialismo”.

Para resolver os graves problemas da humanidade, é necessário a interação entre Estados e povos, a nível internacional, frisou o Santo Padre. Mas esta interação, “não é imposição”.

Perdão pelos pecados da Igreja na colonização

Referindo-se aos “muitos graves pecados contra os povos nativos da América, em nome de Deus”, também Francisco, como fizeram seus predecessores, pediu perdão, acrescentando:

“Peço-vos também a todos, crentes e não crentes, que se recordem de tantos bispos, sacerdotes e leigos que pregaram e pregam a boa nova de Jesus com coragem e mansidão, respeito e em paz; que, na sua passagem por esta vida, deixaram impressionantes obras de promoção humana e de amor, pondo-se muitas vezes ao lado dos povos indígenas ou acompanhando os próprios movimentos populares mesmo até ao martírio. A Igreja, os seus filhos e filhas, fazem parte da identidade dos povos na América Latina. Identidade que alguns poderes, tanto aqui como noutros países, se empenham por apagar, talvez porque a nossa fé é revolucionária, porque a nossa fé desafia a tirania do ídolo dinheiro”.

Defesa da Mãe terra

A covardia em defender a casa comum, que está sendo saqueada, devastada e vexada impunemente é um pecado grave, disse o Papa, que lamentou a falta de resultados nos sucessivos encontros internacionais sobre o tema. “Não se pode permitir que certos interesses – que são globais, mas não universais”, se imponham, submetendo Estados e organismos internacionais , e continuem a destruir a criação”.

Ao concluir, o Papa Francisco afirmou que “O futuro da humanidade não está unicamente nas mãos dos grandes dirigentes, das grandes potências e das elites. Está fundamentalmente nas mãos dos povos; na sua capacidade de se organizarem e também nas suas mãos que regem, com humildade e convicção, este processo de mudança. Estou convosco”.


ÍNTEGRA DO DISCURSO

Boa tarde a todos!
Há alguns meses, reunimo-nos em Roma e não esqueço aquele nosso primeiro encontro. Durante este tempo, trouxe-vos no meu coração e nas minhas orações. Alegra-me vê-los de novo aqui, debatendo os melhores caminhos para superar as graves situações de injustiça que padecem os excluídos em todo o mundo. Obrigado Senhor Presidente Evo Morales, por sustentar tão decididamente este Encontro.

Então, em Roma, senti algo muito belo: fraternidade, paixão, entrega, sede de justiça. Hoje, em Santa Cruz de la Sierra, volto a sentir o mesmo. Obrigado! Soube também, pelo Pontifício Conselho «Justiça e Paz» presidido pelo Cardeal Turkson, que são muitos na Igreja aqueles que se sentem mais próximos dos movimentos populares. Muito me alegro por isso! Ver a Igreja com as portas abertas a todos vós, que se envolve, acompanha e consegue sistematizar em cada diocese, em cada comissão «Justiça e Paz», uma colaboração real, permanente e comprometida com os movimentos populares. Convido-vos a todos, bispos, sacerdotes e leigos, juntamente com as organizações sociais das periferias urbanas e rurais a aprofundar este encontro.

Deus permitiu que nos voltássemos a ver hoje. A Bíblia lembra-nos que Deus escuta o clamor do seu povo e também eu quero voltar a unir a minha voz à vossa: terra, tecto e trabalho para todos os nossos irmãos e irmãs. Disse-o e repito: são direitos sagrados. Vale a pena, vale a pena lutar por eles. Que o clamor dos excluídos seja escutado na América Latina e em toda a terra.

1. Comecemos por reconhecer que precisamos duma mudança. Quero esclarecer, para que não haja mal-entendidos, que falo dos problemas comuns de todos os latino-americanos e, em geral, de toda a humanidade. Problemas, que têm uma matriz global e que actualmente nenhum Estado pode resolver por si mesmo. Feito este esclarecimento, proponho que nos coloquemos estas perguntas:

– Reconhecemos nós que as coisas não andam bem num mundo onde há tantos camponeses sem terra, tantas famílias sem tecto, tantos trabalhadores sem direitos, tantas pessoas feridas na sua dignidade?

– Reconhecemos nós que as coisas não andam bem, quando explodem tantas guerras sem sentido e a violência fratricida se apodera até dos nossos bairros? Reconhecemos nós que as coisas não andam bem, quando o solo, a água, o ar e todos os seres da criação estão sob ameaça constante?

Então digamo-lo sem medo: Precisamos e queremos uma mudança.

Nas vossas cartas e nos nossos encontros, relataram-me as múltiplas exclusões e injustiças que sofrem em cada actividade laboral, em cada bairro, em cada território. São tantas e tão variadas como muitas e diferentes são as formas próprias de as enfrentar. Mas há um elo invisível que une cada uma destas exclusões: conseguimos nós reconhecê-lo? É que não se trata de questões isoladas. Pergunto-me se somos capazes de reconhecer que estas realidades destrutivas correspondem a um sistema que se tornou global. Reconhecemos nós que este sistema impôs a lógica do lucro a todo o custo, sem pensar na exclusão social nem na destruição da natureza?

Se é assim – insisto – digamo-lo sem medo: Queremos uma mudança, uma mudança real, uma mudança de estruturas. Este sistema é insuportável: não o suportam os camponeses, não o suportam os trabalhadores, não o suportam as comunidades, não o suportam os povos…. E nem sequer o suporta a Terra, a irmã Mãe Terra, como dizia São Francisco.

Queremos uma mudança nas nossas vidas, nos nossos bairros, no vilarejo, na nossa realidade mais próxima; mas uma mudança que toque também o mundo inteiro, porque hoje a interdependência global requer respostas globais para os problemas locais. A globalização da esperança, que nasce dos povos e cresce entre os pobres, deve substituir esta globalização da exclusão e da indiferença.

Hoje quero reflectir convosco sobre a mudança que queremos e precisamos. Como sabem, recentemente escrevi sobre os problemas da mudança climática. Mas, desta vez, quero falar duma mudança noutro sentido. Uma mudança positiva, uma mudança que nos faça bem, uma mudança – poderíamos dizer – redentora. Porque é dela que precisamos. Sei que buscais uma mudança e não apenas vós: nos diferentes encontros, nas várias viagens, verifiquei que há uma expectativa, uma busca forte, um anseio de mudança em todos os povos do mundo. Mesmo dentro da minoria cada vez mais reduzida que pensa sair beneficiada deste sistema, reina a insatisfação e sobretudo a tristeza. Muitos esperam uma mudança que os liberte desta tristeza individualista que escraviza.

