Vocacional - Província Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil - OFM

III – Anotações espirituais em torno do masculino e feminino, uma questão

08/03/2021

 

I

Usualmente não é possível falar do masculino e feminino sem se referir de algum modo à afetividade, ao sexo e à sexualidade. Na Espiritualidade, sexo e sexualidade se referem à união de corpo, alma e espírito, no amor do encontro entre dois seres humanos, entre homem e mulher, de cuja união podem e devem nascer e renascer três novos seres humanos, a saber pai, mãe e filho, enquanto vida humana a partir e dentro da existência cristã. Trata-se, portanto, de uma totalidade toda própria, com sua lógica própria, ou com a sua razão de ser, cuja imensidão, profundidade e originariedade abrange, toca e atinge o âmago da profundidade a mais íntima do ser humano, a pessoa[1], que na linguagem usual da Psicologia parece receber o nome de Self, Selbst (Jung). O que a mundividência cristã, usando indevidamente a Filosofia, explica como Deus transcendente da metafísica i. é, para além do ser humano, de alguma forma está referido, embora de um modo muito deficiente e defasado, à experiência de fundo do ser humano, onde homem e mulher, em sendo pessoa é acolhida e recepção cordial e grata do toque, da diligência e do cuidado de uma transcendência radicalmente outra, na ternura e vigor de um encontro também radicalmente outro. Radicalmente outro quer dizer tão inteiramente idêntico nele mesmo que não pode ser percebido, explicado, a não ser nele mesmo como ele mesmo A esse fundo do ser humano acima denominado Self, Selbst, na Psicologia, e na mundividência da Espiritualidade de pessoa, a Grande Tradição do Pensamento Ocidental chamou de Psiqué, Lógos, Espírito, Razão, Liberdade e Ser[2]. Nesse sentido falar do masculino e feminino é como tocar na ponta de um ice-berg, cujo fundo submerso na sua totalidade é o mistério da essência do Homem. A Espiritualidade da mundividência cristã pretende falar sobre o masculino e o feminino a partir e dentro da dimensão da pessoa acima insinuada.

II

Usualmente se distinguem os adjetivos feminino e masculino dos substantivos fêmea e macho. Correspondentemente se distingue sexual do genital. O adjetivo genital se refere ao aspecto físico-corporal de reprodução animal do ser humano e a suas implicações; sexual, ao aspecto psicofísico, anímico sensual, erótico do ser humano, que de alguma forma está relacionado com o aspecto genital. Pergunta-se: o sexual diz respeito, de alguma forma, também à dimensão chamada espiritual? Os medievais perguntariam pois: os espíritos (a saber, a alma, o espírito, o anjo e Deus) têm sexo? Se o tem, de que sexo é?

Essa questão, hoje ridicularizada, na realidade implica uma questão que nos aparece na questão atual, colocada acerca da Ciência Moderna no que se refere ao seu ser. Em que consiste a cientificidade das ciências naturais e a cientificidade das ciências humanas? O que significa o termo ciência, quando se refere às ciências modernas, naturais e humanas? O saber científico tem sexo? Certamente não?! Há geometria, aritmética ou matemática feminina, masculina, ou sensual e erótica, ou católica ou protestante ou budista, há matemática anciã, adulta, infante? Certamente o saber científico nada tem a ver com todos esses adjetivos, indicativos do ser humano. Mas há Psicologia feminina? O saber chamado psicológico, enquanto saber, é masculino, feminino ou neutro? Por que intuição é feminina? Raciocínio, masculino? O que significa intelecto é mais do masculino, o coração, mais do feminino?

