3º Domingo do Advento
- 3º Domingo do Advento
- Textos bíblicos para este domingo
- Reflexões do exegeta Frei Ludovico Garmus
- O Reino necessita de gestos concretos
- Alegria
- O amor à vida
- A alegre esperança do cristão
- Caminhos do Evangelho
3º Domingo do Advento
Muito antes do marketing, Deus
Frei Gustavo Medella
A personalização é uma das chaves para um relacionamento de êxito nos negócios e um dos grandes desafios do marketing na atualidade é fazer com que o cliente se sinta um interlocutor privilegiado daquela marca com a qual ele se relaciona. Para chegar a este grau de sofisticação no relacionamento com o cliente, as empresas lançam mão do entrelaçamento de dados que cada um produz ao navegar nas redes através de seus dispositivos móveis. São mecanismos sofisticados que envolvem muita tecnologia e inteligência artificial para fazer parecer humanizado o quanto mais possível um atendimento quase totalmente realizado por máquinas.
A ideia de proximidade e personalização que as marcas desejam transmitir através de um complexo e caro jogo de máquinas, Deus a assume desde sempre. É preocupação constante do Pai atender com carinho e solicitude a cada filho de acordo com sua necessidade. Por esta razão as leituras proclamadas neste 3º Domingo do Advento são insistentes em destacar a ação de um Deus que “alegra a terra, faz florescer o deserto, fortalece os joelhos enfraquecidos, anima os deprimidos, alimenta os famintos, traz a vista aos cegos, liberta os cativos”, enfim transmite em ações concretas o que significa o verbo que, a partir dos limites da linguagem, usamos para defini-Lo: Amar.
O grande convite do Natal, então, é que nos sintamos pessoalmente amados por Deus que nos entrega Jesus como irmão. N’Ele nos sentimos plenamente filhos, convidados a sermos uns para os outros, presença deste Deus solícito e atencioso em socorrer os seus em suas diferentes necessidades.
FREI GUSTAVO MEDELLA, OFM, é o atual Vigário Provincial e Secretário para a Evangelização da Província Franciscana da Imaculada Conceição. Fez a profissão solene na Ordem dos Frades Menores em 2010 e foi ordenado presbítero em 2 de julho de 2011
Imagem ilustrativa de Frei Fábio Melo Vasconcelos
Textos bíblicos para este domingo
Primeira Leitura: Is 35,1-6a.10
1Alegre-se a terra que era deserta e intransitável, exulte a solidão e floresça como um lírio. 2Germine e exulte de alegria e louvores. Foi-lhe dada a glória do Líbano, o esplendor do Carmelo e de Saron; seus habitantes verão a glória do Senhor, a majestade do nosso Deus.
3Fortalecei as mãos enfraquecidas e firmai os joelhos debilitados. 4Dizei às pessoas deprimidas: “Criai ânimo, não tenhais medo! Vede, é vosso Deus, é a vingança que vem, é a recompensa de Deus; é ele que vem para vos salvar”. 5Então se abrirão os olhos dos cegos e se descerrarão os ouvidos dos surdos. 6aO coxo saltará como um cervo e se desatará a língua dos mudos.
10Os que o Senhor salvou, voltarão para casa. Eles virão a Sião cantando louvores, com infinita alegria brilhando em seus rostos; cheios de gozo e contentamento, não mais conhecerão a dor e o pranto.
Responsório: Sl 145
— Vinde, Senhor, para salvar o vosso povo!
— Vinde, Senhor, para salvar o vosso povo!
— O Senhor é fiel para sempre,/ faz justiça aos que são oprimidos;/ ele dá alimento aos famintos,/ é o Senhor quem liberta os cativos.
— O Senhor abre os olhos aos cegos,/ o Senhor faz erguer-se o caído,/ o Senhor ama aquele que é justo,/ é o Senhor que protege o estrangeiro.
— Ele ampara a viúva e o órfão,/ mas confunde os caminhos dos maus./ O Senhor reinará para sempre!/ Ó Sião, o teu Deus reinará.
