Campanha da Fraternidade 2023

- Campanha da Fraternidade 2023
- Mensagem do Papa Francisco
- Mensagem da CNBB
- Oração
- Reflexão do texto-base
- Hino da CF 2023
- Jesus e a fome
- Temas e Lemas de todas as CFs
Campanha da Fraternidade 2023
Pela terceira vez a fome é tratada pela Igreja no Brasil, na Campanha da Fraternidade. A primeira foi em 1975, com o tema ‘Fraternidade é repartir’ e o lema Repartir o pão’, no clima do Ano Eucarístico que precedeu o Congresso Eucarístico Nacional de Manaus, que trazia o mesmo tema e lema e desejava intensificar a vivência da Eucaristia em nosso povo. A segunda foi em 1985, outro Ano Eucarístico, desta vez em preparação para o Congresso Eucarístico de Aparecida, com o lema ‘Pão para quem tem fome’.
Agora, em 2023, logo depois do 18º Congresso Eucarístico Nacional, que se realizou em Recife, de 11 a 15 de novembro de 2022, sob o tema ‘Pão em todas as mesas’, a Igreja no Brasil enfrentou pela terceira vez o flagelo da fome. Com o lema que é uma ordem de Jesus aos seus discípulos: “Dai-lhes vós mesmos de comer” (Mt 14,16).
“É vocação, graça e missão da Igreja responder ao chamado e cumprir a ordem de Jesus, afirmamos no contexto do 3º Ano Vocacional. A fome é um instinto natural de sobrevivência presente em todos os seres vivos. Contudo, na sociedade humana, a fome é uma tragédia, um escândalo, é a negação da própria existência”.
Mensagem do Papa Francisco

Todos os anos, no tempo da Quaresma, somos chamados por Deus a trilhar um caminho de verdadeira e sincera conversão, redirecionando toda a nossa vida para Ele, que “amou tanto o mundo, que deu o seu Filho único, para que todo o que nele crer não pereça, mas tenha a vida eterna” (Jo 3, 16). Ao preparar-nos para a celebração dessa entrega amorosa na Páscoa, encontramos na oração, na esmola e no jejum, vividos de modo mais intenso durante este tempo, práticas penitenciais que nos ajudam a colaborar com a ação do Espírito Santo, autor da nossa santificação.
Com o intuito de animar o povo fiel nesse itinerário ao encontro do Senhor, a Campanha da Fraternidade deste ano propõe que voltemos o nosso olhar para os nossos irmãos mais necessitados, afetados pelo flagelo da fome. Ainda hoje, “milhões de pessoas sofrem e morrem de fome. Por outro lado, descartam-se toneladas de alimentos. Isto constitui um verdadeiro escândalo. A fome é criminosa, a alimentação é um direito inalienável” (Discurso no encontro com os Movimentos Populares, 28/X/2014).
A indicação dada por Jesus aos seus apóstolos “Dai-lhes vós mesmos de comer” ‹Mt 14, 16) é dirigida hoje a todos nós, seus discípulos, para que partilhemos — do muito ou do pouco que temos — com os nossos irmãos que nem sequer tem com que saciar a própria fome. Sabemos que indo ao encontro das necessidades daqueles que passam fome, estaremos saciando o próprio Senhor Jesus, que se identifica com os mais pobres e famintos: “eu estava com fome, e me destes de comer… todas as vezes que fizestes isso a um destes mais pequenos, que são meus irmãos, foi a mim que o fizestes” ‹Mt 25, 35.40).
É meu grande desejo que a reflexão sobre o tema da fome, proposta aos católicos brasileiros durante o tempo quaresmal que se aproxima. leve não somente a ações concretas — sem dúvida, necessárias — que venham de modo emergencial em auxílio dos irmãos mais necessitados, mas também gere em todos a consciência de que a partilha dos dons que o Senhor nos concede em sua bondade não pode restringir-se a um momento, a uma campanha, a algumas ações pontuais, mas deve ser uma atitude constante de todos nós, que nos compromete com Cristo presente em todo aquele que passa fome.
