Prof. Dr. Frei Jacir de Freitas Faria, OFM[1]
Santo Antônio nasceu Fernando, em 1195, em Lisboa (Portugal) e morreu Antônio, no 13 de junho de 1231, em Pádua (Itália). Era de família rica e morreu como pobre franciscano.
Ouvindo o chamado de Deus, ele se fez frade agostiniano. Estudou a Bíblia. Com o objetivo de ser missionário, passou a ser um seguidor de São Francisco de Assis, seu mestre e amigo. Em viagem missionária que nunca chegou em Marrocos, na África, voltou para a Europa, indo para Pádua, norte da Itália. Atuou como missionário do reino na França e na Itália, numa Europa medieval marcada pelo medo da morte e do inferno.
De sua vida iluminada pelas bênçãos divinas, quero destacar quatro imaginários populares que dizem respeito à sua vida.
- O Menino Jesus que apareceu para ele. Um menino com rosto de adulto. Coisa típica da Idade Média. Teólogos pensavam que Jesus já era um adulto desde criança. O ser criança na Idade Média nada valia.
- A Bíblia que foi objeto de estudo, de vida e fonte de sua inspiração no anúncio do reino de Deus, na sua vida missionária. Os sermões de Santo Antônio têm fundamentos bíblicos e uma forte denúncia contra os ricos, os exploradores do povo, na Baixa Idade Média. Em um dos seus sermões, Antônio proclama com veemência: “A linguagem é viva, quando falam as obras. Cessem, portanto, as palavras e falem as obras. De palavras estamos cheios, mas de obras vazios; por este motivo nos amaldiçoa o Senhor, como amaldiçoou a figueira em que não encontrou fruto, mas somente folhas.”
- O pão distribuído aos pobres. Tradição iniciada pelos frades a partir de dois milagres atribuídos a Santo Antônio. O primeiro foi o de uma mãe que promete, após seu filho ser salvo de um afogamento por milagre de Santo Antônio, que daria a quantidade de farinha para fazer pão para os pobres conforme o peso do seu filho. O segundo milagre foi o de uma comerciante que rezou e pediu a Santo Antônio que consertasse a fechadura enguiçada da porta de seu negócio. Ela prometeu dar trigo aos frades para fazer pão para os pobres.
- Casamento de moças que não conseguiam encontrar marido. Santo Antônio dava dinheiro para a moças pobres ter um dote e poder arrumar casamento. Uma pobre mãe, rezando a Santo Antônio em favor de sua filha, de modo que ele pudesse arrumar um casamento, caso contrário teria que se tornar prostituta. Quando rezava, um bilhete de Santo Antônio caiu da imagem, dizendo que a moça devia ir a um comerciante x e receber dele, em moedas, o valor do peso do bilhete. O tal bilhete pesou 400 escudos. Ela arrumou casamento e daí nasceu a tradição de invocar a Santo Antônio para arrumar casamento.
O evangelho de Mc 4, 26-34 nos apresenta quatro elementos que podem nos ajudar a compreender a missão de Santo Antônio, a saber:
- Reino de Deus. Jesus está à beira do mar, lugar do medo e do reino da morte. Jesus convoca os discípulos e a povo a não ter medo. O reino, que era ele, já tinha chegado. Acreditem em mim, no Evangelho, pregava com ardor missionário. Não percam a esperança, apesar da dominação romana.
- Semente na terra. Nero, o sanguinário imperador romano havia jogado os cristãos para debaixo da terra, nas catacumbas de Roma. Marcos ensina que as comunidades podem e devem crescer por si só, independentemente, do poder opressor.
- Grão de mostarda que se torna a mais saliente das hortaliças, mesmo não sendo tão visto como o cedro do Líbano, do imaginário de Ezequiel.
- Grande hortaliça que embeleza o sonho do Reino de Deus e nos dá vigor para continuar no mundo. Quando acontecerá o Reino? Não sabemos. Necessitamos da paciência que faz a semente germinar por si só.
O ser missionário, como Santo Antônio, nos passos de Jesus, exige de nós atitudes de fé e ousadia. Para ser missionário, como ele, a Bíblia é nossa grande hortaliça que embeleza a nossa missão de anunciar o Reino de Deus num mundo marcado pelo sofrimento e injustiças sociais, repleto de Neros que continuam nos matando. Neros que continuam mandando cristãos para a fogueira com o objetivo de iluminar as “noites romanas” de seus egos inflamados, se julgando imorríveis, invencíveis, para não citar outras coisas horríveis…
O pão é o alimento que nos mantém vivos. Somos chamados a ser sementes na terra, fermento que cresce por si só. Ser missionário é distribuir o pão, matar a fome. É lutar para que haja sempre pão em todas as mesas. Ser missionário é anunciar Jesus, a criança e o adulto, o ressuscitado, que está vivo no meio de nós, nos desinstala da sacristia de nossas Igrejas, acomodadas ao poder.
O nosso casamento é com a paz e o bem! Para que isso aconteça, necessitamos muitos dotes de fé, ternura e esperança, de luta sem fim, sempre. Viva Santo Antônio!
[1] Doutor em Teologia Bíblica pela FAJE-BH. Mestre em Ciências Bíblicas (Exegese) pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma. Professor de exegese bíblica. Membro da Associação Brasileira de Pesquisa Bíblica (ABIB). Sacerdote Franciscano. Autor de dez livros e coautor de quatorze. Último livro: O Medo do Inferno e a arte de bem morrer: da devoção apócrifa à Dormição de Maria às irmandades de Nossa Senhora da Boa Morte (Vozes, 2019). No nosso canal no You Tube: Frei Jacir Bíblia e Apócrifos ou https://www.youtube.com/c/FreiJacirdeFreitasFariaB%C3%ADbliaAp%C3%B3crifos