Mas, não houve aqui uma troca de assunto? Começamos a falar da diferença do aspecto genital do aspecto sexual. Começamos falando portanto da realidade em si, denominado genital e sexual no ser humano. Agora, ao perguntar se o saber científico tem sexo, estamos falando não da dimensão objetiva denominada genital e sexual, mas do saber sobre o genital e sexual. O objeto de um saber pode ser o masculino e o feminino.O sujeito do saber  pode ser masculino ou feminino. Mas o saber, o ato de saber pode ser masculino e feminino? Mas, dizemos: o modo de abordar, o modo de compreender e explicar um objeto, no nosso caso o masculino e o feminino, pode ser masculino e feminino! Mas então podemos também ampliar o que foi dito e dizer: a abordagem, a compreensão de uma coisa, de um tema pode ser genital e sexual, sensorial e sensual, engajado e neutro,  católico, protestante e materialista, progressista e fundamentalista, pode ser material, psíquico e espiritual, historiográfico, estórico, estético e artístico, medicinal, terapêutico etc. Essa questão, hoje muito importante na teoria de conhecimento, esquecida em certos círculos científico-acadêmicos, no início do  século XX mobilizou o Ocidente, quando a Psicologia começou a aplicar para si o método científico experimental. E apareceu sob denominação corrente na época de: psicologismo, biologismo e naturalismo. Não entrando muito nessa questão, para ver mais ou menos de que se trata, em relação ao nosso tema masculino e feminino, vamos ouvir duas anedotas budistas que nos podem fazer ver a questão acima mencionada. São anedotas que mostram o modo de ser de dois homens a respeito de uma jovem mulher em apuros e de duas mulheres a respeito de um monge “exemplar” na busca da iluminação.

III

  • 1ª anedota: Dois monges budistas estavam à caminho na busca da iluminação. Um deles era mais idoso, outro bem novo. Depois de muito caminhar, chegaram a um rio, onde era necessário arregaçar as vestes quase até a cintura, para passar a vau. Uma moça viajante, muito bela, em quimono, estava em apuros, pois o encarregado de transportar as pessoas para a outra margem do rio, não viera trabalhar. O monge mais idoso se aproximou da jovem, disse-lhe “Com licença” e a carregou nos braços, atravessou o rio e a colocou na outra margem. E sem dizer nada prosseguiu o caminho com o seu companheiro mais jovem. Este, a caminhar atrás do outro monge mais idoso murmurava: “Onde se viu, no caminho da iluminação, abraçar uma moça, ele que deveria ser sóbrio e casto, já maduro na sua experiência da busca e realização?” Ao ouvir atrás de si a murmuração, disse o monge idoso: “A caminho da iluminação, há alguém que ainda está abraçado a uma bela e atraente jovem mulher”.
  • 2ª anedota: Era uma vez uma velha viúva rica, budista, leiga, muito piedosa, fervorosa na busca da iluminação. Desejava ter tido um filho monge, mas nenhum dos filhos seguiu o caminho da perfeita iluminação. Decidiu adotar um monge. Construiu um pequeno eremitério, num lugar silencioso e retirado, cercado de uma belíssima paisagem, longe dos burburinhos mundanos. Foi ao mosteiro mais próximo e ofereceu ao abade o eremitério, e lhe prometeu cuidar do sustento e do bem-estar do monge que quisesse doar-se full time à meditação, e assim aplicar todas as suas forças somente à aquisição da iluminação. E recebeu do abade um monge, de grande dedicação à contemplação, que meditava sem cessar, dia e noite, sem nenhum apego às coisas mundanas, sem nenhuma distração. A velha viúva estava satisfeita. Mas, depois de um ano, quis ver o progresso do seu monge de adoção. Chamou uma empregada, belíssima e ansiosa por encontrar um marido e lhe deu a seguinte tarefa: “Minha filha, o monge que mora naquele eremitério, seria um bom partido para ti. Ele é bom e belo, cheio de saúde, é um homem sério e reto. Vai seduzi-lo, usa de todos os teus recursos femininos para que ele se apaixone por ti. Se o conseguires, ele que é meu monge adotado, é teu”. A moça que já há muito tempo sentia uma grande atração e admiração pelo jovem monge, usou de todos os recursos para atraí-lo a si. Depois de uma semana de tentativa, achegou-se à velha mulher, em prantos, e sem nada dizer mostrou-lhe um pequeno bilhete, escrito pelo monge. Ali estava uma haikai, uma pequena poesia, escrita em belíssimas letras chinesas, mais ou menos de seguinte teor: Sou uma grande rocha, firme, impávida e fria, a pedra de iluminação. O que quer esse raquítico cipozinho a se enroscar em mim, com seus fiapos de tentáculos, carentes e sem consistência?” Ao ler essa poesia, a velha se encolerizou, e disse numa voz surda, baixinha, mas cheia de determinação: “Alimentei por um ano um charlatão preguiçoso, travestido de um monge!” Incendiou o eremitério, e expulsou o monge a golpe de caçarola.