Desejo igualmente que esta conscientização pessoal ressoe em nossas estruturas paroquiais e diocesanas, mas também encontre eco nos órgãos de governo a nível federal, estadual e municipal, bem como nas demais entidades da sociedade civil, a fim de que, trabalhando todos em conjunto, possam definitivamente extirpar das terras brasileiras o flagelo da fome. Lembremo-nos de que “aqueles que sofrem a miséria não são diferentes de nós. Têm a mesma came e sangue que nós. Por isso, merecem que nina mão amiga os socorra e ajude, de modo que ninguém seja deixado para trás e, no nosso mundo, a fraternidade tenha direito de cidadania” (Mensagem para o Dia Mundial da Alimentação, 16/X/2018, n. 7)
Confiando estes votos aos cuidados de Nossa Senhora Aparecida e como penhor de abundantes graças celestes que auxiliem as iniciativas nascidas a partir da Campanha da Fraternidade, concedo de bom grado a todos os filhos e filhas da querida nação brasileira, de modo especial àqueles que se empenham incansável- mente para que ninguém passe fome, a Bênção Apostólica, pedindo que continuem a rezar por mim.
Roma, São João de Latrão, 21 de dezembro de 2022.
Franciscus
Mensagem da CNBB
Mensagem
A Campanha da Fraternidade é o modo brasileiro de celebrar a Quaresma. Ela não esgota a Quaresma. Dá-lhe, porém, o tom, mostrando, a partir de uma situação bem específica, o que o pecado pode fazer quando não o enfrentamos. Por isso, a cada ano, recebemos um convite para viver a Quaresma à luz da Campanha da Fraternidade e viver a Campanha da Fraternidade em espírito de conversão pessoal, comunitária e social.
Este ano, com o tema “Fraternidade e Fome”, somos convocados a considerar a fome como referência para nossa reflexão e nosso propósito de conversão. Temos, sem dúvida, fome de Deus. Desejamos estar com Ele e poder participar de seu amor e de sua misericórdia. Temos fome de paz, fraternidade, verdade, concórdia e tudo mais que efetivamente nos humaniza. Durante o tempo da pandemia, no qual, por medidas sanitárias que buscavam nos preservar, não pudemos ir às igrejas para comungar, sentimos fome do Pão do Céu.
A fome, bem sabemos, é um ato de preservação. É um sinal para que não nos distraiamos quando nosso organismo sente falta do necessário para viver. O que ocorre, porém, quando o alimento não chega a todo ser humano? O que faz uma sociedade ter filhos e filhas a quem, embora busquem, clamem, gritem e chorem, não chega o alimento? Por isso, a fome é também um desafio social, humanitário, uma situação que não se pode deixar de enfrentar, pois a fome de uns – a fome de uma só pessoa! – onera a todos nós, onera a sociedade inteira. Cada ser humano que não encontra o necessário para se alimentar é, em si, um questionamento a respeito dos rumos que estamos dando a nós mesmos e à nossa sociedade. A fome é um dos resultados mais cruéis da desigualdade. Afeta inicialmente os mais necessitados. Atinge, contudo, a todos, diz respeito à sociedade inteira. Esta é a razão pela qual o Papa Francisco, sem rodeios, afirma que “não há democracia se existe fome’.
E O Brasil sente fome. Milhões de brasileiros e brasileiras experimentam a triste e humilhante situação de não poder se alimentar nem dar aos seus filhos e filhas o alimento indispensável a cada dia. Por isso, a CNBB apresenta, pela terceira vez, o tema da fome para a Campanha da Fraternidade (1975,1985 e 2023).
Ao falar da vida eterna, Jesus utilizou a imagem do banquete (Mt 22,2), mostrando-nos que o desejo do banquete eterno deve se traduzir em atitudes de compromisso com uma sociedade em que o alimento esteja em todas as mesas. Jesus teve compaixão da multidão faminta (Mt 14,14-21). Embora os discípulos apontassem a solução de deixar o problema nas mãos de quem corria o risco da fome, Jesus abre os olhos e os corações destes mesmos discípulos para que não se justifiquem diante da impossibilidade, mas compreendam que a mudança da realidade começa com eles, em escuta ao Senhor, que lhes ordena darem, eles mesmos, à multidão, o que comer. Jesus indica outra maneira de compreender as interpelações que a vida nos traz. Ultrapassando a lógica imediata, Ele aponta para a necessidade de agir conjuntamente, ainda que as dificuldades sejam grandes e os recursos pequenos. Quando acolhemos o mandamento do Senhor, nosso modo de compreender os desafios torna-se outro e o resultado é infinitamente maior.
