Assim como Francisco em seu tempo, os franciscanos de hoje foram acolhidos com muito afeto e cordialidade pelas lideranças religiosas e autoridades presentes no local. O evento foi promovido pela Conferência da Família Franciscana do Brasil (CFFB), Federação das Associações Muçulmanas do Brasil (FAMBRAS), União Nacional Islâmica (UNI) e Sociedade Beneficente Muçulmana de Santo Amaro (SOBEM).

Em sua fala, Ir. Cleusa Aparecida Neves, presidente da CFFB, afirmou que a ausência do diálogo e a incapacidade de ouvir têm causado sofrimento para a sociedade. “A partir da experiência de Francisco, em sua proximidade com o Sultão, somos provocados a trilhar caminhos da construção do diálogo. Em nosso núcleo de convívio, podemos estar juntos e dialogar, partilhar a vida expressando sonhos, identificando os desafios e criando estratégias para realizá-los”, convocou a religiosa.

Ir. Cleusa denunciou o autoritarismo dos governantes e a promoção de discursos que incitam o ódio pelo diferente e afirmou que a paz significa respeito e educação na relação com o outro. A religiosa convocou os presentes a terem uma postura de diálogo e convivência fraterna e solidária. “Que nossas vidas – iluminadas pela experiência de Francisco em seu encontro com o sultão – sejam mais ricas, com a capacidade de dialogar. E que esta capacidade seja visível em nossas atitudes, sentimentos e afetos. Sejamos pessoas do diálogo e construtores da paz, através da educação, pois paz significa educação. Uma chamada a aprender todos os dias a arte difícil da comunhão, a adquirir a cultura do encontro, clarificando a consciência contra qualquer tentação de violência ou rigidez, contrárias ao amor de Deus e à dignidade do ser humano”, concluiu a presidente da CFFB.

O presidente da Conferência dos Frades Menores do Brasil (CFMB) e Ministro Provincial da Província Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil, Frei César Külkamp, usou as palavras de Dom Hélder Câmara para chamar os presentes a uma relação de diálogo e colaboração. “Seja qual for sua situação de vida, pense em si e nos seus, mas torne-se incapaz de se fechar no círculo estreito de sua pequena família e sua manifestação religiosa. Adote de vez a família humana”, recordou o frade. Ele agradeceu a acolhida e afirmou que o evento aponta um caminho para vencer a intolerância religiosa e o fundamentalismo – que geram ódio, violência e destruição. “Queremos ser presença fraterna em toda humanidade, trabalhando para a integridade e o bem de toda a criação”, afirmou o frade.

Na guerra, todos nós perdemos

Em sua fala, o Sheikh Mohamad Al Bukai, Diretor Religioso da UNI declarou que na guerra não há vencedores. “Todos nós perdemos na guerra, porque perdemos nossa humanidade, nossos valores. A grande vitória acontece quando impedimos o conflito, seguindo o exemplo do nosso Profeta, quando conquistou a Meca sem derramar uma gota de sangue. E seguindo o exemplo de Francisco de Assis, que foi sozinho carregando a bandeira da paz. Este é verdadeiramente o super-herói”, salientou o Sheikh. Ele afirmou ainda que a humanidade sempre buscou a eternidade, desde Adão, mas que a eternidade se dá apenas através das ações praticadas, como o gesto entre Francisco e o sultão. “Há 800 anos, um homem de Deus ergueu a bandeira da paz e foi carregando sozinho, com muita coragem e com muita fé. E o resultado desta coragem é que hoje, 800 anos depois, estamos aqui, do outro lado do mundo, comemorando esta grande ação que ficou eternamente”, recordou Al Bukai. Ele manifestou sua esperança de que o encontro desta noite, na Mesquita da Misericórdia, também seja eternizado e lembrado em 800 anos.

Trabalhar em prol da liberdade religiosa

O presidente da Fambras Halal, Mohamed Hussein El Zoghbi, lamentou os inúmeros casos de intolerância religiosa registrados no Brasil e no mundo. Ele recordou que a Constituição Federal do Brasil, através do artigo 5º, assegura o livre exercício dos cultos religiosos, mas lamentou que na realidade isto não seja respeitado. “Este cenário pode ser transformado quando as religiões se unem, a sociedade se mobiliza e a justiça atua de maneira firme. Dessa forma, conseguiremos avanços. O que estamos fazendo hoje é importante neste sentido”, celebrou.

Ao final, ele presentou Ir. Cleusa e Frei César com uma réplica da corneta de marfim, presente do sultão a São Francisco. “Desejo que as religiões transformem sua força numa corneta de marfim, chamando seus fiéis a respeitar os diferentes credos e buscar um caminho de união. Há muita carência na sociedade brasileira, que pode ser amenizada com acolhimento, solidariedade, gestos fraternos vindos de qualquer grupo religioso. Que não permitamos que nos seja tirado o direito de professar a nossa fé”, concluiu El Zoghbi.

Sinais concretos e o desejo de ações conjuntas

Antes de iniciar o evento, os católicos franciscanos se uniram aos muçulmanos em oração. A Mesquita da Misericórdia acolheu fraternalmente todos os presentes, que puderam conhecer o espaço e ouviram as explicações do Sheikh Mohamad Al Bukai. Às 20h30, todos participaram de um momento de oração junto aos muçulmanos.

Na área externa, os líderes presentes plantaram um ipê, que ficará como um sinal concreto de tudo o que foi dito e realizado nesta noite histórica, e descerraram uma placa comemorativa. Durante o evento, os líderes e autoridades assinaram uma carta de compromisso pela tolerância religiosa. O cardeal de São Paulo, Dom Odilo Pedro Scherer, enviou uma carta felicitando a iniciativa. O vereador Rodrigo Goulart entregou aos presentes o voto de júbilo da Câmara Municipal de São Paulo pela promoção do evento.

Durante o evento, os presentes acompanharam apresentações culturais. Através de uma apresentação teatral, os franciscanos representaram o encontro entre Francisco e o sultão. Ao final do encontro, os presentes participaram de um coquetel com comidas árabes.


Fonte: https://franciscanos.org.br/noticias/franciscanos-e-muculmanos-celebram-a-amizade-e-o-dialogo.html