Iconografia

Iconografia antoniana

Santo Antônio através dos séculos

Não existe uma imagem de Santo Antônio que lhe seja contemporânea e as mais antigas imagens que a ele se referem, apareceram a partir do final de 1200, são muito diversas uma das outras e não nos dão a possibilidade de reconstruir o seu aspecto físico. Para podermos imaginar como ele era, nos resta somente alguns rápidos passos literários.

O autor da «Assídua» (a primeira biografia do Santo), referindo-se à pregação do Santo realizada em Pádua durante a quaresma do ano em que morreu diz: «Causa realmente maravilha o fato de ser ele aflito por uma certa natural corpulência e também por uma contínua doença, e que porém, pelo zelo assíduo das almas, ele não deixasse nunca de pregar, de ensinar e de ouvir as confissões até o pôr do sol e quase sempre em jejum».

Nestas referências à sua «natural corpulência» e «doença contínua», de onde alguns chegaram a pensar em sintomas de hidropsia, podemos descobrir algum indício de como fosse o aspecto físico do Santo, que alguns pintores poderiam ter recolhido, quer referindo-se diretamente à «Assídua» ou também à tradição oral. Além disso, sobre a deformação física causada nos últimos anos pela doença de que viria a morrer, insiste também uma outra fonte literária, a de Tommaso de Pavia, enquanto o Rigaud, que nos relata a sua permanência na França, no-lo descreve macilento, sem com isso cair em contradição com o que diz a «Assídua». É, por outra forma, bem conhecido que os jejuns e as outras mortificações físicas, a que se submetia Santo Antônio, já desde a sua vida de eremita na Romanha, enfraquecera muito sua saúde.

A reabertura do túmulo do Santo, e o reconhecimento de seus ossos confirmaram que Santo Antônio possuía uma bela estrutura física e, alto, um metro e setenta, era bastante superior como estatura à média daquele tempo. Um outro interessante resultado deste reconhecimento foi a descoberta de sinais que testemunham o seu costume de rezar ajoelhado.

É ainda o mesmo anônimo autor da «Assídua» a nos deixar o mais breve indício sobre a figura do Santo quando fala de sua morte e da improvisa transformação de suas mãos que, perdendo a cor primitiva, tornaram-se brancas: «suas mãos, tornando-se brancas, venceram a beleza da cor que antes possuíam». Do que se pode deduzir que Santo Antônio fosse de cor morena clara, e que em todo caso possuía lindas mãos.

É claro que não obstante toda a nossa boa vontade, bem pouco podemos descobrir com estes testemunhos, a respeito da figura do Santo. Não podemos, porém, excluir que o próprio Giotto quando descreveu Santo Antônio nos dois famosos afrescos, de Assis e de Florença, que o mostram fazendo um sermão no capítulo de Arles e S. Francisco aparece milagrosamente, tenha tido em consideração uma tradição que afirmava que Santo Antônio era de corporatura grande.

A esta mesma tradição poderia se referir o anônimo pintor de 1300 que desenhou uma tela com uma imagem de Santo Antônio, que está sobre uma coluna da ábside de sua basílica e que conforme uma tradição popular seria a única verdadeira imagem do Santo … Santo Antônio é aí representado, de frente, tamanho natural, com o saio franciscano, abençoando com uma mão e segurando na outra um livro.

Sua face é imberbe e, se a pintura merece ainda crédito por causa dos danos do tempo e dos restauros realizados, não se deve excluir da figura aquela corpulência de que se falou. A seus pés, aparecem, em dimensões menores, segundo o costume da época, as figuras daqueles que subvencionaram a obra. Esta pintura, porém, situa-se no final do século 1300 e já este fato dá lugar a muitas dúvidas de que se trate de uma autêntica derivação de um retrato do Santo, que tivesse sido perdido, o que não parece possível pelo fato de ter se espalhado tão rapidamente e com tanto entusiasmo a devoção antoniana na cidade.

Não faltaram outras obras que no passado foram consideradas como autênticos retratos originais de Santo Antônio. O estudioso De Mandach, que no final do século passado publicou um livro, hoje já superado, mas que continua de importância fundamental, sobre a iconografia antoniana (Saint Antoine de Padoue et I’art italien), examina alguns quadros e demonstra a inconsistência do significado documentário a eles atribuído ou, no caso da imagem que se conserva no palácio da Genga em Espoleto, e que provém da antiga igreja de São Simão, a impossibilidade de ler realmente a obra.