Observemos: a) o modo de ser do monge mais velho que carregou uma moça muito bonita em apuros para transportá-la à outra margem do rio, podemos chamá-lo de modo coisal de abordar uma realidade. Aqui, o contacto do corpo e corpo, do monge e da jovem mulher é de coisa para coisa, de coisa e coisa. Aqui se dá o encosto, não porém, toque ou contato propriamente ditos. A relação não é propriamente relacionamento. Não há colorido. É neutro. Indiferente e indiferenciado em referência a aspectos que não sejam naquilo que diz respeito à lógica de um transporte de carga, do carregador de fardos. Aqui o ato humano é apenas ocorrência. b) O modo de ser do monge mais novo em referência ao ato de seu colega de ter carregado a moça, podemos chamá-lo de moral. Aqui não se trata apenas de um ato como ocorrência. Trata-se de um modo de ser que visa uma meta dentro de um projeto. Por isso diz: “Onde se viu, um monge, no caminho da iluminação…” Aqui a moça pode aparecer de imediato como impedimento, perda de tempo; mas também como tentação cedida de tocar no feminino como objeto de prazer etc. A relação aqui entre o monge mais novo e a moça sai da neutralidade do encosto de coisa e coisa e se torna um envolvimento colorido, onde a moça não é um simples peso de carga, mas um ‘objeto’ que toca o sujeito mais agudamente, como impedimento, tentação. Nesse toque surge uma dimensão que antes não havia na ocorrência de encosto coisa e coisa. Proibição e permissão, mandamento e submissão, apego e renúncia são termos que começam a ter um sentido dentro dessa dimensão moral. No entanto, no monge mais jovem essa dimensão parece ainda não estar na plenitude do seu ser, de modo que ele considera o modo de agir do monge mais velho como uma transgressão ou infidelidade ao projeto da busca da iluminação; ao passo que à primeira vista o  monge mais velho parece mover-se no modo de ser apenas coisal, pode ser que vive a plenitude da dimensão moral, que nele poderíamos chamar de ético, onde a meta da busca da iluminação impregna todos os seus atos, de tal sorte que tudo, a cada momento, todos os seus afazeres têm um único sentido e função, ser etapas e momentos de uma única busca que é a aquisição da iluminação. c) Na segunda anedota, a velha viúva e o monge parecem estar vivendo intensamente essa dimensão ética acima mencionada no b). E a moça empregada, na busca do seu marido, numa dimensão que é mais do que a dimensão coisal, intensamente sensível, sensual onde está em atividade de algum modo o modo genital e sexual, mas tudo isso a partir e dentro de um modo de ser impulsivo e instintivo, o qual denominamos de natural ou hedônico ou estético. Aqui a meta, o projeto de casamento é como que uma eclosão da realização natural do seu instinto. d) Voltando à atitude ética tanto da velha viúva como do monge, percebemos no fim da anedota uma diferença radical. No monge, na sua atitude ética, a meta da iluminação é buscada não como uma causa a que ele se entrega para ser transformado segundo o desígnio da iluminação. Em vez disso, a meta é usada, para engrandecer o poderio e a autosuficiência do próprio eu. Assim, em lugar de tornar-se um “corpo livre”, a saber, uma disposição bem concreta e finita, cada vez nova, aberta cordialmente ao frescor do inesperado, tornara-se endurecido qual uma “cabeça” de pedra, a ponto de desprezar a “possibilidade” da jovem mulher como “cipozinho” mirrado. Com outras palavras, a sua dimensão ética, tornara-se moralizante, ideológica, e não mais uma preparação incondicional para a liberdade da iluminação. A velha senhora percebe tudo isso, por estar ela na plenitude da dimensão ética. Temos assim nas anedotas mencionadas as seguintes dimensões de abordagem do que é masculino e feminino: 1. dimensão da abordagem material-coisal; 2. natural (ou estética, hedônica); 3. ética (ou moral ou moralizante); e como que insinuada na plenitude da dimensão ética, 4. a dimensão da abordagem religiosa.

IV

A seguir sugerimos, apenas como proposta, examinar juntos as seguintes afirmações hipotéticas: a) As Ciências positivas naturais, na abordagem do que seja masculino e feminino, permanecem na dimensão 1, e reduzem e miram as dimensões seguintes a partir e dentro de si. b) As Ciências humanas ou permanecem na dimensão 2, reduzindo e mirando as outras a partir e dentro de si; c) As Ciências filosóficas questionam a partir e dentro da dimensão 3, a si e as outras, interrogando-as no sentido do ser, presente e dominante na impostação das suas pressuposições de fundo. d) A Espiritualidade, enquanto cristã e saber, tenta ser sabedoria, i. é, ao sabor do toque da gratuidade da alteridade radical de um radical outro ab-soluto, i. é, livre e solto na sua doação graciosa e grata, deixando-se criticar, i. é, limpar-se pelas ciências a, b, c em tudo quanto nela se aninhou como explicações, pressuposições, hipóteses, teorias e doutrinas que não vêm nem pertencem à dimensão e abordagem da graça, ternura e vigor da sua dimensão.