Que, portanto, esta Quaresma seja vivida em forte espírito de solidariedade. Que nosso jejum abra nosso coração aos irmãos e irmãs que sofrem com a fome. Que nossa solidariedade seja intensificada. Que saibamos encontrar soluções criativas para a superação da fome, seja no nível mais imediato, assistencial, seja no nível de toda a sociedade. Que efetivamente se cumpra a responsabilidade dos governantes, em seus diversos níveis, concretizando políticas públicas, principalmente as de estado, que atinjam a raiz deste vergonhoso flagelo, garantindo não apenas a produção de alimentos, mas também que eles cheguem a cada pessoa, em especial as mais fragilizadas. Que o Senhor Jesus nos possa um dia dizer: “Vinde ( … ) eu estava com fome, e me destes de comer; todas as vezes que fizestes isso a um destes mínimos que são meus irmãos, foi a mim que o fizestes!” (Mt 25,34.40).
Abençoada Quaresma! Intensa Campanha da Fraternidade! Santo caminho até a Páscoa do Senhor, na oração, no jejum e na misericórdia.
D. Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo de Belo Horizonte – MG
Presidente
D. Mário Antônio da Silva
Arcebispo de Cuiabá – MT
2º Vice-Presidente
D. Jaime Spengler
Arcebispo de Porto Alegre – RS
1º Vice-Presidente
D. Joel Portella Amado
Bispo auxiliar do Rio de Janeiro – RJ
Secretário-Geral
Cf. FRANCISCO. Mensagem ao diretório argentino do Comitê Pan-Americano de [uízes pelos Direitos Sociais e a Doutrina Franciscana, 2 de outubro de 2021.
Oração
Pai de bondade,
ao ver a multidão faminta,
vosso Filho encheu-se de compaixão,
abençoou, repartiu os cinco pães e dois peixes
e nos ensinou: “dai-lhes vós mesmos de comer”.
Confiantes na ação do Espírito Santo,
vos pedimos:
inspirai-nos o sonho de um mundo novo,
de diálogo, justiça, igualdade e paz;
ajudai-nos a promover uma sociedade mais solidária,
sem fome, pobreza, violência e guerra;
livrai-nos do pecado da indiferença com a vida.
Que Maria, nossa mãe, interceda por nós
para acolhermos Jesus Cristo em cada pessoa,
sobretudo nos abandonados, esquecidos e famintos.
Amém
Reflexão do texto-base
Consequências da fome
67. “A fome ameaça não só a vida das pessoas, mas também a sua dignidade. Uma carência grave e prolongada de alimentação provoca a debilidade do organismo, a apatia, a perda do sentido social, a indiferença e, por vezes, a hostilidade em relação aos mais frágeis: em particular as crianças e os idosos” (62) Historicamente, a fome é um dos maiores destruidores da família, pois a desestabiliza e desestrutura, obrigando à separação por meio da migração forçada pela necessidade; gera violência doméstica, violência no campo e na cidade e leva à perda do sentido da vida. É causa do êxodo rural, tão presente em nossa história passada e presente. Os agricultores estão envelhecendo e os jovens, retirados de suas realidades, não querem mais voltar para o campo e permanecer na terra. As periferias urbanas vão inchando e os governantes assistem a isso de braços cruzados.
68. Há diversas consequências no campo da saúde, seja ela física ou psíquica. Pessoas expostas a riscos sociais de insegurança alimentar, leve ou moderada, substituem a alimentação saudável (alimentos naturais e pouco processados) por uma alimentação extremamente prejudicial à saúde (alimentos ultraprocessados, ricos em açúcar, sal, gordura e conservantes), dado que seus preços são menores. “A fome produz uma raça de crianças raquíticas, homens condenados à baixa estatura, deficiências irremediáveis no desenvolvimento intelectual e gente mais vulnerável a doenças (…) Com fome, o ser humano não se pode manter nem se defender dos ataques dos parasitas ou das forças naturais” (63).
