O serviço minorítico

O minorismo é uma maneira de seguir os traços de Cristo-servo. Quando esta vontade humilde de serviço tem suas raízes na pessoa de Jesus Cristo, necessariamente vai se encarnar na realidade cotidiana. Seria trair a Francisco dissociar uma leitura espiritualista de uma leitura sociológica desta noção de minorismo. Seu enraizamento é cristológico, sua aplicação é sociológica.

Francisco insiste na pedagogia do “fazer”. Repete muitas vezes que só se compreende bem aquilo que se experimentou e que nossas ações convertem mais do que mil pensamentos. Cristo conclui a cena do lava-pés, dizendo: “Sereis felizes se o fizerdes” (Jo 13.1-17).

Francisco e a tradição franciscana haverão de descobrir múltiplas aplicações desse minorismo-serviço, desse submeter-se voluntariamente aos outros, no plano dos relacionamentos interpessoais, no exercício da autoridade, no servir e trabalhar na propriedade de outros, no modo de conceber a missão, na maneira de se situar perante a Igreja, no posicionamento diante das criaturas. Vale sempre a lei do serviço minorítico.

Sabemos que Francisco ouviu o Evangelho no encontro entre seu tempo e a Palavra de Deus. Ora, em sua época, os minores eram também, em sentido sociológico do termo, o “povinho”, esses que eram desprezados, excluídos pelos maiores, a nova classe dos dirigentes burgueses que confiscaram o poder graças às suas riquezas. Na lógica do lava-pés, Francisco e seus companheiros optaram pelos marginais em benefício dos quais os movimentos medievais nada fizeram senão que trocassem de patrões. Os frades menores espontaneamente se sentirão solidários destas pessoas de baixa condição e tantas vezes desprezadas: “E os irmãos devem alegrar-se quando viverem entre pessoas insignificantes e desprezadas, entre os pobres, fracos, enfermos, leprosos e os que mendigam pela rua” (Regra não bulada, IX).

Neste contexto, encontramos o minorismo em sua acepção original de serviço, ou seja, vontade deliberada de servir ocupando o último lugar. Para Francisco e seus irmãos, tal não significa uma submissão vil e indigna do homem, mas uma opção, uma escolha voluntária, uma missão recebida do Senhor que necessita de uma sólida identidade interior enraizada na pessoa de Cristo. Em nossa sociedade ocidental e em tantas culturas, o minorismo não constitui um valor que se imponha por si mesmo. É um desafio, quer dizer, o desafio do Evangelho, de um Deus cuja revelação é humanamente desconcertante. O minorismo não se concebe sem referência a um chamamento da parte do Senhor e ao dom do Espírito. Somente a fé e a caridade podem dar um sentido libertador a este incompreensível minorismo que será necessário sempre reinventar no plano familiar, profissional e social.

O frade menor é o homem do lava-pés. Não é nem um “minus”, nem um “plus”, mas um irmão que compreendeu que o verdadeiro poder é o do amor que serve. O frade menor tenta, apesar de covardias e de fragilidade, hoje, à sua maneira, exprimir a ternura do Cristo-servo que liberta os homens e os reabilita em sua dignidade de filhos de Deus. Que esse Testamento de Cristo-servo toque nossas fibras interiores a exemplo de Francisco que, antes de dar o último suspiro, quis uma vez ainda ouvir o capítulo 13 de João lá onde Cristo lava os pés dos seus.

Finalmente, esse minorismo nada mais é que o abaixamento de Cristo, do Criador que mergulha na finitude do Homem, que nada mais é do que um corpo dilacerado na cruz, objeto de piedade e de zombaria, despojado de toda aparência de poder. E, no entanto, a maior revolução da história germinava desse crucificado, cujo “minorismo” encobria o triunfo do Amor, o único poder que tem para ele promessas de eternidade.

Frei Almir Guimarães

Referência: Michel Hubaut, Chemins d’intériorité avec saint François, Éditions franciscaines 2012, p.132-136