V

Depois de termos discutido à beça as afirmações hipotéticas anteriores, tentemos agora destacar uma das assim chamadas características diferenciais do masculino e feminino, a saber, o binômio ativo e passivo, para ver como dentro da perspectiva da acima mencionada afirmação hipotética d) a da Espiritualidade (dimensão 4) considera o ativo como característica do masculino, e o passivo como característica do feminino.

Em primeiro lugar, a espiritualidade deixa de lado as considerações da dimensão 1, por ser ela neutra demais no seu modo de ser, onde ainda não surgiu a diferença entre masculino e feminino; mas considera a dimensão 2, porém,  passiva, portanto feminina; ao passo que a dimensão 3, ela considera ativa, portanto masculina. E na dimensão 4 apenas insinuada na compreensão que a viúva budista tinha da iluminação, ao chamar o monge de charlatão, a espiritualidade vislumbra um passivo todo próprio, que é a essência do feminino. E é esse feminino da 4ª dimensão que conduz tanto o religioso como a religiosa na lógica da sua doação ao amor, dentro do celibato cristão. A seguir vamos esquematizar o que foi dito de modo mais detalhado, mas assim em estilo telegráfico, pois o que aqui está exposto só serve para servir de instrumentum laboris para as nossas trocas de idéias.

  1. Dimensão da abordagem material-coisal: silenciada, pois ao menos à primeira vista parece neutra demais, demasiadamente coisal para poder referir-se ao ser humano na sua vitalidade sensível, sensual, erótica e hedônica, estética da dimensão 2 natural; ou na responsabilização, moralizante, moral e ética da dimensão 3, ética, e da 4, da religiosa, o lugar próprio da espiritualidade. No entanto é de grande interesse para a espiritualidade uma interpretação toda própria e aprofundada dessa neutralidade provisoriamente coisal. Cf. o amor no Mistério da Encarnação em São Francisco: Natal, Eucaristia, Morte na Cruz.
  2. Dimensão natural (ou estética, hedônica) = passivo, feminino: aqui pertence o elemento sensorial de prazer e desprazer e suas sensações; elemento sensual, desde o prazer e desprazer em nível genital, erótico, até ao prazer e o desprazer em nível da sensibilidade estético-espiritualista. O fascínio e a atração pelo gosto e desgosto; pela beleza e hediondez, pelo prazer e horror envolvente na passividade do ser afetado, do padecer as vicissitudes da necessidade vital. É a dimensão ou o reino do sensível, do visível na impostação “metafísica” tradicional; é a dimensão da “carne”. Atribuições: naturalidade, espontaneidade, vitalidade, vivência, coração, sentimento, irrupção instintiva, paixão cega. Mãe libertadora e devoradora. “Participation mystique”. Na Ásia: Dragão, que é feminino: Ternura e vigor da vida elementar (intempéries e erupções da fúria da natureza; a generosidade e o abismo da pujança vegetal e animal), gracinha e fofura das crianças, espontaneidade e vitalidade inocente e solta das meninas, infantes e adolescentes, sua doçura e sensibilidade; graça e beleza da jovem mulher, virgem (Jung-Frau: a garota de Ipanema – Vinicius de Moraes); sensualidade madura, cheia de ternura e vigor de recepção e doação do amor-paixão, cuidado e diligência, mas ao mesmo tempo tenaz, persistente, envolvente como fogo abrasador e devorador, serenidade cheia de transparência da bondade na benignidade do retraimento. Mãe-Terra.
  3. Dimensão ética: aqui a dominante é autonomia e responsabilização da liberdade, que se chama também o reino da necessidade livre. O tom é ativo, masculino. É o reino do saber, querer, buscar, conquistar, do poder. Reino do empenho, do trabalho, planejamento, do assumir. Esse masculino, no entanto, nada tem a ver propriamente com o “colorido” machão do poder e dominação da subjetividade agressiva e empoada, mas com o varão no sentido latino do vir, -i; donde vem a palavra virtus, -tis, a virtude, do sentido grego do anér sophón, o varão na acepção da imensidão, profundidade da vigência de serenidade clara, vigorosa da generosidade de ser. Na Ásia: O céu. A vigência da grandiosa serenidade da imensidão do céu aberto, infinito, a perder-se no abismo da claridade profunda. Explicar o ideograma chinês Daí: 1 = linha do horizonte; em cima Céu, em baixo Terra. Homem atravessado por uno é daí = grande. Ligar a idéia dessa grandeza com virtus, trabalho e cuidado do Senhor, i. é, Dominus, Dominus dominantium, = servo modo de pai de família: daí o éthos como moradia, a possibilidade do morar, habitar a Terra Þ Mundus.