69. Já conhecemos a associação de alimentos ultraprocessados a doenças crônicas como diabetes, doenças cardiovasculares, hipertensão, câncer, e ainda com problemas de saúde mental como depressão e ansiedade. Toda alimentação desequilibrada, com excesso de ultraprocessados ou rica em carboidratos e gorduras, e pobre em vitaminas e proteínas, causa desequilíbrio e consequentemente desnutrição. Junto à má alimentação, vêm os efeitos metabólicos do excesso de gordura e carboidratos. Além de desnutridas, estas pessoas têm maior disposição a desenvolver colesterol alto e diabetes ao longo do tempo.
70. Há outro efeito da insegurança alimentar que também pode trazer sérios problemas de saúde. É o que os nutricionistas chamam de “carga dupla da má nutrição”, ou seja, a coexistência do excesso de ultraprocessados e da falta de nutrientes na alimentação. Assim, numa família que passa por uma situação de insegurança alimentar, pode haver indivíduos desnutridos e obesos ao mesmo tempo. O Brasil é campeão mundial em obesidade em crianças e mulheres em idade fértil.
71. As principais vítimas da insegurança alimentar são as crianças, já que, no caso delas, pode comprometer o crescimento e o desenvolvimento físico e cognitivo, uma vez que a anemia, que é a ausência de ferro no organismo, pode comprometer o desenvolvimento de órgãos, tecidos e o funcionamento cerebral, afetando capacidades como a memória e a atenção, a leitura e a aprendizagem de linguagens como um todo, o que por sua vez leva ao mau rendimento escolar. Esse déficit pode ser irreversível em situações de insegurança alimentar grave. Impactos dessa natureza não se resumem ao desempenho acadêmico, mas também afetam capacidades de tomada de decisão e o desenvolvimento socioemocional do indivíduo. Crianças que sofrem de insegurança alimentar têm seu desenvolvimento e suas perspectivas de futuro prejudicadas. Ao longo de uma vida, isso pode levar ao abandono dos estudos, menores perspectivas salariais ou baixa capacidade de manter um emprego fixo.
72. Nesse sentido, o último Relatório da UNESCO (2022) afirma: “O direito à educação está intimamente conectado a outros direitos humanos. Como garantidores de direitos, os Estados têm a responsabilidade de realizar esforços intersetoriais para criar as condições necessárias para viabilizar e facilitar a aprendizagem de todas as crianças e jovens. Isso significa garantir o acesso a direitos fundamentais, como o direito à água e ao saneamento, à alimentação e à nutrição saudáveis, à proteção social, a viver em um ambiente familiar e comunitário estável e saudável, que promova o bem-estar emocional e físico e a viver livre de todas as formas de violência” (64).
73. No caso de adultos malnutridos, o problema é especialmente perigoso em idosos e gestantes, que correm maior risco de morte. Embora as doenças crônicas atinjam mais os adultos, crianças que se alimentam mal tendem a sofrer as consequências no futuro, com risco maior de desenvolver as mesmas doenças. Quanto mais avança a idade, pior se torna o quadro metabólico.(65)
74. Além disso, é preciso cuidar para que os ambientes educativos sejam supridos com alimentos saudáveis e a própria educação contribua para uma vida saudável, para a partilha com os mais necessitados e para a sustentabilidade.
75. Ironicamente, temos uma crescente indústria de proteínas caríssimas, direcionadas a um público situado no outro extremo, o daqueles que podem pagar absurdos por seus alimentos fitness, enquanto outros, nada têm para comer. “Gastam-se somas incalculáveis para a satisfação de prazeres deprimentes, entre os quais avulta hoje o consumo de tóxicos e sua indústria.”(66)
76. Uma consequência quase ignorada é o aumento da criminalidade. Muitos que hoje estão privados de liberdade, no sistema carcerário, já foram privados, ontem, da participação no sistema produtivo e no sistema de consumo, vindos, em grande número, de realidades de fome, miséria, desemprego e toda sorte de provações.