Segunda Leitura: Tg 5,7-10
Irmãos: 7Ficai firmes até à vinda do Senhor. Vede o agricultor: ele espera o precioso fruto da terra e fica firme até cair a chuva do outono ou da primavera.8Também vós, ficai firmes e fortalecei vossos corações, porque a vinda do Senhor está próxima. 9Irmãos, não vos queixeis uns dos outros, para que não sejais julgados. Eis que o juiz está às portas.
10Irmãos, tomai por modelo de sofrimento e firmeza os profetas, que falaram em nome do Senhor.
Jesus é o Messias?
Evangelho: Mt 11, 2-11
* 1 Quando Jesus terminou de dar essas instruções aos seus doze discípulos, partiu daí, a fim de ensinar e pregar nas cidades deles.
2 João estava na prisão. Quando ouviu falar das obras do Messias, enviou a ele alguns discípulos, 3 para lhe perguntarem: «És tu aquele que há de vir, ou devemos esperar outro?» 4 Jesus respondeu: «Voltem e contem a João o que vocês estão ouvindo e vendo: 5 os cegos recuperam a vista, os paralíticos andam, os leprosos são purificados, os surdos ouvem, os mortos ressuscitam e aos pobres é anunciada a Boa Notícia. 6 E feliz aquele que não se escandaliza por causa de mim!»
* 7 Os discípulos de João partiram, e Jesus começou a falar às multidões a respeito de João: «O que é que vocês foram ver no deserto? Um caniço agitado pelo vento? 8 O que vocês foram ver? Um homem vestido com roupas finas? Mas aqueles que vestem roupas finas moram em palácios de reis. 9 Então, o que é que vocês foram ver? Um profeta? Eu lhes afirmo que sim: alguém que é mais do que um profeta. 10 É de João que a Escritura diz: ‘Eis que eu envio o meu mensageiro à tua frente; ele vai preparar o teu caminho diante de ti’. 11 Eu garanto a vocês: de todos os homens que já nasceram, nenhum é maior do que João Batista. No entanto, o menor no Reino do Céu é maior do que ele.
Bíblia Sagrada – Edição Pastoral
Reflexões do exegeta Frei Ludovico Garmus
3º Domingo do Advento, ano A
Oração: “Ó Deus de bondade, que vedes o vosso povo esperando fervoroso o natal do Senhor, dai chegarmos às alegrias da Salvação e celebrá-las sempre com intenso júbilo na solene liturgia”.
- Primeira leitura: Is 35,1-6a.10
É o próprio Deus que vem para vos salvar.
A primeira leitura nos coloca no contexto do exílio da Babilônia. Muitos dos exilados da segunda geração se acomodaram à situação de povo dominado e exilado; outros que conheceram a terra de Judá, Jerusalém e o seu Templo não viam mais perspectivas de um retorno. Não tinham mais ânimo nem de pensar num possível retorno à terra prometida, da qual estavam separados por um imenso deserto. O profeta dirige-se a estes judeus desanimados, para ajudá-los a confiar no Senhor que vem salvar seu povo. Quer abrir-lhes os olhos para a nova realidade política que estava surgindo: o cruel domínio de Babilônia seria substituído pelo “servo de Deus” Ciro, rei dos persas. Em breve, Ciro haveria de permitir o retorno dos exilados. O texto, repleto de alegria, encorajamento e esperança, é um convite para louvar o Senhor que “vem para nos salvar”. A imagem da transformação da natureza e do deserto num lugar pleno de vida é um convite para fortalecer os desalentados. Cegos novamente enxergando, coxos andando, surdos ouvindo e mudos falando são o alegre sinal da salvação que vem vindo (ad-vento), prenúncio de novos ventos soprando na política nacional e internacional (Evangelho). – Estamos vivendo hoje em tempos de profunda crise política, ética, econômica e social, agravadas pela corrupção, desemprego e violência. Conseguimos sentir novos ventos do Espírito soprando, ouvir os clamores das ruas, das escolas e do povo sofrido? Nós, como Igreja de Cristo, responderemos a estes clamores? Somos portadores de esperança para os mais pobres e deserdados? Os exilados voltaram para sua terra e suas casas destruídas com esperança de reconstruí-las. O Papa Francisco lançou um veemente apelo para cuidarmos com mais carinho de nossa “casa comum, o planeta Terra”, começando pelos pobres que nela vivem, e incluindo o cuidado de todos os seres vivos que conosco convivem. Sentimo-nos convidados a participar deste esforço coletivo de toda a humanidade? Se ficarmos parados e sem ânimo, perderemos mais uma oportunidade de salvação, de transformação de nossas vidas… Abramos nossos olhos, nossos ouvidos e o nosso coração, e “caminhemos à luz do Senhor”.
