21º Domingo do Tempo Comum
- 21º Domingo do Tempo Comum
- Leituras bíblicas para este domingo
- Reflexão do exegeta Frei Ludovico Garmus
- Palavras duras, mas divinas
- A quem iremos, Senhor?
- Também vós quereis ir embora?
- A opção certa
- Reflexão em vídeo de Frei Gustavo Medella
21º Domingo do Tempo Comum
Não dá mais!
Frei Gustavo Medella
“Vocês também querem ir embora”? Vontade de sumir, largar tudo, jogar para o alto. “Não dá mais!” Quem nunca sentiu? Quase sempre este sentimento brota em ocasiões de crise, conflito, carência e desencontro. Momento em que o ser humano se vê sem forças para seguir lutando, em que o fio da esperança está prestes a se romper. Jesus percebia também que, entre os discípulos, à medida que as exigências da missão se tornavam mais severas, tais pensamentos também ganhavam força e encontravam espaço. “Qual o sentido de tudo que temos feito? Como esta história vai terminar? Que garantias nós temos?”, certamente eram questões tratadas nos bastidores desta primeira comunidade primitiva.
Perceber que, mesmo estando face a face com o Filho de Deus, o Messias, aqueles homens também tiveram seus momentos de dúvida e fraqueza, não deixa de ser um alento para quem, dois mil anos depois, escolhe seguir este mesmo caminho inspirado por Jesus. A dúvida, o medo e a incerteza não devem ter a última palavra sobre a comunidade de fé, mas não deixam de ser importantes, pois representam um chamado à humildade, à conversão e a um discernimento constante.
É importante para o caminheiro da fé de vez em quando se perguntar por que razões ele segue caminhando. É chance de retornar ao amor primeiro, ao encanto inicial. É oportunidade ímpar de fazer a mesma experiência de Pedro que, mesmo diante de todas as provações experimentadas, encontra novamente a força para dizer: “Senhor, a quem iremos? Tu tens palavras de vida eterna”.
FREI GUSTAVO MEDELLA, OFM, é o atual Vigário Provincial e Secretário para a Evangelização da Província Franciscana da Imaculada Conceição. Fez a profissão solene na Ordem dos Frades Menores em 2010 e foi ordenado presbítero em 2 de julho de 2011.
Imagem ilustrativa de Frei Fábio Melo Vasconcelos
Leituras bíblicas para este domingo
Primeira Leitura: Josué 24,1-2.15-18
Naqueles dias, 1 Josué reuniu em Siquém todas as tribos de Israel e convocou os anciãos, os chefes, os juízes e os magistrados, que se apresentaram diante de Deus. 2 Então Josué falou a todo o povo: 15 “Se vos parece mal servir ao Senhor, escolhei hoje a quem quereis servir: se aos deuses a quem vossos pais serviram na Mesopotâmia ou aos deuses dos amorreus, em cuja terra habitais. Quanto a mim e à minha família, nós serviremos ao Senhor”. 16 E o povo respondeu, dizendo: “Longe de nós abandonarmos o Senhor para servir a deuses estranhos. 17 Porque o Senhor, nosso Deus, ele mesmo é quem nos tirou, a nós e a nossos pais, da terra do Egito, da casa da escravidão. Foi ele quem realizou esses grandes prodígios diante de nossos olhos e nos guardou por todos os caminhos por onde peregrinamos e no meio de todos os povos pelos quais passamos. 18 Portanto, nós também serviremos ao Senhor, porque ele é o nosso Deus”.
Palavra do Senhor.
Sl 33(34)
Provai e vede quão suave é o Senhor!
Bendirei o Senhor Deus em todo o tempo, / seu louvor estará sempre em minha boca. / Minha alma se gloria no Senhor; / que ouçam os humildes e se alegrem! – R.
O Senhor pousa seus olhos sobre os justos, / e seu ouvido está atento ao seu chamado; / mas ele volta a sua face contra os maus, / para da terra apagar sua lembrança. – R.