O tempo, irmãos e irmãs, o tempo parece exaurir-se; já não nos contentamos com lutar entre nós, mas chegamos até a assanhar-nos contra a nossa casa. Hoje, a comunidade científica aceita aquilo que os pobres já há muito denunciam: estão a produzir-se danos talvez irreversíveis no ecossistema. Está-se a castigar a terra, os povos e as pessoas de forma quase selvagem. E por trás de tanto sofrimento, tanta morte e destruição, sente-se o cheiro daquilo que Basílio de Cesareia chamava «o esterco do diabo»: reina a ambição desenfreada de dinheiro. O serviço ao bem comum fica em segundo plano. Quando o capital se torna um ídolo e dirige as opções dos seres humanos, quando a avidez do dinheiro domina todo o sistema socioecónomico, arruína a sociedade, condena o homem, transforma-o em escravo, destrói a fraternidade inter-humana, faz lutar povo contra povo e até, como vemos, põe em risco esta nossa casa comum.

Não quero alongar-me na descrição dos efeitos malignos desta ditadura subtil: vós conhecei-los! Mas também não basta assinalar as causas estruturais do drama social e ambiental contemporâneo. Sofremos de um certo excesso de diagnóstico, que às vezes nos leva a um pessimismo charlatão ou a rejubilar com o negativo. Ao ver a crónica negra de cada dia, pensamos que não haja nada que se possa fazer para além de cuidar de nós mesmos e do pequeno círculo da família e dos amigos.

Que posso fazer eu, recolhedor de papelão, catador de lixo, limpador, reciclador, frente a tantos problemas, se mal ganho para comer? Que posso fazer eu, artesão, vendedor ambulante, carregador, trabalhador irregular, se não tenho sequer direitos laborais? Que posso fazer eu, camponesa, indígena, pescador que dificilmente consigo resistir à propagação das grandes corporações? Que posso fazer eu, a partir da minha comunidade, do meu barraco, da minha povoação, da minha favela, quando sou diariamente discriminado e marginalizado? Que pode fazer aquele estudante, aquele jovem, aquele militante, aquele missionário que atravessa as favelas e os paradeiros com o coração cheio de sonhos, mas quase sem nenhuma solução para os meus problemas? Muito! Podem fazer muito. Vós, os mais humildes, os explorados, os pobres e excluídos, podeis e fazeis muito. Atrevo-me a dizer que o futuro da humanidade está, em grande medida, nas vossas mãos, na vossa capacidade de vos organizar e promover alternativas criativas na busca diária dos “3 T” (trabalho, teto, terra), e também na vossa participação como protagonistas nos grandes processos de mudança nacionais, regionais e mundiais. Não se acanhem!

2. Vós sois semeadores de mudança. Aqui, na Bolívia, ouvi uma frase de que gosto muito: «processo de mudança». A mudança concebida, não como algo que um dia chegará porque se impôs esta ou aquela opção política ou porque se estabeleceu esta ou aquela estrutura social. Sabemos, amargamente, que uma mudança de estruturas, que não seja acompanhada por uma conversão sincera das atitudes e do coração, acaba a longo ou curto prazo por burocratizar-se, corromper-se e sucumbir. Por isso gosto tanto da imagem do processo, onde a paixão por semear, por regar serenamente o que outros verão florescer, substitui a ansiedade de ocupar todos os espaços de poder disponíveis e de ver resultados imediatos. Cada um de nós é apenas uma parte de um todo complexo e diversificado interagindo no tempo: povos que lutam por uma afirmação, por um destino, por viver com dignidade, por «viver bem».

Vós, a partir dos movimentos populares, assumis as tarefas comuns motivados pelo amor fraterno, que se rebela contra a injustiça social. Quando olhamos o rosto dos que sofrem, o rosto do camponês ameaçado, do trabalhador excluído, do indígena oprimido, da família sem tecto, do imigrante perseguido, do jovem desempregado, da criança explorada, da mãe que perdeu o seu filho num tiroteio porque o bairro foi tomado pelo narcotráfico, do pai que perdeu a sua filha porque foi sujeita à escravidão; quando recordamos estes «rostos e nomes» estremecem-nos as entranhas diante de tanto sofrimento e comovemo-nos…. Porque «vimos e ouvimos», não a fria estatística, mas as feridas da humanidade dolorida, as nossas feridas, a nossa carne. Isto é muito diferente da teorização abstracta ou da indignação elegante. Isto comove-nos, move-nos e procuramos o outro para nos movermos juntos. Esta emoção feita acção comunitária é incompreensível apenas com a razão: tem um plus de sentido que só os povos entendem e que confere a sua mística particular aos verdadeiros movimentos populares.

Vós viveis, cada dia, imersos na crueza da tormenta humana. Falastes-me das vossas causas, partilhastes comigo as vossas lutas. E agradeço-vos. Queridos irmãos, muitas vezes trabalhais no insignificante, no que aparece ao vosso alcance, na realidade injusta que vos foi imposta e a que não vos resignais opondo uma resistência activa ao sistema idólatra que exclui, degrada e mata. Vi-vos trabalhar incansavelmente pela terra e a agricultura camponesa, pelos vossos territórios e comunidades, pela dignificação da economia popular, pela integração urbana das vossas favelas e agrupamentos, pela auto-construção de moradias e o desenvolvimento das infra-estruturas do bairro e em muitas actividades comunitárias que tendem à reafirmação de algo tão elementar e inegavelmente necessário como o direito aos “3 T”: terra, tecto e trabalho.

Este apego ao bairro, à terra, ao território, à profissão, à corporação, este reconhecer-se no rosto do outro, esta proximidade no dia-a-dia, com as suas misérias e os seus heroísmos quotidianos, é o que permite realizar o mandamento do amor, não a partir de ideias ou conceitos, mas a partir do genuíno encontro entre pessoas, porque não se amam os conceitos nem as ideias; amam-se as pessoas. A entrega, a verdadeira entrega nasce do amor pelos homens e mulheres, crianças e idosos, vilarejos e comunidades… Rostos e nomes que enchem o coração. A partir destas sementes de esperança semeadas pacientemente nas periferias esquecidas do planeta, destes rebentos de ternura que lutam por subsistir na escuridão da exclusão, crescerão grandes árvores, surgirão bosques densos de esperança para oxigenar este mundo.