77. Não existe no nosso País uma agência reguladora da alimentação, como existe para os medicamentos e outras realidades (67). Uma entidade reguladora ajudaria a não nos alimentarmos mal por desconhecermos o que de fato os alimentos trazem para dentro de nós.
62 Pontifício Conselho Cor Unum. A fome no mundo. Um desafio para todos: o desenvolvimento solidário. Cidade do Vaticano, 1996, n. 5.
63 CNBB. Pão para quem tem fome. Campanha da Fraternidade 1985, n. 17 e 12.
64 UNESCO. Reimaginar nossos futuros juntos: um novo contrato social para a educação. Brasília: Comissão Internacional sobre os Futuros da Educação., Boadilla dei Monte: Fundación SM, 2022, p. 107.
65 CNN BRASIL. 19 milhões de brasileiros vivem com fome; consequências na saúde são irreversíveis. Por Camila Neuman. São Paulo, 28 de outubro de 2021. Disponível em https:www.cnnbrasil.com.brlsaude/19-milhoes-de-brasileiros-vive-com-fome-consequencias-na-saude-sao-irreversiveis. Acesso em: 2 de maio de 2022.
66 CNBB. Pão para quem tem fome. Campanha da Fraternidade 1985, n. 22.
67 Agência Nacional de Águas; Agência Nacional de Aviação Civil (Anac); Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel); Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS); Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel); Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq); Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT); Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa); Agência Nacional do Cinema (Ancine); Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis.
Hino da CF 2023
Hino da CF 2023
Gabriel Belisario, de 23 anos, da diocese de Guarapuava (PR), foi o autor escolhido da melodia que animará as reflexões durante a Quaresma deste ano.
Gabriel Belisario é um leigo e casado, natural de Guarapuava, onde também reside. Atualmente, ele trabalha na Secretaria da Ação Evangelizadora da diocese de Guarapuava.
Esta foi a primeira vez que Gabriel participou de um concurso para a escolha de música do hino da Campanha da Fraternidade. Sobre a inspiração, ele afirmou que o tema e o lema da Campanha em si já foram grande fonte de inspiração. Neste ano, a CF aborda o tema “Fraternidade e fome” e o lema “Dai-lhes vós mesmos de comer” (Mt 14, 16).
“A fome é algo que assola a humanidade e é necessário falar de fraternidade e partilha a respeito deste problema. O mandato de Jesus que é o lema da Campanha, ‘Dai-lhes vós mesmos de comer” (Mt 14, 16), nos convoca enquanto Igreja missionária para este compromisso de ajudarmos, através da partilha, nossos irmãos mais pobres e necessitados. Por isso, ao compor a música, segui as orientações do concurso e busquei deixá-la simples e acessível aos ouvidos de quem a escutará, com melodia e ritmo fluentes, realçando bem o sentido da letra, e pensando na finalidade de suscitar e provocar o sentimento de adesão ao compromisso proposto por esta Campanha”, afirmou.
Para Gabriel, “é uma alegria poder contribuir com este Projeto de Evangelização da Igreja e poder contribuir com uma obra que pode conscientizar as pessoas acerca da realidade da fome em que hoje vivemos”.
Ele recorda o que afirma o Papa Francisco na Fratelli Tutti, que “a alimentação é um direito inalienável”. “Que possamos, com alegria e coração aberto, cumprirmos o mandato de Jesus”, deseja Gabriel.
CNBB / Portal Kairós
Jesus e a fome
Nos 59 anos da Campanha da Fraternidade, a CNBB, pela terceira vez, aborda a questão da fome (1975, 1985 e 2023).
O trabalho dignifica o ser humano, sendo, também, o primeiro e fundamental meio de autossustento. É uma máxima do Criador: “Com o suor do teu rosto, ganharás o pão de cada dia” (Gn 3,19).
Catástrofes naturais, ou aquelas que são provocadas pela ação humana, podem levar a uma fome generalizada.
A História da Humanidade registra várias delas e são narradas na Bíblia, como o Dilúvio (Gênesis caps. 6 a 9) e as conhecidas “sete vacas gordas e sete vacas magras” da cultura egípcia. O Egito preparou-se para a carestia, estocando alimentos.