Salmo responsorial: Sl 145
Vinde, Senhor, para salvar o vosso povo.
- Segunda leitura: Tg 5,7-10
Fortalecei vossos corações porque a vinda do Senhor está próxima.
Os primeiros cristãos esperavam que a segunda vinda do Senhor acontecesse em breve. Por isso, Tiago, depois de ameaçar com o juízo divino os cristãos ricos que atrasavam o salário dos trabalhadores (Tg 5,1-6), na leitura de hoje, dirige-se aos mais pobres e convida-os e permanecerem firmes na fé e na esperança, aguardando a vinda do Senhor. Nessa esperança da vinda do Senhor, o cristão não pode ficar parado. Deve imitar o exemplo do agricultor, que prepara o terreno, semeia a semente e, com paciência, espera a chuva e uma boa colheita. Recomenda também aos cristã que, enquanto esperam a próxima vinda do Senhor, não fiquem brigando e discutindo entre si. Por fim, nos tempos difíceis em que a comunidade vivia, apresenta como modelo os profetas. Eles, em meio às guerras, à violência e destruição levantavam a bandeira da salvação e da esperança de um futuro melhor.
Aclamação ao Evangelho: Is 61,1
O espírito do Senhor sobre mim fez a sua unção,
Enviou-me aos empobrecidos a fazer feliz proclamação.
- Evangelho: Mt 11,2-11
És tu aquele que há de vir ou devemos esperar um outro?
A pergunta de João Batista – “És tu aquele que há de vir ou devemos esperar um outro”? –, não é para gerar dúvidas, mas a certeza. João pregava um batismo de conversão, batizava as pessoas para significar o perdão dos pecados. Dizia ao povo que ele mesmo não era o salvador esperado. Mas que, depois dele, viria alguém mais forte do que ele, do qual nem se considerava digno de carregar as sandálias. Quando Jesus soube que João foi preso por Herodes Antipas (Mt 4,12s), retirou-se para a Galileia e fixou morada em Cafarnaum. Começou a sua pregação e logo começou a escolher discípulos. A pregação e os milagres que fazia tornaram Jesus conhecido em toda a região. E João, ao ser preso, tinha certeza que seria executado. Nesta expectativa, queria deixar claro aos seus discípulos, e a nós também, quem era o verdadeiro salvador esperado, o Cristo prometido pelas Escrituras. A pergunta de João não gera dúvidas, mas busca a certeza. Esta certeza vem da resposta de Jesus: “Os cegos recuperam a vista, os paralíticos andam, os leprosos são curados, os surdos ouvem, os mortos ressuscitam e os pobres são evangelizados”. Mais do que as palavras, são as ações de Jesus que evangelizam. Para concluir, Jesus dá seu próprio testemunho sobre a pessoa e o significado da missão do Batista: um homem austero, que fala e age com segurança, sem deixar-se abalar por qualquer adversidade na sua missão.
Nos tempos difíceis em que estamos vivendo, como podemos nos preparar para receber o Senhor que vem nos salvar? A primeira leitura nos convida a esperar com alegria a Salvação que Deus nos preparou. A segunda leitura propõe manter uma fé firme na vinda do Senhor, apesar dos sofrimentos. O Evangelho aponta a conversão e o perdão dos pecados como a melhor preparação para o Natal do Senhor.
FREI LUDOVICO GARMUS, OFM, é professor de Exegese Bíblica do Instituto Teológico Franciscano de Petrópolis (RJ). Fez mestrado em Sagrada Escritura, em Roma, e doutorado em Teologia Bíblica pelo Studium Biblicum Franciscanum de Jerusalém, do Pontifício Ateneu Antoniano. É diretor industrial da Editora Vozes e editor da Revista “Estudos Bíblicos”, editada pela Vozes. Entre seus trabalhos está a coordenação geral e tradução da Bíblia Sagrada da Vozes.