Clamam os justos, e o Senhor bondoso escuta / e de todas as angústias os liberta. / Do coração atribulado ele está perto / e conforta os de espírito abatido. – R.
Muitos males se abatem sobre os justos, / mas o Senhor de todos eles os liberta. / Mesmo os seus ossos ele os guarda e os protege, / e nenhum deles haverá de se quebrar. – R.
A malícia do iníquo leva à morte, / e quem odeia o justo é castigado. / Mas o Senhor liberta a vida dos seus servos, / e castigado não será quem nele espera. – R.
Segunda Leitura: Efésios 5,21-32
Irmãos, 21 vós que temeis a Cristo, sede solícitos uns para com os outros. 22 As mulheres sejam submissas aos seus maridos como ao Senhor. 23 Pois o marido é a cabeça da mulher, do mesmo modo que Cristo é a cabeça da Igreja, ele, o salvador do seu corpo. 24 Mas como a Igreja é solícita por Cristo, sejam as mulheres solícitas em tudo pelos seus maridos. 25 Maridos, amai as vossas mulheres, como o Cristo amou a Igreja e se entregou por ela. 26 Ele quis assim torná-la santa, purificando-a com o banho da água unida à Palavra. 27 Ele quis apresentá-la a si mesmo esplêndida, sem mancha nem ruga, nem defeito algum, mas santa e irrepreensível. 28 Assim é que o marido deve amar a sua mulher, como ao seu próprio corpo. Aquele que ama a sua mulher ama-se a si mesmo. 29 Ninguém jamais odiou a sua própria carne. Ao contrário, alimenta-a e cerca-a de cuidados, como o Cristo faz com a sua Igreja; 30 e nós somos membros do seu corpo! 31 Por isso o homem deixará seu pai e sua mãe e se unirá à sua mulher, e os dois serão uma só carne. 32 Este mistério é grande, e eu o interpreto em relação a Cristo e à Igreja.
Palavra do Senhor.
A fé em Jesus exige decisão
Evangelho: Jo 6,60-69
-* 60 Depois que ouviram essas coisas, muitos discípulos de Jesus disseram: «Esse modo de falar é duro demais. Quem pode continuar ouvindo isso?» 61 Jesus sabia que seus discípulos estavam criticando o que ele tinha dito. Então lhes perguntou: «Isso escandaliza vocês? 62 Imaginem então se vocês virem o Filho do Homem subir para o lugar onde estava antes! 63 O Espírito é que dá a vida, a carne não serve para nada. As palavras que eu disse a vocês são espírito e vida. 64 Mas entre vocês há alguns que não acreditam.» Jesus sabia desde o começo quais eram aqueles que não acreditavam e quem seria o traidor. 65 E acrescentou: «É por isso que eu disse: ‘Ninguém pode vir a mim, se isso não lhe é concedido pelo Pai.’ « 66 A partir desse momento, muitos discípulos voltaram atrás, e não andavam mais com Jesus. 67 Então Jesus disse aos Doze: «Vocês também querem ir embora?» 68 Simão Pedro respondeu: «A quem iremos, Senhor? Tu tens palavras de vida eterna. 69 Agora nós acreditamos e sabemos que tu és o Santo de Deus.»
* 60-71: As palavras de Jesus provocam resistência e desistência até entre os discípulos. Muitos conservam a idéia de um Messias Rei, e não querem seguir Jesus até à morte, entendida por eles como fracasso. E não assumem a fé por medo de se comprometerem. Os Doze apóstolos, porém, aceitam a proposta de Jesus e o reconhecem como Messias, dando-lhe sua adesão e aceitando suas exigências.
Bíblia Sagrada – Edição Pastoral
Reflexão do exegeta Frei Ludovico Garmus
21º Domingo do Tempo Comum
Oração: “Ó Deus, que unis os corações dos vossos fiéis num só desejo, dai ao vosso povo amar o que ordenais e esperar o que prometeis, para que, na instabilidade deste mundo, fixemos os nossos corações onde se encontram as verdadeiras alegrias”.