Vejo, com alegria, que trabalhais no que aparece ao vosso alcance, cuidando dos rebentos; mas, ao mesmo tempo, com uma perspectiva mais ampla, protegendo o arvoredo. Trabalhais numa perspectiva que não só aborda a realidade sectorial que cada um de vós representa e na qual felizmente está enraizada, mas procurais também resolver, na sua raiz, os problemas gerais de pobreza, desigualdade e exclusão.

Felicito-vos por isso. É imprescindível que, a par da reivindicação dos seus legítimos direitos, os povos e as suas organizações sociais construam uma alternativa humana à globalização exclusiva. Vós sois semeadores de mudança. Que Deus vos dê coragem, alegria, perseverança e paixão para continuar a semear. Podeis ter a certeza de que, mais cedo ou mais tarde, vamos ver os frutos. Peço aos dirigentes: sede criativos e nunca percais o apego às coisas próximas, porque o pai da mentira sabe usurpar palavras nobres, promover modas intelectuais e adoptar posições ideológicas, mas se construirdes sobre bases sólidas, sobre as necessidades reais e a experiência viva dos vossos irmãos, dos camponeses e indígenas, dos trabalhadores excluídos e famílias marginalizadas, de certeza não vos equivocareis.

A Igreja não pode nem deve ser alheia a este processo no anúncio do Evangelho. Muitos sacerdotes e agentes pastorais realizam uma tarefa imensa acompanhando e promovendo os excluídos em todo o mundo, ao lado de cooperativas, dando impulso a empreendimentos, construindo casas, trabalhando abnegadamente nas áreas da saúde, desporto e educação. Estou convencido de que a cooperação amistosa com os movimentos populares pode robustecer estes esforços e fortalecer os processos de mudança.

No coração, tenhamos sempre a Virgem Maria, uma jovem humilde duma pequena aldeia perdida na periferia dum grande império, uma mãe sem tecto que soube transformar um curral de animais na casa de Jesus com uns pobres paninhos e uma montanha de ternura. Maria é sinal de esperança para os povos que sofrem dores de parto até que brote a justiça. Rezo à Virgem do Carmo, padroeira da Bolívia, para fazer com que este nosso Encontro seja fermento de mudança.

3. Por último, gostaria que refletíssemos, juntos, sobre algumas tarefas importantes neste momento histórico, pois queremos uma mudança positiva em benefício de todos os nossos irmãos e irmãs. Disto estamos certos! Queremos uma mudança que se enriqueça com o trabalho conjunto de governos, movimentos populares e outras forças sociais. Sabemos isto também! Mas não é tão fácil definir o conteúdo da mudança, ou seja, o programa social que reflita este projeto de fraternidade e justiça que esperamos. Neste sentido, não esperem uma receita deste Papa. Nem o Papa nem a Igreja têm o monopólio da interpretação da realidade social e da proposta de soluções para os problemas contemporâneos. Atrever-me-ia a dizer que não existe uma receita. A história é construída pelas gerações que se vão sucedendo no horizonte de povos que avançam individuando o próprio caminho e respeitando os valores que Deus colocou no coração.

Gostaria, no entanto, de vos propor três grandes tarefas que requerem a decisiva contribuição do conjunto dos movimentos populares:
3.1 A primeira tarefa é pôr a economia ao serviço dos povos.

Os seres humanos e a natureza não devem estar ao serviço do dinheiro. Digamos NÃO a uma economia de exclusão e desigualdade, onde o dinheiro reina em vez de servir. Esta economia mata. Esta economia exclui. Esta economia destrói a Mãe Terra.

A economia não deveria ser um mecanismo de acumulação, mas a condigna administração da casa comum. Isto implica cuidar zelosamente da casa e distribuir adequadamente os bens entre todos. A sua finalidade não é unicamente garantir o alimento ou um «decoroso sustento». Não é sequer, embora fosse já um grande passo, garantir o acesso aos “3 T” pelos quais combateis. Uma economia verdadeiramente comunitária – poder-se-ia dizer, uma economia de inspiração cristã – deve garantir aos povos dignidade, «prosperidade e civilização em seus múltiplos aspectos». Isto envolve os “3 T” mas também acesso à educação, à saúde, à inovação, às manifestações artísticas e culturais, à comunicação, ao desporto e à recreação. Uma economia justa deve criar as condições para que cada pessoa possa gozar duma infância sem privações, desenvolver os seus talentos durante a juventude, trabalhar com plenos direitos durante os anos de atividade e ter acesso a uma digna aposentação na velhice. É uma economia onde o ser humano, em harmonia com a natureza, estrutura todo o sistema de produção e distribuição de tal modo que as capacidades e necessidades de cada um encontrem um apoio adequado no ser social. Vós – e outros povos também – resumis este anseio duma maneira simples e bela: «viver bem».

Esta economia é não apenas desejável e necessária, mas também possível. Não é uma utopia, nem uma fantasia. É uma perspectiva extremamente realista. Podemos consegui-la. Os recursos disponíveis no mundo, fruto do trabalho intergeneracional dos povos e dos dons da criação, são mais que suficientes para o desenvolvimento integral de «todos os homens e do homem todo». Mas o problema é outro. Existe um sistema com outros objetivos. Um sistema que, apesar de acelerar irresponsavelmente os ritmos da produção, apesar de implementar métodos na indústria e na agricultura que sacrificam a Mãe Terra na ara da «produtividade», continua a negar a milhares de milhões de irmãos os mais elementares direitos econômicos, sociais e culturais. Este sistema atenta contra o projeto de Jesus.

A justa distribuição dos frutos da terra e do trabalho humano não é mera filantropia. É um dever moral. Para os cristãos, o encargo é ainda mais forte: é um mandamento. Trata-se de devolver aos pobres e às pessoas o que lhes pertence. O destino universal dos bens não é um adorno retórico da doutrina social da Igreja. É uma realidade anterior à propriedade privada. A propriedade, sobretudo quando afeta os recursos naturais, deve estar sempre em função das necessidades das pessoas. E estas necessidades não se limitam ao consumo. Não basta deixar cair algumas gotas, quando os pobres agitam este copo que, por si só, nunca derrama. Os planos de assistência que acodem a certas emergências deveriam ser pensados apenas como respostas transitórias. Nunca poderão substituir a verdadeira inclusão: a inclusão que dá o trabalho digno, livre, criativo, participativo e solidário.

Neste caminho, os movimentos populares têm um papel essencial, não apenas exigindo e reclamando, mas fundamentalmente criando. Vós sois poetas sociais: criadores de trabalho, construtores de casas, produtores de alimentos, sobretudo para os descartados pelo mercado global.