O Reino necessita de gestos concretos
Frei Clarêncio Neotti
O Natal de Jesus tem a ver com a criatura humana concreta. Há gente que quer ver apenas a parte espiritual de Jesus e as implicações espirituais de sua mensagem. Acontece que nós homens não somos só carne ou só espírito. Cristo nasceu
para salvar o homem: seu espírito e sua carne. O Reino dos Céus é para a criatura humana na plenitude de seu ser, do seu viver, ou, como diz o papa João Paulo lI, para “cada homem, em toda a sua singular realidade do ser e do agir, da inteligência e da vontade, da consciência e do coração” (Encíclica Redemptor Hominis, n. 46). Parece justo, pois, se desejarmos saber como está o Reino de Deus na terra, perguntar-nos como está a saúde da criatura humana: sua saúde física e espiritual. Pode-se falar em Reino dos Céus, quando tantos milhares morrem de fome? De fome de pão, de fome de paz, de fome de ser compreendido, de fome de viver com dignidade? Todo aquele que melhorar a sorte do homem na terra está construindo o Reino de Deus aqui, está ajudando a acontecer o Natal de Jesus e o natal dos homens (Mt 25,31-46).
Porque a criatura humana “é a primeira e fundamental via da Igreja” (Redemptor Hominis, n. 46), isto é, o objeto de toda a sua evangelização (razão de seu existir), a Igreja necessariamente vela pela dignidade do homem em todos os
seus aspectos e diversos campos da vida: o religioso, o social, o político, o econômico e o cultural. Vela pelo nosso destino eterno e pelos caminhos que nos conduzem para lá. O Reino dos Céus alcança a criatura humana na sua origem, envolve-a durante toda a sua peregrinação terrena e a introduz na eternidade. São sobretudo os Sinóticos (Mateus, Marcos e Lucas), que desenvolvem o tema do Reino de Deus ou, com o mesmo significado, do Reino dos Céus. O tema volta forte no Apocalipse.
FREI CLARÊNCIO NEOTTI, OFM, entrou na Ordem Franciscana no dia 23 de dezembro de 1954. Durante 20 anos, trabalhou na Editora Vozes, em Petrópolis. É membro fundador da União dos Editores Franciscanos e vigário paroquial no Santuário do Divino Espírito Santo (ES). Escritor e jornalista, é autor de vários livros e este comentário é do livro “Ministério da Palavra – Comentários aos Evangelhos dominicais e Festivos”, da Editora Santuário.
Alegria
Frei Almir Guimarães
Alegrai-vos sempre no Senhor. De novo eu vos digo, alegrai-vos! O Senhor está perto (Fl 4,4-5)
A alegria é um presente belo, mas também vulnerável. Um dom que devemos cuidar com humildade e generosidade no fundo da alma. O romancista alemão Hermann Hesse diz que os rostos atormentados, nervosos e tristes de tantos homens e mulheres se devem ao fato de que a felicidade só pode senti-la a alma, e não a razão, nem o ventre, nem a cabeça, nem o bolso (Pagola, Lucas p. 25)
♦ Este terceiro domingo do advento é conhecido como domingo da alegria. A leitura do profeta Isaías hoje proclamada respira, transpira exultação. “Alegre-se a terra que era deserta e intransitável exulte a solidão e floresça como um lírio. Germine e exulte de alegria e louvores”. A comemoração do nascimento de Jesus e tudo a ele vinculado constituem os motivos da alegria. Nunca nos esqueçamos que a ressurreição do Senhor é que nos trouxe indelével alegria. “Maria, por que choras? Não roubaram o teu Senhor. Ele vive. Ninguém pode tirar a tua alegria”. A singeleza da proximidade de Deus, sua visita no Menino das Palhas, faz com que tenhamos confiança no futuro. Esse Deus que se manifestou no Natal quer ser Deus conosco, quer acompanhar nossos passos, estar perto de nossos acertos e relativizar nossos desacertos.