- Primeira leitura Js 24,1-2a.15-17.18b
Serviremos ao Senhor, porque ele é o nosso Deus.
Terminada a conquista da Terra Prometida, Josué convoca uma grande assembleia no Santuário de Siquém. Na presença das doze tribos de Israel, dos anciãos, dos chefes e dos juízes do povo, faz um longo discurso no qual exorta o povo a servir fielmente a Deus. Provoca o povo a uma decisão: servir aos deuses dos outros povos ou servir ao Senhor que os libertou do Egito. Ele e sua família já decidiram servir unicamente ao Senhor. O povo, lembrado da maravilhosa libertação do Egito, da proteção divina recebida no deserto, da Aliança selada com Deus no Sinai e do dom da terra (Ex 24,3-8), também decide servir ao Senhor: “Longe de nós abandonarmos o Senhor, para servir a deuses estranhos… Nós também serviremos ao Senhor, porque ele é o nosso Deus”. É uma decisão de fé, fidelidade e amor ao único Deus, que liberta da escravidão. Assim Josué renovou a aliança do povo com Deus. Discursos comovem, exemplos de fé e amor a Deus, como o de Josué e sua família, arrastam (Evangelho).
Salmo responsorial: Sl 33
Provai e vede quão suave é o Senhor!
- Segunda leitura: Ef 5,21-32
Este mistério é grande, em relação a Cristo e à Igreja.
A leitura que ouvimos choca nossa sensibilidade, sobretudo, a das mulheres, quando Paulo diz: “As mulheres sejam submissas aos seus maridos”. Fixando nossa atenção apenas nessa frase que choca aos ouvidos modernos, estamos sujeitos a perder a mensagem mais profunda do texto. Basta ouvir a conclusão da frase: “como ao Senhor” – isto é, a Cristo Jesus, o ponto de comparação. Submissão não significa dominação do marido sobre a mulher. Todo o texto é iluminado pela frase inicial: “Vós que temeis a Cristo, sede solícitos uns para com os outros”. Todos nós que seguimos e amamos a Cristo devemos amar (ser solícito com) uns aos outros. Ser solícito é sinônimo de amar. Esta solicitude/amor começa na família, da qual nos fala Paulo. Na cultura de então, o homem era “a cabeça” da família. Hoje os maridos dizem: “Quem manda lá em casa é a mulher”… A comparação é com Cristo, “cabeça da Igreja e o Salvador de seu Corpo”, aquele que dá a vida por nós. Cristo é o modelo de amor/solicitude para a mulher e para o marido. A Igreja ama a Cristo, porque “cabeça” e corpo estão unidos. Assim, a mulher é solícita em tudo (ama) pelo seu marido. O marido, por sua vez, sendo “a cabeça da mulher”, deve amá-la (ser solícito) como Cristo ama a Igreja; isto é, deve ser capaz de dar até sua vida por sua esposa. E o Apóstolo argumenta: Amar a sua mulher é amar a si mesmo, porque “o homem deixará seu pai e sua mãe e se unirá à sua mulher, e os dois serão uma só carne”. Por isso, conclui Paulo, a união de amor entre homem e mulher é um grande “mistério”, um “sacramento” do amor que nos une a Deus. Eles se tornam uma só carne e ninguém odeia sua própria carne, mas ama sua esposa como a si mesmo, a exemplo de Cristo que ama sua Igreja.
Aclamação ao Evangelho
Ó Senhor, vossas palavras são espírito e vida;
as palavras que dizeis, bem que são de eterna vida.
- Evangelho: Jo 6,60-69
A quem iremos? Tu tens palavras de vida eterna.