Conheci de perto várias experiências, onde os trabalhadores, unidos em cooperativas e outras formas de organização comunitária, conseguiram criar trabalho onde só havia sobras da economia idólatra. As empresas recuperadas, as feiras francas e as cooperativas de catadores de papelão são exemplos desta economia popular que surge da exclusão e que pouco a pouco, com esforço e paciência, adota formas solidárias que a dignificam. Quão diferente é isto do facto de os descartados pelo mercado formal serem explorados como escravos!

Os governos que assumem como própria a tarefa de colocar a economia ao serviço das pessoas devem promover o fortalecimento, melhoria, coordenação e expansão destas formas de economia popular e produção comunitária. Isto implica melhorar os processos de trabalho, prover de adequadas infra-estruturas e garantir plenos direitos aos trabalhadores deste sector alternativo. Quando Estado e organizações sociais assumem, juntos, a missão dos “3 T”, ativam-se os princípios de solidariedade e subsidiariedade que permitem construir o bem comum numa democracia plena e participativa.

3.2 A segunda tarefa é unir os nossos povos no caminho da paz e da justiça.
Os povos do mundo querem ser artífices do seu próprio destino. Querem caminhar em paz para a justiça. Não querem tutelas nem interferências, onde o mais forte subordina o mais fraco. Querem que a sua cultura, o seu idioma, os seus processos sociais e tradições religiosas sejam respeitados. Nenhum poder efetivamente constituído tem direito de privar os países pobres do pleno exercício da sua soberania e, quando o fazem, vemos novas formas de colonialismo que afetam seriamente as possibilidades de paz e justiça, porque «a paz funda-se não só no respeito pelos direitos do homem, mas também no respeito pelo direito dos povos, sobretudo o direito à independência».

Os povos da América Latina alcançaram, com um parto doloroso, a sua independência política e, desde então, viveram já quase dois séculos duma história dramática e cheia de contradições procurando conquistar uma independência plena.

Nos últimos anos, depois de tantos mal-entendidos, muitos países latino-americanos viram crescer a fraternidade entre os seus povos. Os governos da região juntaram seus esforços para fazer respeitar a sua soberania, a de cada país e a da região como um todo que, de forma muito bela como faziam os nossos antepassados, chamam a «Pátria Grande». Peço-vos, irmãos e irmãs dos movimentos populares, que cuidem e façam crescer esta unidade. É necessário manter a unidade contra toda a tentativa de divisão, para que a região cresça em paz e justiça.

Apesar destes avanços, ainda subsistem factores que atentam contra este desenvolvimento humano equitativo e coarctam a soberania dos países da «Pátria Grande» e doutras latitudes do Planeta. O novo colonialismo assume variadas fisionomias. Às vezes, é o poder anônimo do ídolo dinheiro: corporações, credores, alguns tratados denominados «de livre comércio» e a imposição de medidas de «austeridade» que sempre apertam o cinto dos trabalhadores e dos pobres. Os bispos latino-americanos denunciam-no muito claramente, no documento de Aparecida, quando afirmam que «as instituições financeiras e as empresas transnacionais se fortalecem ao ponto de subordinar as economias locais, sobretudo debilitando os Estados, que aparecem cada vez mais impotentes para levar adiante projetos de desenvolvimento a serviço de suas populações». Noutras ocasiões, sob o nobre disfarce da luta contra a corrupção, o narcotráfico ou o terrorismo – graves males dos nossos tempos que requerem uma ação internacional coordenada – vemos que se impõem aos Estados medidas que pouco têm a ver com a resolução de tais problemáticas e muitas vezes tornam as coisas piores.

Da mesma forma, a concentração monopolista dos meios de comunicação social que pretende impor padrões alienantes de consumo e certa uniformidade cultural é outra das formas que adota o novo colonialismo. É o colonialismo ideológico. Como dizem os bispos da África, muitas vezes pretende-se converter os países pobres em «peças de um mecanismo, partes de uma engrenagem gigante».

Temos de reconhecer que nenhum dos graves problemas da humanidade pode ser resolvido sem a interação dos Estados e dos povos a nível internacional. Qualquer ato de envergadura realizado numa parte do Planeta repercute-se no todo em termos econômicos, ecológicos, sociais e culturais. Até o crime e a violência se globalizaram. Por isso, nenhum governo pode atuar à margem duma responsabilidade comum. Se queremos realmente uma mudança positiva, temos de assumir humildemente a nossa interdependência. Mas interação não é sinônimo de imposição, não é subordinação de uns em função dos interesses dos outros. O colonialismo, novo e velho, que reduz os países pobres a meros fornecedores de matérias-primas e mão de obra barata, gera violência, miséria, emigrações forçadas e todos os males que vêm juntos… precisamente porque, ao pôr a periferia em função do centro, nega-lhes o direito a um desenvolvimento integral. Isto é desigualdade, e a desigualdade gera violência que nenhum recurso policial, militar ou dos serviços secretos será capaz de deter.

Digamos NÃO às velhas e novas formas de colonialismo. Digamos SIM ao encontro entre povos e culturas. Bem-aventurados os que trabalham pela paz.
Aqui quero deter-me num tema importante. É que alguém poderá, com direito, dizer: «Quando o Papa fala de colonialismo, esquece-se de certas ações da Igreja». Com pesar, vo-lo digo: Cometeram-se muitos e graves pecados contra os povos nativos da América, em nome de Deus. Reconheceram-no os meus antecessores, afirmou-o o CELAM e quero reafirmá-lo eu também. Como São João Paulo II, peço que a Igreja «se ajoelhe diante de Deus e implore o perdão para os pecados passados e presentes dos seus filhos». E eu quero dizer-vos, quero ser muito claro, como foi São João Paulo II: Peço humildemente perdão, não só para as ofensas da própria Igreja, mas também para os crimes contra os povos nativos durante a chamada conquista da América.

Peço-vos também a todos, crentes e não crentes, que se recordem de tantos bispos, sacerdotes e leigos que pregaram e pregam a boa nova de Jesus com coragem e mansidão, respeito e em paz; que, na sua passagem por esta vida, deixaram impressionantes obras de promoção humana e de amor, pondo-se muitas vezes ao lado dos povos indígenas ou acompanhando os próprios movimentos populares mesmo até ao martírio. A Igreja, os seus filhos e filhas, fazem parte da identidade dos povos na América Latina. Identidade que alguns poderes, tanto aqui como noutros países, se empenham por apagar, talvez porque a nossa fé é revolucionária, porque a nossa fé desafia a tirania do ídolo dinheiro. Hoje vemos, com horror, como no Médio Oriente e noutros lugares do mundo se persegue, tortura, assassina a muitos irmãos nossos pela sua fé em Jesus. Isto também devemos denunciá-lo: dentro desta terceira guerra mundial em parcelas que vivemos, há uma espécie de genocídio em curso que deve cessar.