Abandonada, portanto, a esperança de possuir uma imagem da verdadeira figura de Santo Antônio através dos documentos artísticos, não nos resta que considerá-los somente pelo único aspecto histórico válido, isto é, como testemunhos da difusão e das características do culto do Santo. Como em muitos outros casos foram expressão imediata e eloquente da consideração em que o Santo era tido, dos poderes carismáticos que lhe eram atribuídos, do modo com que era lembrado, amado e invocado pelos fiéis. Também a colocação destas obras pode ser importante. A sua imagem quase sempre colocada junta à de São Francisco, nos mostra a importância que teve Santo Antônio na Ordem Franciscana e como fosse considerado a figura mais representativa da Ordem logo em seguida à de seu fundador.

 


Exatamente em Pádua, no recinto que conduz da Basílica do Santo para a sacristia, encontramos um afresco, realizado no final do século 1200, e que representa a Virgem com o Menino, e ao lado São Francisco e Santo Antônio, em pé, com as faces sem barba, os dois muito semelhantes, de tal modo que somente as chagas deixam reconhecer São Francisco. Em um tímpano na igreja dos Frari em Veneza, e que data mais ou menos da mesma época, encontramos ainda São Francisco e Santo Antônio ao lado de Nossa Senhora, com a diferença porém que os dois santos além de estarem ajoelhados, trazem desta vez a barba. Poderíamos então continuar com uma classificação das imagens antonianas tendo como base a presença ou não da barba, mas é claro que esta distinção, além de nos convencer, no começo, da falta de um único modelo iconográfico, não nos levaria muito longe, ainda que, tendo como base um díptico conservado na Gallerie dell’Accademia de Florença e atribuído a Berlinghiero Berlinghieri, e sobre outras considerações, pareceria lógico afirmar que a imagem de Santo Antônio sem barba fosse a mais próxima a uma tradição que se refere à sua figura real. Naquele díptico, de fato, enquanto a imagem de S. Francisco, que totalmente conforme à tradição retratística do santo, é apresentado com a barba, a de Sto. Antônio é pelo contrário sem barba, e o fato pareceria não casual, e, considerado o empenho do pintor a dar uma certa verosimilhança às figuras, devido a circunstâncias objetivas. Enfim, também em Pádua, onde a recordação de Sto. Antônio podia ser obviamente mais viva, por todo o século XIV e XV ele é representado imberbe.

Existe uma clara diferença entre como Sto. Antônio é representado em Pádua e nas regiões circunstantes, realmente envolvidas pela presença do Santo e de seus milagres, e modo como é visto nas regiões mais distantes, onde o Santo, pelo menos num primeiro tempo, aparece como representante, da Ordem Franciscana, mesmo que em primeiro plano, ao lado do próprio S. Francisco, e mais tarde junto com S. Luís de Toulouse.

Enquanto na pintura da Itália setentrional o atributo do lírio consegue uma difusão muito ampla durante o século 1400, este permanecia por outro lado rejeitado na Toscana e na Úmbria onde pelo contrário aparecem freqüentemente dois outros atributos, chama e coração que se intercalam ao livro. Em muitas pinturas enquanto Sto. Antônio com a mão esquerda segura o livro, com a mão direita conserva ora a chama, ora o coração. A primeira pode significar o seu amor ardente e o sacrifício a Deus de sua própria vida, e o coração deve ter tido um significado idêntico. Estes atributos perduram por todo século 1400 e desaparecem quando o culto do Santo se fixou com uma iconografia mais definida e conhecida.

Muito mais tarde ainda apareceram os atributos da Cruz e do Menino Jesus, mas enquanto a presença da cruz, além de tardia, foi também esporádica, a imagem do Menino Jesus acabou tornando-se inseparável da imagem do Santo de tal modo que passou a constituir o motivo mais comum na iconografia moderna do mesmo Santo. Isto tem a sua origem num episódio descrito no Libra dos Milagres que nos conta como o Santo teria sido visto, em sua cela, com o Menino Jesus nos braços. Como no referido livro não se diz onde este milagre se deu, muitas localidades disputaram este privilégio. Conforme a tradição mais antiga este fato teria acontecido em Camposampiero, quando Sto. Antônio era hóspede do conde Tiso.

Um momento particular da história da iconografia do Santo deu-se na metade do século 1400, com a realização da estátua em bronze feita por Donatello, sobre o altar mór da Basílica. E isto não somente pelo valor intrínseco desta obra, mas pelo fato que apresentava uma figura de Sto. Antônio já decididamente distinta da precedente tradição mais ou menos retratística, e se preocupava sobretudo em refletir o significado ideal de sua espiritualidade. Naquele momento, a imagem de Sto. Antônio abandonava definitivamente toda conotação histórica para tornar-se o símbolo do ardor moral e de virtudes sobrenaturais com que era definitivamente considerado pela devoção popular.

Calendário Messaggero di S. Antonio – 1983