- Insistimos na leitura da última sentença do parágrafo 2, tentando ver melhor de que se trata. A sentença em questão é: “Já para Heidegger, pensar consiste em encontrar-se no Dasein com o Dasein, com a pré-sença na fenomenologia de todo e em todo fenômeno”.
E recordemos: “Para Husserl, pensar é exercer e exercitar a fenomenologia da consciência”. E nisso: “Pensar não é uma função tética de uma consciência transcendental”. Mas: “Pensar é acompanhar as peripécias, as vicissitudes e os percalços dessa ininterrupta passagem”. Sim, mas de que passagem? “Da passagem que em Husserl, pela intencionalidade, a consciência está sempre passando continuamente do fenômeno para a fenomenologia”. Pois: “Todo e qualquer fenômeno já é em si mesmo, como fenômeno, fenomenologia”. Mas em que sentido? “No aparecimento e desaparecimento de sua vigência, o fenômeno passa a recolher o ser e acolher o nada de suas diferenças e referências a si mesmo e a todos os demais fenômenos”.
- O simples fato de ser é fenômeno.
- Mas o fenômeno não é fato.
- Fenômeno já é em si mesmo, como fenômeno, fenômeno-logia.
- Fenômeno é, enquanto fenômeno, logia do fenômeno.
- Logia é Logos, e Logos é légein: é a vigência no aparecimento e desaparecimento, portanto no fenômeno, a recolher o ser e acolher o nada de suas diferenças e referências a si mesmo e a todos os demais fenômenos.
- Essa vigência é passagem.
- A passagem é entre-medio.
- Entre não é ligação dos já constituídos extremos, mas Stimmung, o verbo medial, a saber, a ligação como médium, ou melhor, como a tênue vibração da verdade do ser (a-létheia): passagem.
- No modo de ser, em que sempre de novo e cada vez temos ente e ente, o entre de um ente chamado sujeito e no e com o outro ente chamado objeto é uma relação intencional. Nessa relação intencional, embora não se dê o entre como ligação dos extremos já constituídos, o entre jamais é um encontrar-se no e com o outro de si na identidade de si, pois o que aqui se liga, o que aqui está ligado não é o ente no seu ser, mas re-petição do ente na sua entidade, na qual não se dá a passagem como re-vira-volta (Kehre), mas apenas como o médium do igual cujo sentido do ser se corporifica como algo. Assim o ente não vem à luz no seu ser, a não ser como “função” tética de uma consciência transcendental ou como conhecimento do ente, a partir, no e com o ente.
- Pensar nessa situação é exercer e exercitar a fenomenologia da consciência.
k. Para Heidegger, pensar é a mesma passagem. Só que é a in-sistência nessa passagem na qual o fenômeno se encontra como re-vira-volta na qual o Ser não é nem fundamento, nem causa, nem ente como-tal (überhaupt), mas suave vibração infinitesimal do toque e da passagem da verdade do ser e do ser da verdade, a-létheia.