Aos irmãos e irmãs do movimento indígena latino-americano, deixem-me expressar a minha mais profunda estima e felicitá-los por procurarem a conjugação dos seus povos e culturas segundo uma forma de convivência, a que eu chamo poliédrica, onde as partes conservam a sua identidade construindo, juntas, uma pluralidade que não atenta contra a unidade, mas fortalece-a. A sua procura desta interculturalidade que conjuga a reafirmação dos direitos dos povos nativos com o respeito à integridade territorial dos Estados enriquece-nos e fortalece-nos a todos.

3.3 A terceira tarefa, e talvez a mais importante que devemos assumir hoje, é defender a Mãe Terra.

A casa comum de todos nós está a ser saqueada, devastada, vexada impunemente. A covardia em defendê-la é um pecado grave. Vemos, com crescente decepção, sucederem-se uma após outra cimeiras internacionais sem qualquer resultado importante. Existe um claro, definitivo e inadiável imperativo ético de atuar que não está a ser cumprido. Não se pode permitir que certos interesses – que são globais, mas não universais – se imponham, submetendo Estados e organismos internacionais, e continuem a destruir a criação. Os povos e os seus movimentos são chamados a clamar, mobilizar-se, exigir – pacífica mas tenazmente – a adoção urgente de medidas apropriadas. Peço-vos, em nome de Deus, que defendais a Mãe Terra. Sobre este assunto, expressei-me devidamente na carta encíclica Laudato si’.

4. Para concluir, quero dizer-lhes novamente: O futuro da humanidade não está unicamente nas mãos dos grandes dirigentes, das grandes potências e das elites. Está fundamentalmente nas mãos dos povos; na sua capacidade de se organizarem e também nas suas mãos que regem, com humildade e convicção, este processo de mudança. Estou convosco. Digamos juntos do fundo do coração: nenhuma família sem tecto, nenhum camponês sem terra, nenhum trabalhador sem direitos, nenhum povo sem soberania, nenhuma pessoa sem dignidade, nenhuma criança sem infância, nenhum jovem sem possibilidades, nenhum idoso sem uma veneranda velhice. Continuai com a vossa luta e, por favor, cuidai bem da Mãe Terra. Rezo por vós, rezo convosco e quero pedir a nosso Pai Deus que vos acompanhe e abençoe, que vos cumule do seu amor e defenda no caminho concedendo-vos, em abundância, aquela força que nos mantém de pé: esta força é a esperança, a esperança que não decepciona. Obrigado! E peço-vos, por favor, que rezeis por mim.

Santuário de Caacupé: “Aqui estamos em casa”

Terminada a visita ao Hospital Pediátrico “Niños de Acosta Ñú” o Papa Francisco dirigiu-se ao Santuário Mariano de Caacupé, onde presidiu à Eucaristia, com Missa votiva da Imaculada Conceição da Bem-aventurada Virgem Maria, e cantos em espanhol e língua indígena guaraní.

Na sua homilia o Papa começou por sublinhar a importância do Santuário como casa de todos os crentes, um lugar de festa, de encontro, de família, lugar onde se vai para pedir perdão para recomeçar de novo, e para lá se leva a vida concreta e se renovam as energias para viver a alegria do evangelho. E falando do Santuário de Caacupé, disse o Papa: “Muitos batismos, muitas vocações sacerdotais e religiosas, muitos namoros e matrimônios nasceram aos pés da nossa Mãe. Muitas lágrimas e despedidas. Vimos sempre com a nossa vida, porque aqui estamos em casa e o melhor de tudo é saber que há alguém que nos espera”.

Tal é a importância do Santuário de Caacupé para o povo paraguaio. E, comentando a passagem do Evangelho, Francisco falou de Maria que disse “sim” ao projeto, à vontade de Deus, um “sim” que não foi nada fácil de viver, disse o Papa, porque não lhe encheu de privilégios mas, pelo contrário,  “uma espada trespassaria a sua alma”, como lhe disse Simeão no Templo. Mas nós vemos nela uma verdadeira mãe que nos ajuda a manter vivas a fé e a esperança no meio de situações complicadas, ela é a mulher de fé, é a Mãe da Igreja, e a sua vida é a prova de que Deus não decepciona, não abandona o seu povo, mesmo que haja momentos ou situações em que parece que Ele não está lá, disse o Papa Francisco percorrendo em seguida, brevemente, os três momentos difíceis na vida de Maria: no nascimento de Jesus em que, para acolher o filho, o único lugar disponível era um estábulo de animais; a fuga para o Egipto, pois a sua vida estava em perigo e tiveram de ser migrantes pela ganância e a avareza do imperador; e a morte na cruz:

“Não deve haver situação mais difícil para uma mãe do que acompanhar a morte de um filho. São momentos lancinantes. Lá, ao pé da cruz, vemos Maria, como qualquer mãe, firme, sem abandonar, mas acompanhando o seu filho até ao momento extremo da morte e morte de cruz. E aqui também ela poderia ter-se perguntado: Mas onde está aquilo que o Anjo Me disse? Mas em seguida a vemos contendo e sustentando os discípulos”.

E Maria quis permanecer no meio do seu Povo – prosseguiu o Papa – com os seus filhos, com a sua família, sempre seguindo Jesus, do lado da multidão. Não tem um programa próprio, não vem para nos dizer nada de novo, mas apenas que a sua fé acompanha a nossa fé. Ela sempre esteve e continua a estar nos nossos hospitais, nas nossas escolas, nas nossas casas. Esteve e continua a estar conosco no trabalho e no caminho. Esteve e continua a estar na mesa de cada casa. Esteve e continua a estar na formação da Pátria, fazendo de nós uma Nação. Sempre com uma presença discreta e silenciosa: no olhar de uma efígie de uma pequena imagem ou uma medalha. Sob o sinal de um rosário, sabemos que não estamos sozinhos.