Os outros povos, inclusive Israel, “para não morrerem de fome” (Gênesis, caps. 42 a 46) migram para lá. Quando se esgotaram os recursos, submetem-se à escravidão.
Israel, após “430 anos” (Ex 12,40), regressa ao seu país, passando um longo período no deserto. Ali murmuram contra Javé, pois não tinham nem pão, nem água (caps. 16 e 17).
Estas duas experiências pelas quais passaram, fez com que a Torah inserisse leis sociais que garantissem vida digna aos “órfãos, viúvas e estrangeiros” (Dt 24, 17-18). O objetivo é de que “entre vós, não haja pobres” (15,4-11).
Uma vez estabelecidas no país (Palestina), as assíduas vozes proféticas ecoavam no meio do povo e dos governantes, lembrando-os desse compromisso. Mesmo assim, a fome persistia.
O profeta Elias, por causa da longa estiagem, constata que a “fome era extrema em Samaria” (1Rs 18,2) e que Javé o mandou mendigar um pão a uma viúva de Sarepta (cf. 1Rs 17,8-16).
“A fome dominava a cidade e não havia comida para o cidadão comum”, diz Jeremias (52,6). Outros profetas constatavam a mesma situação. Mesmo tendo conhecimento desta delicada situação, Amós abre outra perspectiva ao afirmar que “Javé mandará fome sobre a terra – não a de pão, nem de água – mas de ouvir a Palavra de Deus” (Am 8,11).
Os Evangelhos narram que Jesus, por duas vezes, tem “compaixão do povo”.
A primeira foi quando viu uma multidão, abatida e desorientada, como “ovelhas sem pastor. E começou a ensinar-lhes muitas coisas” (Mc 6,34). Sua ação imediata é o ensino.
Na segunda vez, ficou comovido porque o povo “não tinha o que comer” (Mt 15,32). Sua ação imediata foi providenciar comida.
Os apóstolos sugerem que despeça a multidão “para que fossem ao povoado onde poderiam comprar pão”. Jesus, porém, os compromete, dizendo: “Dai-lhes vós mesmo de comer” (Mt 14,16).
O eixo que move Jesus é a “compaixão”. Ver o povo desorientado como ovelhas sem pastor e vê-lo faminto – isto mexe com suas entranhas (= etimologia da palavra compaixão). É como se fosse uma foto impressa em seu coração, do qual nunca sairá. Vira-e-mexe, ela palpita dentro dele numa mútua solidariedade e empatia.
A compaixão ultrapassa, em muito, a um sentimentalismo passageiro. Ela é um “comover-se no mais profundo do ser – as vísceras ou entranhas – que leva Jesus a uma ação concreta de libertação” (CF/2023, Texto Base nº 20).
Para o judeu, 5 pães e 2 peixes, é a quantia de alimento para uma família passar o dia. Por isso, quem apresenta a solução é um menino e não um assalariado adulto que o apóstolo Felipe sugere: 200 denários para que cada um possa receber um bocado. Denário é a diária que um trabalhador recebe por um (01) dia de serviço. As ações que movem a compaixão não são números matemáticos.
Deus realiza milagres no nosso dia a dia. Para tanto, faz-se necessário a partilha dos 5 pães e 2 peixes, e a bênção; ela é o “erguer os olhos” para agradecer o fruto do “suor do rosto”.
O milagre inclui, também, a descentralização do poder: os apóstolos organizam o povo em grupos, distribuem o pão e recolhem as sobras.
“Para combater a falta de alimento é necessário agir sobre as causas que a promovem. Na raiz deste drama estão, sobretudo, a falta de compaixão e uma escassa vontade política e social” (CF/2023, Texto Base nº 09).
Combater a fome não se faz somente com a política social (ver a realidade). Ela tem, também, uma raiz bíblica, a compaixão.
São duas mãos que se entrelaçam em mútua entreajuda. Continuaremos a refletir no próximo mês!
Frei Luiz Iakovacz, ofm
Temas e Lemas de todas as CFs