Vida Cristã - Província Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil - OFM

A paciência da semente e o Reino de Deus na inspiração de Mc 4,26-34

29/01/2021

                                                                                                                    Imagem ilustrativa (fonte: Canva)

Frei Jacir de Freitas Faria, OFM

O texto de Mc 4,26-34 nos apresenta a relação entre a semente e o Reino de Deus. O modo como Jesus fez para falar do Reino de Deus é chamado de parábola. O que é isso, parábola? Trata-se de um recurso literário, didático, simples e muito utilizado no tempo de Jesus. Temos uma parábola quando uma coisa conhecida é colocada ao lado de uma desconhecida. Por exemplo, a semente de mostarda do texto de Mc 4 é o elemento conhecido; o desconhecido, o Reino de Deus. Para entender como o Reino acontece, Jesus recorre ao modo como a semente de mostarda se desenvolve. A catequese de Jesus era feita por parábolas.

Tendo esclarecido esse primeiro ponto, passemos à compreensão do Reino de Deus a partir da parábola da semente de mostarda. Comecemos pelas perguntas: o que a semente tem a ver com nossa vida? Podemos relacionar a semente com a paciência? Jesus quis relacionar o Reino de Deus com a semente ou com o pé de mostarda? A maioria das interpretações insiste em mostrar que o Reino Deus é como uma semente pequena que cresce e fica grande. Vejamos.

Há três modos possíveis de compreender a parábola da semente de mostarda a partir de seu centro, isto é, da semente, da árvore ou do pé de mostarda?

A partir da semente, o foco do texto é colocado no processo que parte do pequeno, semente, para o grande. A pequena semente de mostarda é o novo Israel, isto é, os seguidores de Jesus, os quais se tornarão grandes na construção do Reino de Deus.

Considerando que o centro da passagem seja uma árvore, seria o mesmo que dizer que o pequeno Israel, os seguidores de Jesus, tornar-se-ia uma grande árvore apocalíptica no fim dos tempos. Textos do Primeiro Testamento falam do cedro do Líbano como árvore apocalíptica (Sl 104,12; Ez,31,3.6; Dn 4,10-12). E é nessa grande árvore que os pássaros fariam os seus ninhos. Acreditamos que se Jesus, de fato, quisesse referir-se a uma árvore apocalíptica, ele teria mencionado o cedro do Líbano e não a mostrada.

A terceira possiblidade de compreender a parábola é o pé de mostarda. A mostarda é uma planta medicinal e culinária que chega a medir, no máximo, 1 m e ½ de altura. Ela se desenvolve melhor ao ser transplantada. Depois de plantada, torna-se uma erva daninha. Temos dois tipos de mostarda, a selvagem e a culinária. Por ser uma planta impura, o código deuteronômico (Dt 22,9) proíbe a sua plantação. Nisso, talvez, esteja o motivo provocador de Jesus em buscar uma comparação não muito aceita para falar do Reino que ele pregava.

O Reino de Deus chega e se esparrama. Não pode ser controlado, torna-se abundante como a nossa tiririca. Atrai pássaros, os quais são inimigos de qualquer agricultor. O Reino, depois de semeado, perde o controle, toma conta do terreno todo. Assim como o Reino, a mostarda é motivo de escândalo para muitos. O Reino é indesejável e violador das regras de santidade.

Para falar do pé de mostarda, capaz de abrigar pássaros, Jesus parte da semente pequena que cresce e se torna uma árvore. Para que isso aconteça, temos que ter persistência e paciência. E é isso que Jesus estava querendo ensinar. Na vida, precisamos ter paciência para conquistar o que almejamos. Até Jesus teve que esperar trinta anos para iniciar a sua vida pública. Uma das sabedorias humanas é ter paciência. Permita-me alargar a comparação, parábola, que Jesus fez com a nossa vida. Veja! A mulher engravida. Para ela é um tempo difícil de espera. São nove meses até que um minúsculo embrião cresça e saia de seu ventre. Quanta espera! A criança nasce, não sabe falar e nem andar. Quanta espera para se tornar adulto. Bater asas, voar do ninho, amadurecer. Quanta luta! Muitos nem conseguem essa proeza em vida. Queimam etapas. Chegam aos quarenta querendo ser a criança que nunca foram.

Para finalizar, eu diria que o Reino de Deus precisa ser buscado sempre, germinado sempre como a vida, incomodar sempre como a mostarda. Na construção do reino, a paciência é a palavra-chave. O reino se realiza às escondidas como a semente de mostarda, mas quando vemos sinais de sua presença, exclamamos: aí está o pé de mostarda, o indesejado que nos acolhe como pássaros sedentos de sua sombra, de sua justiça em todos os níveis! Amém! Assim seja.


Frei Jacir de Freitas Faria, OFM Doutor em Teologia Bíblica pela FAJE-BH. Mestre em Ciências Bíblicas (Exegese) pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma. Professor de exegese bíblica. Membro da Associação Brasileira de Pesquisa Bíblica (ABIB). Sacerdote Franciscano. Autor de dez livros e coautor de quatorze. Inscreva-se no nosso canal: https://www.youtube.com/c/FreiJacirdeFreitasFariaB%C3%ADbliaAp%C3%B3crifos

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