E por último o Papa referiu-se particularmente às mulheres e mães do Paraguai que, com muita coragem e abnegação, souberam levantar um País destruído e submerso pela guerra: “E quero referir-me de modo especial a vós, mulheres e mães paraguaias que, com grande coragem e abnegação, soubestes levantar um país derrotado, afundado, submerso pela guerra. Vós tendes a memória, o DNA daquelas que reconstruíram a vida, a fé, a dignidade do seu povo. Como Maria, vivestes situações muito, muito difíceis que, vistas sob uma lógica comum, poriam em causa toda a fé. Pelo contrário vós, como Maria, impelidas e sustentadas pelo seu exemplo, continuastes crentes, inclusive «com uma esperança para além do que se podia esperar» … Deus abençoe e anime a vossa fé, Deus abençoe a mulher paraguaia, a mais gloriosa da América”.

E Francisco terminou com um apelo a não perder a memória, as raízes, os inúmeros testemunhos que receberam de povo crente, comprovado pelas suas lutas, uma fé que se fez vida, uma vida que se fez esperança e – sublinhou – uma esperança que vos leva a «primeirear» na caridade, pois como Jesus «primeireou» no amor, sede vós os portadores desta fé, desta vida, desta esperança, sede vós os forjadores deste hoje e do amanhã paraguaio, disse o Papa convidando a todos a olhar para a imagem de Maria e rezar para que sejamos dignos de alcançar as promessas e graças de nosso Senhor Jesus Cristo.


ÍNTEGRA DA HOMILIA

Estar aqui convosco é sentir-me em casa, aos pés da nossa Mãe, a Virgem dos Milagres de Caacupé. Num santuário, nós, filhos, encontramo-nos com a nossa Mãe e lembramo-nos de que somos irmãos uns dos outros. É um lugar de festa, de encontro, de família. Vimos apresentar as nossas necessidades, vimos agradecer, pedir perdão e recomeçar. Muitos batismos, muitas vocações sacerdotais e religiosas, muitos namoros e matrimónios nasceram aos pés da nossa Mãe. Muitas lágrimas e despedidas. Vimos sempre com a nossa vida, porque aqui estamos em casa e o melhor de tudo é saber que há alguém que nos espera.

Como tantas outras vezes, viemos porque queremos renovar a paixão de viver a alegria do Evangelho.

Como não reconhecer que este santuário é parte vital do povo paraguaio, parte da vossa vida. Assim o sentis, assim o rezais, assim o cantais: «No teu Éden de Caacupé, é o teu povo, Virgem pura, que Te dá o seu amor e fé». E estamos hoje, como Povo de Deus, aos pés da nossa Mãe para Lhe dar o nosso amor e fé.

No Evangelho, acabámos de ouvir o anúncio do Anjo a Maria com estas palavras: Alegra-Te, ó cheia de graça, o Senhor está contigo. Alegra-Te, Maria; alegra-Te! Perante esta saudação, Ela ficou perplexa e interrogava-Se acerca do seu significado. Não entende grande coisa do que estava a acontecer; mas soube que vinha de Deus e disse: Sim. Maria é a Mãe do Sim. Sim ao sonho de Deus, sim ao projeto de Deus, sim à vontade de Deus.

Um sim que não foi nada fácil de viver, como sabemos. Um sim, que não a cumulou de privilégios nem distinções; antes, como Lhe dirá Simeão na sua profecia, «uma espada [Lhe] trespassará a alma» (Lc 2, 35) E sabemos que a trespassou… Por isso A amamos tanto, encontrando n’Ela uma verdadeira Mãe que nos ajuda a manter viva a fé e a esperança no meio das situações mais complicadas. Seguindo a profecia de Simeão, far-nos-á bem rever brevemente três momentos difíceis na vida de Maria.