♦ João Batista se posta diante de nós pedindo que preparemos os caminhos do Senhor, que venhamos a desobstruir nosso interior para que a brisa suave do Senhor nos visite pessoalmente e que sempre de novo retomemos nosso processo de conversão pessoal e no seio da Igreja. Para receber o Salvador, a casa precisa ter nas paredes, portas, janelas e dependências o perfume da verdade, da coerência, de vida feita para os outros e devotado ao que nos ama até o fim. E sobretudo o desejo que é sede do Mistério no qual estamos imersos. Sem conversão perecemos.Vegetamos. Viver a ilusão da vida. E a vida não pode ser ilusão.
♦ Tudo isso precisa nos envolver em clima de alegria. Tema difícil, esse da alegria. Não se trata de sermos adeptos de uma felicidade pequena, conforto, carros, dinheiro rendendo enquanto dormimos, nossos filhos bem na vida, risos, viagens. Merecemos tudo isso e temos direito a esses momentos de contentamento. Consistirá nisso a alegria?
♦ Talvez a razão de tantas alegrias fugazes se deva ao fato de esquecemos de cuidar de nossa vida interior e assim é importante para nós o que vem de fora, coisas, tudo fugaz. Pagola assim reflete: “A alegria não é fácil. Não se pode forçar ninguém a ficar alegre; não se pode impor a alegria a partir de fora. A verdadeira alegria deve nascer do mais profundo de nós mesmos. Do contrário será riso exterior, gargalhada vazia, euforia passageira, mas a alegria ficará fora, à porta de nosso coração” (Pagola, Lucas p.25).
♦ Jürgen Moltmann: “A palavra última e primeira da grande libertação que vem de Deus não é ódio, mas alegria; não é condenação mas absolvição. Cristo nasce da alegria de Deus e morre e ressuscita para trazer alegria a este mundo contraditório e absurdo”.
♦ A alegria se manifesta de múltiplas maneiras:
>> Há certamente grandes manifestações de alegria: espetáculos de música, dança, festas mais importantes em que o corpo participa de uma alegria interior: canto, danças, fogos ,vida celebrada.
>> Há essa refeição entre amigos para comemorar um aniversário ou um evento com o rito do estar juntos, a beleza da toalha e o carinho do que se come como sacramento da estima ou mero café expresso por duas pessoas que se encontraram na rua e se estimam.
>> Alegria tão simples: um email carinhoso, um delicado presente que recebemos, o sorriso e o beijo que menino levado recebe do pai depois de um bom pito, o menino se achega junto ao peito do pai, alegria do dever cumprido mesmo com certa dificuldade, a alegria estampada no rosto da senhora de idade descascando goiabas para fazer geleia…alegria que tem a ver com paz da consciência e confiança no amanhã, alegria do casal que passa pela igreja depois do nascimento do primeiro filho, alegria do resultado de uma biopsia, alegria da família que recebe para um almoço festivo o pai que, por caprichos do destino, cometeu um infração e passou meses prisão… alegria que não consiste em gargalhar mas sorrir chorando ou chorar sorrindo.
♦ Precisamos saber fazer festa: a festa interrompe a rotina cheia de tédio, reúne os dispersos, celebra a vida, confraterniza… O homem não é apenas feito para o trabalho e ficar preocupado com os lucros mas precisa cantar, dançar, gostar das cores, de claridade e não apenas do cinzento.
♦ Pode ser que muitos fizemos que o cristianismo se assemelhasse a uma realidade enfadonha, marcada pelo tédio… celebrações pesadas, discursos ameaçadores sobre castigos e pecados… Há pessoas que bocejam durante uma celebração eucarística. Será que sabemos festejar? Pode ser que mesmo as festas mais tradicionais sejam marcadas pelo vazio. A celebração pode ser uma festa?
♦ Paira sempre um terrível mistério. Como alegrar-nos com nossos fracassos, com os sofrimentos do corpo, com filhos que morreram na luta contra a bandidagem… Será preciso ler a gramática da cruz do Senhor.
