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Carta do Ministro Geral para Pentecostes 2024

16/05/2024

Premissa

Em seu discurso aos anciãos de Éfeso, o apóstolo Paulo reassume sua vida em missão. Ele reconhece o Espírito do Senhor Crucificado e Ressuscitado como protagonista do seu longo caminho e a própria alma da missão. Ele é o único a guiá-lo, orientá-lo, sempre impulsioná-lo além de si mesmo e além de muitas fronteiras.

Se o Pentecostes nos faz ouvir sempre esta brisa do Espírito, este ano o seu sopro é particular na memória dos Estigmas de São Francisco, que nos trazem de volta ao centro do nosso carisma, viver o Evangelho, seguindo as pegadas do Cristo pobre e crucificado. Sob essa luz, hoje, 13 de maio de 2024, recordamos o 500º aniversário da chegada dos primeiros Doze Frades missionários em Veracruz, México, enviados pelo Ministro Geral, Frei Francisco de los Ángeles Quiñones, na liberdade do espírito, alma de toda vocação missionária. É um evento singular e importante na história da Ordem que recebeu pouca atenção. Com efeito, entre luzes e sombras, é o projeto mais completo e importante para a evangelização dos povos da América, uma verdadeira resposta ao dom do Espírito.

Viver segundo o santo Evangelho

Muitos frades navegaram para as Américas compelidos pelo desejo de viver e anunciar o Evangelho através de um forte impulso voltado para a reforma da vida franciscana e da Igreja para um mundo novo. Estes “Doze primeiros franciscanos” – e muitos dos frades que chegaram depois deles – vieram das correntes do reformismo espanhol da época. Eles eram membros da Província de São Gabriel, a origem do movimento mais rigoroso do franciscanismo espanhol do século XVI. O ideal missionário destes frades nasceu num contexto de luta por um estilo de vida baseado em duas notas fundamentais: o radicalismo evangélico e o eremitismo contemplativo, no clima da liberdade do espírito que chama a viver o Evangelho. A formação intelectual de alguns desses frades também desempenha um papel importante na compreensão da missão evangelizadora.

O objetivo concreto do ideal missionário era, nas suas origens, bastante vago, desde a missão aos povos do Oriente, até aos povos descobertos na misteriosa América. Por outro lado, recordamos que em 1524 a reforma da Igreja, promovida pelo agostiniano Martinho Lutero, já estava em vigor e que um dos frades que tentaram vir ao México, Frei Juan Glapión, participou da Dieta de Worms em 1521. O primeiro projeto de organização da Igreja no México, em 1526, nos dá uma ideia do tipo de reforma eclesiástica que esses primeiros franciscanos estavam planejando.

A vida franciscana como missão é muito clara nas instruções que o Ministro Geral, Frei Francisco de los Ángeles Quiñones, dá aos primeiros Doze. “Uma vez que ides plantar o Evangelho nos corações que ainda não o receberam, fazei-o de tal modo que a vossa maneira de viver não se desvie dele. E isso fareis se viagiardes diligentemente sobre a observância da Regra, que é fundada no Santo Evangelho, observando-o pura e simplesmente, sem glosas e dispensações” (Instrução).

Encorajados pela obediência do Ministro Geral, os primeiros franciscanos no México repensaram o modelo de vida de seus irmãos na Espanha, com base em eremitérios e pequenas comunidades, a fim de dedicarem-se à evangelização e à pastoral das comunidades indígenas nas cidades do México recentemente conquistadas. O incremento de suas presenças em pouco tempo foi muito grande. Isso aconteceu, em parte, também porque o estilo de vida dos frades era no início muito próximo daquele dos indígenas, simples, humilde, despojado de pretensões.

Podemos então reconhecer como a primeira fonte de uma renovada missão foi a dimensão contemplativa e penitencial do carisma franciscano.

Conversão contínua, anúncio do Evangelho e aspiração ao martírio

Nos dois documentos missionários com os quais os franciscanos foram enviados ao México pelo Ministro Geral, “Obediência” e “Instrução”, três elementos são muito claros: vida exemplar, trabalho de conversão e desejo de martírio. Para o Ministro Geral, a prioridade na missão é a forma de vida. Estas características estão presentes desde as origens da Ordem. Ao longo dos séculos, as circunstâncias culturais em que os projetos missionários foram formados mudaram, mas os elementos mencionados acima estão sempre presentes.