No texto do domingo anterior Jesus se apresentava como o pão descido do céu. Para ter a vida eterna é necessário alimentar-se deste pão celestial, comer a sua carne e beber o seu sangue. Cristo nos sustenta na caminhada da vida cristã com a doação de sua própria vida. No evangelho de hoje temos a reação dos judeus a essas palavras de Jesus, consideradas “duras”, difíceis de escutar. Jesus insiste que veio de Deus e para Deus vai “subir”. Os judeus estão entendendo suas palavras segundo a carne e não segundo o Espírito, por isso não acreditaram nele. E Jesus explica: “O Espírito é que dá vida, a carne não adianta nada. As palavras que eu vos falei são espírito e vida”. E o evangelista comenta: “Jesus sabia… quem eram os que não tinham fé”.
Diante de Jesus não dá para se esconder ou ficar neutro. É necessário escolher entre seguir a Cristo com fé ou abandoná-lo, como muitos o fizeram na história de Israel (1ª leitura). Quando Jesus pergunta aos discípulos que ainda ficaram com ele se também queriam ir embora, Pedro reafirma sua fé: “A quem iremos, Senhor? Tu tens palavras de vida eterna. Nós cremos, firmemente, e reconhecemos que tu és o Santo de Deus” (cf. Mt 16,13-16). A fé que professamos em Cristo é que nos une, num só corpo, como Igreja (2ª leitura).
FREI LUDOVICO GARMUS, OFM, é professor de Exegese Bíblica do Instituto Teológico Franciscano de Petrópolis (RJ). Fez mestrado em Sagrada Escritura, em Roma, e doutorado em Teologia Bíblica pelo Studium Biblicum Franciscanum de Jerusalém, do Pontifício Ateneu Antoniano. É diretor industrial da Editora Vozes e editor da Revista “Estudos Bíblicos”, editada pela Vozes. Entre seus trabalhos está a coordenação geral e tradução da Bíblia Sagrada da Vozes.
Palavras duras, mas divinas
Frei Clarêncio Neotti
O Evangelho de João distingue-se pelas contínuas dicotomias, isto é, pela colocação de dois termos antagônicos, duas opções contrárias, deixando ao leitor a escolha, depois dos argumentos pró e contra apresentados: luz x trevas, dia x noite, pecado x graça, Deus x diabo, espírito x carne, sim x não. Também hoje o ouvinte de Jesus é posto diante de uma alternativa, depois da doutrina proposta por Jesus. Ou aceitamos ou não aceitamos. Não há terceira opção.
As palavras de Jesus eram duras, inéditas, contrárias aos costumes, mas apresentadas como vindas do céu (v. 50), com autoridade divina, por alguém que se dizia enviado do Pai (v. 57), que apresentava todas as qualidades e fazia os milagres previstos pelos profetas (v. 14).
A dureza das palavras de Jesus referiam-se a quatro assuntos sobretudo. Primeiro, a afirmação de que vinha do céu, enviado do Pai (vv. 38.42). Aceitar isso seria reconhecê-la divino e com autoridade divina e, portanto, capaz de ensinamentos novos e verdadeiros. Segundo, o poder que ele dizia ter de ressuscitar os mortos (v. 54). Os judeus estavam divididos quanto à ressurreição. Os fariseus ensinavam’ que os mortos ressuscitariam. Os saduceus não aceitavam a ressurreição. Parte do povo seguia os fariseus e parte os saduceus. Terceiro, o problema de comer carne. Havia leis muito rígidas para o consumo da carne dos animais. Que dizer de carne humana? Quarto, a impossibilidade de se beber sangue, já que a lei mosaica era de extremo rigor para quem consumisse sangue (Lv 17,10.14).
FREI CLARÊNCIO NEOTTI, OFM, entrou na Ordem Franciscana no dia 23 de dezembro de 1954. Durante 20 anos, trabalhou na Editora Vozes, em Petrópolis. É membro fundador da União dos Editores Franciscanos e vigário paroquial no Santuário do Divino Espírito Santo (ES). Escritor e jornalista, é autor de vários livros e este comentário é do livro “Ministério da Palavra – Comentários aos Evangelhos dominicais e Festivos”, da Editora Santuário.