♦ Há alegrias mais profundas como a de sabermos que fomos inventados pelo amor para amar. Que Deus não nos criou para vivemos oprimidos, na miséria, na dor. Somos resultado de um plano de amor e esse plano não se interrompe. E esse amor se manifesta no presépio do Menino das Palhas. Valemos muito as olhos de Deus. Delicado falar do tema da alegria quando sofremos injustiças, padecemos no corpo e no espírito. Deus sabe tirar proveito para nos mesmo quando os dias são de verter lágrimas.
♦ Cristãos e fieis temos a convicção, apesar de sinais exteriores dizerem o contrário, de que nosso destino é a glória. Alegria da esperança de sermos acolhido por Deus amor na soleira da sala do banquete da glória. Carregamos no nosso mistério pessoal, ao longo da vida, sementes da festa que não acaba. Tudo muda quando ser humano se sente acompanhado por Deus.
Oração
O Senhor anda espreitando as agruras
que vivem os seus.
Uma voz grita:
“Fortalecei as mãos enfraquecidas.
Firmai os joelhos debilitados.
Criai ânimo,
Deus vem e vem para salvar”.
Os olhos dos cegos vão se abrir.
As pessoas poderão vislumbrar o sentido de seus dias.
Os surdos ouvirão palavras que partem do coração de Deus
e que atingem as pessoas de coração contrito.
Alegria pela vida, por ver os campos floridos,
alegria que se manifesta em nossos cantos e jubilações,
alegria que é presente dado aos que se entregam ao Mistério.
Alegria de vivermos novamente a esplendorosa humildade
Do nascimento de Deus na terra dos homens.
Alegrai-vos sempre no Senhor.
FREI ALMIR GUIMARÃES, OFM, ingressou na Ordem Franciscana em 1958. Estudou catequese e pastoral no Institut Catholique de Paris, a partir de 1966, período em que fez licenciatura em Teologia. Em 1974, voltou a Paris para se doutorar em Teologia. Tem diversas obras sobre espiritualidade, sobretudo na área da Pastoral familiar. É o editor da Revista “Grande Sinal”.
O amor à vida
José Antonio Pagola
Diante das diferentes tendências destrutivas que podem ser detectadas na sociedade contemporânea (necrofilia), Erich Fromm fez um apelo vigoroso a desenvolver tudo que seja amor à vida (biofilia), se não quisermos cair no que o célebre cientista chama “síndrome de decadência”.
Devemos certamente estar muito atentos às diversas formas de agressividade, violência e destruição que são geradas na sociedade moderna. Mais de um sociólogo fala de autêntica “cultura da violência” Mas existem outras formas mais sutis e, por isso mesmo, mais eficazes de destruir o crescimento e a vida das pessoas.
A mecanização do trabalho, a massificação do estilo de vida, a burocratização da sociedade, a coisificação das relações são outros tantos fatores que estão levando muitas pessoas a sentir-se não seres vivos, mas peças de uma engrenagem social.
Milhões de indivíduos vivem hoje no Ocidente vidas cômodas, mas monótonas, onde a falta de sentido e de projeto pode afogar todo crescimento verdadeiramente humano.
Então, algumas pessoas acabam por perder o contato com tudo o que é vivo. Sua vida se enche de coisas. Só parecem vibrar adquirindo novos artigos. Funcionam segundo o programa que lhes dita a sociedade.
Outras pessoas buscam todo tipo de estímulos. Precisam trabalhar, produzir, agitar-se ou divertir-se. Hão de experimentar sempre novas emoções, algo excitante que lhes permita sentir-se ainda vivas.
Se algo caracteriza a personalidade de Jesus é seu amor apaixonado pela vida, sua biofilia. Os relatos evangélicos o apresentam lutando contra tudo que bloqueia, mutila ou minimiza a vida. Sempre atento ao que
pode fazer as pessoas crescer, sempre semeando vida, saúde, sentido.
Ele mesmo nos traça sua tarefa com expressões tomadas de Isaías: “Os cegos veem e os coxos andam; os leprosos ficam limpos e os surdos ouvem: os mortos ressuscitam e aos pobres é anunciada a Boa Notícia. E feliz aquele que não se escandalizar de mim”.