  4. Essa dimensão não é resultado de 2 e 3, enquanto fundamentação, complementaridade, evolução, oposição, mas sim resultado de repercussão diferencial do e ao uno: na espiritualidade cristã isso se chama participação e comunicação: comunhão. É, pois, um fenômeno do encontro, o mais intenso e profundo no amor, exemplificado pela união corpo e alma e espírito na contração sexual de duas pessoas, uma masculina e outra feminina: matrimônio cristão. Mútua doação e recepção de si, num movimento centripetal de contração, onde se dá a concreção de mútua posse e identificação: desenhar o movimento espiral, centripetal para a direção de um ponto: olho do furacão. Esse movimento de doação e recepção, da recepção da doação e da doação da recepção da doação etc. etc., continuamente se abandona ao deixar-se continuamente para trás, abandona a si, se renuncia, se aniquila, morre para que haja vida, no retraimento humilde, pobre e sine proprio do servo inútil da disponibilidade-serventia, do servo de toda a humana criatura: Deus de Jesus Cristo, a Misericórdia. Esse modo de ser que está presente no ponto assintótico da fuga para dentro do olho de furacão que em tudo, de tudo, para tudo, é apenas a disponibilidade de ser usado como serviço à saúde da vida em todas as dimensões é o que está acenado nessa 4ª dimensão que é a da espiritualidade cristã e aparece junto do matrimônio cristão como o celibato cristão dos religiosos e das religiosas. Mas aqui se há algo como superioridade, está pertence ao matrimônio cristão, pois o celibato é na sua essência participação na essência desse Servo de toda humana criatura, cujo nome é um Deus chamado Jesus Cristo, o pobre e humilde, Crucificado. Essa Dimensão é anunciada por São Francisco de Assis como a Senhora Pobreza, e é a feminilidade originária, em cujo fascínio e em cuja atração da graça vivem tanto o varão como a mulher como cavalheiro(a)s, irmã(o)s de armas, companheiro(a)s, sócio(a)s , no seguimento de Jesus Cristo.
  5. Se tudo que aqui foi lançado assim de modo provisório, nas discussões ficar mais coerente e claro, então devemos tentar mostrar como o esquecimento da 4ª dimensão faz de-cair as dimensões 2 e 3 para variantes da dimensão 1: coisa bloco como pedra; e a nihilidade do vazio da ocorrência sem vida. E colocar a hipótese: Se assim 1 e 4 coincidem, disso não resultaria a Eucaristia e a Cruz como Morte de Deus e Morte da morte de Deus: Castidade, Obediência e Pobreza como Vida Consagrada, hoje?

[1] Pessoa é uma palavra chave da Espiritualidade. Não confundir, porém, aqui o conceito de sujeito com a pessoa. Pessoa só se torna compreensível na experiência do que na mundividência cristã, nem sempre muito transparente para dentro de si mesma até o fundo, é chamado de encontro de amor. De aqui entendido tanto como genitivo subjetivo como objetivo. Cf. O mistério da Santíssima Trindade: uma natureza em três pessoas.
[2] Todos esses termos significam coisas diversas, conforme são usados na Espiritualidade, Psicologia e Filosofia. Esses termos foram denominados por Blaise Pascal de mots primitifs, i. é, palavras originárias, e indicam não isso ou aquilo, nem conjunto disso ou daquilo, mas sim totalidade das totalidades, i. é, mundidade dos mundos, e nascem lá onde o ser humano se torna aquilo que é o próprio dele mesmo, a saber, existência, i. é, a aberta de todo um sentido do ser que inaugura uma nova paisagem do ser.
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