A quem iremos, Senhor?
Frei Almir Ribeiro Guimarães, OFM
A quem iremos, Senhor? Só tu tens palavras de vida eterna. Nós cremos firmemente e reconhecemos que tu és o santo de Deus (Jo 6, 68-69).
Escolher. Saber escolher. Escolhas pequenas. Escolhas fundamentais. Escolhas a partir das quais se organiza uma existência. O tema da escolha se tornou complicado devido à pluralidade das opções, em razão de uma reflexão séria sobre o sentido das escolhas definitivas como prisões que impedem a aceitação do fato da mudança. Na primeira leitura deste domingo vemos Josué declarar peremptoriamente sua escolha: “Quanto a mim e à minha família, nós serviremos ao Senhor”. No final do discurso do Pão da Vida de João, a exclamação de Pedro nos toca profundamente no momento em que o Mestre questiona se os Doze querem ir embora como os outros: “A quem iremos Senhor?”
Escolher Cristo, optar por Cristo não quer dizer apenas ser membro de uma religião e professar intelectualmente um credo que encerra dogmas de fé. Trata-se de criar com ele um pacto, de orientar palavras, gestos, propósitos sob a claridade de sua adorável pessoa. Trata-se de encontrar sua palavra viva a ressoar no mais profundo de nós mesmos e no mundo. Uma palavra que mexe com nosso projeto existencial. Um palavra que nos coloca num estado de profunda e feliz inquietude.
“Todos os cristãos, em qualquer lugar e situação que se encontrem, estão convidados a renovar hoje mesmo seu encontro pessoal com Jesus Cristo, ou pelo menos, tomar a decisão de deixar-se encontrar por Ele, de procurá-lo dia a dia sem cessar” (Papa Francisco, A alegria do Evangelho, 3). Sim, talvez o mais urgente seria que nos deixássemos encontrar por ele.
Nunca perdemos de vista que ele, o Senhor, vive e é o ressuscitado e que, de muitas formas e maneiras, apresenta-se a nós. No final da infância, no tempo da juventude e da maturidade sempre somos convidados a nos colocar em sua presença de tal sorte que vivamos nele e com ele. Tudo isso sem beatice e ritos adocicados. Uma forte presença que nos envolve e nos interpela. Nada de repetições de estilos pastorais, de rezas, de costumes sem sua presença tonificante e forte.
Sabemos que importante na vida é viver e viver em plenitude. Por diferentes circunstâncias escolhemos a pessoa de Cristo, o caminho de Cristo, a estrada que nos é aberta por sua pessoa, por ele que é grão de trigo que morre, esposo que nos espera, coração que nos acolhe quando estamos sobrecarregados.
Optar por Cristo quer dizer acolher a força do Evangelho. O Evangelho é Jesus Cristo, sua mensagem, sua vida, sua ressurreição. Optar por Jesus quer dizer viver casamento, paternidade, maternidade, juventude, maturidade, velhice, doença e tempo sadio, todos os relacionamentos do jeito que Jesus viveu. Trata-se de uma decisão que acompanha a vida toda.
Depois de dois mil anos as palavras de Jesus não deixam de nos surpreender. Os valores que jesus viveu e que queremos abraçar não deixam ser, à primeira vista, desconcertantes: “Os valores que Jesus propõe como capazes de levar o ser humano ao máximo desenvolvimento não deixam de ser desconcertantes: o perdão diante da violência, partilhar em vez de acumular, cooperar em vez de competir, ser austeros e não consumistas, amar sem esperar retribuição, dar a vida pelos outros em vez de desfrutá-la até o fim para o próprio interesse” (Pedro José Gomez Serrano).
Os que optam por Cristo escolhem viver sob a luz de uma sabedoria alternativa. Ela será experimentada por aqueles que seguem o caminho chamado Jesus, pelos que passam pela porta estreita e apontam na direção de uma abundância de vida. Os que o seguem experimentam profunda alegria. Não somente a alegria que podem proporcionar os sucessos pessoais ou simplesmente a falta de conflitos, mas aquela que nasce por sermos profundamente amados.