Verdadeiramente felizes são aqueles que descobrem que ser crente não é odiar a vida, mas amá-Ia; não é bloquear ou mutilar nosso ser, mas abri-lo às suas melhores possibilidades. Muitas pessoas abandonam hoje a fé em Jesus Cristo, antes de ter experimentado a verdade destas suas palavras: “Eu vim para que os seres humanos tenham vida e a tenham em abundância” (Jo 10,10).
JOSÉ ANTONIO PAGOLA cursou Teologia e Ciências Bíblicas na Pontifícia Universidade Gregoriana, no Pontifício Instituto Bíblico de Roma e na Escola Bíblica e Arqueológica Francesa de Jerusalém. É autor de diversas obras de teologia, pastoral e cristologia. Atualmente é diretor do Instituto de Teologia e Pastoral de São Sebastião. Este comentário é do livro “O Caminho Aberto por Jesus”, da Editora Vozes.
A alegre esperança do cristão
Pe. Johan Konings
A esperança que temos é a mola propulsora de nossa vida. Que é que você espera da vida? Como ela se tornaria melhor? Quem poderia ajudá-lo para isso? São essas as perguntas de todo o mundo e também do cristão, perguntas que a liturgia deste domingo suscita em nós. Deus mesmo é a esperança do fiel. Ele não é um castigador, um fiscal de nossos pecados e nem mesmo da “desordem estabelecida” na sociedade em que vivemos. Ele não deseja castigar, mas transformar aquilo que está errado: ele vem salvar. Esta é a esperança anunciada pelos profetas (1ª leitura).
Com a vinda de Jesus começou irreversivelmente a realização desta esperança, a realização da profecia. João Batista não percebe bem o que Jesus está fazendo. Manda perguntar se ele é o Messias, ou se é para esperar outro (evangelho). Jesus aponta os sinais que ele está realizando: aquilo que os profetas anunciaram. Daí a conclusão: já não precisamos aguardar outro.
Ora, Jesus apenas iniciou. Implantou. A plantação deve ainda crescer. Com a paciência e a firmeza do agricultor, devemos esperar o amadurecimento de seu reino na História. Com o “sofrimento e paciência dos profetas que o anunciaram…(2ª leitura)
A esperança suscita em nós alegria confiante: Deus deu início à realização de seu projeto. Quando se olha com objetividade o que a palavra de Cristo já realizou no mundo, apesar das constantes recaídas de uma humanidade inconstante, reconhecemos que ela foi eficaz. Devemos também olhar para os sinais que se realizam hoje: a transformação impulsionada pelo evangelho de Cristo se reflete na nova consciência do povo, que assume sua própria história na construção de uma sociedade mais fraterna.
A esperança fundamenta uma firmeza permanente, confiante de que Deus erradicará o mal que ainda persiste.
A esperança exterioriza-se na celebração, expressão comunitária de nossa alegria e confiança.
A esperança do cristão é Jesus. Ele é aquele que havia de vir. Não precisamos ir atrás de outro messias, oferecidos pelo mundo do consumo, por promessas políticas ambíguas e assim por diante. Consumo e política são propostas humanas, e podemos servir-nos delas conforme convém, com liberdade. Mas o Messias vem de Deus; ele merece nossa adesão, nele podemos acreditar. Chama-se Jesus. Feliz quem não se deixa abalar em relação a ele (cf. Mt 11,6)!
Esperamos que o amor e a justiça que Cristo veio trazer ao mundo, e nos quais somos chamados a participar ativamente, realizem o plano de Deus para a humanidade, desde já e para sempre, “assim na terra como no céu”.
PE. JOHAN KONINGS nasceu na Bélgica em 1941, onde se tornou Doutor em Teologia pela Universidade Católica de Lovaina, ligado ao Colégio para a América Latina (Fidei Donum). Veio ao Brasil, como sacerdote diocesano, em 1972. Em 1985 entrou na Companhia de Jesus (Jesuítas) e, desde 1986, atuou como professor de exegese bíblica na FAJE, Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia, em Belo Horizonte. Faleceu no dia 21 de maio de 2022. Este comentário é do livro “Liturgia Dominical, Editora Vozes.
Caminhos do Evangelho