  1. Primeiro: o nascimento de Jesus. Não havia lugar para eles. Não tinham uma casa, uma morada para receber o seu filho. Não havia lugar, onde pudesse dar à luz. Nem família por perto, estavam sozinhos. O único lugar disponível era um curral de animais. E, na sua memória, ecoavam certamente as palavras do Anjo: Alegra-Te, Maria, o Senhor está contigo. E poderia ter-Se perguntado: Onde está Ele agora?
  2. Segundo momento: a fuga para o Egito. Tiveram de partir, exilar-Se. Em Belém, não só não havia lugar nem família, mas até mesmo as suas vidas corriam perigo. Tiveram que sair, partindo para uma terra estrangeira. Foram emigrantes perseguidos pela cobiça e a ganância do Rei Herodes. E lá ela também poderia ter-se perguntado: Onde está aquilo que o Anjo Me disse?
  3. Terceiro momento: a morte na cruz. Não deve haver uma situação mais difícil para uma mãe do que acompanhar a morte do seu filho. São momentos lancinantes. Lá, ao pé da cruz, vemos Maria, como qualquer mãe, firme, sem abandonar, mas acompanhando seu filho até ao momento extremo da morte e morte de cruz. E lá também poderia ter-se perguntado: Onde está aquilo que o Anjo Me disse? Em seguida, a vemos contendo e sustentando os discípulos.
  4. Contemplamos a sua vida e sentimo-nos compreendidos, entendidos. Podemos sentar-nos a rezar e usar uma linguagem comum a tantas situações que vivemos diariamente. Podemo-nos identificar com muitas situações da sua vida. Contar-Lhe as nossas coisas, porque Ela entende-as.
  5. Ela é mulher de fé, é a Mãe da Igreja, Ela acreditou. A sua vida é testemunha de que Deus não decepciona, que Deus não abandona o seu Povo, embora existam momentos ou situações onde parece que Ele não está. Ela foi a primeira discípula que acompanhou seu Filho e sustentou a esperança dos apóstolos nos momentos difíceis. Estavam trancados com não sei quantas chaves, com medo, no cenáculo. Foi a mulher que esteve atenta e soube dizer – quando parecia ser o fim da festa e da alegria –: «Não têm vinho!» (Jo 2, 3). Foi a mulher que soube ir e ficar com a sua prima «cerca de três meses» (Lc 1, 56), para esta não estar sozinha no parto. Esta é nossa mãe, tão boa, tão generosa, tão presente acompanhando-nos na nossa vida.
  6. Sabemos tudo isto pelo Evangelho; mas também sabemos que, nesta terra, é a Mãe que esteve ao nosso lado em muitas situações difíceis. Este santuário guarda como um tesouro a memória de um Povo que sabe que Maria é Mãe, que esteve e está ao lado dos seus filhos.
  7. Esteve e está nos nossos hospitais, nas nossas escolas, nas nossas casas. Esteve e está nos nossos trabalhos e nos nossos caminhos. Esteve e está à mesa de cada lar. Esteve e está na formação da Pátria, fazendo-nos uma Nação. Sempre com uma presença discreta e silenciosa. Quando olhamos uma imagem, um santinho ou uma medalha, o sinal dum terço, sabemos que não andamos sozinhos, porque ela nos acompanha.
  8. E por que motivo? Porque Maria simplesmente quis estar no meio de seu Povo, com os seus filhos, com a sua família. Seguindo sempre Jesus, no meio da multidão. Como boa mãe, não abandonou os seus; antes pelo contrário, sempre apareceu onde um filho podia ter necessidade d’Ela. E isto, só porque é Mãe.
  9. Uma Mãe que aprendeu a ouvir e a viver, no meio de tantas dificuldades, aquele «não temas, o Senhor está contigo». Uma Mãe que continua a dizer-nos: «Fazei o que Ele vos disser». Este é o seu convite constante e contínuo: «Fazei o que Ele vos disser». Não tem um programa próprio, não vem dizer-nos nada de novo; antes, ela gosta de ficar calada, apenas a sua fé acompanha a nossa fé.
  10. Vós sabeis isto, experimentastes o que estamos a partilhar convosco. Todos vós, todos os paraguaios têm a memória viva de um Povo que encarnou estas palavras do Evangelho. E quero referir-me de modo especial a vós, mulheres e mães paraguaias, que, com grande coragem e dedicação, soubestes levantar um país derrotado, afundado, submerso por uma guerra iniqua.
  11. Vós tendes a memória, vós tendes o DNA daquelas que reconstruíram a vida, a fé, a dignidade do seu povo, junto com Maria. Vivestes situações muito, muito difíceis, que, vistas sob uma lógica comum, poriam em causa toda a fé. Pelo contrário vós impelidas e sustentadas pela Virgem Maria, continuastes crentes, inclusive «com uma esperança para além do que se podia esperar» (Rm 4, 18). E quando tudo parecia desmoronar-se, dizíeis juntamente com Maria: Não temamos! O Senhor está conosco, está com o nosso povo, com as nossas famílias; façamos o que Ele nos disser. E assim encontrastes ontem e encontrais hoje força para não deixar que esta terra caia no caos. Deus abençoe esta tenacidade, Deus vos abençoe e anime, Deus abençoe a mulher paraguaia, a mais gloriosa da América.
  12. Como povo, viemos à nossa casa, à casa da Pátria paraguaia, para ouvir mais uma vez estas palavras que nos fazem muito bem: «Alegra-te, o Senhor está contigo». São um apelo a não perder a memória, a não perder as raízes, os inúmeros testemunhos que receberam de povo crente, comprovado pelas suas lutas. Uma fé que se fez vida, uma vida que se fez esperança e uma esperança que vos leva a «primeirear» na caridade. Sim, como Jesus, continuem a «primeirear» no amor. Sede vós os portadores desta fé, desta vida, desta esperança. Vós, paraguaios, sede forjadores deste hoje e do amanhã.
  13. Voltando o olhar para a imagem de Maria, convido-vos a dizer juntos: «No teu Éden de Caacupé, é o teu povo, Virgem pura, que Te dá o seu amor e fé». Todos juntos: «No teu Éden de Caacupé, é o teu povo, Virgem pura, que Te dá o seu amor e fé». Rogai por nós, Santa Mãe de Deus, para que sejamos dignos de alcançar as promessas e graças de nosso Senhor Jesus Cristo. Amen.

HOMILIA DO SANTO PADRE

Praça do Santuário Mariano de Caacupé, Assunção, Paraguai

Sábado, 11 de Julho de 2015


Papa: povo que esquece sua história é um povo seco

Foi debaixo de uma chuva intensa que o Papa Francisco chegou à cidade de Assunção, capital do Paraguai nesta sexta-feira dia 10 de julho. O mau tempo não desencorajou os paraguaios que vieram em massa pelas estradas para saudar o Santo Padre.

No aeroporto de Assunção, a cerimônia de boas-vindas decorreu ao sabor de uma sugestiva coreografia com danças e cânticos guarani. O Papa foi acolhido pelo presidente Horácio Cartes.

O primeiro discurso do Papa Francisco foi no encontro com as autoridades no Palácio Presidencial. O Santo Padre agradeceu a hospitalidade e recordou a dolorosa história do Paraguai que entre os séculos XIX e XX sofreu conflitos fratricidas, falta de liberdade e violações dos direitos humanos: “Quanta dor e quanta morte! Mas é admirável a tenacidade e o espírito de superação do povo paraguaio para se refazer perante tanta adversidade e prosseguir nos seus esforços para construir uma nação próspera e em paz.”

No seu discurso, o Santo Padre prestou homenagem aos milhares de paraguaios simples, cujos nomes não aparecerão escritos nos livros de história “mas que foram e continuam a ser verdadeiros protagonistas da vida do seu povo”. Em particular, o Papa reconheceu com emoção e admiração o papel desempenhado pela mulher paraguaia nestes momentos dramáticos da história do país.

Reconhecendo que já há alguns anos que o Paraguai está empenhado na construção de um projeto democrático sólido e estável e empenhado também em combater a corrupção, o Papa Francisco exortou os paraguaios a potenciarem o diálogo como meio privilegiado para favorecer o bem comum.

Salientando a cultura do encontro e o respeito das legítimas diferenças de opinião como base para a superação dos conflitos e das divisões ideológicas, o Santo Padre declarou que os pobres devem ser a prioridade: “Os pobres e necessitados deverão ocupar um lugar prioritário. Estão-se a cumprir muitos esforços para que o Paraguai progrida no caminho do crescimento econômico. Houve passos importantes nos campos da educação e da saúde. Não pare o esforço de todos os atores sociais, enquanto existirem crianças sem acesso à instrução, famílias sem casa, trabalhadores sem um trabalho digno, agricultores sem uma terra para cultivar e tantas pessoas obrigadas a emigrar para um futuro incerto.”

“…que não haja mais vítimas da violência, da corrupção ou do narcotráfico. Um desenvolvimento econômico que não tem em conta os mais fracos e infelizes, não é um verdadeiro desenvolvimento.”

Na conclusão do seu discurso, o Papa Francisco assegurou a colaboração da Igreja Católica para “uma sociedade inclusiva” e que indica “o caminho da misericórdia” aberto por Cristo que “ilumina a caridade” para que ninguém se sinta marginalizado.


DISCURSO DO SANTO PADRE

 Senhor Presidente,

Autoridades da República,

Membros do Corpo Diplomático,

Senhoras e Senhores!