Na “Instrução” destaca-se o esclarecimento de que a forma de vida do missionário não deve ser baseada em elementos externos, cerimônias e costumes, mas na “observância do Evangelho e da Regra” uma cláusula que explica a liberdade evangélica de espírito com que os frades atuaram no México. Convencido da importância do testemunho de vida, o Ministro Geral pediu aos frades que vivessem em comunidades e cidades, “porque o bom exemplo que teriam visto no vosso modo de viver seria uma ajuda para a conversão tanto quanto as palavras e a pregação”. Essas intuições são de grande valor.

Também no texto de “A Obediência”, o ministro diz que o envio dos frades ao México ocorre “quando o dia já está declinando na décima primeira hora”: era forte, portanto, o sentido de um tempo da história que exigia um urgente chamado à conversão e à decisão.

Comparação entre diferentes culturas

Entre os aspectos importantes para compreender a missão franciscana no México não há apenas a vida eremítica e contemplativa dos primeiros frades, mas também a influência que o ambiente religioso e cultural do humanismo renascentista teve sobre esses ideais, bem como sobre as culturas para as quais a missão foi dirigida.

Em sua longa viagem missionária, a Ordem franciscana, antes de chegar ao México, já tinha tido contatos com grandes culturas. O que faz a diferença é que o conhecimento das culturas dos países da China já existia na Europa medieval, enquanto na Europa não havia conhecimento algum das grandes culturas do México e de parte da América Central.

Foi, portanto, um encontro completamente novo, não sem dificuldades, para entrar em um mundo desconhecido, “totalmente diferente”. Daqui nascerá uma realidade em parte nova, com o desejo de um tipo diferente de vida franciscana e até de Igreja. Isso foi possível também graças ao fato de que muitos dos primeiros frades, que chegaram ao México, juntamente com o testemunho de vida, fossem dotados de uma sólida preparação cultural, graças também às contribuições que o Renascimento estava dando à cultura: o interesse pelas artes, pelas línguas e pela etnografia. A compreensão do mundo indígena incluía, surpreendentemente, sua religião, reconhecida por alguns como uma riqueza e não apenas algo a ser eliminado.

Suas mentes eram abertas e sensíveis ao que encontravam, mesmo aquelas daqueles que se dedicavam sobretudo à vida eremítico-contemplativa. Por esta razão, eles também puderam imaginar o nascimento de uma nova Igreja, próxima daquela primitiva pela simplicidade e pobreza de seus meios, livre do peso de riquezas e pompa exterior, mesmo na liturgia, capaz de viver entre os indígenas superando os modelos europeus de bispados e privilégios. A vida religiosa vivida na verdade era o modelo em que se inspirar.

As sombras não faltaram nesse percurso. O risco de combinar uma “conquista espiritual” com a colonial; de ver as religiões locais apenas como algo demoníaco a ser extirpado; de considerar os indígenas como “infantis”, “rudes” e “bárbaros” a serem corrigidos; de uma certa aceleração na evangelização, que não permitia uma inculturação mais completa. O sincretismo religioso foi um efeito, com suas luzes e sombras. A intersecção de dois mundos não foi tão simples e, muitas vezes, parece ter coincidido mais com a imposição daquele europeu, em detrimento do novo. Os milhões de mortes entre os indígenas são uma memória muito dolorosa. Da releitura destes acontecimentos complexos e, portanto, da purificação da memória, pode nascer uma história renovada. Somos ajudados por aquilo que os Sumos Pontífices repetiram e pelo que o Papa Francisco fez justamente na sua carta de 27 de setembro de 2021 ao Presidente do Episcopado Mexicano: “Por esse motivo, em várias ocasiões, tanto meus predecessores como eu pedimos perdão pelos pecados pessoais e sociais, por todas as ações ou omissões que não contribuíram para a evangelização”.