A quem iremos? Os jovens não podem caminhar a esmo borboleteando, seguindo a doutrina da hora, das mensagens que às dezenas chegam aos seus celulares. Os casais não são meros comparsas de uma caminhada qualquer, mas amam-se na força do amor de Jesus. A quem iremos? Os que optam pela vida consagrada haverão de ter esse Jesus como esposo delicado de sua venturosa vida.
A quem iremos? “Toda a vida de Jesus, sua forma de tratar os pobres, seus gestos, sua coerência, sua generosidade simples e cotidiana, e finalmente sua total dedicação, tudo é precioso e fala à nossa vida pessoal” (Papa Francisco, A alegria do Evangelho, n. 265)
Prece
Quero seguir-te.
Tu me conheces e sabes o que quero,
tanto meus projetos como minhas fraquezas.
Não posso ocultar-te nada Jesus.
Gostaria de deixar de pensar em mim e
dedicar mais tempo a ti.
Gostaria de entregar-me inteiramente a ti.
Gostaria de seguir-te aonde tu fores.
Mas nem isso me atrevo a dizer-te,
porque sou fraco.
Tu o sabes melhor do que eu.
Sabes de que barro sou feito,
tão frágil e inconstante.
Por isso, preciso ainda mais de ti,
para que tu me guies sem cessar,
para que sejas meu apoio e meu descanso.
Obrigado, Jesus, por tua amizade!
FREI ALMIR GUIMARÃES, OFM, ingressou na Ordem Franciscana em 1958. Estudou catequese e pastoral no Institut Catholique de Paris, a partir de 1966, período em que fez licenciatura em Teologia. Em 1974, voltou a Paris para se doutorar em Teologia. Tem diversas obras sobre espiritualidade, sobretudo na área da Pastoral familiar. É o editor da Revista “Grande Sinal”.
Também vós quereis ir embora?
José Antonio Pagola
O mundo em que vivemos já não pode ser considerado como cristão. As novas gerações não aceitam facilmente a visão da vida que antes se transmitia de pais a filhos por via de autoridade. As ideias e diretrizes que predominam na cultura moderna estão muito distantes da inspiração cristã. Vivemos numa época “pós-cristã”.
Isto significa que a fé já não é “algo evidente e natural”. O cristão está sujeito a um exame crítico cada vez mais implacável. São muitos os que neste contexto se sentem sacudidos pela dúvida e não faltam aqueles que, deixando-se levar pelas correntes do momento, abandonam tudo.
Uma fé combatida a partir de tantas frentes não pode ser vivida como há uns anos. O crente já não pode apoiar-se na cultura ambiental nem nas instituições. A fé vai depender cada vez mais da decisão pessoal de cada um. Será cristão quem tomar a decisão consciente de aceitar e seguir a Jesus Cristo. Este é o dado talvez mais decisivo no momento religioso que se vive hoje: está se passando de um cristianismo por nascimento para um cristianismo por decisão.
Pois bem, a pessoa precisa apoiar-se em algum tipo de experiência positiva para tomar uma decisão tão importante. A experiência está se convertendo numa espécie de critério de autenticidade e em fator fundamental para decidir a orientação da própria vida. Isto significa que, no futuro, a experiência religiosa será cada vez mais importante para fundamentar a fé. Será crente aquele que experimentar que Deus lhe faz bem e que Jesus Cristo o ajuda a viver.
O relato evangélico de João é hoje mais significativo do que nunca. Num determinado momento, muitos discípulos de Jesus duvidam e vão embora. Então Jesus diz aos Doze: “Também vós quereis ir embora?” Simão Pedro lhe responde em nome de todos a partir de uma experiência básica: “Senhor, a quem iremos? Tu tens palavras de vida eterna. Nós cremos”. Muitos vivem hoje num estado intermediário entre um cristianismo tradicional e um processo de descristianização. Não é bom viver na ambiguidade. É necessário tomar uma decisão fundamental na própria experiência. E tu, também queres ir embora?