Saúdo cordialmente Vossa Excelência, Senhor Presidente da República, e agradeço-lhe as deferentes palavras de boas-vindas e estima que me dirigiu, em nome próprio e ainda do governo, dos altos cargos do Estado e do querido povo paraguaio. Saúdo também os ilustres membros do Corpo Diplomático e, através deles, faço chegar os meus sentimentos de respeito e apreço aos respectivos países.

Um sentido «obrigado» a todas as pessoas e instituições que colaboraram, com esforço e dedicação, na preparação desta viagem para que me sentisse em casa. E não é difícil sentir-se em casa, nesta terra tão acolhedora. O Paraguai é conhecido como o coração da América, não só pela posição geográfica mas também pelo calor da hospitalidade e proximidade do seu povo.

Desde os seus primeiros passos como nação independente até dias ainda recentes, a história do Paraguai conheceu o sofrimento terrível da guerra, do confronto fratricida, da falta de liberdade e da violação dos direitos humanos. Tanta dor e tanta morte! Mas é admirável a tenacidade e o espírito de superação do povo paraguaio para se refazer perante tanta adversidade e prosseguir nos seus esforços por construir uma nação próspera e em paz. Aqui, no jardim deste palácio – que foi testemunha da história do Paraguai, desde quando era apenas margem do rio e era usado pelos Guaranis até aos últimos acontecimentos contemporâneos – quero prestar homenagem aos milhares de paraguaios simples, cujos nomes não aparecerão escritos nos livros de história mas que foram e continuam a ser verdadeiros protagonistas do seu povo. E quero reconhecer, com emoção e admiração, o papel desempenhado pela mulher paraguaia nestes momentos tão dramáticos da história, de modo especial essa guerra iniqua que quase chegou a destruir a fraternidade dos nossos povos. Sobre os seus ombros de mães, esposas e viúvas carregaram o peso maior, souberam levar por diante as suas famílias e o seu país, infundindo nas novas gerações a esperança num amanhã melhor. Deus abençoe à mulher paraguaia, a mais gloriosa da América.

Um povo que esquece o seu passado, a sua história, as suas raízes, não tem futuro, é um povo seco. A memória, firmemente apoiada na justiça e livre de sentimentos de vingança e ódio, transforma o passado numa fonte de inspiração para construir um futuro de convivência e harmonia, tornando-nos cientes da tragédia e insensatez que é a guerra. Nunca mais guerras entre irmãos! Construamos sempre a paz! Uma paz também do dia a dia, uma paz da vida quotidiana na qual todos participamos evitando gestos arrogantes, palavras ofensivas, atitudes prepotentes e, positivamente, fomentando a compreensão, o diálogo e a colaboração.

Desde há alguns anos que o Paraguai está empenhado na construção dum projeto democrático sólido e estável. E é justo reconhecer, com satisfação, quanto progresso se fez neste caminho, graças aos esforços de todos, mesmo no meio de grandes dificuldades e incertezas. Encorajo-vos a continuar trabalhando com todas as vossas forças para consolidar as estruturas e instituições democráticas que deem resposta às justas aspirações dos cidadãos. A forma de governo adoptada na Constituição – uma «democracia representativa, participativa e pluralista» –, baseada na promoção e respeito dos direitos humanos, afasta a tentação da democracia puramente formal, definida no documento de Aparecida como aquela que se contenta com estar «fundada em procedimentos eleitorais honestos» (cf. Aparecida 74). Esta é uma democracia formal.

Em todas as áreas da sociedade, mas especialmente na atividade pública, deve-se promover o diálogo como meio privilegiado para favorecer o bem comum, baseado na cultura do encontro, do respeito e do reconhecimento das legítimas diferenças e opiniões dos outros. Não se deve deter no conflito; a unidade é sempre superior ao conflito; um exercício interessante é decantar, no amor à pátria e no amor ao povo, toda a perspectiva que nasce das convicções duma opção partidária ou ideológica. E o mesmo amor deve ser o motor para crescer diariamente em gestões transparentes que lutam com ímpeto contra a corrupção. Sei que existe uma firme vontade para desterrar hoje a corrupção.

Queridos amigos, nesta vontade de serviço e trabalho pelo bem comum, devem ocupar um lugar prioritário os pobres e necessitados. Muitos esforços estão a ser feitos para que o Paraguai avance no caminho do crescimento económico. Deram-se passos importantes no campo da educação e da saúde. Que esse esforço de todos os agentes sociais não cesse até que deixe de haver crianças sem acesso à educação, famílias sem teto, operários sem trabalho digno, camponeses sem terras para cultivar e pessoas obrigadas a emigrar para um futuro incerto; deixe de haver vítimas da violência, da corrupção ou do narcotráfico. Um desenvolvimento económico que não tem em conta os mais fracos e desfavorecidos não é verdadeiro desenvolvimento. A medida do modelo económico deve ser a dignidade integral da pessoa, especialmente da pessoa mais vulnerável e indefesa.

Senhor Presidente, queridos amigos! Desejo, em nome também dos meus irmãos bispos do Paraguai, assegurar-lhes o empenho e a colaboração da Igreja Católica no esforço comum por construir uma sociedade justa e inclusiva, onde se possa viver em paz e harmonia. Porque todos nós, incluindo os pastores da Igreja, somos chamados a preocupar-nos com a construção dum mundo melhor (cf. Evangelii gaudium, 183). A isso nos move a certeza da nossa fé em Deus, que quis fazer-Se homem e, vivendo entre nós, compartilhar o nosso destino. Cristo abre-nos o caminho da misericórdia, que se baseia na justiça mas vai mais longe e ilumina a caridade, de modo que ninguém fique à margem desta grande família que é o Paraguai, ao qual amais e quereis servir.

Com imensa alegria por me encontrar nesta terra consagrada à Virgem de Caacupé – e quero também lembrar especialmente aos meus irmãos paraguaios de Buenos Aires, da minha diocese anterior; eles também têm uma paróquia da Virgem dos Milagres de Caacupé -, imploro a bênção do Senhor sobre todos vós, sobre as vossas famílias e sobre todo o querido povo paraguaio. Que o Paraguai seja fecundo como o indica a flor da passiflora no manto da Virgem e, como essa faixa com as cores do Paraguai que cinge a imagem, assim a nação se abrace à Mãe de Caacupé. Muito obrigado!

DISCURSO DO SANTO PADRE

Jardim do Palácio de Los López, Assunção (Paraguai)

Sexta-feira, 10 de Julho de 2015