Frei Mário José Knapik
Ao escrever a Encíclica “Louvado sejas sobre o cuidado da casa comum”, o Papa Francisco reporta-se a cada pessoa que habita neste planeta, com louvores ao Criador do Universo, nosso Sumo Eterno Bem. Ele conclama “toda a família humana para a diligência da casa comum e o desenvolvimento sustentável e integral da criação” (13). Na ótica da integridade, todos os seres, as coisas e as instâncias estão ligados e interligados, conectados e interconectados. Tudo está correlacionado e entrelaçado pelo amor que Deus tem a cada uma das suas criaturas.
O amor divino acolhe, abraça, une e integra todos os seres do planeta em uma única fraternidade universal. Propicia relações de reciprocidade, sincronicidade e harmonia de todos para com todos. “Se nos sentimos intimamente unidos a tudo e a todos, então brotarão, de modo espontâneo, a sobriedade e a solicitude” (11). Irrompe-se a ética do cuidado, da convivência amorosa, da afabilidade ao valor de cada criatura e da veneração respeitosa a todos os seres.
Auscultar a mensagem que cada ser enuncia e celebrar a diversidade das criaturas e a beleza da vida é a nossa missão originária no conjunto de todos os seres. Isso porque, à luz da tradição bíblica, fomos a última instância a entrar no teatro da criação. Não obstante, o Criador nos incumbe, principalmente, da nobre responsabilidade de proteger a criação dos vetores dominantes da atualidade, tão desestabilizadores e devastadores da harmônica fraternidade universal. Dentre estes, evidenciam-se o relativismo prático, a cultura do descartável, o paradigma tecnocrático, os interesses do mercado divinizado e o consumismo desenfreado, sem fronteiras nem barreiras.
Diante desse contexto atual, é crescente a preocupação pelo o que está acontecendo com o nosso planeta, embora não dispomos ainda de uma cultura da corresponsabilidade comum pela dignidade de todos os povos e pelo desvelo da nossa casa comum. “O meio ambiente é um bem coletivo, uma herança comum, patrimônio de toda a humanidade e responsabilidade de todos” (95).
Detentor de múltiplas e distintas habilidades, o ser humano é apto a construir com todos os seres da natureza a fraternidade universal. Além disso, é capaz de amar, de respeitar e de contemplar a grandeza e a beleza de cada uma das criaturas de Deus. O fascínio e a admiração que ele tem por cada uma delas levam-no a cuidar com afeição da casa comum.
“A natureza é um manancial incessante de encanto e de reverência. Sentir cada criatura que canta o hino da sua existência é viver jubilosamente no amor de Deus” (85). É contemplar o Criador por todas as suas criaturas, pois refletem, a seu modo, a generosidade e a bondade do Altíssimo. É viver a espiritualidade na sua grandeza e profundidade. É perceber, na dinâmica do silêncio e da compreensão, o valor intrínseco de cada criatura e o esplendor do nosso planeta. A espiritualidade “constitui uma magnífica contribuição para o esforço de renovar a humanidade” (216). Ela encoraja para um estilo de vida contemplativo e profético, em que valores são ressignificados, paradigmas são reconstruídos, relações humanas são fortalecidas e o amor divino é vislumbrado em todas as criaturas.
“A pessoa cresce, amadurece, e santifica-se tanto mais, quanto mais se relaciona, sai de si mesma para viver em comunhão com Deus, com os outros e com a natureza” (240). É o dinamismo de sair de si mesmo para
relacionar-se, para interagir e acolher o outro em sua peculiaridade, estabelecendo com todas as criaturas uma convivência respeitosa e harmoniosa. O Criador é o referencial por excelência da misterialidade da vida em todo o planeta Terra. “Ele é o Senhor da Terra e de tudo o que nela existe” (Dt 10,14).
A encíclica realça também os desafios que precisam ser enfrentados com urgência pela humanidade para preservar o planeta Terra, tais como: diversos poluentes atmosféricos (concentração de gases com efeito de estufa), mudanças climáticas (aquecimento global, derretimento das calotas polares e glaciares), redução dos recursos naturais (principalmente da água), perda da biodiversidade (desaparecimento de milhares de espécies vegetais e animais), deterioração da qualidade da vida humana, degradação social, desigualdade planetária. Esses desafios “provocam mudanças climáticas inauditas e uma destruição sem precedentes dos ecossistemas terrestres e aquáticos, com graves consequências para todos nós” (24).
Diante disso, o Papa nos interpela e nos inspira com a seguinte indagação: “somos nós os primeiros interessados em deixar um planeta habitável a quem vai suceder-nos?” (cf. 160). Somos plenamente conscientes da sublime missão que temos de cuidar da Terra e de trabalhar nela para o bem de todos, de maneira integral e integradora. Há muito por fazer em níveis mundial, nacional e local. Trata-se, sobretudo, de um fazer educativo, isto é, de ações que se transformem paulatinamente em novos hábitos comportamentais, em novos estilos de vida.
“Em alguns países, há belos e fascinantes exemplos de melhoria do ambiente: saneamento de rios, recuperação de florestas nativas, embelezamento de paisagens, produção de energia renovável, melhoria dos transportes públicos, entre outras ações”. (cf. 58). Não menos suntuosas e relevantes são as iniciativas locais para os desenvolvimentos sustentável, equitativo e integral do planeta, como a redução do consumo de água, de energia elétrica, de combustível, de papel e de plástico, a separação do lixo orgânico do reciclável, o não desperdício de alimentos, a não poluição, o não desmatamento, entre outras. Essas ações cotidianas multiplicam-se na sociedade, promovem mudanças benfazejas e podem fazer a diferença em todo o planeta.
O ser humano traz em seu próprio bojo as aptidões necessárias para o terno cuidado da casa comum e o desenvolvimento integral de toda a criação. Com alegria e simplicidade vivemos a espiritualidade evangélica franciscana, sendo mensageiros da paz e do bem a todas as criaturas, na total gratuidade e na comunhão ao Deus Criador.