JOSÉ ANTONIO PAGOLA cursou Teologia e Ciências Bíblicas na Pontifícia Universidade Gregoriana, no Pontifício Instituto Bíblico de Roma e na Escola Bíblica e Arqueológica Francesa de Jerusalém. É autor de diversas obras de teologia, pastoral e cristologia. Atualmente é diretor do Instituto de Teologia e Pastoral de São Sebastião. Este comentário é do livro “O Caminho Aberto por Jesus”, da Editora Vozes.
A opção certa
Pe. Johan Konings
Há cinco semanas estamos acompanhando o episódio do sinal do pão (Jo 6). Hoje ouvimos o desenlace. No domingo anterior vimos como Jesus se apresentou como o “pão da vida” e proclamou que estava oferecendo sua carne como alimento para a vida do mundo.
Muitos não “engoliram” isso, porque “essa palavra é dura demais” (6,60). Dura, não apenas pela dificuldade de compreensão (alguns falavam até em antropofagia), mas sobretudo por causa das consequências práticas. Estranharam o que Jesus disse a respeito de sua carne. Estranhariam muito mais ainda sua “subida aonde estava antes”, sua glorificação, pois essa se manifesta na “exaltação” de Jesus…. no alto da cruz, quando ele revela plenamente o amor infinito de Deus, seu Pai. Só pelo Espírito de Deus é possível compreender isso (6,52-53). É difícil “alimentar-se” com a vida que Jesus nos propõe como caminho, com aquilo que ele disse e fez, sobretudo, com o dom radical de sua vida na morte – pois tudo isso significa compromisso.
A 1ª leitura dá um exemplo de compromisso. O povo de Israel, ao tomar posse da terra prometida, teve de escolher com quem ia se comprometer, com os outros deuses, ou com Javé, que os tirou do Egito. Visto que Javé mostrou de que ele era capaz, optaram por ele (Js 24). Optar significa decidir-se, não em cima do muro. É dizer sim ou não.
Jesus põe os seus discípulos diante da opção por ele ou pelo lado oposto. “Vós também quereis ir embora?” E Pedro responde, em nome dos Doze e dos fiéis de todos os tempos: “A quem iríamos. Tu tens palavra de vida eterna”. O que Jesus ensina é o caminho da vida eterna, da comunhão com Deus para sempre. Foi para isso que Jesus reuniu em torno de si os Doze, que representavam o novo Israel, o povo de Deus, para que o seguissem pelo caminho. Para que constituíssem comunidade, comungando da vida que ele dá pela vida do mundo. Nosso ambiente parece recusar essas palavras de vida eterna. Por diversas razões. Uns porque querem viver sua própria vidinha, sem se comprometer com nada, outros porque preferem um caminho próprio, individual… O difícil da palavra de Jesus consiste nesse compromisso concreto. Ao longo dos séculos, houve quem tornasse o cristianismo difícil por meio de penitências e exercícios, até reprimindo e deprimindo. Mas a verdadeira dificuldade é abdicar da auto-suficiência e entregar-se a uma comunidade reunida por Cristo para segui-lo pelo caminho da doação total. Só que este caminho é também o caminho da “perfeita alegria”, de que fala Francisco de Assis.
PE. JOHAN KONINGS nasceu na Bélgica em 1941, onde se tornou Doutor em Teologia pela Universidade Católica de Lovaina, ligado ao Colégio para a América Latina (Fidei Donum). Veio ao Brasil, como sacerdote diocesano, em 1972. Em 1985 entrou na Companhia de Jesus (Jesuítas) e, desde 1986, atuou como professor de exegese bíblica na FAJE, Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia, em Belo Horizonte. Faleceu no dia 21 de maio de 2022. Este comentário é do livro “Liturgia Dominical, Editora Vozes.
Reflexão em vídeo de Frei Gustavo Medella