A missão de hoje para a nossa Ordem

Da memória dos primeiros frades do México, podemos receber luz para o nosso presente. Com efeito, estamos redescobrindo cada vez mais que a renovação da vida de seguimento e da vida de missão caminham juntas. Esta última, de fato, não corresponde às obras e aos serviços que nos foram solicitados e nos quais parecemos realizados. A ação evangelizadora brota da vida vivida segundo o Evangelho, como irmãos e menores contemplativos em missão entre e com os pobres.

Se queremos uma renovação da nossa ação missionária hoje, é necessário fazer nova a vida, isto é, escolher como irmãos o primado da relação com Deus, de uma vida verdadeiramente fraterna, de uma sobriedade de vida e de trabalho que não nos afaste muito dos mais humildes, de uma missão vivida juntos, na paixão pela paz e pela casa comum. Não é uma opção, mas um imperativo para hoje e para o futuro.

De uma vida franciscana capaz de contínua reforma, poderemos também encontrar a alegria de cruzar nossas fronteiras, de deixar comodidades e seguranças que nos anestesiam e nos fazem esquecer a beleza e a paixão de nossa vocação de irmãos e menores.

Pergunto-me cada vez mais insistentemente se a escassez das vocações missionárias entre nós hoje não se deve precisamente ao definhar-se da paixão pela vida franciscana, muitas vezes considerada coincidente com alguns ministérios pastorais. O desejo de renová-la profundamente e não apenas em palavras, ousando mais, será uma fonte de missionários em todos os lugares.

Àqueles que me perguntam insistentemente como vai a Ordem, gostaria de responder que vai bem onde encontro irmãos animados por esses desejos e com a vontade de começar a realizá-los, enquanto vai mal onde nos contentamos em continuar o que existe, sem um novo olhar sobre a vida e em direção ao futuro. Não podemos pedir aos irmãos mais jovens que simplesmente continuem o que a história nos legou e que nós conservamos, muitas vezes passivamente, convictos de que é o melhor para o anúncio do Evangelho hoje.

Estou intimamente certo de que o Espírito nos pede outra coisa e com urgência: isto é, ter a coragem de nos deixarmos impelir para além de nossas seguranças, mesmo pastorais, para conceber e começar a viver uma vida franciscana “nova” nos modos e nos meios, sustentada por uma adequada preparação para a missão. O fim de tudo permanece a comunhão com o Cristo pobre e crucificado, anunciado a todos como o Salvador que, em cada língua, cultura e credo, faz resplandecer o seu Amor humilde e redentor.

O relançamento das chamadas “Novas Formas” de vida e evangelização, a retomada de algumas presenças missionárias da Ordem, a reflexão sobre novas maneiras de nos organizarmos em territórios onde as formas jurídicas que dispomos parecem que não são mais suficientes, a necessidade de começar a partir de novas realidades, também em termos de entidade, para acompanhar as possibilidades e as sementes de um renascimento, tudo isso não é apenas necessário, mas urgente, um verdadeiro chamado do Espírito hoje.

Que a memória dos Primeiros Doze frades do México e daqueles que os seguiram nos estimule a superar limites e obrigações que nos parecem intransponíveis e a deixar circular entre nós o sopro do Espírito, que faz novas todas as coisas, não só no dia de Pentecostes, mas sempre, porque sem a sua “santa operação” não seríamos nada, apenas tristes guardiães de museus. Ao contrário, desejamos muito mais neste tempo da história que é uma graça para nós!

Juntamente com a renovação de nossa vida, lá onde estamos, recordo que a Ordem precisa urgentemente de missionários neste momento, especialmente em Marrocos, Turquia e Rússia, além de certamente na Terra Santa. Recordo também a missão na Amazônia e o valor das nossas presenças com os indígenas de muitos países. Faço urgente apelo aos irmãos que se sentirem chamados para viver nestes países, a fim de anunciar o Evangelho com a vida e, quando ao Senhor agradar, com a palavra: respondei com generosidade e confiança!

Vários estão fazendo isso em outros lugares e a vida continua a fluir.

Desejando-vos um Pentecostes de luz para um novo impulso de vida em missão, saúdo-vos, com a Bênção de São Francisco.


Roma, 13 de maio de 2024

Fr. Massimo Fusarelli, ofm

Ministro geral

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